EUA: um sul no norte
por Angel Guerra Cabrera
[*]
Os Estados Unidos não estão isentos das consequências
sociais e políticas das práticas selvagens do mercado
"livre" que levaram a rebeliões populares e mudaram o mapa
político da América Latina. Desde o governo de Ronald Reagan, a
elite estadunidense levou a cabo uma ofensiva contra as
regulações do capitalismo surgidas com Franklin Delano Roosevelt,
que deram lugar ao "estado previdência". A essência
desta ofensiva consistiu numa liberalização e
desregulamentação económicas que permite às grandes
corporações actuarem à sua vontade. Os ricos tornaram-se
cada vez mais ricos enquanto os trabalhadores participam cada vez menos do
produto social.
A maior expropriação dos operários pode ser claramente
apreciada no facto de que as grandes corporações
contribuíam com mais de 20 por cento da arrecadação fiscal
na década de 60, ao passo que na actualidade sua
contribuição não chega a 10 por cento. A
consequência foi a deterioração progressiva da
educação pública, dos serviços que recebem os
raquíticos bairros habitados pela classe operária e pelas
minorias, e um sistema de saúde privatizado que está entre os
mais caros e mais deficientes entre os países desenvolvidos, e ao qual
muitos não têm acesso. Esta situação piorou com
cortes substancias de impostos para os ricos e as corporações
durante a administração Bush e o aumento frenético dos
gastos bélicos, que já constituem 48 por cento do total mundial.
Outro efeito da política de liberalização económica
irrestrita é o grave dano ao meio ambiente, dentro e fora dos Estados
Unidos, provocado pelo modelo de produção e consumo
desperdiçador que vigora. Mais uma vez agravado durante o
período bushista, no qual relaxaram-se ao máximo as normas de
protecção ecológica internas e em que Washington negou-se
a ratificar o Protocolo de Quioto
[1]
para diminuir as emissões contaminantes. Qualquer
relação desta conduta com o vínculo íntimo do
presidente e de vários dos seus colaboradores imediatos com a
indústria petrolífera não é pura coincidência.
O produto principal das políticas económicas aplicadas desde a
época Reagan, inspiradas nas teorias neoliberais de Milton Friedman e
Frederick Von Hayek, foi um aprofundamento sem precedentes da desigualdade
social. Mas o fenómeno não é exclusivamente republicano,
porque estas políticas continuaram com o governo de William Clinton e
muitos legisladores democratas fizeram-nas suas. Essa desigualdade é
claramente evidente na situação do mundo laboral. Em 2005 os
salários dos trabalhadores haviam caído pelo terceiro ano
consecutivo. Um de cada seis postos na indústria manufactureira
desapareceu e os novos trabalhos no sector de serviços são mal
pagos e quase sempre carecem de benefícios. A cadeia Wal-Mart é
paradigma deste tipo de trabalho lixo.
A economia estadunidense tem um grave problema que, num momento não
muito longínquo, afectará o nível de vida de dezenas de
milhões de pessoas: gasta muito mais do que produz. Isto reflecte-se
no facto de que em 2005 a poupança das famílias foi negativa
pela primeira vez desde 1930. Por outras palavras, as pessoas pediram
empréstimos acima dos seus rendimentos para gastar em consumo. O mesmo
ocorre com o governo e o sector privado. A dívida da economia
estadunidense está a crescer muito mais rapidamente do que os seus
rendimentos e, como se sabe, isto não pode sustentar-se por muito tempo
sem que o país se afunde numa crise financeira. Por agora mantêm
a economia a flutuar, mas é uma bomba relógio que pode explodir a
qualquer momento.
Como parte deste quadro, desenvolveu-se nos Estados Unidos uma
sistemática política anti-operária que reduziu a 8 por
cento do total o número de trabalhadores sindicalizados no sector
privado. Em contraste, um inquérito recente revelou que 53 por cento
dos assalariados quiseram pertencer a sindicatos, mas a lei proíbe quase
toda acção de protesto operário e impede as
reuniões de trabalhadores sindicalizados com não sindicalizados,
que devem ser autorizados pela entidade patronal. A catástrofe de Nova
Orleans desnudou perante o mundo o que é evidente: a existência
de uma grande humanidade empobrecida e desprotegida no reino da opulência.
15/Junho/2006
[1]
Ver a propósito:
Aquecimento global: uma impostura científica
, de Marcel Leroux
A falsificação da história climática a fim de 'provar' o aquecimento global
, de John L. Daly
Mitos climáticos
, blog de Rui G. Moura
[*]
Contacto:
aguerra_123@yahoo.com
O original encontra-se em
http://www.jornada.unam.mx/2006/06/15/034a1mun.php
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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