Década 2010-2020:
Rumo a uma vitória por nocaute do ouro sobre o dólar
A Reserva Federal dos EUA já não está em
condições de continuar o seu combate de muitas décadas
contra a "relíquia bárbara" a fim de assegurar a
supremacia da sua divisa no seio do sistema monetário internacional.
Como o LEAP/2020 analisa neste GEAB nº 41, a década que agora
começa vai portanto ser notavelmente marcada pelo nocaute total do
dólar (e a queda da maior parte das grandes divisas internacionais) face
ao ouro.
Como já lembrámos muitas vezes em diferentes números do
GEAB: o ouro constitui ao mesmo tempo uma aplicação de
médio/longo prazo destinada a tornar seguro o seu capital face aos
riscos de perda de valor das divisas-papéis e dos activos financeiros,
bem como um eventual meio de pagamento em caso de crise monetária muito
grave. Em ambos os casos, a opção de aplicar em ouro uma parte
dos seus haveres corresponde a uma antecipação dos acontecimentos
e dos riscos nos próximos anos (e não nas próximas semanas
ou meses). Neste GEAB nº 41, número especial do início de
uma nova década, pareceu portanto oportuno ao LEAP/E2020 propor a sua
antecipação sobre a evolução do ouro durante os
anos 2010-2020, completando os elementos já fornecidos pela nossa equipe
no
GEAB nº 34 de Abril de 2009
. Esta visão decenal é tanto
mais legítima porque consideramos que a nossa análise constitui
uma ajuda à decisão para os investidores individuais assim como
para os responsáveis de bancos centrais e de instituições
responsáveis pela perenidade a médio e longo prazo de grandes
quantidades de activos (como por exemplo os fundos de pensão, os fundos
soberanos e os seguros). Com efeito, pela primeira vez desde quase 40 anos
(desde o fim da convertibilidade do dólar em ouro em 1971), os
interesses dos bancos centrais mundiais e dos investidores individuais
convergem novamente: a garantia de valor não mais assegurada de todo
pelo dólar enquanto divisa internacional de reserva, e enquanto este
último não tiver sucessor global reconhecido, o ouro permanece o
único activo a poder tornar perene de forma duradoura este valor.
Já havíamos examinado a situação paradoxal do
mercado do ouro no GEAB nº 34, mostrando que se o mercado do metal amarelo
parecia realmente ser organizado pelo Fed e pelos grandes bancos centrais para
impedir toda apreciação significativa do ouro, não era
menos certo que, devido à crise sistémica global, ao afundamento
estrutural da influência dos Estados Unidos (e portanto do Fed) e
à desagregação conexa do sistema monetário
internacional herdado de 1971, o ouro era uma aplicação segura em
tempos altamente incertos. Para recordar: desde a data de
publicação do GEAB nº 34, o ouro ganhou mais de 30% em
dólares dos EUA e +23% em Euros. E ganhou mais de 100% em dólares
dos EUA e mais de 85% em Euros desde as primeiras recomendações
de diversificação das aplicações em favor do ouro
físico (até um terço dos activos) dadas pelo LEAP/E2020 em
2006.
Mas se o ouro viu efectivamente o seu curso subir consideravelmente desde esta
data, isto não se deveu a uma evolução do mercado para uma
maior transparência e menos manipulações pela Reserva
Federal americana e seus colegas principais. Os três dispositivos
principais utilizados para tentar impedir todo retorno do ouro ao seio do
sistema monetário internacional estão ainda em vigor, a saber:
- o desenvolvimento de um mercado de "ouro-papel" diluindo o mercado
do ouro físico num oceano de contratos fictícios pois no
essencial apoiados sobre um ouro que não existe realmente (ou, o que vem
a dar no mesmo, que é utilizado várias vezes para diferentes
contratos)
- a manipulação do nível das reservas reais de ouro
físico, nomeadamente as dos Estados Unidos que não são
objecto de nenhuma auditoria independente desde há décadas
- a política de comunicação sistemática
através dos grandes media económicos e financeiros visando
estigmatizar a aplicação em ouro como um reflexo arcaico,
reservado aos velhotes que não jurariam senão sobre o ouro assim
como recontariam muitas vezes as suas guerras esquecidas, e aos obcecados
enlouquecidos pelo metal amarelo.
Como todo o mundo pôde constatar no decorrer dos últimos quarenta
anos, e até ainda há pouco tempo, esta estratégia
funcionou notavelmente levando mesmo numerosos países, com o Reino Unido
à cabeça
[1]
, a se desembaraçarem a preço vil das suas reservas em metal
amarelo. Esta anedota ilustra assim muito bem a necessidade para os dirigentes,
seja de ter uma boa capacidade pessoal de antecipação dos
acontecimentos, seja de ter acesso a este tipo de antecipação. No
caso, a factura da não antecipação ter-se-á elevado
a pelo menos dez mil milhões de dólares.
Mas se a organização do mercado, que permite desde há
quarenta anos manter o ouro à distância do sistema
monetário internacional, continuou a estar operacional, o que é
que mudou para entretanto tornar possível esta forte alta do metal
amarelo? Foi a reversão de um factor essencial da ordem mundial, devido
ao impacto crescente da crise sistémica e da entrada na fase de
deslocação geopolítica mundial: a Reserva Federal dos EUA
não tem mais os meios para lutar contra este velho inimigo da hegemonia
do Dólar dos EUA que o ouro representa. Esta perda de meios é
naturalmente um fenómeno complexo, comportando várias facetas que
analisamos em pormenor neste número do GEAB.
Como indicado anteriormente, o aparecimento deste primeiro GEAB do ano, onde
publicamos tradicionalmente nossas antecipações para os 12 meses
seguintes, coincide excepcionalmente com o início de uma década;
e, além disso, de uma década de que todos os observadores atentos
sentem que vai marcar um pandemónio da ordem mundial. Também
excepcionalmente, Franck Biancheri, coordenador do GEAB, que prepara
actualmente um livro acercad o mundo após a crise (saída prevista
em França na Primavera de 2010), aceitou por à
disposição da nossa equipe, e portanto dos leitores do GEAB, as
grandes linhas de um dos seus dois cenários de antecipação
para a década 2010-2020. A nossa equipe aproveitou assim esta
ocasião para fazer com que os nossos assinantes fossem beneficiados com
um mergulho geopolítico racional daquilo que a década vir pode
nos reservar
[2]
. Dentre os dois calendários elaborados, intitulados respectivamente
"A aurora dolorosa do mundo posterior"
[3]
e "O crepúsculo trágico do mundo anterior"
[4]
, a nossa equipe optou por apresentar o segundo que é sem qualquer
dúvida o mais inquietante mas que nos parece também reflectir
mais lucidamente as tendência hoje em acção.
15/Janeiro/2010
Notas:
(1) Em 2004, Gordon Brown, então ministro das Finanças, foi o
arquitecto deste esplêndido fracasso económico-financeiro que
terá custado neste dia mais de 10 mil milhões de dólares
de não ganhos
(manque à gagner)
ao Tesouro britânico. A leitura deste artigo do
Times,
datado de 28/12/2009, proporciona um raro exemplo de comparação
vantajosa da França em relação ao Reino Unido pela sua
vontade na época de não seguir a "moda económica e
financeira" ditada por Washington. Dito isto, os contribuintes
britânicos podem consolar-se dizendo que se tivesse havido dez mil
milhões a mais nas suas caixas, o seu governo o seu governo os teria
dado igualmente aos bancos no decorrer dos últimos meses. E, para lhes
dar outra vez moral, que eles saibam que o
Times
esquece de precisar que Nicolas Sarkozy, então ministro francês
do Orçamento, havia orquestrado uma venda menos importante mas
também inteiramente ideológica do ouro nacional (Fonte:
Boursorama
, 30/12/2009). Sem comentários!
(2) Recordamos que este tipo de cenário, aqui apresentado como uma
crónica anual da próxima década, não tem como
pretensão descrever em pormenor os acontecimentos que virão. Ele
visa essencialmente permitir tornar mais compreensíveis, mais vivas, as
tendências identificadas no quadro do trabalho de
antecipação. Estas crónicas do futuro constituem pois de
alguma forma uma versão imaginada das análises fundamentais
desenvolvidas alhures.
(3) "A aurora dolorosa" pois dar à luz uma nova ordem mundial
não pode ser feito senão na dor, como todo parto, mesmo que a
seguir se revele positivo.
(4) "O crepúsculo trágico" pois se for esta via a que
se impõe, ela terá todas as características de uma
tragédia, a saber: o final infeliz e a percepção
consciente de todos os protagonistas da história de que ela vai terminar
muito mal.
[*]
Global Europe Anticipation Bulletin.
O original encontra-se em
www.leap2020.eu
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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