O México descobre a luta de classes:
eleições e perspectivas económico-sociais

por José C. Valenzuela Feijóo [*]
"Lutaremos como se possa, com o que se possa e até onde se possa."
A. M. López Obrador, recordando Juárez.
(No Zócalo, 16/07/2006).

I- O conflito de base subjacente
II- O padrão de acumulação neoliberal em vigor. Breve recapitulação
III- Parêntesis: o neoliberalismo e o seu efeito de decomposição
IV- A mudança estrutural. As grandes opções
V- A eleição e a fraude
VI- Os de cima e os de baixo. Os modos da política
VII- As forças que podem pressionar pela mudança. Alguns antecedentes.
VIII- Breve incursão sobre o tipo de liderança e seu condicionamento
IX- Perspectivas
Notas

I- O conflito de base subjacente

No México, o actual conflito eleitoral é a expressão de um conflito sócio-político mais profundo. Por um lado está o padrão capitalista neoliberal, imperante há duas décadas e meia e hoje impulsionado por Calderón. Pelo outro lado, um projecto também capitalista, mas com uma orientação mais democrática e nacionalista. Trata-se, então, de um conflito entre duas formas ou modos do capitalismo. Os grupos sociais beneficiados pelo neoliberalismo são pequeníssimos: o grande capital financeiro especulativo, alguns grandes grupos industriais com capacidade exportadora (assentes nos baixos salários e em alguma possível vantagem comparativa natural) e o capital estrangeiro. O outro modelo, impulsionado por López Obrador (doravante AMLO), beneficia em primeiro lugar a burguesia industrial, especialmente a que trabalha para o mercado interno; a seguir, camadas médias urbanas, operários e camponeses. A congruência, pelo menos relativa, entre os interesses objectivos dessas classes ou fracções de classe e o que possibilita um ou outro estilo de capitalismo é o que determina aquilo que podemos denominar alinhamento e bloco potencial. Naturalmente, o que foi indicado aponta para um agrupamento ideal, o que supõe uma perfeita consciência classista. Na realidade, o alinhamento é diferente pois o factor ideológico opera provocando comportamentos políticos "não congruentes". Algo que no México é visível e de grande alcance. Exemplo: o actual bloco neoliberal no poder acaba por ser apoiado por segmentos não menores de classes ou fracções de classe cujo interesse objectivo não se conjuga com o que o neoliberalismo é capaz de gerar. Este modelo beneficia quando muito uns 5% da população total. Mas na última eleição votou por Calderón algo mais de um terço dos votantes. O factor que aqui opera é o da alienação social ou "falsa consciência de classe", fenómeno muito extenso no caso mexicano. [1] Por isso mesmo também se dá uma forte dissociação entre o peso efectivo e o peso potencial do bloco progressista. Contudo, a figura e o carisma de AMLO elevou o peso efectivo e o peso potencial do bloco progressista e levou-o a uma quota eleitoral que se deve aproximar dos 40%. [2]

A diferença, nada menor, entre o bloco progressista efectivo e o potencial também nos indica o peso da ideologia dominante e sua capacidade hegemónica ainda forte. No "poder hegemónico", vale recordar Gramsci, influem dois factores básicos: i) a capacidade da classe dominante para forjar alianças classistas, o que supõe a concessão de alguns benefícios, especialmente económicos, às classes subordinadas; [3] ii) a cooptação dos intelectuais radicais e a geração de uma ideologia capaz de penetrar profundamente nas classes subalternas. No México, nos velhos tempos do PRI e do modelo de industrialização substitutiva que emerge já com Cárdenas (anos trinta do século XX), o primeiro factor — que hoje se qualifica como "populismo" — era especialmente significativo. Com o advento do neoliberalismo, este factor dissolve-se: as concessões económicas do actual bloco de poder aos de baixo quase desapareceram. Por isso mesmo, tudo passou a depender do factor ideologia. Com a difusão e penetração dos mass media, este poder decuplicou. Mas como, por outro lado, actua solitário e "não só de telenovelas vive o homem", no combate "realidade da miséria" versus "ideologia da prosperidade" (ou "foxilândia"), a realidade começou a ganhar terreno. O que, obviamente, tem estado na base da grande popularidade de AMLO. Ainda que de imediato convenha advertir: neste ascenso, opera uma simbiose significativa: o descontentamento com a situação actual associa-se sentimentalmente à figura pessoal de AMLO. Ou seja, não estamos na presença do desenvolvimento e avanço de um corpus ideológico (isto é, um sistema de ideias) efectivamente alternativo. Observa-se antes um enfraquecimento do compromisso anterior com os de cima e a adesão emocional a uma figura que se crê reivindicar os de baixo. Esta atitude opera mais em termos intuitivos e emocionais do que a partir de uma reflexão amadurecida. Trata-se, portanto, de uma consciência classista muito embrionária e que, pelo menos por agora, funciona perfilhando uma espécie de "cesarismo" mitigado. Contudo, se observarmos o passado, o passo é gigantesco. Hoje, os pobres começam a sentir-se dignos e com direitos para discutir a vontade dos ricos. A dicotomia ainda é a de "pobres contra ricos". Mas daqui para salto a uma etapa superior, a do conflito de "classe contra classe", poderá não haver tanta distância.

II- O padrão de acumulação neoliberal em vigor. Breve recapitulação.

Para melhor situar o conflito em processo convém recordar o quadro estrutural vigente. O que pode e não pode resultar. Trata-se do modelo neoliberal em curso e podemos ensaiar uma síntese muito breve dos seus traços fundamentais.

Primeiro, temos um salto muito forte na taxa de exploração (ou taxa de mais valia). De acordo com as nossas estimativas esta teria passado de um nível de 4.13 por volta de 1981 até um nível de 6.35 em 2004. [4] Para colocar isto em termos simples: uma taxa de mais valia de 6.35 implica que um operário produtivo típico trabalha para si pouco mais de 8 minutos e para o capital pouco menos de 52 minutos. Além de se tratar de um salto muito pouco habitual deve sublinhar-se o método seguido: o grosso do aumenta é explicado a partir da queda do salário real. Ou seja, o mais retrógrado dos métodos que permitem elevar a taxa de mais valia. [5]

Segundo: opera uma redistribuição intra-capitalista da mais-valia. Ao aumentar o grau de monopólio eleva-se a porção apropriada pelo sector monopólico (no interior do qual o grande capital estrangeiro desempenha um papel dominante). Além disso, eleva-se drasticamente a parte apropriada pelo capital dinheiro de empréstimo e bursátil (juros, lucros de capital) e cai a parte que vai parar nas mãos do capital produtivo industrial (lucro empresarial).

Terceiro: ainda que o excedente e o potencial de reprodução ampliada do sistema se eleve substancialmente, a taxa de acumulação (acumulação sobre excedente) tende a descer. Consecutivamente, eleva-se a parte do excedente que se utiliza como gasto improdutivo.

Quarto: observa-se um salto no grau de abertura externa e uma forte desregulação dos fluxos externos, de capital e comerciais. Em geral, a propensão para o défice estrutural externo acentua-se e o "tecto de crescimento" que este impõe torna-se menor do que o de outras épocas.

Quinto: o sistema passa a operar com baixos ritmos de crescimento (pode-se falar de uma situação de quase estancamento) e com um grau de instabilidade (o flutuabilidade do investimento e do PIB) superior ao experimentado no padrão anterior.

Sexto: a capacidade de absorção ocupacional do sistema afunda-se e concentra-se, quase exclusivamente, nos sectores improdutivos. Este traço, combinado com o um e o dois, dá lugar a um padrão de distribuição do rendimento extremamente regressivo. [6]

Num plano mais político, convém sublinhar dois aspectos cruciais: a) no bloco de poder dá-se um deslocamento em favor do capital financeiro especulativo e contra o do capital industrial. É o primeiro (muito imbricado com o capital estrangeiro) o que passa a ocupar as posições de comando; b) muda o mecanismo de dominação que privilegia o bloco de poder. Se antes faziam-se concessões económicas significativas às camadas médias burocráticas, à classe operária mais organizada e aos camponeses (ou seja, "alimentava-se" o bloco histórico herdado da revolução), no novo padrão essas prebendas tendem a desaparecer. A seguir, a ideologia — quase na sua pureza — passa a funcionar como o recurso único do consenso possível.

Em geral, temos uma combinação muito perversa de exploração muito elevada, forte desperdício e crescimento lento ou nulo. Por isso mesmo, deve-se perguntar qual a possível "racionalidade histórica" do modelo neoliberal. À primeira vista, pareceria que se trata de uma pura irracionalidade: sabemos que um capital que não acumula é um capital destinado, a longo prazo, a desaparecer. Mas isto é a aparência. A realidade nunca existe gratuitamente. [7] Por isso, se indagarmos bem, podemos discernir a funcionalidade (temporal, é claro) do modelo: um, redefinir para baixo o valor da força de trabalho, para assim facilitar o acesso a uma fase de acumulação mais complexa e pesada. Dois, recompor a composição do produto, possibilitando uma especialização internacional mais eficiente. Mas trata-se de possibilidades que não se materializam em termos de crescimento. O neoliberalismo latino-americano é muito eficaz na elevação da taxa de exploração, mas não é capaz de estimular a acumulação pesada. Além disso, é capaz de destruir boa parte do parque industrial e de elevar o grau de abertura externa. Mas não é capaz de impulsionar uma abertura desenvolvimentista, no estilo por exemplo da Coreia do Sul. O que o modelo pode fala-nos da sua funcionalidade. O que não pode — as tarefas pendentes — fala-nos das suas impotências e caducidade assegurada. Ou seja, porque, depois de um certo tempo, exige sua substituição por outro padrão de acumulação, que seja capaz de assegurar um crescimento capitalista dinâmico.

Não seria preciso dizer: tais mutações exigem a mediação da política.

III- Parêntesis: o neoliberalismo e o seu efeito de decomposição

Indicámos que o neoliberalismo implica uma mudança no bloco de poder. Na qualidade de força dirigente surge o capital financeiro-especulativo. Ou seja, um capital que: a) opera no espaço circulatório: b) é improdutivo: apropria-se mas não cria maia-valia; c) acede à mais-valia pela via dos juros e dos lucros bursáteis especulativos ou flutuações do capital fictício [8] ; d) compete com o capital produtivo pela mais-valia, pois o que ganha um perde o outro; e) é um tipo de capital que pelo carácter do seu ciclo e quase total alheamento do espaço da produção, acentua in extremis a fetichização das relações económicas [9] ; f) quando se transforma em fracção dominante, em regra provoca uma tendência ao estancamento económico, ao mesmo tempo que acentua a instabilidade económica e decompõe o capital produtivo; g) pelo menos no contexto latino-americano, provoca um efeito de contágio no capital industrial ou produtivo. Perante o leque díspar de rentabilidades que gera o quadro neoliberal, o capitalista industrial percebe que ganha mais se se puser a investir em papeis (capital fictício), o que dá lugar à denominada "bursatilização" ou "financeirização" da empresa industrial. [10] Ou seja, esta experimenta uma espécie de degeneração produtiva e começa a operar como uma vulgar correctora de valores.

Diversos autores sublinharam o impacto malsão desta fracção do capital. Keynes, nomeadamente, foi muito crítico e chegou a clamar pela "eutanásia do rentista". Marx foi igualmente duro. Qualifica-os de "bandidos honrados" e aponta o facto de que "o sistema de crédito, cujo eixo são os supostos bancos nacionais e os grandes prestamistas de dinheiro e usurários que pululam em torno deles, constitui uma enorme centralização e confere a esta classe parasitária um poder fabuloso que lhe permite não só dizimar periodicamente os capitalistas industriais como imiscuir-se do modo mais perigoso na verdadeira produção, da qual este bando não sabe absolutamente nada e com a qual nada tem a ver". [11]

Mas há algo mais e que vai mais além da economia pura. É o efeito de decomposição moral que provoca o domínio desta fracção do capital. Para o caso, vale recordar o juízo muito agudo de Marx: "enquanto a aristocracia financeira fazia as leis, regia a administração do Estado, dispunha de todos os poderes públicos organizados e dominava a opinião pública mediante a situação de facto e mediante a imprensa, repetia-se em todas as esferas, desde a corte até a taberna mais ordinária, a própria prostituição, a mesma fraude descarada, o mesmo afã pelo enriquecer-se, não mediante a produção e sim mediante o escamotear da riqueza alheia já criada. E nomeadamente nas altas esferas da sociedade burguesa propagou-se o desenfreamento pela satisfação dos apetites mais malsãos e desordenados, que a cada passo se chocavam com as próprias leis da burguesia; desenfreamento no qual, pela lei natural, vai buscar sua satisfação a riqueza procedente do jogo, desenfreamento pelo qual o prazer converte-se em crápula e no qual confluem o dinheiro, a lama e o sangue. A aristocracia financeira, tanto nos seus métodos de aquisição como nos seus prazeres, não é senão o renascimento do lumpenproletariado nas altas esferas da sociedade burguesa". [12]

O neoliberalismo também provoca um efeito de decomposição na classe operária, especialmente no proletariado industrial. Ou seja, no segmento classista mais forte (pelo seu potencial orgânico e político) do bloco popular.

A classe operária experimenta uma exploração redobrada e uma descida absoluta no seus níveis de vida. Mas há algo mais. O ritmo anémico da acumulação determina uma capacidade de absorção ocupacional muito baixa. Por isso, observa-se uma forte descida na porcentagem da classe operária (trabalhadores assalariados ao serviço do capital) em relação à ocupação total. Mais ainda, observa-se até uma descida absoluta na sua dimensão numérica.

Dos que permanecem na classe, há duas deslocações a sublinhar: i) aumenta o peso percentual dos ocupados em actividades improdutivas; i) aumenta o peso dos ocupados em estabelecimentos médios e pequenos. O que, só por si, deve debilitar significativamente o peso específico (seu poder de incidência política) da classe. Para isto também contribuem o aumento no exército industrial de reserva, a chamada "flexibilidade laboral" e o carácter "precário" do grosso da actual ocupação industrial.

O emagrecimento quantitativo do proletariado provoca um sério efeito de desclassificação. O que nos leva a perguntar: o que sucede com estes desclassificados? Qual o seu destino social?

Alguns caem na marginalidade social mais completa: consomem-se no álcool, na droga, na depressão, etc. Em breve desaparecem como sujeitos sociais e até como pessoas.

A grande maioria, em todo o caso, procura reinserir-se em outros sectores económicos, aqueles que por definição não podem ser capitalistas. Portanto, devem incorporar-se a um quadro estrutural sociologicamente diferente, assumir status e papeis sociais diferentes e, afinal de contas, reinventar-se como personagens sociais. Em termos psicológicos, a transformação costuma ser bastante traumática. Mas aqui interessa-nos indagar minimamente no "novo" e nas consequências sócio-políticas que gera.

Partamos de um dado elementar: aqueles que o capitalismo não absorve, aqueles que não encontram um capital variável que os procure, são por definição pessoas pobres, sem controle de meios de produção. E como só têm sua força de trabalho, arriscam a aniquilação directa. Como fazem? O caminho é conhecido: de um modo ou de outro arranjam-se para conseguir um mínimo e precário meio de produção: uma bicicleta, um cabaz, a cozinha e a máquina de costura doméstica, um martelo, um cubículo de dois por dois, uma maleta de viajante, um lugar na rua, etc. Ou seja, trata-se de conseguir um minimo-minimorun de recursos (necessariamente ultra-rudimentares) para poder desenvolver alguma actividade económica elementar. Daqui, uma primeira consequência: os sectores marginalizados pelo capital incorporam-se ao pequeno comércio e à pequena produção (aparentemente, mais à primeira do que à segunda). Em suma, expande-se um sector da pequena economia, rudimentar e de muito baixa produtividade. Consecutivamente, o que foi o pôde ser proletariado industrial metamofoseia-se e aparece como "pequena burguesia pauperizada".

Neste sector, o processo de trabalho assume um carácter basicamente pessoal-familiar. E no caso do pequeno comércio, muitas vezes de rua e ambulante, que parece absorver o grosso das sobras populacionais do capitalismo, observam-se outros traços de interesse: i) o trabalhador muda muito de lugar e de actividade e, por isso mesmo, não costuma ter clientelas fixas. Além disso, tende ao desenraizamento; ii) a lógica económica em que se insere pressiona-o a comprar barato e vender caro. Ao mesmo tempo, não costuma funcionar com margens de preços mais ou menos estáveis. De facto, este circuito e as condições em que operam estimulam os truques e enganos, ao comprar e sobretudo ao vender: iii) as condições em que desenvolve seu trabalho não favorecem nem a disciplina pessoal nem uma vida que funcione com horizontes de longo prazo. Além disso, trata-se de uma actividade quotidianamente incerta e alheia a qualquer tipo de segurança social (serviços médicos, pensões de velhice, etc); iv) a instabilidade e incerteza podem lumpenizar bastante parte destes segmentos. Além disso, costuma empurrá-los para actividades ilícitas: roubos, sequestros, narcotráfico, etc. Certas tradições rural-comunitárias muito mexicanas comtrapõem-se a estas tendências. Mas trata-se de valores e usos que, sobretudo no meio urbano, vêem-se desintegrando muito rapidamente.

Estes sectores, quantitativamente muito extensos, não podem estar nada felizes com o sistema. Ao contrário. Mas, pelas suas próprias condições objectivas, não possuem capacidade organizativa e costumam ser politicamente instáveis. Ou seja, oscilantes. Podendo passar desde a actos de rebeldia extrema até a condutas passiva e de desprezo para com a política. Inclusive, sob determinadas condições, podem chegar a servir como base ou carne de canhão de movimentos fascistas. Em linhas gerais pode-se sustentar: se a esquerda estiver bem organizada e for lúcida, pode canalizar a raiva destes segmentos por caminhos racionais e politicamente eficazes. Se não estiver, podem-se desviar para movimentos fascistóides. Ou então, o que por agora seria mais provável, deles podemos esperar que surjam grandes e parciais arrebentamentos de rebeldia. Parciais num duplo sentido: sem continuidade temporal e focalmente loalizados. Ou seja, alheios a qualquer estratégia de longo prazo.

IV- A mudança estrutural. As grandes opções

Quais podem ser as opções de substituição do modelo neoliberal? Em termos de lógica económica e de modo muito sinóptico, podemos distinguir as três que se seguem:

a) Um padrão secundário exportador. Neste caso, enfatiza-se o avanço para uma fase de industrialização pesada, controla-se em direcção ao rebaixamento da taxa de juros, insiste-se na abertura externa mas agora em termos regulados (impusionam-se as exportações industriais e regula-se o crescimento das imortações), não se modifica substancialmente a distribuição do rendimento e eleva-se substancialmente a taxa de acumulação. Também se expande a ocupação industrial e observa-se uma forte regulação estatal. A fracção hegemónica é o grande capital industrial. Exemplo deste padrão pode ser a Coreia do Sul.

b) Um padrão capitalista democrático-nacional. Em relação ao padrão neoliberal as mudanças básicas seriam: melhoria substancial no emprego e na distribuição do rendimento, crescimento industrial mais voltado para os bens de consumo e em função do mercado interno. Regulação estatal significativa, operando como fracção hegemónica da burguesia industrial que trabalha para o mercado interno e que é menos monopólica. Aproxima-se do projecto de AMLO. [13]

c) Um estilo de transição ao socialismo. Trata-se já de uma mutação maior e podemos supor que implicaria uma coexistência entre um moderno sector socialista e um não débil sector capitalista. Muito provavelmente trabalha para o mercado interno, elevando o grau de industrialização e melhorando a distribuição do rendimento.

Na actual conjuntura, os modelos a) e c) não funcionam como opções efectivas. O socialista por óbvias razões de correlação de forças (nacional e internacional), pela grande debilidade da classe operária mexicana e pela decomposição ideológica que experimentou o ideal socialista. A opção a) resulta surpreendente que não seja arvorada. Há aqui a expressão de uma miopia política e económica maior da grande burguesia industrial e de debilidade frente aos EUA. A longo e até a médio prazo não deve ser descartada.

A opção restante, a (b), foi a que se perfilou e ganhou força. De facto, é a que vem operando como única alternativa efectiva e relevante ao modelo neoliberal em curso. E foi a que nas últimas eleições presidenciais [02/Julho/2006] se colocou no primeiro plano do cenário político.

V- A eleição e a fraude

As eleições não são tão insignificantes como um certo "ultrismo" costuma qualificá-las nem tão decisivas como são sonhadas pelo reformismo. São um barómetro, uma conjuntura em que se concentram as forças políticas e opinião das gentes. Além disso, podem funcionar como factor desencadeador de movimentos sócio-políticos de grande significado. No caso que nos preocupa, as eleições presidenciais acabaram por sintetizar o conflito entre duas grandes opções: a do modelo neoliberal (Calderón) e a de um capitalismo nacional e democrático (López Obrador). Ou seja, entre a delgada camada oligárquica hoje dominante e o vasto oceano que hoje forma o povo mexicano. Por isso mesmo, a conjuntura eleitoral torna-se de grande importância e convém que seja examinada detidamente.

Quatro meses antes das eleições, a vantagem de AMLO sobre os seus adversários era enorme. Contudo, sua presença nos media (televisão em especial) era reduzida. E por aquela data começou uma feroz campanha de propaganda da direita e do governo. [15] Uma pequena parte, não mais de uns 15% centrava-se no programa de Calderón. Tudo o mais apontava para um ataque impiedoso a AMLO. A propaganda, pelo rádio e pela televisão, foi esmagadora, por vezes à razão de duas ou três mensagens por minuto de transmissão. Isto, pelo lado da propaganda explícita pois noticiários e até programa desportivos e de espectáculos acrescentavam mais e mais ataques a AMLO. Não menos chamativo foi o conteúdo da propaganda: poucas vezes se viu tão crasso e grosseiro. Inventaram-se números sobre a despesa e a dívida do Distrito Federal sob a administração AMLO (sem parar de mentir quando o orçamento foi aprovado por um Parlamento se maioria de AMLO e com a aprovação do partido PAN, o de Calderón), chegou-se a sustentar que AMLO repetira o programa do seu principal inimigo, o ex-presidente Salinas (que foi grande impulsionador do neoliberalismo, ontem e hoje apoiado por Calderón) e que se AMLO se tornasse presidentes, as camadas médias perderiam casas, frigoríficos, liquidificadores e televisão. A norma (ao que parece concebida por publicistas espanhóis) foi a mentira e a mais completa falta de escrúpulos e de ideologia. Aqui, o "imperativo categórico" do professor Kant foi atirado directamente no caixote do lixo. E poderíamos muito bem falar de imoralidade absoluta. [16] E convém reiterar: a crítica ideológica — como por exemplo acusar AMLO de "desprezar o livre mercado", de "subsidiar os pobres" e "fomentar a intervenção estatal", de "não promover o investimento estrangeiro", de "apoiar o divórcio" e não "querer vender a Pemex aos gringos", etc [17] — desapareceu por completo e foi substituída pela mentira soez, no melhor estilo de Goebbels. Não é o caso de evitar o juízo moral que esta conduta merece, mas é mais interessante apontar o aspecto mais oculto que se manifesta neste tipo de conduta. Um: quase não se fala do projecto próprio. A atenção concentra-se no rival. Daqui podemos deduzir: não existe nenhuma vontade de convencer acerca das bondades ou vantagens do próprio projecto. Dois: a crítica ao oposto não maneja argumentos (ideias, raciocínios, deduções) de ordem racional mas, muito pelo contrário, instala-se na ordem puramente emocional: os medos, os perigos, as ansiedades. Em suma, abandona-se o espaço da razão e nos instala directamente no plano das emoções mais elementares e primitivas. No fundo, encontramos uma tentativa, certamente inconsciente, de reviver o modo de dominação medieval, o do medo aos santos infernos e às mais terrenais fogueiras que pregavam curas e bispos para submeter o campesinato indigente. Podemos, em consequência, deduzir: na elite neoliberal o afã hegemónico (isto é, de convencer ) é ou muito fraco ou inexistente. O que poderá talvez dever-se à rusticidade intelectual dos ideólogos (tecnocratas) neoliberais. Ou então, ao facto de que implícita e inconscientemente maneja-se a ideia de uma impossibilidade estrutural: o modelo neoliberal não dá para atrair grandes massas da população. Por isso mesmo, deve-se recorrer à coacção directa. Algo assim como um "purgatório" iniludível, o que se justificaria (para as possíveis e não muito abundantes "boas consciências") pela promessa, a longo-longo prazo, de uma expansão económica capaz de melhorar o bem estar geral. Para o que, a curva distributiva em "U" investigada por Kuznets, poderia representar alguma racionalização. [18] Com um problema nada pequeno: em tais padrões de desenvolvimento, a distribuição regressiva encontra justificação histórica enquanto for associada a altos ritmos de acumulação e crescimento, algo totalmente alheio ao padrão neoliberal.

Retomemos nosso fio. A brutal propaganda da direita debilitou AMLO. Contudo, nos dias anteriores à eleição, poucos jornalistas (falamos de jornalistas inseridos no establishment dos grandes media) duvidavam do seu triunfo. Ao nível dos inquéritos, se retirarmos os mais extremos e fizermos médias por classes, dava-se uma diferença de 4-2 pontos percentuais em favor de AMLO. [19]

A eleição realizou-se dia 2 de Julho. Os resultados oficiais, bastante demorados e sinuosos, davam como ganhador o candidato das direitas, por uma margem de meio ponto percentual. A surpresa foi grande, espalharam-se as dúvidas e, pelo menos para os perdedores, foi algo muito difícil de aceitar. [20]

A fraude é mais do que provável. Afinal de contas, trata-se de um velho costume da política mexicana. Mas agora, juntamente com os métodos mais tradicionais (dos quais dia a dia vão aparecendo mais provas), parecem haver-se incorporado alguns mecanismo cibernéticos muito refinados. As evidências têm-se multiplicado (ao mesmo tempo que todos os media repicam acerca da "grande jornada democrática" e de um "sistema eleitoral que é modelo e digno de ser imitado a nível mundial" — glup!), mas aqui não podemos entrar nesse plano, que antes de tipo técnico-policial. Num plano mais apriorístico, há matemáticos que falam de inconsistências lógicas muito suspeitas na temporalidade dos cálculos. No plano das redes do poder, há dados gritantes:   i) o candidato da direita foi padrinho de casamento do actual director do órgão máximo responsável pela contagem;   i) o cunhado do candidato da direita, dono de uma empresa de computação, obteve um sumarento e obscuro contrato como o organismo eleitoral máximo;   iii) a grosseira campanha de propaganda deste organismo supostamente neutral, depois da eleições, contra as colocações de AMLO. Mas há algo mais: a direita e o seu candidato vêm-se negando rotundamente a aceitar uma segunda contagem dos sufrágios. Por outras palavras, recusam um procedimento que lhes deveria conceder — se realmente têm mais votos — uma legitimidade muito forte. A aposta é clara e deve ser sublinhada: aponta-se para a dominação sem legitimidade. Ou seja, violência sem consenso, poder não revestido de legitimidade.

VI- Os de cima e os de baixo. Os modos da política

A mudanças sociais podem ser muito diversas, mas podemos agrupá-las em duas modalidades básicas. 1) Reformas: se preservarem os traços mais essenciais do sistema e alterarem alguns traços secundários ou de segunda ordem. 2) Revoluções: se alterarem os traços mais essenciais do sistema, ou seja, suas relações de propriedade e as correspondentes relações de classe: "as revoluções, as verdadeiras (...), transformam as instituições e deslocam a propriedade". [21] A classe subordinada pode desenvolver dois modos de luta política: a) luta ou política reformista; b) luta ou política revolucionária. Pela seu lado, a luta da classe dominante também assume dois estilos: a) luta reformista; b) política conservadora e reaccionária. Neste caso, recusa-se toda classe de alterações no sistema. No primeiro, aceitam-se mudanças (reformas) na medida em que não afectarem as bases do sistema.

As reformas que pressionam os de baixo e desejam ou aceitam os de cima podem ser convergentes. Materializam-se, dão lugar a uma transição que vai de uma etapa ou fase para outra etapa ou fase no desenvolvimento do sistema. Em regra, a resposta reformista da classe dominante é o método mais eficaz para preservar o sistema a longo prazo: além de assegurar seu dinamismo produtivo, contribui para solidificar a legitimidade da ordem social vigente. As políticas intransigentes da classe dominante, pelo contrário, costumam pressionar o avanço das posturas políticas revolucionárias no seio da classe explorada. Mas se o radicalismo entra em acção, a classe dominante não poderá responder com diálogos e sim com o uso sem restrição do poder repressivo estatal. Como advertia Marat nos inícios da Revolução Francesa: "pretender que homens que durante dez séculos gozaram de toda a liberdade para dominar-nos, roubar-nos e oprimir-nos impunemente decidam-se agora de bom grado a serem simplesmente nossos iguais é o cúmulo da loucura". [22] Por isso mesmo, se neste contexto tiver de materializar-se a mudança, a força da repressão estatal deverá ser contrariada por uma força superior. Por isso se diz que, em regra, não há revoluções pacíficas e que a revolução funciona como parteira da história.

O acima indicado também implica que nos momentos de grande colisão, a classe alta não vacila em dissolver a forma democrático-burguesa. Para o caso, é util recordar algumas colocações clássicas. Quanto a Engels, foi dito que "previa que a burguesia faria em pedaços suas próprias formas constitucionais se estas ameaçassem sua propriedade". [23] De Rosa Luxemburgo, um estudioso da sua obra destaca que "acertava completamente quando insistia em que a classe capitalista em, em todas as partes, é menos sentimental acerca da democracia que acerca da permanência da sua supremacia". [24] Quanto a Lenine, assinalava que "o partido dominante de uma democracia burguesa só cede a defesa da minoria (leia-se domínio do aparelho estatal, JVF) a outro partido burguês, ao passo que ao proletariado, em todo problema sério, profundo e fundamental, ao invés da 'defesa da minoria' cabe-lhe como destino estados de guerra ou progroms. Quanto mais desenvolvida está a democracia, tanto mais próxima se encontra do progrom ou da guerra civil em toda divergência política perigosa para a burguesia". [25] Em suma, ceder o poder à classe operária é algo que a burguesia não aceita e para evitá-lo não vacila em desfazer-se dos cânones democrático-burgueses e recorrer à violência extrema. Ao mesmo tempo, indica-se que a transição no poder de uma fracção burguesa para outra pode ter lugar conservando as formas democráticas.

Pois bem, o que a actual experiência mexicana (e não só a actual) vem mostrando é algo que contradiz a tese de Lenine e torna-a ainda mais grave: rompe-se com a democracia não só frente a um eventual perigo de um movimento anti-capitalista. Quando se trata de avançar para outra forma de capitalismo, o actual bloco neoliberal também está disposto a romper com a norma democrático-burguesa e entrar no espaço da coacção. [26] O significado das últimas eleições, sua fase prévia e a que se lhe seguiu, parece apontar neste sentido.

Teríamos então: a direita neoliberal, no actual contexto, aposta na força. E como bem sabemos, uma força só pode ser contraposta por outra força de sinal oposto e mais poderosa. Mas basta esta observação para perceber a tremenda disparidade que existe neste espaço: o bloco progressista, neste plano — o da força — funciona com uma orfandade completa. Neste sentido, a escolha das direitas parece inteligente: o desnível é tão forte que nem sequer permite que se chegue a uma confrontação efectiva. Quando muito poderia verificar-se uma ou outra escaramuça impotente. Mas é muito claro que o bloco progressista, neste plano, está totalmente condenado à derrota. Antes, inclusive, de qualquer possível confrontação.

Contudo, a direita estaria a começar a brincar com fogo. Se só oferece coacção, para o bloco popular a moral é evidente: deve começar a preparar-se também no plano da força. Se assim for, este não será um caminho curto. Muito pelo contrário, estar-se-ia a abrir uma rota sinuosa, áspera e não linear. Em que, além disso, o país cairia num contexto de quebra da normalidade mais elementar e começaria a viver sentado nas baionetas.

Está o país, então, numa rota de grande colisão? A pergunta merece uma maior discussão.

VII- As forças que podem pressionar pela mudança. Alguns antecedentes.

Aceitemos que a base económica exige uma mudança no padrão de acumulação. Mas daqui não se deduz que a mudança esteja na ordem do dia. Primeiro porque o movimento que vai da base económica à variável política (passando pelo ideológico) não é algo automático, costuma ser muito sinuoso e inclusive poderia não chegar a ocorrer durante um longo período de tempo. Além disso, a mesma variável política poderia ter (algo muito habitual) um comportamento errático. Mas além desta colocação de ordem geral, devemos considerar alguns traços muito peculiares do actual período. O problema a considerar é o dos agentes possíveis da mudança e do que poderíamos denominar seu "estado de saúde".

Para melhor entender o ponto, comecemos por uma colocação introdutória.

Recordemos um texto bastante conhecido de Marx. Nele prognostica-se o que se poderia passar com o curso e o avanço do desenvolvimento capitalista. E para melhor ressaltar o ponto que nos interessa separamos no texto os parágrafos que se seguem: 1) "com a diminuição constante no número dos magnatas capitalistas que usurpam e monopolizam todas as vantagens deste processo de alteração" (Marx refere-se ao processo de crescimento, socialização das forças produtivas e centralização de capitais que tipifica o capitalismo, nota de JVF); 2) "cresce a massa da miséria, da opressão, da servidão, da degeneração, da exploração"; 3) "mas aumenta também a rebeldia da classe operária, cada vez mais numerosa e disciplinada, mas unida e organizada pelo mecanismo do próprio processo capitalista de produção". [27]

Cotejemos agora estes enunciados com as actuais realidades mexicanas. [28] O ponto 1) cumpre-se com total clareza no México, os ricos são cada vez mais ricos (já o são a nível mundial) e menores em número. O ponto 2) também se cumpre amplamente: os níveis de miséria e exploração vêm atingindo extremos inauditos. Quanto ao ponto 3), encontramos incongruências. Um: a classe operária não é mais numerosa. Antes ao contrário, cai seu peso relativo (porcentagem da ocupação total) e até a sua magnitude absoluta. Dois: não está nem mais unida nem mais organizada. De facto, atravessa sérios problemas de organização e unidade. Três: quanto à maior rebeldia, o ponto não está claro: em alguns dos seus segmentos (mineiros, Sicartsa) dá mostras de despertar para a luta. Em outros, continua um tanto ou muito adormecida.

Continuemos com o ponto 3), mas mudemos agora "classe operária" por "povo" em geral (inclusive descartando os operários propriamente ditos). Neste contexto, ao continuar a cotejar com o México, encontramos: a) forte crescimento numérico do povo; b) mais e novas rebeldias. Mas atenção!: nesta rebeldia não há uma consciência classista que se traduza numa orientação política anti-capitalista. Pelo menos no momento é basicamente raiva, contrariedades e frustrações muito fundas; c) muito pouca organização. Em suma, uma indignação ou raiva que não consegue traduzir-se numa força política com directrizes claras. Pelo menos, não no grau que se poderia esperar a partir do alto nível da contrariedade da rebeldia social.

Neste ponto, permita-se-nos deter o passo. O bloco progressista (o potencial e o efectivo) é integrado por segmentos classistas muito heterogéneos. Por isso, em cada um deles podemos encontrar opções e potencialidades diferentes. Neste sentido, antes de incorrer em generalizações apressadas convém examinar o que sucede com as diversas fracções que compõem o todo.

Por enquanto, deixamos de lado a classe operária. E perguntamos: a) Quem integra o bloco, o potencial e o efectivo? b) Que se pode esperar de tais segmentos? Qual é sua capacidade de liderança e qual é o projecto que favorecem?

Quanto à diversas fracções classistas que poderiam alinhar-se no bloco potencial, identificamo-las no quadro que se segue:

Quadro 1.

O esquema é em traços muito gerais e exigiria apresentar matizes e explicações longas. Mas isto nos levaria demasiado longe e optámos por correr o risco inerente a todo traço grosso.

Como apreciação geral, digamos que no bloco efectivo os segmentos 1.1, 2.1.1 e 2.2.3 estão fracamente representados e muito dificilmente elevarão sua participação. Os segmentos 1.2, 1.3, 2.1.3 e 2.2.4 poderiam elevar-se bastante.

O peso quantitativo da burguesia é mínimo. [29] Menos de 250 mil pessoas, o que equivale a uns 0,7% da ocupação não agrícola total. De todos eles, uns 0,1% (um por mil, pouco mais de 300 patrões) pertencem à grande burguesia, uns 6,2% à burguesia média e uns 93,6% à burguesia pequena. [30] O "peso específico" destes segmentos certamente está muito acima do seu peso quantitativo. [31] Este é o caso, sobretudo, da grande burguesia. Aqui, sublinhemos, localiza-se o próprio coração do poder económico e político do país. Deles, uma parte provavelmente não maior, é a que trabalha para o mercado interno e que poderia acabar por ser favorável ao projecto de AMLO. O ponto é algo curioso: se AMLO chegasse ao governo, este grupo seria muito beneficiado e, por isso mesmo, podemos supor que acabaria por apoiá-lo. Mas hoje tem-lhe desconfiança e praticamente todos o recusam. Quanto à burguesia média e pequena, é muito provável que aqui, sem serem majoritários, apareçam apoios a AMLO.

O conjunto quantitativamente mais forte é o da pequena burguesia. A informação básica mostra-se no quadro que se segue:

Quadro II - México, nível e composição da pequena burguesia não agrária
Sectores Nº ocupados Porcentagem sobre o total da classe Porcentagem sobre ocupação não agrícola Porcentagem sobre ocupação total
1.- Pequena Produção. 16,773,730 77.8 48.6 40.6
1.1. Produtivos 5,740,653 26.6 16.6 13.9
1.2. Improdutivos 11,033,077 51.2 32.0 26.7
2.- Sector capitalista 2,902,881 13.5 8.4 7.0
2.1. Profissionais 1,180,143 5.5 3.4 2.9
2.2. De escritório 1,722,738 8.0 5.0 4.2
3.- Sector governo 1,879,038 8,7 5.4 4.5
Totais 21,555,649 100.0 62.4 52.2
Fonte: estimado a partir de INEGI, "Encuesta Nacional...", ob. cit.

A informação disponível não permite que nos atenhamos estritamente à classificação de grupos exposta antes. Mas pode servir-nos como uma primeira e grossa aproximação.

O que salta à vista em primeiro lugar é a tremenda importância quantitativa do sector. Explica uns 62% da ocupação urbana e mais da metade da ocupação total. Se aos totais calculados lhe acrescentássemos a pequena burguesia agrária, aproximar-nos-íamos a quase dois terços da ocupação total. [32] Em contas resumidas, actualmente o México pode ser catalogado como um país que é basicamente pequeno burguês.

Contudo, trata-se de um conjunto muito variegado e com fortes diferenças internas. O tema merece um exame ad hoc que não podemos fazer aqui. Mas no Quadro II podem-se captar alguns traços básicos. As camadas médias com situação económica média ou folgada devem-se situar no sector capitalista (sobretudo em técnicos e profissionais) e no governo. Quando muito explicariam uns 22% do conjunto total. E em relação à ocupação total, alcançariam uns 11,5%. O grosso das camadas pequeno burguesas localiza-se no sector da pequena produção mercantil (que a estatística oficial denomina "sector não estruturado" ou "informal"): explicam uns 77,8% do conjunto e em relação à ocupação total quase uns 41%. São as camadas mais pauperizadas e precárias, inserem-se principalmente em actividades improdutivas (comércio e serviços) e desenvolvem trabalhos do tipo vendedor ambulante, etc. Neste sentido, ao enunciado geral prévio podemos acrescentar que o país, além de ser basicamente pequeno burguês, é de uma pequena burguesia muito empobrecida e em processo de decomposição.

Passemos a examinar a classe operária. Os antecedentes mais grossos mostram-se no Quadro III.

Quadro III - A classe operária no México. Alguns antecedentes quantitativos.
Sector de trabalho Número de operários (*) Porcentagem da ocupação não agrícola Porcentagem ocupação total
Pequena ind. 5,856,740 ( 43.2 ) 17.0 14.2
Media ind. 4,080,564 ( 30.1 ) 11.8 9.9
Grande ind. 3,627,561 ( 26.7 ) 10.5 8.8
Totais 13,564,865 ( 100.0 ) 39.3 32.8
Total ajustado(**) 10,661,984 ( 78.6 ) 30.9 25.8
(*) O número entre parênteses indica a porcentagem do estrato sobre o total da classe.
(**) Ao total de trabalhadores remunerados retirámos o grupo de trabalhadores de escritório e o de profissionais e técnicos. Para isso, aplicamos a porcentagem destes grupos sobre a população ocupada total. Trata-se de uma aproximação pois nossa fonte não cruza posição ocupacional com dimensão de estabelecimento.
Fonte: estimado a partir de INEGI, "Encuesta nacional de ocupación y empleo 2005", citada.


O que mais chama a atenção é o baixo peso quantitativo da classe: só explica uma quarta parte da ocupação total. E equivale a quase a metade do conjunto pequeno burguês. Tudo isso nos mostra muito vivamente as carências do desenvolvimento capitalista no país. Em segundo lugar, chama a atenção o facto de que a menor porcentagem dos assalariados localiza-se nos grandes estabelecimentos (menos uma quarta parte). Correspondentemente, o grosso da classe localiza-se em negócios médios e pequenos. Nos pequenos, encontram-se uns 43% (medido sobre o total não ajustado) e mais da metade se cotejarmos com o total ajustado. O que, se recordarmos a correlação entre tamanho de fábrica e nível de organização e consciência da classe, nos adverte que as condições objectivas não jogam a favor de uma classe activa e "para si".

Outra informação de interesse refere-se à localização da classe em sectores produtivos ou improdutivos. Neste caso não podemos fazer o ajuste que exige a presença da pequena burguesia assalariada. Em todo o caso, a informação permite-nos uma aproximação grossa ao problema.

A informação nos mostra que 69% dos ocupados localiza-se no sector improdutivo. Além disso, que o segmento improdutivo é muito mais forte no estrato de estabelecimentos pequenos. Ver o quadro que se segue:

Quadro IV - Ocupação assalariada por tamanho e sectores produtivo e improdutivo. (porcentagens do total)
Sectores Pequenos Médios Grandes Total
Produtivo 17.0 34.0 50.0 31.0
Improdutivo 83.0 66.0 50.0 69.0
Total 100.0 100.0 100.0 100.0
Sectores        
Produtivo 25.0 33.0 42.0 100.0
Improdutivo 53.0 28.0 19.0 100.0
Nota: Não se considera o sector agropecuário e como sectores produtivos contabiliza-se a construção e indústria manufactureira. Como improdutivos, comércio e serviços. Isto em função da classificação da estatística oficial.
Fonte: estimado a partir de INEGI, ob. cit.


Na parte superior do quadro, linhas 1 a 4, mostra-se a distribuição do emprego assalariado por tamanho e sector. E podemos ver que no segmento de estabelecimentos pequenos 83% da ocupação é gerado no sector improdutivo. Ao passo que, no segmento de grandes estabelecimentos, a ocupação distribui-se em partes iguais, 50% e 50%. Em suma, é muito claro que a menor tamanho, maior o peso das actividades improdutivas. E vice-versa. Algo que não deve surpreender pois uma parte significativa do sector improdutivo corresponde ao grupo de "não transacionáveis". Ou seja, trata-se de actividades que ficam à margem da competição externa e, por isso mesmo, permitem o refúgio dos mais fracos.

Na parte inferior do quadro, linhas 5 a 7, os dados são computados de outra maneira. Aqui podemos ver como a ocupação, produtiva ou improdutiva, distribui-se segundo dimensões do estabelecimento. A linha 6, por exemplo, assinalá-los que 42% da ocupação produtiva origina-se nos grandes estabelecimentos, uns 33% nos médios e uns 25% nos pequenos. Em resumo, o sector produtivo está associado positivamente ao tamanho da empresa. Entretanto, no sector improdutivo (linha 7), verificamos que 53% da ocupação é originada nos pequenos negócios, uns 28% nos médios e só uns 19% nos grandes estabelecimentos. Em suma: quanto menor é a dimensão do negócio, maior é o peso das actividades improdutivas. Neste contexto, podem-se depreender muitas e graves conclusões que aqui não podemos discutir. Mas basta uma indicação: a dimensão do despropósito das iniciativas neoliberais para impulsionar o segmentos dos "pequenos changarros" [NT 1] . Com isso não só apostam nos mais baixos níveis de produtividade (ou seja, na reprodução do subdesenvolvimento) como também em acentuar ainda mais o grave parasitismo que vem degradando a economia do país.

Terminemos esta digressão quantitativa. Podemos ensaiar um balanço final, para o que distribuímos a ocupação agropecuária (17,3% do total, excluindo o grupo de "outros") nas três categorias básicas que estivemos a manejar. [33] Isto nos daria a seguinte distribuição percental da ocupação total (sem contabilizar "outros"), urbana e rural:

Burguesia 1.5 %
Pequena burguesia 68.7 %
Proletariado 29.8 %

Em suma, o que domina no país é o vasto e variegado mundo da pequena burguesia. Esta é muito dissemelhante, mas na sua maior parte vem caindo na condição de camada pauperizada. O que também nos fala de um capitalismo anémico, estancado, parasitário e incapaz de absorver produtivamente a maior parte da população. De facto, o que este sistema vem provocando são dois tipos de expulsões: a) a que envia gente para fora do país; b) a que expulsa para o interior atrasado o sector das pequenas e paupérrimas actividades informais.

O acima descrito também nos pode ajudar a entender alguns aspectos relevantes da situação actual:   i) a massificação do movimento pela mudança;   ii) a eventual instabilidade política dessas massas;   iii) o carácter da sua mobilização, mais ligada a uma personalidade carismática do que a organizações partidárias;   iv) a debilidade orgânica e ideológica que permeia as bases do movimento. [34]

Adicionalmente, pensando no modelo de capitalismo democrático e nacional impulsionado por AMLO, teríamos: a) como força principal (ou seja, numericamente majoritária) a pequena burguesia; b) como opções de força dirigente, a burguesia industrial não monopolista que trabalha para o mercado interno ou a classe operária industrial. Isto, num sentido teórico-abstracto, como um juízo antes apriorístico. Mas o que a realidade concreta hoje nos indica é uma tremenda orfandade (ideológica e política) da classe operária. Além disso, uma extensa falsa consciência na burguesia industrial nacional. [35]

Começa-se portanto a perfilar uma hipótese: estamos na presença de uma realidade objectiva que começa a pressionar pela mudança. Não obstante, essa mesma realidade parece também debilitar os possíveis agentes sociais (classes e/ou fracções de classes) que poderiam impulsionar e dirigir essa mudança com a adopção de uma estratégia coerente.

Contudo, convém incorporar de imediato um factor nada insignificante. A nível de direcções políticas (do tipo PRD e no círculo de AMLO), a burguesia industrial (a média, em especial) está muito sobre-representada e ocupa posições de comando. Esta é uma das maiores peculiaridades da situação actual: existe uma representação política que surge desconectada das suas bases objectivas. [36] Dizendo isto de outra maneira: a classe per se anda por um lado e seus representantes político-literários mais lúcidos andam por outro. Por agora, a convergência é mínima, ainda que — obviamente — possa chegar a crescer. O problema já foi indicado: para que o político convirja e se una ao económico, o bloco de AMLO teria que chegar ao governo e então, a partir dali, provocar a convergência

Resta uma pergunta: acaso não há capacidade de direcção por parte da pequena burguesia? E, se não do seu conjunto, não podem tê-la algumas das suas fracções componentes?

Precisemos: por força dirigente entendemos aquela classe (ou fracção de classe) que encabeça o movimento em favor de uma mudança estrutural e que, ao frutificar, implanta uma ordem económica e política que responda aos seus interesses objectivos de classe. Ou seja, a mudança provocada põe a classe numa situação de comando, no económico e no político.

Neste sentido, a experiência histórica conhecida é bastante eloquente: esta classe por vezes (não sempre) funcionou com um grande factor de empuxão. Mas nunca como força dirigente. De um modo ou de outro, sempre acabou por favorecer os desígnios de outra classe. Neste caso, Lenine sustentava que ao pequeno burguês "une-o economicamente e politicamente a burguesia (...), ou o proletariado. De um 'terceiro caminho', de uma 'terceira força' só podem papaguear e sonhar os fátuos Narcisos". [37]

Por que esta impotência política? Num sentido muito geral, podemos apontar o que se segue. Se o projecto político que se arvora for estritamente congruente com a posição de classe deste grupo, tratar-se-ia de reproduzir sua condição de pequeno produtor mercantil. Foi o que fizeram muito claramente autores como Rousseau [38] , Proudhon e outros. O problema chave é que tal propósito exige congelar as forças produtivas. Por isso mesmo, trata-se de um projecto com nenhuma viabilidade histórica substantiva. Por outro lado, se aceita que é necessário impulsionar uma maior produtividade do trabalho, o que de facto começa a fazer é estimular a transição para o capitalismo. Ou seja, transformar o pequeno burguês num capitalista incipiente.

O indicado é especialmente válido para a pequena burguesia independente. Para a assalariada, especialmente no seu segmento burocrático-estatal, em circusntâncias históricas muito particulares, poderia procurar avançar para um "socialismo burocrático". Ou seja, para um capitalismo monopólico estatal de aparência socialista. Mas aqui também haveria "mudança de pele": o que surgiria seria uma "burguesia burocrática de Estado". Finalmente, quando ao segmento intelectual, que é parte do grupo de técnicos e profissionais, em regra muito poucos funcionam como "intelectuais orgânicos da pequena burguesia" stricto sensu (casos de Rousseau, Proudhon, etc). Além de que fazem-no com todas as limitações estruturais já mencionadas. Mas na sua grande maioria acabam por integrar-se nos lados fundamentais. [39] Em alguns casos reproduzem a ideologia dominante acomodando-a às condiçoes do meio social pequeno-burguês em que vivem. Por outras palavras, passam a funcionar directamente como intelectuais orgânicos das classes fundamentais. Em suma, a camada é um viveiro muito fecundo, mas em benefício de outras classes.

Em resumo: na pequena burguesia, em todos os seus diferentes componentes, não podemos encontrar uma capacidade de direcção real e substantiva. E sim uma grande força de apoio. A qual, além disso, assume uma peculiaridade que passamos a indicar.

VIII- Breve incursão sobre o tipo de liderança e seu condicionamento

No bloco progressista actual não existe uma direcção sólida e homogénea. O que há é um líder carismático cercado de uns poucos colaboradores. [40] Trata-se de uma liderança pessoal de tipo carismático, quase órfão de teoria e doutrina. A dedução parece clara: trata-se de avançar das decisões intuitivas para outras sustentadas em reflexões e estudos sólidos, e de uma direcção unipessoal quase absoluta a outra de carácter mais colectivo. Mas isto é mais fácil de dizer do que de praticar. E que esta situação tenha lugar e que se repita reiteradamente, há longo tempo, deveria alertar-nos: nesta expressão subjectiva muito provavelmente estão a incidir causas objectivas muito poderosas, ancoradas na própria estrutura da sociedade actual.

No México, vale a pena insistir no ponto, em virtude da paralisia do processo de acumulação e reprodução ampliada, encontramo-nos hoje perante um verdadeiro mare magnum de elementos pequeno burgueses. Não se trata aqui de segmentos que se libertam do domínio latifundiário como em fins do século XIX e durante a primeira metade do século XX. Agora, a origem é outra: o estancamento e a decomposição do capitalismo industrial, sua incapacidade para gerar emprego produtivo. Dada a condição pequeno burguesa de base, trata-se de grupos muito diversos que vão desde o vendedor ambulante ao profissional independente, ao artesão e pequeno comerciante. Desde o pequeno negócio de comidas ao bufarinheiro e ao narcotraficante menor. O panorama é muito heterogéneo e, por isso mesmo, não se pode esperar que deste oceano brotem comportamentos políticos coerente e unificados. O que costuma imperar é a inconstância, por vezes o arrivismo rasteiro e em outras a rebeldia vociferante. Além disso, boa parte destes grupos "não podem representar-se e têm, sim, que ser representados. Seu representante tem aparecer ao mesmo tempo como seu senhor, como uma autoridade por cima deles, como um poder ilimitado de governo que os proteja das demais classes e lhes envie, a partir do alto, a chuva e o sol". [41]

Neste contexto, deve-se compreender que a figura de um líder carismático transforma-se em algo inevitável. Mais ainda, numa verdadeira necessidade do processo. De outro modo, as possibilidades de aceder ao sentimento das grandes massas populares seriam mínimas. A questão, por conseguinte, precisa ser colocada em outro plano: o de saber se a liderança actuará num sentido favorável ao progresso e à futura autonomia do povo ou no sentido mexicano mais antigo, como personagem caciqueira que se serve do seu poder para subordinar e explorar seus seguidores. Pelo que se sabe, felizmente AMLO situar-se-ia no primeiro trilho. O que, naturalmente, não anula a necessidade de empurrar com toda a força que se possa, o avanço para uma direcção mais moderna, colectiva e racional.

IX- Perspectivas

Na actual conjuntura (Julho, 2006), os prognósticos acerca da evolução do conflito não são simples. Mas convém arriscar algumas hipóteses grossas.

Um: a direita não aceitará a recontagem de votos. Dois: assumirá a presidência com legitimidade nula, apoiando-se mais nas baionetas (na ameaça de usá-las e em alguma aplicação pontual) e na brutal coacção mediática em curso. Três: no povo processar-se-ão sentimentos previsíveis de frustração e grande nojo. A frustração é muito grande pois haviam-se depositado grandes esperanças na actividade do novo governo e, além disso, existia uma forte confiança no triunfo eleitoral de AMLO. O nojo, pela fraude e pela soberba grosseira e racista que hoje exibe a direita. Neste contexto, brotam duas tentações: abandonar a mobilização ou deslizar para acções violentas não coordenadas. [42]

Para o bloco popular, neste contexto, os desafios tornar-se-ão grande e complicadíssimos. Trata-se de acumular forças aceleradamente e, ao mesmo tempo, evitar todo enfrentamento terminal e decisivo. Isto, enquanto a correlação de forças for ainda desfavorável. A urgente acumulação de forças exige aprofundar a mobilização do povo a partir de baixo, fomentar sua criatividade e capacidades orgânicas, gerar e forjar quadros tirando-os até de debaixo das pedras. Neste contexto, não é fácil regular o conflito e mantê-lo num espaço que não sufoque a iniciativa popular e, ao mesmo tempo, não precipite enfrentamentos prematuros.

A direita, ao descartar o consenso, esgrime a violência (a que chama a "força da lei") e colocou o povo e a sua actual direcção política num campo minado para o qual não está preparado. Por essa razão, deve-se hoje evitar esse tipo de enfrentamentos. Mas, ao mesmo tempo, deve começar a preparar-se para assumi-lo em algum momento do futuro. Hoje, em todo caso, as tarefas são fundamentalmente políticas e convém visualizá-las num quadro estratégico de longo prazo.

Insistamos na táctica de cerco que está a aplicar a direita. Esta é muito clara:   a) apelar ao respeito irrestrito à lei e à institucionalidade (algo que lhes é inteiramente favorável: as leis não foram feitas para favorecer o povo e sim para oprimi-lo. Além de que, se estorvam, não vacilam em saltar olimpicamente por cima delas);   b) apelar à supressão de manifestações maciças, actos de protesto, até de certo tipo de declarações que desnudam o conflito classista e a hipocrisia do núcleo dominante, etc. A questão é muito óbvia: trata-se de colocar o conflito num espaço completamente favorável ao grande capital. Para o que vem-se desdobrando uma campanha feroz nos media ao mesmo tempo que se começa a subornar descaradamente a escumalha das direcções sindicais e políticas. Além disso, mobiliza-se activamente (a esta mobilização não há restrições) o clero e as cúpulas empresariais.

Nos sectores de base esta pressão não vinga. Mas sim na ala direita do bloco progressista. Estes dirigentes, que rodeiam AMLO muito estreitamente, ainda experimentam a indignação da fraude. Mas mais tarde impor-se-á neles a vocação pelo "acordo conciliador" com as cúpulas do poder e o seu temor consanguíneo (casos de Ortega, Arce, Camacho, etc) à mobilização dos de baixo. Se estes — a base popular — conseguirem fortalecer-se, forjar quadros e ascender a postos de direcção poderão deslocar a alta direitista do bloco. O que também agudizaria a contradição principal do período, a que se dá entre a muito fina camada neoliberal dominante e o movimento popular. Com isso, o avanço para um capitalismo nacional e democrático tornar-se-ia possível e muito provável. Poderia parecer paradoxal: o desenvolvimento e radicalização da base popular a operar como condição do triunfo de uma ordem económica do tipo capitalista. Mas na realidade o fenómeno não é nada infrequente: em múltiplos casos a história nos mostra o povo a obrigar a burguesia a cumprir suas tarefas históricas.

Acrescentemos: um caminho como o insinuado é só uma possibilidade e que poderá perfeitamente não frutificar. O próprio conteúdo socio-classista da base popular, a debilidade da classe operária e a consciência política não desenvolvida conspiram contra esta possibilidade.

Superar tais carências não é fácil. Por isso, dever-se-ia insistir nas tarefas políticas centrais. Uma, muito genérica e que nem por óbvia deve ser silenciada: trata-se de expandir as dimensões do bloco popular até aproximá-lo do seu máximo potencial. O que implica clareza estratégica e assumir o processo como um caminho longo que exige movimentos posicionais bem pensados. O problema que aqui emerge é o método a seguir para conseguir a expansão: acomodar-se à ideologia dominante dando mostra de boa educação — o "não se assustem que somos bons meninos" — ou desenvolver a ideologia e a consciência classista dos de baixo? No bloco popular, até agora, dominou a primeira rota. Mas a experiência, uma vez mais, é muito claro: tal rota só conduz ao fracasso. E afinal de contas, só exprime o domínio da ideologia oligárquica dominante no interior do bloco popular. Nesta postura, além disso, observam-se até incongruências aritméticas: trabalha-se para convencer cinco por cento e deixam-se de lado os noventa e cinco por cento restantes. Com um agregado muito maior procura-se cultivar em terreno seco e rochoso (o da cúpula dominante) e deixa-se de semear no que é naturalmente terra fecunda para a esquerda. Em suma, "as forças acumulam-se na luta e não a evitá-la passivamente". [43]

Desenvolver a consciência política dos de baixo coloca diversas exigências. Uma: democratizar minimamente medias como a televisão e a rádio. Dever-se-ia no mínimo assegurar para o povo um canal de TV aberto e de alcance nacional. Além disso, controlar o abuso e a chantagem política dos canais privados. Na realidade, falar de liberdade e de democracia política no contexto televisivo e radial actual é uma simples farsa. Dois: uma consciência política medianamente adequada exige estudar e investigar, recuperando os acervos teóricos disponíveis como o marxismo crítico (à margem do qual nenhuma esquerda pode ser eficaz). Também devem ser resgatadas correntes burguesas progressistas como o estruturalismo cepalino. [NT 2] E, nestes quadros, criticar impiedosamente todas as estupidezes da política económica neoliberal. Três: desdobrar uma prática radical, de acumulação tenaz de forças. Ou seja, entender que a consciência política não é matéria de livro puros e sim, de modo principalíssimo, de desenvolver uma prática que reordene a cabeça dos sectores populares.

A prática democrática progressista supõe e exige a presença de uma organização sólida. Trata-se de transformar a indignação em força, o que exige desenvolver e/ou inventar organismos de base, civis e partidários, capazes de canalizar a criatividade e a praxis popular nas suas múltiplas vertentes.

Finalmente: em todos os planos — ideológico, orgânico, político — há que apoiar-se na classe operária industrial. Despertá-la para a luta, limpá-la de práticas e líderes corruptos, devolver-lhe seu papel dirigente. Importa sublinhar: organizar as diversas camadas da pequena burguesia tropeça com problemas que em grande parte derivam da sua situação objectiva de classe. Na classe operária o problema é outro: a condição objectiva, neste caso, facilita a organização e a capacidade política. E é o factor subjectivo o que hoje arrolha esse potencial.

A moral que decorre é cristalina: o avanço do povo passa pela luta em favor da democracia, pela sua efectiva implantação em todos os espaços da vida social. E sublinhemos: trata-se de uma democracia substantiva, não simplesmente formal. Ou seja, para que, no final das contas, a maioria chegue a ser dona da sua vida. [44]

NOTAS
1- "Não é suficiente ser operário para ser comunista" salienta Gruppi. O qual também escreve que a classe hegemónica "ganha para as soluções que propõe massas suficientes para construir a base do seu próprio poder, ainda que os interesses reais destas massas estejam e oposição às suas soluções". Nisto influi tanto a capacidade política da classe dominante (capacidade para fazer concessões e forjar alianças) como sua capacidade ideológica: "é precisamente a ideologia (...) o que permite às classes dominantes soldar em torno de si um bloco de forças sociais diferentes". Cf. Luciano Gruppi, "El concepto de hegemonía en Gramsci", em Hobsbawm, Portelli e otros, "Revolución y democracia en Gramsci", pág. 45. Fontanamara, Barcelona, 1981.
2- Em termos puramente eleitorais, restam uns 25% para repartir entre outras forças políticas. Neste campo, se a base eleitoral se visse obrigada a escolher entre Calderón e López Obrador, muito provavelmente uns dois terços acabariam por apoiar AMLO.
3- "O facto da hegemonia pressupõe indubitavelmente que se têm em conta os interesses e as tendências dos grupos sobre os quais se exerce a hegemonia, que se forme um certo equilíbrio de compromisso, ou seja, que o grupo dirigente faça sacrifícios de ordem económico-corporativo, mas é também indubitável que tais sacrifícios e tal compromisso não podem referir-se ao essencial, uma vez que se a hegemonia é ético-política não pode deixar de ser também económica, não pode senão estar baseada na função decisiva que o grupo dirigente exerce no núcleo reitor da actividade económica". Cf. A. Gramsci, "Notas sobre Maquiavelo, sobre política y sobre el Estado moderno", pág. 55. Juan Pablos edit., México, 1975.
4- Ver J.C. Valenzuela Feijóo, "Estancamiento, parasitismo y desigualdad: la economía del sexenio",UAM-I, 2006. Neste trabalho apresenta-se informação quantitativa sobre a economia mexicana no último período.
5- Também nos países desenvolvidos este é o traço central do neoliberalismo. Referindo-se aos EUA, Duménil e Lévy escrevem: "é importante distinguir fins e meios na análise do neoliberalismo. A estabilidade dos preços, ou a livre mobilidade internacional do capital, são meios para um único fim: a restauração do rendimento e da riqueza das classes mais ricas". Cf. G. Duménil y D. Lévy, "Tendencias de la formación de las rentas en el neoliberalismo", New Left Review, enero-febrero 2005 (edic. española).
6- Por exemplo: para 2004 estima-se que 20% das famílias mais pobres captavam 3,7% dos rendimentos monetários totais. Entretanto, 20% das famílias mais ricas apoderavam-se de 53,9%. Manejando decís tem-se que os 10% mais pobres captam 1,1% e os 10% mais ricos 37,4%. Trata-se de rendimentos correntes. A distribuição da riqueza patrimonial é muitíssimo mais desigual. Dados em INEGI, "Encuesta Nacional de Ingresos y Gastos de los Hogares, 2004"; Aguascalientes, 2005.
7- "Tudo o que existe es racional" dizia Hegel. Ou seja, tudo tem sua razão de ser.
8- Em sentido estrito, o capital dinheiro de empréstimo não se deve confundir com o capital fictício bursátil. Mas aqui não podemos começar a examinar nem a distinção nem as suas diversas formas de acesso à mais valia global.
9- "O juro apresenta-se ao capital não em oposição ao trabalho e sim, pelo contrário, como se não tivesse relação com o trabalho, e nada mais do que como uma relação de um capitalista com outro, portanto, como uma categoria de todos os pontos de vista extrínseca à relação do capital com o trabalho, e independente dela". O juro apaga o "carácter contraditório do capital" e "é, portanto, nada mais que uma manifestação da mistificação do capital na sua forma mais extrema, na medida em que representa uma relação social como tal, expressa nada mais do que relações entre capitalistas, e de modo algum relações entre o capital e o trabalho". C. Marx, "Teorías sobre la Plusvalía" (Historia Crítica), Tomo 3, págs. 407-8. Edit. Cartago, Buenos Aires, 1975.
10- O ponto, nos seus momentos mais iniciais, já fora advertido por María C. Tavares. A seguir foi retomado por autores como Chesnais e Serfati. Ver: 1) M.C. Tavares, "De la sustitución de importaciones al capitalismo financiero", págs. 197 y ss. FCE, México, 1979; 2) F Chesnais y D. Plihon edits., "Las trampas de las finanzas mundiales", en especial caps. 1,2 y 3. Akal, Madrid, 2003.
11- C. Marx, "El Capital", Tomo III, pág. 511. FCE, México, 1973.
12- C. Marx, "Las luchas de clases en Francia de 1848 a 1850", en M-E, O.E. Tomo I, pág. 212. Edit. progreso, Moscú, 1974. Marx certamente refere-se a uma situação bastante distante; no tempo e no espaço, da do México neoliberal. Mas a tremenda actualidade dos seus juízos revela-nos que há pautas comuns ao domínio da oligarquia financeira.
13- Neste, enfatiza-se também a expansão do sector energético e seus escalonamentos para dentro. Com isto, procura-se gerar uma capacidade adequada para importar. Através do mesmo, superar o frequente gargalo externo que costuma afectar este tipo de estratégia económica.
14- Para um exame cuidadoso ver Jorge Isaac y J. Valenzuela, "Crisis neoliberal y alternativa socialista"; en Heinz Dieterich editor, "Globalización, exclusión y democracia en América Latina", edit. Joaquín Mortiz, México, 1997.
15- Mais pormenores em José Valenzuela Feijóo, "A actual conjuntura política e tendências subjacentes" , em resistir.info, Lisboa, Portugal. Também em OLA, Observatório Latinoamericano, Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil, Maio, 2006 ( http:/ www.ola.cse.usfc.br ).
16- Não esqueçamos que a actual direcção do PAN é de claro enraizamento clerical-franquista e está muito ligada ao fâmulo Aznar. A hipocrisia e falta de escrúpulos deste grupo nota-se também em Calderón, o qual não vacila em utilizar sinistramente os seus filhos pequenos (de 8, 5 e 3 anos) e, grotescas exibições públicas. Talvez alguém lhe tenha dito que isso dar-lhe-ia um tom "kennedyano". O que o psicólogo não o advertiu foi o terrível impacto que tem na formação da personalidade de uma criança ser exibido como uma coisa objecto de marketing. Que depois se nos fale de "humanismo" e de "respeito à família" já é parte habitual desta basófia moral. Também convém recordar: os jornalistas demo-liberais (auto-considerados progressistas, na realidade são neoliberais que procuram preservar as formas do "decoro cidadão") armaram um terrível escândalo quando AMLO qualificou como "chachalacas" (um pássaro muito gritante) os seus oponentes. Nas pessoas, o qualificativo provocava divertimento e risadas. Nos jornalistas, um grito de espanto: o vocábulo até lhes parecia "subversivo" da ordem institucional e, por isso mesmo, diziam que reduziria a aprovação eleitoral de AMLO. Significativamente, as diatribes anti-AMLO, ainda que "sujas", eram qualificadas como parte iniludível da vida política democrática. E acrescentava-se que reduziam a votação em favor de AMLO e elevavam as preferências por Calderón. Em suma, o eterno duplo padrão, aplicado inclusive pelos publicistas "progressistas".
17- Todas as quais, além disso, são muito relativas se se estudar com cuidado o programa de AMLO.
18- Ver, por ejemplo, S. Kuznets, "Crecimiento económico y estructura económica", G. Gili, Barcelona, 1970.
19- No meio das empresas que fazem inquéritos observa-se uma tremenda corrupção: "tanto pagas e tantos pontos percentuais de concedemos".
20- "Y pensar que extraviamos / la senda milagrosa / en que se hubiera abierto / nuestra ilusión, como perenne rosa..." escribía López Velarde.
21- Albert Matthiez, "La revolución francesa", pág. 9. Letras, Santiago de Chile, 1936.
22- Marat, en L'Ami du Peuple, 30/6/1790. Citado por A. Soboul, "Para comprender la Revolución Francesa", pág. 99. Edic. Critica, Barcelona, 1983.
23- R. Blackburn y Carlos Johnson, "El pensamiento político de Karl Marx", pág. 70. Fontanamara, Barcelona, 1980.
24- Norman Geras, "Actualidad del pensamiento de Rosa Luxemburgo", pág. 53. ERA, México, 1980.
25- V. I. Lenin, "La revolución proletaria y el renegado Kautsky", en O.E., Tomo 3, pág. 77. Edit. Progreso, Moscú, 1973.
26- A fé da classe alta na forma democrática também está muito associada à visão que manejam do povo simples, à consideração digamos valórica que lhe dão. A respeito, a situação parece ser muito semelhante à prevalecente nos tempos de Porfirio Díaz. Recordemos um diálogo entre Díaz e o seu ministro do Interior Ramón Torres. Torres : "Excelência, a situação é alarmante. Os inimigos unem-se em torno de Francisco Madero, que tem muitas esperanças de triunfar nas próximas eleições". Díaz : "Madero é um sonhador perigoso". Torres : "Tem razão Excelência(...) dementes dessa classe o México não conheceu até hoje. Encerramos seu jornaleco El Tercer Imperio". Díaz : "Não é suficiente Ramón. Há que deter Panchito Madero e seus adeptos (...) Nosso povo é ignorante e bruto, e está disposto a seguir qualquer demagogo que lhe prometa o que não é seu". Torres : "Às ordens, Excelência. Verdadeiramente, Madero é uma força que atrai toda a escória da sociedade." Como vemos, depois de quase um século, pouco ou nada mudou na percepção manejada pelos de cima sobre o povo simples. A citação é de I. Lavretski, "Francisco Villa", pág. 15. Edit. Macehual, México, 1978.
27- C. Marx, "El Capital", Tomo I, vol. 3, pág. 953. Siglo XXI edits. México, 1975.
28- Por certo, Marx nem remotamente está a pensar em realidades como a mexicana. Não considerámos o texto para verificar sua validade e sim como um exercício que nos permite ressaltar alguns aspectos que consideramos chaves no panorama actual.
29- Os dados que se seguem foram tomados de INEGI, "Encuesta Nacional de Ocupación y Empleo 2005"; Aguascalientes, 2005. Por pequeno estabelecimento, entendem-se os que ocupam dentre 16 e 50 trabalhadores na indústria, 6 a 50 nos serviços e a 6 a 15 no comércio. Médio estabelecimento é o que na indústria e serviços ocupa entre 51 e 250 trabalhadores, e no comércio entre 16 e 250, Grandes os que ocupam 251 ou mais pessoas em qualquer sector. Dada esta classificação, consideramos como burguesia os que nestes agrupamentos aparecem na qualidade de "empregadores".
30- Numa contagem mais rigorosa, é muito provável que uma boa parte da burguesia pequena deveria ser classificada como pequena burguesia. Especialmente para os localizados no Comércio e Serviços.
31- Por peso específico entendemos o poder (económico e político) que uma classe ou fracção de classe pode exercer. Em regra, difere bastante do peso quantitativo da classe.
32- A população ocupada na agricultura equivale a 16,5% da ocupação total. Facilmente uns dois terços poderiam ser catalogados como pequenos proprietários ou camponeses. Logo, teríamos 52.2 + 11.0 = 63.2.
33- Distribuímos 5% para a burguesia, 80% para a pequeba burguesia e 15% consideramos como proletariado agrícola.
34- Os pontos ii) y iii) são retomados na numeração seguinte.
35- Durante muitos anos o sector empresarial do país delegou sua representação política no partido oficial, o PRI. Este administrou o poder com eficácia singular, integrando boa parte dos sectores populares. Mas ao cindir-se do PRI, o segmento empresarial revelou uma imperícia e cegueira brutais em matéria de assuntos políticos. A falta de prática transformou-o em analfabeto funcional.
36- O qual, seja dito de passagem, mostra-nos — mais uma vez — a grande autonomia com que costumam mover-se as variáveis ideológicas e políticas. E como, pelo menos em prazos historicamente curtos, podem dissociar-se em grau não menor. Neste contexto, convém recordar que diversos analistas discutiram um tipo de dissociação: a que tem lugar quando a classe passa a desconhecer o partido que tradicionalmente representou seus interesses. Algo que aconteceu no México com o PRI. Mas o caso inverso: o de uma direcção política que ainda não se encontra com a classe, não porque esta o haja despedido e sim porque ainda não o reconheceu, ainda lhe é "invisível" ou muito difusa, causou menos preocupação. Isto para o caso da burguesia. Pois para o caso do proletariado, a literatura socialista é abundantíssima acerca das relações entre o Partido e a classe.
37- V. I. Lenin, "Sobre el impuesto en especie", en O.E., Tomo 3, pág. 630. Edit. Progreso, Moscú, 1974. Por sua parte, Engels indica que "seu carácter (o da pequena burguesia, J.V.F.) está determinado por sua situação intermédia entre a classe dos grandes capitalistas (...) e a classe do proletariado ou dos operários". Além disso, indica que esta classe "vacila eternamente entre a esperança de alinhar-se na classe mais rica e o medo de ser lançada ao nível dos proletários ou até dos mendigos". Cf., F. Engels, "Revolución y contrarrevolución en Alemania", pág. 9. Edit. Progreso, Moscú, 1971. Também se escreveu que "dentre todas as premissas de uma insurreição, a mais instável refere-se ao estado de ânimo da pequena burguesia. Nos tempos de crise nacional, a pequena burguesia segue a classe capaz de inspirar-lhe confiança, não só pelas suas palavras como pelos seus feitos. É capaz de impulsos e até de delírios revolucionários, mas carece de resistência, os fracassos deprimem-na facilmente e suas fogosas esperanças logo transmutam-se em desilusão. São estas violentas e rápidas mutações de ânimo que dão tanta instabilidade a cada situação revolucionária". Cf. L. Trotsky, "Historia de la revolución rusa", vol. II, pág. 577. Juan Pablos editor, Máxico, 1972.
38- Um exame pormenorizado em J. Valenzuela Feijóo, "Mercado, socialismo y libertad"; LOM edits., Santiago de Chile, 2003.
39- Bem se disse que "os intelectuais não podem ser definidos como uma única unidade social e sim, antes, como uma série de grupinhos diversos. Têm que ser definidos de acordo com sua função e suas características subjectivas, mais do que em relação à sua posição social". Cf. Wright Mills, "Las clases medias en Norteamérica (White-Collar)", pág. 191. Aguilar, Madrid, 1961.
40- Além de um partido medíocre e com uma capacidade orgânica lastimosa.
41- C. Marx, "El 18 de Brumario de Luis Bonaparte", en O.E., Tomo I, pág. 490. Edit. Progreso, Moscú, 1974.
42- Em outros tempos alguém advertia: "Pais da Pátria! Hoje não vos pedimos que compartilheis vossas posses e riqueza, esses bens que o céu deu em comum a todos os homens. Conhecei toda a extensão da nossa moderação (...) Calculai um instante as consequências terríveis que pode ter a irrflexão. Tremei ao reduzir-nos ao desespero e não nos deixar outro partido senão seguir o de vingar-nos de vós entregando-nos a toda classe de excessos". O texto é de Marat nos inícios da Revolução Francesa. Cf. Louis Barthou y Gérard Walter, "Marat", págs. 115-6. Edit. Osiris, Santiago de Chile, 1934.
43- L. Trotsky, "Historia de la revolución rusa", vol. II, pág. 346. Edic. citada.
44- Recordemos Fayad Hamiz: "quiero llegar en el tiempo necesario, / ni antes ni después (...) / En el tiempo del pan sobre la mesa y las manos amadas en mis manos./ No tengo ninguna prisa: de todos modos llegaremos". Em suma, não ferir a cabeça por queimar os tempos. E não confundir as precauções com pretextos para não avançar todo o possível.

NT 1- Changarro: mexicanismo que designa micro-negócios (fabricação de tortillas, lojinhas, postos de vendas, etc).
NT 2- Cepalino: vem de CEPAL, sigla da Comissão Económica das Nações Unidas para a América Latina.


[*] Da Divisão de Ciências Sociais da UAM-I.

Este ensaio encontra-se em http://resistir.info/ .
24/Jul/06