Para além da comparação
por Gilad Atzmon
[*]
"A actuação militar de Israel é uma agressão
injustificada que está a ser executada num estilo hitleriano, à
moda fascista".
(Hugo Chavez, presidente da Venezuela)
"Evidentemente, o presidente Chavez precisa de um controle de realidade no
que se refere ao conflito do Médio Oriente".
(Abraham H. Foxman, director da Liga Nacional Anti-Difamação)
Há uma tendência entre todos nós, as vozes críticas
de Israel e do sionismo. Muitas vezes comparamos Israel com o Terceiro Reich,
equiparamos as IDF (Israel Defense Forces) com a Wehrmacht, descobrimos
semelhanças entre as tácticas da Força Aérea
israelense com a blitz técnica da Luftwaffe, por vezes associamos os
crimes de guerra de Sharon e de Olmert com aqueles de Hitler. Eu
próprio caí nesta armadilha mais de uma vez. Mas agora corrigi
minha concepção. Este modo de falar deve cessar de uma vez
por todas.
Encarar Hitler como o mal supremo é nada menos que uma
capitulação ao discurso sio-cêntrico. Encarar Hitler como
o homem perverso e o Terceiro Reich como a corporificação da
perversidade é deixar Israel fora de perigo. Comparar Olmert a Hitler
é proporcionar a Israel e a Olmert um escudo moral metafórico. A
comparação mantem Hitler na liderança e deixa Olmert
atrás.
Minha mãe, uma mulher realmente muito inteligente, desafiou-me
tempos atrás ao perguntar-me: "Diga-me Gilad, por que é que
você e os seus amigos sempre comparam Israel com os nazis? Será
que Israel não é suficientemente mau?" Naquela altura
considerei a sua observação um tanto divertida, mas o instinto
da minha mãe estava mais do que correcto. Israel é
na verdade "suficientemente mau". Israel já estabeleceu uma
interpretação exclusiva da noção de perversidade
que conseguiu ultrapassar qualquer outro mal. É chegado o momento de
internalizarmos o facto de que Israel e sionismo são o Mal extremo sem
comparação possível. E se isto não é
suficiente, ao contrário do nazismo que pertence ao passado, a
perversidade do sionismo é um crise que ainda está a desdobrar-se
e a agravar-se.
Chavez obviamente tem todo o direito de dizer o que disse, mas devo recordar ao
simpático presidente venezuelano que Hitler nunca arrasou um país
sem qualquer razão de todo, e foi exactamente isto o que os israelenses
fizeram no Líbano durante quatro semanas e em Gaza ao longo de anos a
fio. Ao ver a carnificina e a devastação no Líbano
não restam quaisquer dúvidas. A actual brutalidade israelense
não é senão maldade por amor à maldade. Castigo
sem compaixão. Israel é uma devastadora
ressurreição colectiva do Sansão bíblico. É
uma representação moderna do homem que mata mulheres,
crianças e idosos, o vitorioso mestre hebreu da retaliação
indiscriminada e cega.
Durante anos, liberais politicamente correctos que se consideram de esquerda
tem estado a insistir em dizer-nos que a agressão israelense deveria ser
compreendida em termos de expansão colonial. Esta linha de pensamento
ainda é promovida por mais do que uns poucos activistas da paz judeus
por todo o mundo. A razão é simples: se Israel for um estado
colonialista, então o arcaico paradigma marxista do século XIX
pode ser aplicado ao conflito. Além disso, se Israel for na verdade uma
força regional de expansionismo colonial, então nada está
categoricamente errado com os israelenses: eles são apenas como
foram
os britânicos, mas com 150 anos de atraso.
Absurdo! Esta interpretação datada é fundamentalmente
errada e deliberadamente enganadora. Além disso, não é
mais aplicável, nem mesmo como uma folha de parreira PC [politicamente
correcta] judeo-cêntrica. Ao observar a devastação que a
Força Aérea Israelense deixou na sua esteira, ao olhar a morte e
a carnificina no Líbano não fica qualquer espaço para a
dúvida. Isto nada tem a ver com colonialismo ou expansionismo. O
Líbano e Beirute nunca fizeram parte da aspiração sionista
por
Lebensraum
[espaço vital].
É o inverso, até o fim da década de 1960 os israelenses
estavam absolutamente certos de que o Líbano seria o primeiro
país árabe a fazer a paz com o Estado judeu. Israel nunca teve
qualquer interesse ao norte do Rio Litani e apesar disso agora Israel destruiu
todas as pontes, todos os aeroportos, todas as centrais eléctricas
libanesas. Hospitais, aldeias e bairros inteiros foram arrasados, um milhar de
civis libaneses perdeu suas vidas e mais de um milhão de cidadãos
estão deslocados e sem lar.
Agora é o momento de ficarmos de pé e dizer que, ao
contrário dos nazis que tinham respeito por outros movimentos nacionais
(incluindo o sionismo), Israel tem respeito zero seja por quem for, incluindo
seus vizinhos do lado. O comportamento israelense deveria ser percebido como a
versão moderna do vulgar barbarismo bíblico, à beira do
canibalismo. Israel não é senão a maldade por amor
à maldade. É a perversidade sem qualquer
comparação.
Por conseguinte, não há lugar para comparações
entre Israel e os nazis. Se tiver de ser feita uma comparação,
então são os israelenses que ganham o campeonato da brutalidade e
as razões são óbvias. A Alemanha nazi era uma tirania.
Israel é uma democracia dirigida por um governo de unidade nacional de
centro-esquerda. Por um lado, não temos qualquer ferramenta objectiva
formal para determinar se o povo alemão aprovou os crimes nazis (em
primeiro lugar os alemães não foram informados acerca dos crimes
homicidas dos nazis, em segundo não havia sistemas independentes de
inquéritos objectivos na Alemanha daquele tempo). Por outro, os
israelenses aprovaram colectivamente os crimes do seu governo no Líbano
e este facto está esmagadoramente documentado em mais do que uns poucos
inquéritos.
Os nazis foram na verdade expansionistas propriamente ditos. Eles tentavam
tomar cidades e terras intactas. Tapetes de bombas e apagamento total de
áreas populadas, que está tão na moda entre militares e
políticos israelenses (bem como entre os anglo-americanos) nunca foram
uma táctica ou estratégia nazi. Aparentemente, Israel não
está a tentar tomar o Líbano: os israelenses não parecem
interessados na terra libanesa. Só querem destruí-la.
Alguém pode perguntar o que é que eles pretendem realmente
alcançar. De facto, ninguém em Israel ou alhures sabe isso.
Pretendem desmantelar o Hezbollah? Certamente alcançaram o extremo
oposto.
Sua impressão de que o Hezbollah é uma pequena
facção de uma milícia fundamentalista minoritária
que poderia ser eliminada sem esforço mostra-se uma tese cada vez mais
ridícula a cada dia que passa. O Hezbollah não só
demonstrou que é uma força importante como agora é apoiado
por 85 por cento do povo libanês e isto inclui a população
cristã (80 por cento de apoio entre os cristãos libaneses).
Será que Israel quer manter seu poder de dissuasão? Certamente
alcançou o extremo oposto. A partir de agora todo árabe sabe que
o Exército Israelense não tem mais a sua aureola. De facto, as
fotos das botas militares israelenses deixadas no solo libanês dizem
tudo. Nesta guerra, é o soldado israelense que está a tirar as
suas botas e a correr em fuga.
Será que Israel quer proteger seus centros populosos? Certamente
alcançou o extremo oposto. Quanto mais Israel atinge a infraestrutura
do Líbano, maiores são as barragens de mísseis que caem
sobre cidades israelenses. De facto, é apenas uma questão de
tempo até que Tel Aviv obtenha um vislumbre acerca da vida em Gaza e em
Beirute. Na verdade Israel não tem plano ou estratégia; ao
invés disso pratica a forma mais baixa de fúria bárbaro
colectivo. Os israelenses demolem por amor à demolição.
Israel é na realidade um mal sem qualquer comparação.
Mas temos de admitir que os nazis eram muito bons a provocar algum
escândalo internacional. Poucos amaram Hitler além do mundo
germânico (e da aristocracia inglesa). O canibalismo israelense, por
outro lado, é adorado por alguns líderes ocidentais, e Blair,
Bush e mesmo Merkel temem enfrentar a barbárie sionista.
Enquanto o nazismo foi derrotado 12 anos depois de tomar o poder, a brutalidade
sionista é uma bola de neve de raiva repulsiva que não conhece
fronteiras e não para. Ela volta-se sobre o ocidente e recruta em torno
de si as forças mais moralmente deterioradas, sejam elas Blair e seus
apaniguados ou radicais fundamentalistas cristãos americanos. O
sionismo tenciona tornar o nosso planeta um campo de batalha sangrento. No
imediato está a reduzir a instituição ONU a um fantoche
neoconservador americano. É tempo de admitir que os sionistas
estão a posicionar-se no próprio centro do chamado "Choque
cultural".
Enquanto o nazismo era um movimento nacionalista-expansionista com
ambições vastas mas limitadas, o Estado judeu e seu
lobbies
sionistas estão a tentar reviver o espírito de uma cruzada
global em nome de uma bizarra guerra religiosa (judeus-cristãos contra
muçulmanos).
Se quisermos salvar este mundo, se quisermos viver num planeta humano, devemos
concentrar o foco sobre o mais grave inimigo da paz, aqueles que são
perversos por amor à maldade: o Estado israelense e o sionismo mundial.
É mais do que tempo de sair do armário e dizer tudo em alta voz.
Israel e o sionismo põem o nosso mundo em perigo. Não é
apenas o Líbano, a Palestina e os árabes que sofrem. É
agora a Grã-Bretanha e a América que são arrastados numa
guerra idiota. É todo o ocidente a quem se pede que recupere o que os
israelenses perderam no Líbano. Temos de admitir que Israel é o
mal supremo ao invés da Alemanha nazi. Abe Foxman e a LAD estão
correctos quanto à mudança, todos nós precisamos uma
verificação de realidade. Nunca deveríamos comparar
Israel à Alemanha nazi. No que diz respeito à maldade, temos
agora de considerar que Israel ocupa a liderança.
11/Agosto/2006
[*]
Músico de jazz israelense, escritor e activista político.
A aparecer dentro em breve: a revelação de uma arma
israelense que tem sido mantida em segredo. O autor descobriu
pormenores desta nova arma destrutiva utilizada contra o povo libanês.
O original encontra-se em
http://onlinejournal.com/artman/publish/article_1093.shtml
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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