"A Grécia tem de sair do euro e declarar a moratória da
dívida"
por Costas Lapavitsas
[*]
entrevistado por João Alexandre Peschanski
Um quarto dos trabalhadores gregos estão desempregados um
índice que atinge 50% quando considerados apenas a
população economicamente ativa com menos de 25 anos, de acordo
com dados oficiais. O Fundo Monetário Internacional e a União
Europeia adotaram medidas para supostamente resgatar a economia grega, cujo
Produto Interno Bruto (PIB) caiu quase 7% em 2011, que pioraram a
situação social. Há protestos diários na capital
Atenas, muitos dos quais acabam em confrontos violentos com a polícia.
Para resolver a crise econômica e social, a Grécia tem de
"tomar as rédeas de seu próprio futuro". A
opinião é do economista grego Costas Lapavitsas, professor da
Universidade de Londres e coordenador do grupo de economistas políticos
Pesquisa sobre Dinheiro e Finanças (RMF, na sigla em inglês), que
se tornou uma das principais referências acadêmicas na
análise das causas e consequências da recessão global
iniciada em 2007. Segundo ele, o futuro soberano da Grécia passa
necessariamente pela moratória da dívida e a saída da zona
do euro.
Lapavitsas sugere, nesta entrevista exclusiva ao
Brasil de Fato,
concedida em 25 de abril, durante uma visita aos Estados Unidos para uma
série de conferências sobre a crise europeia, que as
políticas e instituições da zona do euro intensificaram o
impacto da recessão na Grécia e no que ele chama de países
periféricos do bloco, como Espanha, Portugal e Irlanda. Para sair da
crise, diz Lapavitsas, a Grécia precisa adotar medidas de resgate de sua
soberania nacional e de desenvolvimento industrial.
Brasil de Fato Por que a zona do euro esteve tão
vulnerável à crise imobiliária e financeira, que se
iniciou nos Estados Unidos, em 2007?
Costas Lapavitsas Essa fragilidade à crise global foi causada por
fatores relacionados à estrutura interna da zona do euro. É
porque a zona do euro é ela mesma problemática, porque ela criou
tensões profundas dentro de si. Posso ser mais preciso: a zona do euro
criou dentro de si mesma uma oposição entre um centro e uma
periferia. A periferia é provavelmente a Grécia, a Espanha, o
Portugal, a Irlanda; a Itália está na fronteira. A periferia se
tornou periferia porque perdeu competitividade em relação ao
centro, desenvolvendo enormes déficits, tanto em
transações quanto no saldo comercial, o que levou a uma
multiplicação de suas dívidas. Ou seja, à medida
que a periferia foi perdendo poder econômico, gerou-se uma dívida,
interna e externa, privada e pública. Quando a crise atinge a zona do
euro, a dívida que havia sido acumulada na periferia se tornou a
principal causa de sua fragilidade, colocando a zona do euro em uma
situação muito problemática.
Por que esses países que se tornaram periféricos perderam
competitividade?
Vale notar que não se trata de periferia e centro no sentido
clássico da teoria do desenvolvimento, em que se opõem Primeiro e
Terceiro Mundo. O capitalismo produz continuamente essa distinção
entre periferia e centro, uma dimensão combinada de desenvolvimento
desigual. A zona do euro fez a mesma coisa, do seu próprio modo, que tem
a ver com a formação do euro. A moeda, usada globalmente, foi
criada para competir com o dólar, oferecendo a bancos e
corporações uma forma de dinheiro confiável para manter
suas reservas e organizar transações. Para criar essa forma de
dinheiro, os países europeus tiveram de criar um sistema para
mantê-lo, que tem vários elementos. Essa variedade é um
reflexo do fato de esses países serem 17 Estados. O sistema que foi
criado foi pensado para estabelecer um sistema monetário comum, um banco
central. Mas, aí começa o problema, há uma variedade de
políticas fiscais, já que são 17 Estados, 17 classes
dominantes, e, portanto, uma variedade de práticas bancárias.
Apesar de haver um sistema monetário comum, há 17 tipos de bancos
nacionais na zona do euro. Esse sistema com moeda comum e variedade de bancos,
rigidez fiscal com limites, fez com que fosse necessário ter
flexibilidade em alguma área: o mercado de trabalho. O que aconteceu
então na zona do euro foi uma competição para baixar os
custos de trabalho. Aí, a Alemanha ganhou, sem ter realmente um
competidor no mesmo nível. A Alemanha manteve congelados os custos de
trabalho por quase duas décadas, agora. Os países
periféricos tiveram menos êxito; custos de trabalho congelados na
Alemanha e custos da unidade de trabalho em alta em outros países
levaram-nos a serem menos competitivos. Isso criou um abismo no mercado e os
países periféricos não puderam equilibrar a perda de
competitividade com desvalorização monetária ou com outras
políticas econômicas, já que isso fazia parte do sistema
comum.
Na formação do euro, houve acordos para manter em
equilíbrio o mercado de trabalho. Por que esses acordos não foram
respeitados, já que foram respeitados os acordos monetários e
fiscais?
A atitude da zona do euro em relação ao mercado de trabalho
é contraditória. Por um lado, há uma
proteção de direitos trabalhistas e sindicais, que garantem
benefícios reais aos trabalhadores; por outro lado, há uma
pressão contínua para baixar os custos salariais. Nesse
espaço de contradição, houve por parte de todos os Estados
um esforço para produzir competitividade com
flexibilização no mercado de trabalho, removendo rigidez. Isso
ficou claro no Tratado de Lisboa, no Tratado de Nice e outros acordos.
Há, portanto, uma pressão uniforme para baixar os custos de
trabalho, por mais que de fato haja algum acordo mínimo em
relação a direitos trabalhistas. É a diferente capacidade
de ter êxito em baixar os custos de trabalho que levou a resultados
divergentes, à criação do centro e da periferia.
Como a Alemanha conseguiu surgir como o país europeu dominante?
A Alemanha manteve seus trabalhadores sem aumento salarial por duas
décadas. Conseguiu fazê-lo ao se aproveitar da estrutura de
negociação trabalhista tripartite que existe há tempo por
lá. Sentam para negociar todo acordo trabalhista empregados,
empregadores e representantes do Estado. Após a
reunificação das Alemanhas, foram adotadas políticas
públicas, muitas vezes com a conivência dos sindicatos, para
congelar os custos de trabalho e enfraquecer o sindicalismo. A Alemanha
oriental não tem sindicatos fortes; há áreas da Alemanha
ocidental que perderam representatividade sindical. Claro que tudo isso foi
costurado pelo partido social-democrata alemão, sob o governo de Gerhard
Schroeder. Só um partido com origem de esquerda poderia ter imposto esse
tipo de situação, finalmente instrumentalizada pelas classes
dominantes alemãs, em detrimento dos trabalhadores europeus como um todo.
Como a crise iniciada em 2007 acentuou a vulnerabilidade da periferia da zona
do euro?
A crise imobiliária dos Estados Unidos transformou-se numa crise do
sistema bancário global, a partir do momento em que os títulos
podres vinculados às hipotecas foram vendidos como legítimos.
Entrou-se numa recessão global: os bancos globais enfraqueceram-se em
termos de liquidez e solvência, incluindo os bancos europeus.
Especialmente em 2008 e 2009, a recessão global fez com que os Estados
tivessem de intervir para apoiar suas economias internas. Obviamente a
capacidade de arrecadação e os rendimentos dos Estados foram
reduzidos, pois as economias internas se contraíram. Para os
países periféricos, que já tinham dívidas enormes,
o resultado foi catastrófico. Não conseguiram recuperar vigor,
já que o que conseguiam acumular eram mais dívidas. Haviam
perdido competitividade, tinham grande déficits públicos, perdiam
capacidade de arrecadação tributária. Mesmo se tentassem
manter suas economias internas com algum equilíbrio, o sistema
financeiro global não tinha interesse em emprestar mais, quando percebeu
que a dívida grega não era a mesma coisa que a dívida
alemã, isto é, quando percebeu que a dívida da
Grécia e do Portugal, por mais que fosse em euro, não seria
bancada pela Alemanha. Daí, a fraqueza desses países
periféricos ficou totalmente exposta e o impacto da crise foi muito mais
severo. Quando ficou claro que os países periféricos estavam em
crise, os bancos começaram a sentir novas pressões da crise,
já que os bancos haviam emprestado a esses Estados. A crise
começou como uma crise bancária, tornou-se uma recessão,
foi para os Estados e, daí, ameaçou voltar aos bancos. Foi quando
a crise ameaçou voltar aos bancos que a União Europeia interveio;
interveio para resgatar os bancos e, ainda agora, é esse o sentido da
intervenção.
As políticas de austeridade adotadas em toda a Europa, mas especialmente
nos países que você caracteriza como periféricos,
são expressões dessa lógica de intervir para resgatar os
bancos?
Os parâmetros que têm direcionado a intervenção da
União Europeia são, primeiro, o resgate dos bancos e a
transferência dos custos da crise para outros setores, especialmente os
assalariados, os trabalhadores. Em segundo, a intervenção quis
evitar os custos nacionais, mas daí se deparou com o problema
próprio à constituição da zona do euro. Como eu
disse antes, não existe algo como um banco europeu, existem bancos
nacionais, espanhóis, portugueses, gregos. A zona do euro até se
mobilizou para resgatar os bancos, mas não pode fazê-lo de modo
geral, tem de resgatar bancos nacionais. O mecanismo para resgatar os bancos
teve de ser o Estado. Isso criou mais um problema: por que o Estado
alemão resgataria bancos espanhóis? Isso jamais aconteceria. Os
alemães disseram: é o Estado espanhol que tem de resgatar os
bancos espanhóis. Mas na perspectiva do Estado espanhol só pode
fazê-lo com ajuda de outros Estados, especialmente a Alemanha. Aí
voltamos aos problemas da construção da zona do euro, que
não é homogênea, está cheia de
contradições. Além disso, não é uma
aliança, construiu-se como um mecanismo hierárquico, com alguns
países no topo, que não estão preparados para assumir as
perdas dos bancos, economias e Estados periféricos.
A dívida grega era em grande parte com bancos de outros países
europeus, especialmente a Alemanha. Não ajudar o Estado grego pode levar
ao colapso do sistema bancário alemão.
Claro, e isso tem sido um dos pontos em relação aos quais os
políticos europeus têm realmente brigado. Há uma
interdependência da crise, clara desde os primeiros sinais de
vulnerabilidade, que, além do mais, não tem como ser resolvida. E
é um problema muito sério: se os bancos começarem a entrar
em colapso, a própria zona do euro vai desaparecer. Isso não
é algo que a classe dominante alemã e francesa queira. Mas, ao
mesmo tempo, não quer dar dinheiro para a periferia para salvar o
sistema e não quer transformar a zona do euro de maneira
drástica, pois o modelo europeu atual, por mais contraditório que
seja, é positivo para as grandes corporações. A falta de
solução da crise europeia não tem a ver com a
incompetência dos políticos europeus, o que muita gente costuma
dizer "a Angela Merkel não é boa", "o
Nicolas Sarkozy é ruim". Esses políticos são
geralmente muito melhores do que a média dos jornalistas ou analistas
econômicos: se houvesse algo a ser feito, a Merkel e o Sarkozy saberiam.
O problema é estrutural; tem a ver com os interesses e os mecanismos em
jogo na zona do euro. Todos sabem que há um problema, mas não
têm como adotar uma medida comum, como a do governo estadunidense.
Há um mosaico de intervenções, que não atingem de
maneira sistêmica a fonte da crise.
Diante da incapacidade de uma solução conjunta, no nível
da zona do euro, os países periféricos têm de tomar medidas
de proteção de sua soberania para sair da crise e, especialmente,
impedir que seus efeitos continuem tendo impactos tão negativos em suas
populações.
Os países periféricos não serão capazes de resolver
suas crises, de maneira a atender aos interesses de suas
populações, de suas sociedades, a não ser que tomem as
rédeas de seu próprio futuro. As decisões que estão
sendo tomadas no centro da União Europeia e impostas à periferia
são estritamente do interesse do centro. O que tem de acontecer no
centro é mais complexo; não está tão claro quanto o
que tem de acontecer na periferia. Vale ressaltar que, quando isso acontecer
com os países periféricos, eles têm de evitar um
nacionalismo econômico cego e autodestrutivo. Tomar as rédeas de
seu futuro, assumir o comando de suas políticas públicas para
proteger suas populações, não é a mesma coisa do
que assumir uma atitude de nacionalismo econômico, por mais que possa
levar a isso. O verdadeiro desafio de fazer políticas públicas
progressistas, para a esquerda, é conseguir adotar um programa que
não fique preso ao nacionalismo econômico.
Você está sugerindo que a Grécia saia da zona do euro?
Quais as consequências disso?
Os problemas da dívida e do euro estão inextricavelmente
relacionados. A Grécia tem de sair do euro e declarar a moratória
da dívida. Não existe um sem outro. Para a Grécia,
não pagar a dívida significa algo diferente do que para outros
países periféricos, como Espanha e Portugal. Nos últimos
dois anos, a dívida grega tornou-se uma dívida pública;
antes, os credores eram bancos, agora são instituições
internacionais. A natureza da dívida se modificou, a natureza da
moratória grega será diferente, quando vier, porque virá.
A dívida é insustentável. Mas será mais
difícil nessas condições declarar moratória,
levando a mais tensões interestatais. Isso é culpa dos
políticos europeus, que têm administrado o controle dessa crise
desde 2010. A moratória da dívida é necessária e
tem de ser soberana, iniciada pela Grécia, não pelos credores, e
democrática, com uma comissão auditora, examinando a legitimidade
dos empréstimos, prestando contas de maneira democrática, para
que se possa descobrir como e por que o país se endividou tanto. Toda
dívida é uma questão de classe e tem de ser examinada
dessa maneira, ou seja, com participação da sociedade civil, dos
trabalhadores, para que se chegue a uma solução de defesa da
soberania popular. A moratória é necessária agora e a
saída da zona do euro deveria acontecer ao mesmo tempo. Isso será
um choque enorme, maior agora do que teria sido há dois anos, porque a
economia está mais enfraquecida, após dois anos do que chamaram
de resgate da Grécia. Mas não há escolha.
O que acontece depois?
As condições que serão estabelecidas serão de
emergência. A melhor forma de lidar com elas é com
mobilização social e política. Os trabalhadores têm
de ter o controle e administrar essas condições de
emergência, de maneira coletiva, coerente e organizada. Haverá
problemas monetários, já que tem de se criar um sistema para a
circulação de uma nova moeda, que tem de ter câmbio e
outros mecanismos para funcionar. A intervenção do Estado
é necessária para controlar os problemas monetários e
assegurar que a nova moeda se torne viável e dominante. Haverá
problemas com bancos, que não conseguirão lidar com a
confusão de ter obrigações em euro e atender aos
requisitos para a circulação da nova moeda. Os bancos
terão de ser nacionalizados, colocados sob um sistema de propriedade
pública. Haverá um período sem funcionamento
bancário. O controle de capital tem de ser imposto imediatamente. Tem de
se iniciar um processo de reestruturação dos bancos, criando
instituições que possam estimular o desenvolvimento com
preocupação social. Haverá problemas comerciais, de acesso
a mercadorias. No médio prazo, a saída da zona do euro
será positiva, porque a nova moeda será desvalorizada e,
portanto, haverá mais produção interna e um mercado
interno revigorado. Isso pode levar ao renascimento do emprego. A
dependência atual da Grécia em relação aos produtos
de fora é ridícula e isso poderá reverter essa
situação. As exportações também podem ser
beneficiadas.
Os efeitos positivos serão vistos em um ano. Mas no curto prazo
haverá problemas de acesso a mercadorias básicas, em
relação às quais o país tem um déficit, o
que inclui alimentos, medicamentos e petróleo. Para lidar com isso,
será preciso adotar medidas administrativas, condições de
guerra para falar francamente, com intervenção do Estado,
nacionalização e direção do consumo, para garantir
que os mais vulneráveis estejam protegidos, que haja justiça em
como as mercadorias são distribuídas, que crianças tenham
acesso ao que precisam, até que a situação seja
normalizada, o que é uma questão de tempo. Tudo isso soa como
algo muito duro e difícil, mas tudo isso já está
acontecendo na Grécia agora, com desemprego, cortes salariais, falta de
acesso a bens de consumo. Mas isso está acontecendo atualmente de
maneira desigual, sem atingir quem tem mais e devastando a maioria da
população. Medidas administrativas do tipo que estou sugerindo
garantem que o sacrifício seja partilhado, até que o país
esteja melhor.
Essas são medidas de reorganização econômica
após uma eventual saída da zona do euro. O que precisa ser feito
para tirar o país da crise?
Essas medidas não são a resposta toda para solucionar a crise,
são apenas os primeiros passos para que a Grécia e os outros
países periféricos saiam da armadilha na qual estão
atualmente. Essas medidas têm de servir para a apresentação
de um amplo programa de transformação social e econômica. A
Grécia precisa de reformas profundas, colocando sua economia em outro
rumo, reforçando o Estado, adotando uma nova política industrial.
Você diz que a moratória da dívida é
necessária, inevitável, mas o que garante que o governo grego,
que aceitou os planos de austeridade e reprime duramente
manifestações populares, vai declará-la?
Não haverá moratória e saída da zona do euro, se
não se discutir democracia e soberania nacional para a Grécia. A
União Europeia não é um mecanismo para proteger a
democracia, contém em si vários mecanismos para suprimir a
democracia, impondo medidas e práticas antidemocráticas de fora,
mesmo em países grande, como a Itália. Isso é muito
perigoso. Há obviamente interesses poderosos na Grécia que se
alinham com a União Europeia, porque acreditam que sua
posição econômica está protegida. É um tipo
de aliança com a presença externa imperialista. Mas a
população grega não aceita isso nem a
negação da democracia. Precisa restabelecer a democracia e a
saída da zona do euro pode trazer as condições para isso.
Está relacionado a isso o fato de a Grécia ter perdido soberania
nacional, tornando-se rapidamente uma neocolônia, sob
condições de protetorado, que a classe dominante aceita, mas a
população grega não. A moratória da dívida e
a saída da zona do euro podem ser mecanismos para resgatar a soberania
nacional.
Você parece esperar que medidas emergenciais levem a práticas
democráticas, mas geralmente são um contexto para regimes
autoritários.
Não acho que haja o risco de um golpe militar na Grécia, agora.
Há uma noção geral no exército de que o sistema
vigente não funciona, não tem interesse em manter a
situação. O exército tem sofrido ele mesmo com os planos
de austeridade, tanto com cortes em gastos militares quanto em salários.
O exército considera que o problema é profundo e complexo e que
uma ditadura militar não conseguiria responder a isso. O problema
não é o mesmo do passado, comunismo ou anticomunismo, mas muito
mais profundo, relacionado à estrutura econômica, à
direção social do país, e o exército grego
não tem nenhum projeto para solucioná-lo. E acredito que os
oficiais sabem disso. É mais provável que testemunhemos muita
repressão policial, o mecanismo repressivo do Estado, por mais que a
fachada democrática seja mantida. Mas isso ainda tem que ser visto, pois
a própria polícia sofreu com as políticas de austeridade.
Não será possível manter um alto nível de
repressão por muito tempo.
Há um movimento crescente de extrema direita na Grécia.
Por enquanto, são os principais beneficiários das
políticas de austeridade. Isso é péssimo, por mais que
seja compreensível. É reflexo da inabilidade da esquerda de
formular uma alternativa coerente. Alguns setores da esquerda têm sido
muito críticos em relação ao que está acontecendo,
mas defendem uma alternativa que mantenha a Grécia na zona do euro.
Outros setores rejeitam todas as políticas europeias, mas não
sentem que haja uma solução no presente. Diante dessa inabilidade
da esquerda de ter uma alternativa coerente, muitos movimentos de direita, que
têm um discurso de confrontação e nacionalismo agressivo,
têm crescido e isso polariza a política grega. Mas, para fora da
disputa partidária, há realmente muito acontecendo nos protestos,
algo que se pode chamar de unidade classista das ruas, pois toda uma variedade
de pessoas não aceita o que está acontecendo e luta contra as
imposições da austeridade sem parar há dois anos. Ainda
não se conseguiu fazer dessa unidade na luta uma frente coerente, que
leve a uma alternativa política. Mas sou otimista, pois a crise
não está solucionada, deve até piorar, as
condições de vida das pessoas são insustentáveis e,
principalmente, as pessoas não enxergam um futuro para a Grécia e
suas vidas dentro do quadro político e econômico atual. As pessoas
conseguem suportar todo tipo de problemas, se imaginam que sua
situação vai melhorar no futuro. Isso não é o caso
na Grécia. Nessas condições, a luta vai continuar, assim
como a busca por uma alternativa viável e realizável.
15/Maio/2012
Do mesmo autor:
Para Portugal, o tempo está a esgotar-se
Ruptura Uma via para sair da crise da Eurozona
"O BCE não é a solução mágica para a crise da eurozona"
[*]
Professor de Economia da School of Oriental and African Studies (SOAS), membro
do
Research on Money and Finance
, autor de
Crisis in the Euro Zone
.
O original encontra-se em
http://www.brasildefato.com.br/node/9579
Esta entrevista encontra-se em
http://resistir.info/
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