A ligação das pensões à economia e à demografia já existe, mas a politica do governo PSD/CDS e da "troika" está a destruir a Segurança Social

por Eugénio Rosa

Está neste momento em curso no nosso país uma campanha gigantesca de propaganda do governo – em que muitos media estão a colaborar pelo facto de não informarem de uma forma objetiva os portugueses – visando criar a ideia na opinião pública de que é necessário reduzir as pensões porque só assim é que o sistema seria sustentável. E para isso têm também procurado difundir a ideia que o peso das pensões elevadas é grande e que as pensões não estão ligadas nem à economia nem à demografia. Ora tudo isso é mentira.

PENSÕES CONGELADAS EM 2011 POR GOVERNO DE SÓCRATES, E A PARTIR DESSE ANO APENAS TÊM SIDO "ATUALIZADAS" AS PENSÕES ATÉ 246€, E OS AUMENTOS SÃO DE 9 CÊNTIMOS/DIA

Segundo dados oficiais (os últimos disponibilizados são de 2012), na Segurança Social, num total de 3 milhões de pensionistas, apenas 12.000 recebiam pensões superiores a 2.500€, e na CGA de um total de 594.000 apenas 53.500 recebiam pensões superiores também a 2500€.

Em 2011, o governo de Sócrates congelou todas as pensões incluindo as mínimas. Em relação a 2012, 2013 e 2014, o governo PSD/CDS diz, na sua propaganda para iludir a opinião pública, que descongelou as pensões mínimas, e que até as aumentou. A verdade é outra bem diferente. As pensões mínimas da Segurança Social têm quatro escalões cujos valores, em 2010, variavam entre 246,36€ e 379,04€. O governo PSD/CDS apenas tem aumentado o 1º escalão, ou seja, a de 246,36€, deixando os restantes escalões tanto da Segurança Social como da CGA congelados desde 2010. E o mesmo sucede com as pensões de sobrevivência. E os aumentos que tem feito nas pensões de 246,36€ têm sido irrisórios e mesmo chocantes. Em 2012, o aumento mensal nestas pensões foi de 7,64€, o que correspondeu a 25 cêntimos por dia; em 2013, o aumentou foi já de 2,79€ por mês, o que dá 9 cêntimos por dia; e, em 2014, a subida nestas pensões foi somente de 2,57€ por mês, o que corresponde a menos de 9 cêntimos por dia. São com estes aumentos que o governo alimenta a sua propaganda sobre a atualização das pensões mínimas procurando assim enganar a opinião pública. Se olharmos para as estatísticas da Segurança Social sobre a repartição de pensionistas por escalões de pensão (as últimas constam do Relatórios e Contas da Segurança Social de 2012), conclui-se que a esmagadora maioria dos pensionistas está no escalão entre 253,99€ e 419,21€ (1.177.965 reformados em 2012), e praticamente a totalidade destes reformados com pensões, a maioria deles, abaixo do limiar da pobreza não têm tido qualquer aumento nas suas pensões desde 2010, o que determinou que mesmos estes tenham sofrido com o governo PSD/CDS uma redução de 8% no seu poder de compra. E o FMI, entrando na campanha de propaganda e de engano do governo PSD/CDS, ainda tem a "lata" de vir dizer, num estudo que recentemente divulgou e que já referimos, que os mais atingidos pela política de "austeridade" têm sido os ricos.

A LIGAÇÃO DO VALOR E DO AUMENTO DAS PENSÕES À DEMOGRAFIA E AO PIB

O governo, e os seus defensores nos media, têm procurado criar na opinião pública a ideia de que o valor das pensões e o seu aumento não estão ligados nem à demografia nem à economia, o que criaria uma situação insustentável. Tudo isto é uma grande mentira.

Existem já três instrumentos legais que ligam as pensões à demografia e à economia.   O primeiro deles, é o chamado fator de sustentabilidade, que reduz o valor da pensão em vigor desde 2007 e previsto no artº 35º do Decreto-Lei 187/2007. E o corte na pensão é tanto maior quanto mais elevada é a esperança de vida aos 65 anos. Em 2014, o governo alterou arbitrariamente a fórmula de cálculo do fator de sustentabilidade o que determinou que o corte na pensão, apenas determinado por este facto, tenha aumentado de 5,43% para 12,34%. Em alternativa, os trabalhadores são obrigados a se reformarem ou aposentarem um ano mais tarde – aos 66 anos – mas todos aqueles que se reformem ou aposentem antes dos 66 anos (desempregados de longa duração, militares, aposentação antecipada, etc.) sofrem um corte na sua pensão de 12,34% em 2014.   A segunda disposição legal que liga o valor da pensão à economia é o coeficiente de revalorização que serve para atualizar as remunerações tanto no setor privado como na Administração Pública utilizadas no cálculo das pensões. Segundo o nº2 do artº 27º também do Decreto-Lei 187/2007 " Os valores das remunerações registadas entre 1 de Janeiro de 2002 e 31 de Dezembro de 2011, para efeitos do cálculo da pensão com base em toda a carreira contributiva, previstos nos artigos 32.º e 33.º, são actualizados por aplicação de um índice resultante da ponderação de 75% do IPC, sem habitação, e de 25% da evolução média dos ganhos subjacentes às contribuições declaradas à segurança social , sempre que esta evolução seja superior ao IPC, sem habitação. O índice de actualização anual resultante da aplicação do disposto no número anterior não pode ser superior ao IPC, sem habitação, acrescido de 0,5 pontos percentuais" Portanto, como o volume de contribuições declaradas à Segurança Social depende essencialmente da evolução do emprego, e este do crescimento económico, é feita também desta forma a ligação à economia. Esta disposição dá origem todos os anos à publicação em Portaria de duas tabelas de revalorização (veja-se, por ex., a de 2013 que é a Portaria nº 281/2013).   Finalmente , a lei que ligava o aumento das pensões que estavam a ser pagas diretamente à economia é a Lei 53-B/2006 , portanto uma lei de 2006. Segundo o artº 6º desta lei, as pensões seriam aumentadas da seguinte forma: (1) Pensões de valor igual ou inferior 628,83€ o aumento seria igual à subida dos preços mais 20% da taxa de aumento real do PIB se o crescimento deste fosse igual ou superior a 3%; se o crescimento do PIB fosse entre 2% e o 3% o aumento destas pensões não poderia ser superior à subida dos preços mais 0,5%; e se o crescimento do PIB fosse inferior a 2%, as pensões até 628,83€ aumentariam de acordo com a inflação; (2) Pensões de valor compreendido entre 628,83€ e 2515,32€ , o aumento destas pensões seria igual ao aumento de preços acrescido de 12,5% da taxa de crescimento real do PIB, se o crescimento real do PIB fosse igual ou superior a 3%; se o crescimento real do PIB fosse igual ou superior a 2% mas inferior a 3%, o aumento das pensões seria igual à subida de preços; se o crescimento real do PIB fosse inferior a 2%, a atualização das pensões seria igual à subida dos preços menos 0,5 pontos percentuais, portanto estas pensões perderiam poder de compra; (3) Finalmente, as pensões de valor superior 2.515,32€ , seriam aumentadas de acordo com a subida de preços apenas quando o crescimento real do PIB fosse igual ou superior a 3%; se o crescimento real do PIB fosse entre 2% e 3%, a atualização destas pensões seria igual ao aumento de preços menos 0,25 pontos percentuais; e se o crescimento real do PIB fosse inferior a 2%, a atualização destas pensões seria igual à subida verificada nos preços menos 0,75 pontos percentuais. Esta lei foi suspensa em 2011, quando o país entrou em recessão – crescimento negativo – pois a sua aplicação determinaria a redução das pensões que já estavam a ser pagas, o que era absurdo, injusto e inconstitucional. É evidente que o objetivo deste governo e da "troika" não é ligar as pensões à demografia e à economia pois tal ligação já existe, mas sim fazer cortes significativos nas pensões mesmo naquelas que estão a ser já pagas.

A POLITICA DE AUSTERIDADE RECESSIVA PÕE EM CAUSA A SUSTENTABILIDADE DA SEGURANÇA SOCIAL: em 2010, despesa com pensões do Regime Geral e com subsídio de desemprego era superior às contribuições

O quadro 1, com dados oficiais, mostra de uma forma clara os efeitos catastróficos que está a ter na Segurança Social a politica recessiva levada a cabo pelo governo PSD/CDS e pela "troika".

Quadro 1 – Percentagem que as despesas com pensões do Regime Geral e com o subsídio de desemprego representam em relação ao total das Contribuições de cada ano
Período
Contribuições




Milhões €
Pensões Regime Geral



Milhões €
% que as Pensões do Regime Geral repre-sentam das Contribuições
Subsídio de desemprego e apoio ao emprego


Milhões €
% que Subsídio de desemprego e apoio ao emprego representa das Contribuições
Subsídio de desemprego (não inclui o subsídio social de desemprego e outras medidas)
Milhões €
% que só subsídio de desemprego representa das Contribuições
SALDO GLOBAL ANUAL DA SEGURANÇA SOCIAL


Milhões €
2006 11.608 8.990 77,4% 1.828 15,7% 1.390 12,0% 787
2007 12.370 9.598 77,6% 1.685 13,6% 1.239 19,0% 1.172
2008 13.128 10.220 77,8% 1.567 11,9% 1.056 8,0% 1.459
2009 13.866 10.908 78,7% 2.045 14,7% 1.364 9,8% 1.555
2010 13.483 11.424 84,7% 2.221 16,5% 1.524 11,3% 689
2011 13.746 11.886 86,5% 2.104 15,3% 1.566 11,4% 439
2012 13.074 12.307 94,1% 2.593 19,8% 1.993 15,2% 413
2013 13.338     2.812 21,1% 2.161 16,2% 57
2014
Prev.
13.281     2.846 21,4% 2.187 16,5% 260
(*) Inclui pensões de velhice, sobrevivência e invalidez;
(**) Estimativa: valores de 2013 e 2014 referentes apenas a despesa com subsídio de desemprego.
Fonte: Relatorios OE 2006-2012; Síntese Execução Orçamental, Janeiro 2013, DGO, Ministério das Finanças; e Relatório e contas de 2010 e 2012 da Segurança Social.

Como as contribuições estão a diminuir e a despesa com o desemprego a subir, como consequência da política de destruição de emprego e da redução dos salários, em 2006, a despesa com as pensões (velhice, sobrevivência e invalidez) do Regime Geral representava 77,4% das Contribuições, mas em 2012 já atingiu 94,1%. Em 2006, a despesa com o subsídio de desemprego e com o apoio ao emprego representava 15,7% das Contribuições, enquanto em 2014 era já de 21,4%. Se somarmos a despesa com as Pensões do Regime Geral com a do subsídio de desemprego (sem incluir o apoio ao emprego e o subsidio social e desemprego) , em 2006 representava 89,4% das Contribuições em 2012, já atingia 109,4%. É evidente que se não se acabar rapidamente com a politica do governo PSD/CDS e da "troika" ela acabará por destruir a Segurança Social .

15/Abril/2014
[*] Economista, edr2@netcabo.pt

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
17/Abr/14