O OE2007: Um orçamento de confronto com os trabalhadores e que vai
determinar a degradação da Administração
Pública e dos serviços essenciais que esta presta à
população
RESUMO DESTE ESTUDO
Na Proposta de Orçamento para 2007 apresentada pelo governo o valor
constante na rubrica "Remunerações certas e
permanentes", ou seja, para pagar os vencimentos aos trabalhadores da
Administração Pública Central, o governo inscreveu menos
435,7 milhões de euros do que em 2006.
Se a análise for feita por ministérios, conclui-se que em
três ministérios se verifica um aumento de valor, enquanto em onze
ministérios se regista uma diminuição que totaliza 446,2
milhões de euros. O ministério mais atingido é o
da Educação com uma redução de
355, 5 milhões de euros em "Remunerações certas e
permanentes".
Durante o debate na Assembleia República da Proposta do OE para 2007,
colocamos esta questão a vários ministros e embora o
ministro
das Finanças tenha fugido a responder a ela, pelo que tivemos de enviar
ao Ministério das Finanças um requerimento a pedir essa
informação tanto o ministro do Ensino Superior como a
ministra
da Educação confirmaram esse facto, tendo o ministro Mariano Gago
dito que isso era intencional e que visava, pela via das
remunerações, obrigar os estabelecimentos do ensino superior a
despedir trabalhadores. A ministra da Educação procurou
responsabilizar os sindicatos dizendo que já tinha pedido a estes
propostas para reconversão dos trabalhadores considerados
excedentários, e se eles não apresentarem teria de resolver a
situação com os conselhos directivos.
Admitindo que a informação dada pelo ministro das Finanças
é verdadeira que a redução liquida do número
de trabalhadores da Administração Pública em 2007
prevista pelo governo seria apenas de 5.900 o governo para obter a
redução do valor das "Remunerações certas e
permanentes" que resulta da Proposta de OE2007, teria de colocar na
situação de Mobilidade Especial mais de 100.000 trabalhadores da
Administração Pública, pagando a cada um deles menos um
sexto do seu vencimento. É evidente que é uma politica de
confronto com os trabalhadores, que só poderá levar à
degradação quer da Administração Pública
quer da qualidade dos serviços essenciais prestados por ela à
população.
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Neste momento está em debate na Assembleia da República a
Proposta de Orçamento do Estado para 2007 apresentada pelo governo.
Apesar de ser um documento extenso e técnico, portanto de leitura
difícil, é necessário que os portugueses o conheçam
bem porque ele vai afectar profundamente a sua vida nos próximos anos, e
não apenas em 2007. Neste estudo analisaremos a forma como os
trabalhadores da Administração Pública são
tratados, deixando para estudos futuros outros aspectos também muito
importantes dele.
Uma análise atenta da Proposta de Orçamento do Estado para 2007
permite ficar a saber de uma forma concreta o que este governo tenciona fazer
em 2007 em relação à Administração
Pública e aos seus trabalhadores, assim como as eventuais
consequências que essas medidas vão ter nos serviços mais
importantes prestados à população, como seja, a
educação, a saúde, etc., ou seja, na área das
funções sociais do Estado.
O GOVERNO INSCREVEU EM "REMUNERAÇÕES CERTAS E
PERMANENTES" DOS TRABA-LHADORES DA ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA PARA 2007 MENOS DO QUE EM 2006
Se se comparar o valor inscrito na rubrica "Remunerações
certas e permanentes", que servem para pagar os vencimentos a todos os
trabalhadores da Administração Pública Central constante
do Orçamento do Estado para 2007 com o valor que constava do
Orçamento de 2006 conclui-se que ele sofreu uma redução em
relação ao ano anterior que, no contexto actual, é
significativa.
Assim, cruzando dados que constam de diversos mapas, incluindo os dos
Serviços Integrados, da Proposta de Orçamento do Estado para 2007
fornecidos pelo governo com os de 2006, portanto dados constantes de documentos
oficiais, e apesar dos obstáculos criados por este governo para
dificultar essa análise (a informação sobre "Despesas
com Pessoal por classificação económica" constante do
Relatório do OE2007 está mais agregada que a do Relatório
do OE2006 visando dificultar a sua análise); repetindo, fazendo aquele
cruzamento conclui-se que o valor para 2007 é inferior ao de 2006.
Efectivamente, de acordo com a informação constante dos Mapas dos
"Serviços Integrados" anexos à Proposta de
Orçamento de Estado, na rubrica "Remunerações certas
e permanentes", em 2006 estavam orçamentados 8.389,9 milhões
de euros, enquanto em 2007 estão apenas 8.162,9 milhões de euros,
ou seja, menos 227,1 milhões de euros.
No entanto, estes dados ainda não traduzem a totalidade da
redução das verbas orçamentadas destinadas ao pagamento
dos vencimentos dos trabalhadores da Administração
Pública. Há ainda a acrescentar a parcela da chamada
"Dotação Provisional" constante do Orçamento do
Estado destinada ao pagamento das "despesas de Pessoal" . E esse
valor foi, em 2006, de 329,1 milhões de euros e, em 2007, é
apenas de 120,5 milhões de euros.
Somando estes dois valores, ou seja, ao valor inscrito na rubrica
"Remunerações certas e permanentes" a parcela da
"Dotação Provisional" destinada , em cada ano, ao
pagamento de "Despesas de Pessoal" obtém-se 8.719,0
milhões de euros para o ano de 2006 e, apenas, 8.283,3 milhões
de euros, ou seja, menos 435,7 milhões de euros; em percentagem menos
-5%, que é um valor já referido pelo próprio governo.
COMO É QUE O GOVERNO VAI CONSEGUIR REDUZIR A DESPESA COM AS
"REMUNERAÇÕES CERTAS E PERMANENTES" EM 435,7
MILHÕES DE EUROS
A questão fundamental que se coloca, porque ela vai afectar
profundamente a vida dos trabalhadores da Administração
Pública e também de todos os portugueses, na medida em que ela
vai ter efeitos na qualidade e quantidade de serviços prestados à
população, é a seguinte: Como é que o governo vai
conseguir reduzir as despesas naquela dimensão (-435,7 milhões de
euros)? Tenha-se presente que mesmo o reduzido aumento de 1,5% que o governo
pretende impor aos trabalhadores da Administração Pública
em 2007, determinará um acréscimo de despesa, só a
nível das "Remunerações certas e permanentes",
de cerca de 122 milhões de euros, o que é superior ao valor da
"Dotação Provisional" para "Despesas com
Pessoal" em 2007.
A resposta só pode ser de duas uma: Ou reduzindo significativamente o
número de trabalhadores da Administração Pública ou
colocando milhares de trabalhadores na chamada "Situação de
Mobilidade Especial", que é o novo nome dos
"supranumerários", com vencimento reduzido.
Durante o debate do OE2007, o Ministro das Finanças informou que a
previsão de redução de trabalhadores para 2007 era de
5.900, ou seja, praticamente metade do número de
aposentações previstas. Utilizando como base de cálculo o
valor da despesa média anual por trabalhador, conclui-se que a
redução naquele número determinaria, na melhor das
hipóteses, uma redução de despesas de cerca de 92
milhões de euros, restando ainda 343,7 milhões de euros.
Se admitir que a informação do Ministro das Finanças
é verdadeira, ou seja, que o governo não pretende despedir, sendo
a redução apenas resultante da regra anunciada por cada
dois que saiam entra um então seria necessário colocar
cerca de 130.000 trabalhadores na Situação de Mobilidade Geral a
receberem menos um sexto do seu vencimento (se a totalidade da
"Dotação Provisional" não for atribuída
apenas a "Remunerações certas e permanentes" mas
repartida proporcionalmente pelas diferentes subrúbricas das
"Despesas de Pessoal", o que determina que fique menos para
"Remunerações certas e permanentes", o número
de trabalhadores que teriam de ser colocados na SME para obter a
redução de despesa necessária rondaria os 100.000).
O PROBLEMA É AINDA MAIS GRAVE, SENDO A EDUCAÇÃO O SECTOR
MAIS ATINGIDO
O valor global anterior de redução menos 435,7
milhões de euros ainda pode ocultar problemas mais graves, pois a
redução do valor das "Remunerações certas e
permanentes" não é igual em todos os ministérios e,
como em alguns o valor aumenta, a redução em outros
ministérios é ainda maior.
O quadro seguinte, em que os valores das "Remunerações
certas e permanentes" se encontram desagregadas por ministérios,
permite fazer uma análise mais fina e tirar conclusões mais
aderentes à realidade.
Nos valores por ministérios ainda não está incluída
a "Dotação Provisional" para Despesas com Pessoal
(329,1 milhões de euros em 2006 e 120,5 milhões de euros em 2007)
pois desconhece-se a sua repartição por cada um deles. No
entanto, como o valor da dotação em 2006 é 2,7 vezes
superior à de 2007, a sua inclusão só determinaria o
agravamento da diferença identificada.
Assim, em apenas três ministérios
Administração Interna, Justiça e Economia se
verificam aumentos nas dotações destinadas ao pagamento de
vencimentos aos trabalhadores. Em onze Ministérios
Negócios Estrangeiros, Finanças, Defesa, Ambiente e
Desenvolvimento Regional, Agricultura, Obras Públicas, Trabalho,
Saúde, Educação, Ensino Superior, e Cultura
registam-se reduções, entre 2006 e 2007, nos valores nominais
atribuídos a cada Ministério.
O caso mais grave e paradigmático é o do Ministério da
Educação, onde a redução atinge 355,5
milhões de euros, o que vai levar certamente a uma redução
importante do número de trabalhadores, com consequências graves em
todo o sistema escolar e, portanto, para o País que enfrenta uma
gravíssima situação neste campo, já que 72% da
população empregada portuguesa tem ainda o ensino básico
ou menos e o abandono escolar em Portugal, o mais elevado em toda a
União Europeia, foi, segundo o Eurostat, de 38,6% em 2005.
MINISTROS CONFIRMAM A REDUÇÃO E O CONFRONTO COM OS TRABALHADORES
Durante o debate na Assembleia da República sobre o OE2007, colocamos
directamente ao Ministro do Ensino Superior e à Ministra da
Educação a redução das verbas inscritas nos
orçamentos dos seus ministérios destinadas ao pagamento de
vencimentos dos trabalhadores, procurando saber as razões e a forma como
iriam ser obtidas aquelas reduções. E obtivemos as seguintes
surpreendentes e esclarecedoras respostas.
Ambos confirmaram a redução dos valores destinados ao pagamento
das "Remunerações certas e permanentes" em 2007, quando
comparado com os valores de 2006. O ministro do Ensino Superior afirmou que
isso era intencional com o objectivo de obrigar as Universidades e os
Institutos Politécnicos a reduzir as suas estruturas de acordo com os
objectivos do governo. Portanto, o governo, utilizando a redução
do dinheiro destinado ao pagamento das remunerações pretende
obrigar os estabelecimentos de ensino superior a despedir trabalhadores,
nomeadamente pessoal docente. Paralelamente, O Ministério do Ensino
Superior criou um saco azul de mais de 552 milhões de euros na
Função para a Ciência e Tecnologia, donde tirará
verbas que concederá apenas aqueles estabelecimentos que o
Ministério considere mais competitivos. A ministra da
Educação procurou transferir tal responsabilidade para os
sindicatos, informando que já tinha pedido a estes propostas para
reconversão do pessoal considerado excedentário, e se estes
não as apresentassem iria resolver a situação com os
directores das escolas.
É evidente que a estratégia do governo é de confronto com
os trabalhadores, e de despedimentos ou de colocação de milhares
de trabalhadores da Administração na Situação de
Mobilidade Especial, o novo nome para o "quadro dos
supranumerários, o que só poderá determinar a
fragilização e a degradação da
Administração Pública, com consequências graves e
muito negativas na qualidade dos serviços prestados à
população.
29/Outubro/2006
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Economista,
edr2@netcabo.pt
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