Os volteios da teoria económica
por Rick Wolff
A maior parte dos economistas estado-unidenses são professores em
faculdades e universidades. As suas posições académicas
permitem-lhes investigar e ensinar, supostamente de modo independente dos
interesses corporativos. Eles podiam, pelo menos hipoteticamente, proporcionar
as visões críticas dos problemas económicos que são
necessárias para a sua solução. Os economistas podem
ajudar a propor, avaliar e debater o vasto leque de soluções
possíveis desde aquelas que mudam minimamente o status quo
até as que implicam mudança social fundamental. Contudo, a
história mostra que a maior parte dos economistas profissionais tem sido
subserviente aos interesses corporativos ao invés de críticos
construtivos. Eles celebraram o capitalismo, ignoraram ou puseram de lado
sistemas económicos alternativos e só argumentam sobre como
melhor administrar os enormes custos sociais da recorrente instabilidade do
capitalismo. A vergonhosa subserviência corporativa dos economistas tem
sido a ruína do país.
O establishment profissional das Ciências Económicas nos EUA
seus membros auto-intitulam-se "corrente principal"
("mainstream")
nunca conduz. Ele sempre segue. Antes da Grande Depressão, os
economistas da corrente principal abraçavam respeitosamente o que
denominavam "teoria económica neoclássica". Esta
"ciência" económica mostrava, diziam eles, que o que
dava lucros para os negócios beneficiava toda a sociedade. Nesta
perspectiva da corrente principal, a empresa privada e os mercados funcionavam
melhor para toda a gente quando deixados livres da regulamentação
ou interferência governamental. Os grandes negócios dirigiam e
promoviam publicamente esta celebração do capitalismo.
Faculdades e universidades procuravam contribuições financeiras
dos negócios, dos seus proprietários e dos seus líderes.
Eles precisavam inscrever os filhos destas pessoas (poucas outras podiam
permitir-se arcar com os custos da educação superior). As
administrações académicas nem queriam nem apoiavam
professores que criticassem os interesses dos negócios privados ou de
alguma forma os desagradassem (através, por exemplo, do desafio à
corrente principal da ciência económica).
Após 1929, quando as empresas privadas e os mercados livres capitularam
diante da Grande Depressão, os negócios em grande medida passaram
a advogar intervenções maciças do governo para
"consertar" a economia rompida (tal como faz hoje, outra vez).
Excepto por uns poucos teimosos, os economistas profissionais rapidamente
seguiram-nos e reverteram a sua "ciência". Eles descobriram um
novo guru em John Maynard Keynes que exaltou as virtudes e clarificou os
mecanismos das intervenções económicas governamentais. A
corrente principal da ciência económica tornou-se keynesiana desde
o fim da década de 1930 até a década de 1970. Por toda a
parte os cursos de económicas nas faculdades ensinavam acerca de ciclos
de negócios (a expressão polida para designar a instabilidade
crónica do capitalismo). Os manuais instruíram uma
geração de que políticas monetárias e fiscais do
governo eram necessárias e meios eficazes de limitar, compensar e
finalmente eliminar os ciclos de negócios.
Na década de 1970, a corrente principal reverteu o seu curso mais uma
vez. A teoria económica keynesiana havia falhado para a ultrapassagem
ou mesmo a prevenção dos ciclos de negócios capitalistas
nos EUA. As políticas monetárias e fiscais não haviam
proporcionado a prosperidade, crescimento e estabilidade prometidos pelos
keynesianos. Enquanto isso, as corporações estado-unidenses
haviam-se tornado bastante ricas e poderosas ao passo que as
memórias da Grande Depressão haviam-se desvanecido bastante
para minar as regulamentações e controles do governo
provocados pela Grande Depressão. Porque os negócios
ressentiam-se com as intervenções governamentais que limitavam
lucros, os interesses corporativos promoveram a candidatura Reagan à
presidência. A sua vida ao serviço dos interesses corporativos
qualificava-o para reverter o New Deal. Cortes fiscais, especialmente para os
negócios e os ricos, e desregulamentação tornaram-se
fórmulas encantatórias para os líderes políticos de
ambos os partidos. A América corporativa retomou a
celebração anterior a 1929 da empresa privada e dos mercados
livres.
Os economistas académicos também seguiram. Todos os curricula,
manuais e conferências foram mudados. A teoria económica
keynesiana foi afastada, a teoria económica neoclássica estava de
volta e Milton Friedman era o novo guru. Ele fora um teimoso que se mantivera
a celebrar a empresa privada e os mercados livres ao longo do período em
que a corrente principal era keynesiana. Então, quando os
negócios progressivamente decidiram que "a nossa economia
não precisa mais da intervenção do governo" que
constrangia os lucros, Friedman obteve o seu apoio para o departamento de
ciências económicas da Universidade de Chicago. Assim, na nova
América de Reagan, a profissão económica respeitosamente
considerou que a teoria económica de Friedman era agora
"correcta" e "científica". Ele e os seus apoiantes
assumiram o comando da corrente principal. Eles marginalizaram os keynesianos
e ardorosamente re-endossaram a velha teoria económica
"neoclássica" anterior a 1929 que exaltava a empresa privada e
os livres mercados como garantes da prosperidade.
Foi tão completa a adopção da teoria económica
neoclássica pela corrente principal académica que muito poucos
estudantes aprenderam acerca da instabilidade do capitalismo. Os cursos sobre
ciclos de negócios, outrora obrigatórios no curriculum de
económicas, em grande medida desapareceram. Os economistas do governo
Bush eram produtos de educações económicas que os
incapacitavam para lidar com o maciço crash capitalista de hoje.
Portanto, eles (1) deixaram de ver, muito menos impedir, o crash; (2)
esperaram demasiado para actuar quando o crash se desenrolava no fim de 2007 e
durante 2008, e (3) propuseram mal planeadas e pouco eficazes políticas
governamentais, após a outra, desde meados de 2008. Os economistas
reunidos por Obama são exemplos da mesma geração
incapacitada.
A vergonhosa história de oportunismo desta profissão pode ser
melhor ilustrada pela reunião anual de Janeiro de 2009 da suprema
American Economics Association (AEA). O fim de 2008 assistiu os grandes
negócios obterem milhões de milhões em salvamentos do
governo. Destacados economistas da corrente principal na reunião da AEA
covardemente anunciaram os erros dos seus antigos caminhos e advogaram o
retorno à teoria económica keynesiana. Os economistas
neoclássicos viam as suas carreiras em perigo e actuaram rapidamente. O
repórter Louis Uchitelle, do
New York Times,
utilizou mesmo a expressão religiosa "conversão" para
a comunicação apresentada por Martin Feldstein, de Harvard.
Contudo, como muitos cristãos renascidos, os keynesianos renascidos
não terão dúvidas em retroceder ao primeiro sinal de
estabilização do sector financeiro.
Para resumir, as repetidas oscilações entre a teoria
económica neoclássica e a keynesiana na definição
da corrente principal revela a subserviência oportunista da
profissão às necessidades dos negócios. A mesma
subserviência explica porque ela se recusa firmemente a contratar os
economistas que respondem à instabilidade do capitalismo advogando a
mudança social para sistemas económicos alternativos. Na esteira
de mais outro maciço colapso capitalista, entretanto, as nossas escolhas
reais não precisam e não deveriam ser limitadas à teoria
económica neoclássica ou keynesiana, para uma mera
comutação entre formas de capitalismo privado e administrado pelo
Estado. As razões para argumentar a favor de movimentos para
além do capitalismo nunca foram tão fortes. A agora
considerável literatura teórica sobre economias
pós-capitalistas (por exemplo, S. Resnick e R. Wolff,
Class Theory and History: Capitalism and Communism in the USSR
) e a acumulação de experiências locais e nacional com as
mesmas proporciona amplos recursos e lições a fim de efectuar tais
movimentos.
O original encontra-se em
http://mrzine.monthlyreview.org/wolff180109.html
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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