Um império com pés de barro

por Milt Neidenberg

I owe you -- Devo-lhe. O dinheiro do império esgota-se. Neste momento a administração Bush já não pode tomar empréstimos para pagar as contas. A dívida nacional atingiu mais de US$ 8.291.957 milhões no dia 13 de Março e cresce diariamente em US$ 2.170 milhões, segundo o National Debt Clock , o que já excede o limite legal de US$ 8.018 x 10 9 para empréstimos.

O secretário do Tesouro John Snow instou os legisladores a aprovarem imediatamente um novo teto de dívida a fim de evitar o primeiro incumprimento (default) desde sempre. "Sei que partilham o compromisso do presidente e o meu próprio de manter a plena confiança e o crédito do governo americano", escreveu Snow (Wall Street Journal, 07/Março). O incumprimento dos milhões de milhões (trillions) em dívida não é uma opção para o Congresso e o Pentágono.

O orçamento militar de US$ 560 mil milhões deste ano inclui US$ 67,6 mil milhões em gastos de emergência para alimentar guerras antecipativas (preemptive) no Iraque e no Afeganistão — 70 por cento acima dos US$ 334,8 mil milhões do ano fiscal anterior (Wall Street Journal, 10/Março).

Testemunhando perante o Comité de Serviços Armados, o secretário da Defesa Donald Rumsfeld advertiu o Congresso: "Nenhuma nação, não importa quão poderosa, tem os recursos ou a capacidade para defender toda a parte, em todo o momento, contra todo tipo de ataque concebível. ... O único meio de proteger o povo americano, portanto, é prover os nossos militares com uma grande variedade de capacidades ao invés de prepará-los para confrontar alguma ameaça particular.

Tradução: guerra global e o Pentágono pede um cheque em branco.

O insaciável apetite do Pentágono exige que sejam desviados fundos de programas correctos como Segurança Social e Medicare, ou de programas discrecionários que somente constituem um sexto do orçamento nacional. Bush planeia a eliminação total de 141 de tais programas. Os cortes propostos no ano fiscal de 2007 terão impactos sérios sobre o Medicare, Medicaid, apoios para crianças pobres e uma multidão de programas envolvendo trabalhadores pobres:   selos alimentares, habitação, cuidados de saúde e outros planos desesperadamente necessários que já são inadequadamente financiados. As estimativas são de que o défice corrente do orçamento excederá US$ 423 mil milhões no orçamento de US$ 2,77 mil milhões proposto para o ano fiscal de 2007.

Para cobrir o buraco imediato, a administração Bush tem estado a assaltar fundos governamentais que têm excedentes. Um dos alvos é um fundo de pensões de trabalhadores do governo – o G-Fund. Um outro é o Civil Service Retirement and Disability Fund. A Federação Americana dos Empregados do Governo e outros sindicatos de trabalhadores governamentais não foram consultados. O secretário do Tesouro Snow prometeu substituir os fundos, mas o governo irá substituí-los com IOUs [1] tal como fez com a Segurança Social.

O imperialismo americano tem em andamento uma economia IOU com uma sobrecarga militar global do Pentágono. Em 10 de Março um artigo do Wall Street Journal intitulava: "Responsável do Fed adverte do perigo de aumentar o défice orçamental". Timothy Geithner, presidente do New York Federal Reserve Bank, explicava: "A compra estrangeira de títulos americanos [IOUs] pode, ao mascarar o perigo de défices orçamentais, encorajar investidores a assumirem demasiada dívida e exige políticas monetárias mais apertadas do que de outra forma".

Aumentar taxas de juro eleva o custo dos empréstimos e tende a aumentar a estrutura de preços e a inflação. E ao mesmo tempo desencoraja o investimento, arrefece o crescimento económico e põe a estagnação em andamento. A superprodução agrava este desenvolvimento. Esta combinação é chamada estagflação e é uma pré-condição para o colapso financeiro, embora um estado capitalista possa temporariamente protelar a crise económica através da aceleração de contratos militar-industriais.

Geithner dirige o mais poderoso distrito da Reserva Federal e é influente na administração que determina a taxa de desconto. Desde Junho de 2004 o Fed elevou as taxas a curto prazo 14 vezes, para 4,5 por cento. A Wall Street está a apostar num outro aumento em fins de Março.

MILITARISMO E DÍVIDA GLOBAL

Nas suas observações, Geithner destacou a China dentre os países que acumulam enorme quantidade de títulos denominados em dólares a partir de grandes excedentes comerciais. O actual fosso comercial global dos EUA está a registar US$ 68,51 mil milhões por mês. Os países que aceitam estes títulos financiam indirectamente o Pentágono nas suas actividades militares em escala mundial. Quaisquer choques na economia americana poderiam levar os seus bancos centrais a manterem em caixa aqueles haveres em favor de outras divisas e investimentos. O resultado para os gastos do Pentágono e a economia mundial seriam incalculáveis.

A fusão do complexo militar-industrial de que o presidente Dwight Eisenhower (anteriormente general Eisenhower) prevenia cerca de 1961 acelerou o desenvolvimento da crise. A concentração de impérios militar/industriais — Halliburton, Bechtel, Lockheed Martin, Boeing, e os monopólios petrolíferos, os quais praticam preços manipulados cobrados ao governo — cresceu e lucrou enormemente ao longo dos anos. O Pentágono mantem livros separados para o orçamento da defesa regular e para despesas de guerra de emergência. Isto chama-se cozinhar os livros.

A insaciável exigência dos militares por hardware mais refinado e o financiamento acrescido para a Segurança Interna (Homeland Security) resultará em mais dívida e mais empréstimos. A constante expansão das compras militares americanas confirma que Washington está determinada a não ser afastada da dominação global, especialmente sobre o Médio Oriente, com os seus vastos recursos de petróleo e outros produtos.

Enquanto os EUA ameaçam o Irão, a Síria e a Palestina, a sua fatia do produto bruto mundial está a encolher. No princípio da década de 1950 os EUA controlavam mais de 50 por cento da produção bruta mundial. A década de 1960 viu esta fatia diminuir para cerca de 35 por cento, e entre a de 1970 e a de 1980 para 25-27 por cento. A partir de 2002, a ONU relatou evidências de estagnação global, mas não havia números disponíveis para a fatia americana da produção bruta.

Por um lado, a base económica interna e mundial do imperialismo americano está a contrair-se. Por outro, há o contínuo e implacável impulso para a expansão militar e a guerra imperialista. As tendências são entrelaçadas e incompatíveis e conduzirão à inevitável catástrofe.

Um movimento de massas independente, com grande amplitude de classe, em conjunto com as comunidades nacionalmente oprimidas no interior e no exterior pode aproveitar esta contradição aguda do imperialismo.

18/Março/2006

[1] I owe you, uma nota escrita de reconhecimento de dívida.

O original encontra-se em http://www.workers.org/2006/us/economy-0323/

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
22/Mar/06