Desemprego já atinge 1,3 milhão de portugueses,
mas para o 1º ministro isso não é um problema importante

por Eugénio Rosa [*]

Os portugueses ficaram a saber pela boca do 1º ministro Passo Coelho, no discurso que fez na festa do PSD no Pontal, que o desemprego em Portugal não é um problema importante porque " o que era importante não falhamos ". Nas próprias palavras do 1º ministro; o desemprego é uma mera " nota negativa ". E isto no dia em que o INE divulgou os dados sobre o desemprego do 2º Trimestre de 2012, que revelavam que 1,3 milhões de portugueses estavam desempregados ou subempregados por falta de trabalho, e estatísticas recentes da Segurança Social informavam que o número de desempregados a receber subsidio de desemprego tinha diminuído no 2º Trimestre deste ano, apesar do desemprego continuar a aumentar. Mas analisemos os dados divulgados pelo INE e pela Segurança Social para se poder avaliar a dimensão da insensibilidade social e da falta de respeito pelos desempregados do 1ºministro.

DESEMPREGO E SUBEMPREGO POR FALTA DE TRABALHO JÁ ATINGE 1,305 MILHÕES DE PORTUGUESES E APENAS 356,5 MIL DESEMPREGADOS ESTÃO A RECEBER SUBSIDIO DE DESEMPREGO

Com os dados divulgados pelo INE construiu-se o quadro seguinte.

Quadro 1- Desemprego e subemprego em Portugal por falta de trabalho, e desempregados a receber subsidio de desemprego
RUBRICAS
2ºT-2011
3ºT-2011
4ºT-2011
1ºT-2012
2ºT-2012
População Activa - Mil 5 568,0 5 543,4 5 506,5 5 481,7 5 515,2
DESEMPREGO OFICIAL - Mil 675,0 689,6 771,0 819,3 826,9
TAXA DE DESEMPREGO OFICIAL 12,1% 12,4% 14,0% 14,9% 15,0%
Inativos disponíveis mas que não procuram emprego - Mil 147,7 193,4 203,1 202,1 217,4
Subemprego de trabalhadores a tempo parcial - Mil 211,4 210,2 238,0 255,8 261,0
DESEMPREGO REAL - Mil 1034,1 1093,2 1212,1 1277,2 1305,3
TAXA DE DESEMPREGO REAL 18,1% 19,1% 21,2% 22,5% 22,8%
Desempregados a receber subsidio de desemprego - Mil 285,7 296,3 316,1 360,7 356,5
TAXA DE COBERTURA DO SUBSIDIO DE DESEMPREGO
Percentagem do desemprego oficial 42,3% 43,0% 41,0% 44,0% 43,1%
Percentagem do desemprego real 27,6% 27,1% 26,1% 28,2% 27,3%
Fonte : Estatísticas do Emprego - 2º Trim. 2012; Subsidio de Desemprego - Estatísticas da Segurança Social

O INE na informação referente ao 2º Trimestre de 2012 utilizou dois conceitos novos que é importante ter presente para compreender os dados do quadro 1. O primeiro, é o "Subemprego de trabalhadores a tempo parcial" que, segundo o INE, corresponde ao " conjunto de indivíduos empregados dos 15 aos 74 anos que, no período de referência em que foi realizado o inquérito, tinham um trabalho a tempo parcial (inclui os "biscates" para sobreviver) e declararam pretender trabalhar mais horas do que as que habitualmente trabalham e estavam disponíveis para isso"; portanto, são pessoas que desejam trabalhar mais para obter uma melhor remuneração e que só o não fazem porque não encontram trabalho. Este conceito substitui o "subemprego visível" que o INE utilizava anteriormente.

O segundo conceito novo é o de "Inativo disponível mas que não procura emprego" que é, segundo o INE; o "inativo com idade dos 15 aos 74 anos que, no período de referência, estava disponível para trabalhar, mas não tinha procurado um emprego ao longo do período de referência ou nas três semanas anteriores ao inquérito do INE". Este conceito substitui o anterior que era o de "Inactivo disponível ", que incluía também os "inactivos disponíveis desencorajados" que eram aqueles que tinham deixado de procurar emprego porque já não acreditavam que o conseguem arranjar. Portanto, estes dois grupos abrangidos pelos novos conceitos utilizados pelo INE, que os adoptou por serem usados pelo Eurostat, são constituídos (ambos) por portugueses que estão aptos e disponíveis para trabalhar mas ou que o não fazem ou fazem apenas um número reduzido de horas porque não encontram trabalho para o poderem fazer. Na prática, ou estão totalmente sem trabalho ou apenas conseguem trabalhar poucas horas.

Assim, o desemprego oficial que no 2º Trimestre de 2012 atingiu a taxa 15% (15,4% segundo o Eurostat), o que corresponde a 829,6 mil desempregados (849 mil segundo o Eusrostat), se somarmos aqueles dois grupos, um de desempregados e o outro de subempregados, obtém-se 1.305.300, o que corresponde a uma taxa de desemprego real de 22,8%. E no fim do 2º Trim.- 2012, apenas 356,5 mil desempregados (43,1% do desemprego oficial; 27,3% do desemprego real) recebiam subsidio de desemprego, segundo a Segurança Social. E o número de desempregados a receber subsidio que tinha aumentado até ao 1º Trim.2012 para 360,7 mil, no 2º Trim.-2012 diminuiu para 356,5 mil, apesar do desemprego continuar a crescer. Mas isto não é um problema importante para o 1º ministro"; nas suas palavras é apenas uma "nota negativa".

A EXCLUSÃO SOCIAL DOS DESEMPREGADOS ESTÁ A AUMENTAR DEVIDO À SUBIDA RÁPIDA DO DESEMPREGO DE LONGA DURAÇÃO

O desemprego de longa duração está a aumentar muito como revelam os dados do INE.

Quadro 2 – Duração do desemprego 2001/2012
DURAÇÃO DO DESEMPREGO
2ºT-2011
3ºT-2011
4ºT-2011
1ºT-2012
2ºT-2012
Menos de 1 mês - % do Total 3,6% 5,4% 4,2% 3,5% 2,8%
1 a 6 meses - % do Total 28,3% 28,5% 32,8% 33,6% 29,1%
7 a 11 meses - % do Total 13,0% 14,5% 10,5% 12,1% 14,5%
12 a 24 meses - % do Total 21,8% 21,0% 20,3% 23,0% 19,4%
25 e mais meses - % do Total 33,3% 30,7% 32,3% 27,8% 34,2%
DESEMPREGO OFICIAL – Mil 675,0 689,6 771,0 819,3 826,9
LONGA DURAÇÃO – Mil 372,3 356,4 405,5 416,2 443,3
Fonte: Estatísticas do Emprego – 2º Trimestre de 2012 – INE

Entre o 2º Trim.-2011 e o 2º Trim.-2012, o desemprego de longa duração, ou seja, com mais de um ano, passou de 372,3 mil para 443,3 mil, representado, no fim do 2º Trim.-2012,já 53,6% do desemprego oficial total. Para a maioria destes desempregados de longa duração, significa a crescente exclusão do mercado de trabalho, pois devido à sua baixa escolaridade (63,1% tinham o ensino básico) será cada vez mais difícil encontrar emprego. Mas para o 1º ministro, isso também não é um problema importante., o que é importante é obter uma avaliação positiva da troika.

A "REGRA DE OURO" DE PASSOS COELHO SIGNIFICA QUE SEJAM SÓ AS GERAÇÕES ACTUAIS A PAGAR OS INVESTIMENTOS QUE AS GERAÇÕES FUTURAS IRÃO TAMBÉM BENEFICIAR

No discurso que fez no Pontal, Passos Coelho não falou uma única vez de qualquer medida para impulsionar o crescimento económico, nem para criar emprego. Certamente porque isso também não é um problema importante para o 1º ministro, ou então porque acredita, cego pela ideologia neoliberal, que as "avaliações positivas da troika" trarão, como por milagre, o crescimento económico. No entanto, o 1º ministro foi ao baú das velharias salazaristas, e retirou dele aquilo que chamou a "regra de ouro" de qualquer governo a qual, segundo ele, devia ser inscrita na Constituição para obrigar todos os governos a respeitá-la. E essa "regra de ouro" é que o governo nunca devia fazer qualquer despesa que aumentasse a divida. E isto com a justificação de não sobrecarregar as gerações futuras que teriam de pagar essa divida.

A ignorância sobre a economia e tacanhez desta "regra de ouro" salazarenta tornam-se claras quando a confrontamos com a realidade. E para isso basta imaginar algumas situações reais. Suponha-se um investimento na construção de um hospital, ou de uma escola, ou de uma universidade, ou ainda de uma estrada ou então medidas para impulsionar o crescimento económico e o desenvolvimento do país. É evidente, pela duração da sua vida útil, que esse hospital, essa escola, essa estrada vão ser utilizadas também pelas gerações futuras, assim como o crescimento económico e o desenvolvimento do país vão também beneficiar as futuras gerações. Se o Estado nunca se pudesse endividar para fazer esse tipo de investimentos, tal significaria que as gerações actuais teriam de pagar integralmente esses investimentos, embora eles fossem também utilizados pelas gerações futuras, ou então esses investimentos não se realizariam e o país não se desenvolvia.

A "regra de ouro" salazarista, agora também adoptada por Passos Coelho, a vingar só poderia conduzir o país ao atraso e à anemia económica, tal como sucedeu no salazarismo. A defesa do investimento público com base no endividamento não significa que todos os investimentos públicos sejam bons investimentos e por isso devam ser realizados. A situação que o país actualmente enfrenta também resultou de maus investimentos públicos. São exemplos a compra dos submarinos; a construção de estádios de futebol que não são utilizados; as rendas excessivas pagas pelo Estado a grandes empresas como a EDP e Mota-Engil, que ninguém tem coragem para as reduzir, embora não se canse de prometer; benefícios fiscais enormes concedidos às grandes empresas como à GALP e à banca, a construção de centenas de quilómetros de auto-estradas quando era suficiente uma boa estrada; e múltiplas despesas onde se continua a desbaratar impunemente fundos públicos (leia-se o livro recente de Bárbara Rosa e Rui Oliveira, a Má despesa pública , que é esclarecedor).

Há boa despesa pública e má despesa pública, e é necessário e urgente boa despesa pública para tirar Portugal da recessão económica e para criar emprego. Mas a cegueira neoliberal e o espírito de classe impedem Passos Coelho e Vítor Gaspar de compreenderem este ensinamento elementar da ciência económica. Nenhuma empresa funcionaria nem se desenvolveria com gente à frente dela com esta miopia e tacanhez.

15/Agosto/2012

[*] edr2@netcabo.pt

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
16/Ago/12