Grécia: "ajuda" estilo terceiro mundo e dívida
Uma das ironias crueis da negociação de último minuto
entre o Eurogrupo e o governo grego para uma extensão por quatro meses
do programa de "ajuda" existente monitorado pela Troika é que
de acordo com qualquer significado sentido ele não é ajuda de
modo algum.
Em recompensa por permanecer no programa Troika por mais quatro meses
até o fim de Junho e manter-se em condições ainda a
acordar sobre objectivos orçamentais, gastos do governo e
privatizações, o Eurogrupo, o BCE e o FMI desembolsarão as
fatias pendentes dos empréstimos sob o programa existente. O
Financial Times
pode chamar isto de "ajuda" mas não é nada disso.
Não é sequer dinheiro para salvamento dos bancos gregos. Os
11 mil milhões para isso foram devolvidos pelos gregos à
Troika, a qual vai guardá-lo por "segurança".
Entre o princípio de Março e o fim de Junho, a
instituição financeira do Eurogrupo, a European Financial
Stability Facility (EFSF), libertará 1,8 mil milhões,
enquanto o BCE devolverá lucros que fez com a maturação de
títulos do governo grego que comprou em 2014 no valor de 1,9 mil
milhões e o FMI desembolsará outros 3,6 mil milhões
em fundos sob o seu programa de "ajuda" que perdura até Abril
de 2016. Isso soma 7,2 mil milhões.
Mas a maior parte dessa quantia será imediatamente reciclada de volta
à Troika como reembolsos da dívida e de juros por
empréstimos anteriores e de títulos do governo que atingem a
maturação. Nos próximos quatro meses, o FMI deve ser
reembolsado em 5,3 mil milhões enquanto os gregos devem
também prorrogar títulos do tesouro a curto prazo comprados pelos
bancos gregos num valor de cerca de 11 mil milhões. Assim, a
"ajuda" da Troika simplesmente desaparecerá e o povo grego
verá nada da mesma ajudará nos gastos do governo.
E o que acontece após o fim de Junho? Qualquer novo programa com a
Troika (se é que o Syriza decida fazê-lo) envolverá ainda
mais reembolsos, incluindo 6,7 mil milhões a serem devolvidos ao
BCE só em Junho quando atingirem a maturação
títulos do governo e com mais ainda ao FMI. Isso nunca acaba.
É exactamente como a ajuda ao "Terceiro Mundo" que costumava
ser distribuída pelo Banco Mundial e outras agências
internacionais nas décadas de 1980 e 1990. A maior parte desta
"ajuda" acabava nos bolsos de ditadores corruptos ou no reembolso de
dívida anterior. O povo nunca a via. E os níveis de endividamento
permaneciam onde estavam, como acontece na Grécia agora.
Naquela época, finalmente as agências internacionais concordaram
no que foi chamado
Brady debt swap
que cancelou uma parte da dívida que nunca poderia ser reembolsada.
Não há um plano como este disponível para a Grécia,
embora o Syriza pedisse isso nas suas negociações com o Eurogrupo.
A dívida à Troika permanece plenamente inscrita na contabilidade
e, como proporção do PIB grego, está destinada a ascender.
Naturalmente, o custo do serviço desta dívida é
relativamente baixo com reembolsos sobre a parte da UE dos empréstimos
adiados até a próxima década e os juros sobre estes
empréstimo com taxas muito baixas. Mas o passivo da dívida
fica ali para sempre como a pedra de Sísifo.
21/Fevereiro/2015
Ver também:
"Je demande au Peuple Grec de me pardonner d’avoir contribué à cette illusion"
, palavras de
Manolis Glezos, deputado do Syriza
[*]
Economista.
O original encontra-se em
thenextrecession.wordpress.com/...
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
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