'Capitalismo e encarceramento' revisitado

por Richard D. Vogel [*]

“Capitalismo e encarceramento,” escrito pelo autor e publicado na Monthly Review há vinte anos (Março de 1983), analisava o relacionamento entre a economia capitalista e o sistema prisional americano e chegava a uma conclusão indiscutível:

As tendências globais e a correspondência ano-a-ano entre as condições económicas e o aprisionamento estabelecem bastante claramente a relação entre capitalismo e encarceramento — as prisões sob o capitalismo são, como Marx apontava há muito, as lixeiras do exército industrial de reserva. Em muito poucos aspectos as consequências sociais do des- e subemprego do povo são tão claras como se verificam nas flutuações da população prisional (34).

O artigo finalizava com uma nota de especulação acerca do futuro do encarceramento nos Estados Unidos:

Para onde irá a partir daqui? Entre 1971 e 1981 o total da população prisional nos EUA (incluindo todos os estados e as instituições federais) aumentou de 197.838 para 369.009, um aumento de mais de 45 por cento durante a década. Além desta nova elevação permanente, a última década também assistiu às mais altas taxas e aos mais rápidos aumentos no encarceramento em massa da história do país. Estes factos evidentes, junto às tendências actuais do aumento de concentração de pessoas de minorias nacionais nas prisões e a cada vez maior sensibilidade do sistema prisional às exigências do capitalismo monopolista, assegura que o problema prisional nos EUA só pode ficar pior (39-40).

Esta actualização de "Capitalismo e encarceramento" confirma quanto piorou o problema prisional nos últimos vinte anos.

UMA HISTÓRIA DO ENCARCERAMENTO

Gráfico 1. A história do encarceramento nos Estados Unidos durante o século XX pode ser representada graficamente. O gráfico 1 mostra o número de condenados encarcerados sob jurisdição estadual e federal desde 1925 até 2001. Os números são apresentados como taxas por 100.000 habitantes do total nacional para permitir comparações significativas ao longo do tempo. A tendência para o período de 50 anos que vai de 1925 a 1974 indica uma série de subidas e descidas nas populações prisionais, com uma média de 106 por 100.000. A partir de 1975, no entanto, a taxa de encarceramento ascendeu, atingindo um nível de 478 por 100.000 no ano 2000 — mais de 450 por cento da média de 1925 a 1974 !

Um olhar atento ao gráfico 1 revela um aumento firme da população prisional durante a década de Grande Depressão (1929-1939) até o ponto alto de 137,1 por cento em 1939, uma taxa que não seria ultrapassada senão em 1979 (137,3 por 100.000). A partir de 1940 a taxa de encarceramento diminuiu agudamente até alcançar um ponto baixo no fim da Segunda Guerra Mundial. Uma tendência de subida gradual principiou em 1947 e, com uma pequena queda durante a Guerra da Coreia, continuou até 1961. Uma tendência declinante começou em 1962 e continuou durante toda a guerra do Vietnam, alcançando a taxa mais baixa nos EUA da pós-depressão, em 1968, de 94,3 por 100.000.

A mais notável característica do gráfico 1 é a vertiginosa tendência de encarceramento que começou no fim da era da Guerra do Vietnam e continuou até ao fim do milénio, pois ela não só ultrapassa de longe o encarceramento durante a Grande Depressão como também alcança a mais alta taxa de qualquer país na história moderna. Em 31 de Dezembro de 2001 quase dois milhões de prisioneiros estavam a ser mantidos nas prisões federais e estaduais, bem como em cárceres locais.

UM OLHAR MAIS ATENTO:
DESEMPREGO E ENCARCERAMENTO


Gráfico 2. Clique para ampliar. Uma comparação das taxas de desemprego e encarceramento proporciona um meio de explorar o relacionamento entre a procura de mão-de-obra do capitalismo monopolista e as populações prisionais nos Estados Unidos. Este relacionamento é representado no gráfico 2, o qual compara as tendências do desemprego e do encarceramento nos Estados Unidos durante a maior parte do século XX. As taxas de desemprego representam a proporção média anual do total da força de trabalho que está sem emprego mais à procura de colocação. As taxa de encarceramento no gráfico 2 são diferentes daquelas das taxas de população prisional total apresentadas no gráfico 1. Aqui as taxas representam o número de pessoas por 100.000 habitantes da população civil que ficaram adstritos a todas as instituições do Estado pelos tribunais durante o ano.

O gráfico 2 mostra que as flutuações na tendência de pessoas adstritas à prisão correlaciona-se com os movimentos da economia nacional. Este gráfico revela uma alta taxa de encarceramento a acompanhar as deslocações económicas da Grande Depressão quando, em 1931, 51 pessoas por 100.000 habitantes da população civil foram enviados para a prisão. De modo correspondente, a mais baixa de aprisionamento ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial (28,4 por 100.000 em 1944) quando o desemprego caiu para 1,2 por cento.

Imediatamente após a guerra, ambas as taxas, de desemprego e de encarceramento, principiaram uma tendência de subida até 1961 com uma ligeira redução durante a mobilização da Guerra da Coreia. Previsivelmente, a mobilização para o Vietnam produziu quedas dramáticas tanto no desemprego como no número de homens enviados para a prisão. O desemprego chegou ao fundo a 3,5 por cento em 1969, e novos prisioneiros bateram um recorde de baixa de 31,2 novos prisioneiros por 100.000 habitantes em 1968. Tais taxas são comparáveis às taxas baixas do período da Segunda Guerra Mundial.

A actual e mais dramática tendência de encarceramento começou com a desmobilização militar que se seguiu à derrota americana no Vietnam. O gráfico 2 indica que o anterior relacionamento entre desemprego e encarceramento parece ter mudado. Retornaremos posteriormente a este importante desenvolvimento.

A relação entre mobilização bélica e população prisional nunca foi um segredo. Durante a Segunda Guerra Mundial, Thorsten Sellin, então a principal autoridade sobre prisões, preconizou uma convenção da American Prison Association sobre os problemas do pós-guerra que os responsáveis pelas prisões teriam de enfrentar:

Em resultado da guerra a nossa população prisional tem estado a cair. Uma razão para isto é que o grupo etário em que sempre se verificou a maior parte do crime foi convocado. Muitos dos potenciais clientes estão nas forças armadas. Quando o exército for desmobilizado, se isto for acompanhado por considerável deslocação económica, as nossas prisões estarão cheias outra vez. [Ênfase acrescentada]

A previsão de Sellin sobre a Segunda Guerra Mundial demonstrou ser exacta, e o mesmo fenómeno acompanhou a desmobilização do pós-Vietnam. A taxa de encarceramento disparou em 1974, nivelou-se até 1979, e começou então o fenomenal curso ascendente dos últimos vinte anos.

Se o gráfico 2 descreve a correspondência global entre condições económicas e aprisionamento, nos Estados Unidos, ele também indica alguns desvios impressionantes.

Primeiro, dada a relação histórica entre desemprego e encarceramento, deveríamos esperar que tanto as populações prisionais totais (gráfico 1) como a taxa de novos prisioneiros recebidos dos tribunais (gráfico 2) durante a Grande Depressão tivessem sido muito mais elevadas do que realmente foram. E reciprocamente, não deveríamos ter previsto as actuais altas taxas de encarceramento a partir dos números relatados de desemprego dos últimos vinte anos. Estes dois eventos excepcionais pedem análise.

A década da Grande Depressão merece uma atenção especial por duas razões. Além do facto de que as taxas de encarceramento estavam abaixo dos níveis previstos, a década de 1930 testemunhou a primeira tentativa na história dos EUA de aliviar os problemas provocados pelo desemprego em massa através do alívio económico directo. Estes dois eventos estavam estreitamente inter-relacionados.

As taxas de encarceramento aumentaram agudamente até 1931, quando se iniciaram despesas significativas de socorro. Desde o ano de 1931 até o princípio da recuperação económica e o declínio dos programas de socorro em 1940, o relacionamento entre despesas de socorro económico e taxas de encarceramento foi inverso — quanto mais dinheiro foi gasto com o socorro económico, mais baixas foram as taxas de encarceramento. Este relacionamento especial, tal como o relacionamento total entre desemprego e encarceramento, sublinha a base económica do problema prisional nos Estados Unidos. As tendências actuais, contudo, sugerem uma relação totalmente alterada entre capitalismo e encarceramento.

O ponto de viragem na moderna prática penal verificou-se no princípio da década de 1980. A máxima utilização do sistema prisional dos EUA como uma arma da guerra de classe fazia parte da agenda neoconservadora iniciada durante a administração Reagan. O tom foi dado pelo orador na convenção de 1981 da American Correctional Association (antigamente a American Prison Association — a mesma organização dirigida por Thorsten Sellin durante a Guerra Mundial). Ali o Procurado Geral Associado dos Estados Unidos, Rudolph Giuliani, articulou a nova política em termos conservadores clássicos. "No princípio", disse ele, "o homem formou governo para proteger contra o perigo de invasores de fora bem como de predadores a partir de dentro. A defesa nacional e a defesa interna são, portanto, as duas principais funções de qualquer governo. O nosso sistema de justiça criminal está encarregado destas duas tarefas primárias". Nenhuma administração posterior, incluindo aquela do presidente democrata, Bill Clinton, desviou-se das políticas prisionais estabelecidas no princípio da década de 1980.

Um novo olhar aos gráficos 1 e 2 revela que a função actual dos presídios nos EUA não tem precedentes, mas ainda há muito mais nesta estória. A população prisional, ainda que muito elevada, constitui só a ponta do iceberg. Há milhões mais que estão sob controle "correccional". O total de população adulta agora sob controle correccional ultrapassa os 6,6 milhões. Uma decomposição por cada categoria de controle é reveladora. Em 2001, a população prisional representava só 20 por cento do total, em comparação com os 60 sob controle probatório, 11 por cento em cárceres locais, e 9 por cento sob liberdade condicional. Todas estas categorias aumentaram agudamente e proporcionalmente ao longo do período 1980-2001.

Tem havido uma correspondente tendência altista no custo operativo do sistema de justiça criminal norte-americano. Entre 1982 e 1997 as despesas com punições aumentaram uns colossais 381 por cento, os custos policiais saltaram 204 por cento e os desembolsos para funções judiciais expandiram-se 267 por cento. O total de gastos directos com o sistema de justiça criminal nos Estados Unidos nesse período cresceu 262 por cento. O desperdício com o sistema de justiça criminal nos Estados Unidos aproximou-se dos US$ 130 mil milhões em 1997. Por quanto tempo estes níveis de gastos poderão continuar a aumentar, ou mesmo a manter-se, ainda está para ser visto.

MINORIAS NACIONAIS NA PRISÃO

Qualquer análise do sistema prisional americano que ignore a questão do encarceramento e do status das minorias nacionais é superficial e oculta o funcionamento do sistema. Uma questão central na análise do encarceramento nos Estados Unidos é o facto de que actualmente 65 por cento da população condenada é constituída por povos minoritários, ao passo que tais minorias representam grosso modo menos de 25 por cento da população.

Estão disponíveis estatísticas pormenorizadas de prisioneiros negros. Tem havido uma firme tendência ascendente no encarceramento de americanos negros ao longo da segunda metade do século XX, principiando por 30 por cento do total da população prisioneira em 1940 e alcançando 48 por cento em 1995, um aumento de 18 por cento apesar do facto de que a proporção negra do país aumentou apenas 2,6 por cento durante o mesmo período de tempo. Uma análoga tendência de subida é evidente nos cárceres locais e de condados por todo o país.

Enquanto as taxas de encarceramento para brancos em prisões locais subiram só ligeiramente entre 1984 e 1997, as taxas para negros aumentaram substancialmente. Em 1997 a taxa de encarceramento para negros era cinco vezes mais elevada do que aquela para brancos. Esta tendência em prisões locais é claramente paralela ao aumento das taxas de encarceramento para americanos negros em presídios, ilustrando a extensão em que a disparidade racial penetra todo o sistema correccional.

Estudos pormenorizados relatado por Jan M. Chaiken, director do Bureau of Justice Statistics, revela mais uma vez o grau em que o sistema de justiça criminal alveja as minorias masculinas. A Tabela 1 compara americanos encarcerados por raça, etnicidade e género no ano de 1996.

Tabela 1- Taxas de encarceramento por raça, etnicidade e género, EUA, 1996
Número de prisioneiros sentenciados por 100.000 residentes de cada grupo.

  Homens Mulheres
Negros 3 098 188
Hispânicos 1 278 78
Brancos 370 23
Fonte: Jan M. Chaiken, “Crunching Numbers: Crime and Incarceration at the End of the Millennium,” National Institute of Justice Journal (January 2000): 10–17. Disponível em http:// www.ncjrs.org/pdffiles1/jr0002 .

Decompostas por raça e etnicidade, as taxas de encarceramento reflectem as negras perspectivas enfrentadas pelos americanos minoritários. Os homens negros tinham oito vezes mais probabilidade de serem encarcerados em 1996 do que os homens brancos, ao passo que os homens hispânicos tinham duas vezes e meia vezes mais probabilidade de serem aprisionados. A Tabela 1 também revela que, embora as taxas de encarceramento para mulheres fossem significativamente mais baixas do que aquelas dos homens, prevaleciam as mesmas disparidades raciais.

A desproporção de taxas de encarceramento para homens na faixa etária dos 25-29 anos é especialmente dramática. Nesta faixa etária as desproporções raciais são significativamente mais elevadas do que na população prisional em geral. Os homens negros nesta faixa têm dez vezes mais probabilidade de estar na prisão do que os brancos, ao passo que os homens hispânicos têm três vezes mais probabilidade de serem encarcerados.

Em termos de controle correccional, a porcentagem de homens negros sob supervisão correccional é quatro vezes mais elevada do que de homens brancos em todas as categorias etárias com níveis a aproximar-se dos 30 por cento para homens negros nos seus primeiros anos entre os vinte e os trinta, em comparação com os menos de 8 por cento para os homens brancos na mesma faixa etária. Enterrados nestes agregados estatísticos está o facto de que quando a população em liberdade condicional nos Estados Unidos é decomposta por raça, descobrimos que actualmente só 35 por cento daqueles em liberdade condicional são negros, em contraste com as populações das prisões onde eles representam quase 50 por cento de todos os condenados. Estas estatísticas indicam que é quase tão difícil para os homens brancos ficarem na prisão quanto é para os homens negros dela saírem.

A probabilidade de os homens das minorias irem parar à prisão durante as suas vidas é elevada. No processo de "mastigação dos números", o Bureau of Justice Statistics (BJS) desenvolveu um modelo para prever as probabilidades de americanos irem para a prisão durante a sua vida. O seu modelo prevê que um rapaz negro com 16 anos em 1991 tem uma probabilidade de 28,5 por cento de passar algum tempo na prisão durante a sua vida. Esta previsão refere-se só a crimes capitais e não inclui tempos passados em prisões locais ou de condados. Quando as diferenças de classe social no interior da população negra são consideradas, a perspectiva de homens pobres negros serem encarcerados é provavelmente o dobro deste número — mais próximo dos 60 por cento. E, se acrescentarmos as taxas diferenciais nas prisões locais de negros, uma probabilidade de 75 por cento ir para a prisão não é uma estimativa pouco razoável.

Os críticos liberais apressam-se a lamentar a discriminação racial no sistema de justiça criminal, mas afastam-se sempre da estrutura básica do capitalismo que leva à concentração de minorias nacionais à prisão. A forte concentração de condenados das minorias, contudo, não surge como surpresa tendo em vista a deslocação económica e a instabilidade sofrida pelas minorias nacionais nos Estados Unidos. A taxa de desemprego para homens negros é constantemente o dobro daquela de homens brancos, uma constância que representa um facto básico da vida económica das minorias em comparação com a população de homens brancos — de acordo com os padrões habitualmente aceites, os homens brancos enfrentam desemprego sério só durante tempos de recessão económica, ao passo que, em absoluto contraste, os homens das minorias têm enfrentado níveis de desemprego de recessão (e depressão) desde o fim da Segunda Guerra Mundial com excepções durante os períodos de mobilização das guerras da Coreia e do Vietnam. Estas estatísticas do emprego reflectem o facto de que as minorias nacionais historicamente tem servido como o exército de reserva de trabalhadores para o capitalismo americano — uma função que explica a sua super-representação nas prisões americanas.

Também se deve acrescentar que aqui há mais do que economia a actuar na super-representação das minorias nos cárceres e presídios. A revolta negra da década de 1970 e a reacção da classe dirigente contra a população negra, incluindo as guerras às drogas, é sem dúvida uma questão importante. Contudo, isto é assunto que merece uma análise separada e em profundidade, qual o autor está actualmente a empreender.

A POLÍTICA DO APRISIONAMENTO

As contradições de classe que produzem o encarceramento em massa periodicamente explodem em antagonismo aberto — três grandes ondas e um surto de perturbações prisionais na história moderna dos EUA evidenciam isso. A primeira onda ocorreu em 1929 e 1930, quando houve onze grandes levantamentos prisionais em todo o país. A segunda onda começou em 1952 e terminou em 1955. Os motins neste período foram mais generalizados e custosos do que aqueles da depressão. Durante estes quatro anos houve 47 grandes rebeliões que resultaram em consideráveis perdas de vidas e danos em propriedades que excederam os US$ 10 milhões. A última grande onda foi de 1968 a 1971. Durante este período houve 40 grandes perturbações, incluindo a histórica insurreição no Attica Correctional Facility ao norte do estado de Nova York. A onda de perturbações em prisões que se verificou de 1986 a 1991 testemunhou só oito eventos significativos. Destes, apenas um, o motim dos imigrantes cubanos na Penitenciária de Atlanta, foi sério. Colocar estas quatro explosões de insurreições prisionais em perspectiva histórica ilumina a política de aprisionamento nos Estados Unidos.

As primeiras três ondas de insurreições prisionais aconteceram sempre em tempos de recessão económica imediatamente após períodos de relativa prosperidade quando tanto a taxa de novos prisioneiros recebidos dos tribunais e do total de população prisional haviam sido relativamente baixas e estáveis. Em todos os três períodos os levantamentos maciços tiveram lugar quando as prisões do país estavam a encher-se outra vez.

Em cada um destes períodos de entradas maciças, a população prisional experimentou mudanças qualitativas significantes, bem como quantitativas. Homens jovens no início da vida estavam a ser empurrados para dentro da prisão por pressões económicas da economia em estagnação, e eles reagiam contra a injustiça. A proporção crescente da população condenada minoritária aumentou o conflito, especialmente nas décadas de 1960 e 1970.

Durante os períodos iniciais de acumulação, as prisões estavam menos preparadas para manusear o fluxo de novos condenados. Após extensos períodos de funcionamento como guardas de reduzidas populações de condenados mais velhos e mais dóceis, nem o pessoal da prisão nem as instalações físicas estavam aptas para tarefa. Dentro destes períodos críticos o sistema prisional tinha de operar com base numa variação peculiar da lei da oferta e da procura pois primeiro acomodava a sobrecarga e depois justificava a necessidade de mais financiamento, guardas e edifícios, apontando a superlotação e as condições abaixo do padrão do sistema. Foi nestes períodos agudos, quando a exigências ao sistema prisional ultrapassavam os seus recursos, que os levantamentos generalizados tiveram lugar. Nestes três períodos críticos a política do aprisionamento nos Estados Unidos tornou-se clara.

A simples onda de perturbações que se verificou durante a extraordinária construção de prisões dos últimos vinte anos indica que o Estado aprendeu as suas lições com a três primeiras ondas de motins prisionais — especialmente das insurreições abertamente antagónicas das décadas de 1960 e 1970.

LIÇÕES DAS DÉCADAS DE 1960 E 1970

Os responsáveis pelas prisões aprenderam duas importantes lições com a insurreições das décadas de 1960 e 1970. A primeira foi a ameaça colocada ao sistema prisional americano por condenados politicamente unificados. Muitos prisioneiros daquela época estavam conscientes da política de aprisionamento nos EUA — eles podiam verificar que as minorias nacionais estavam super-representadas por trás das grades e todos entendiam demasiado bem que a sua posição na sociedade era a responsável por tal disparidade. Condenados afro-americanos por todo o país estavam a organizar-se e reunir-se em torno de figuras como George Jackson, o condenado negro na Califórnia que deu a palavra final acerca da política de aprisionamento nos EUA nos seus poderosos livros: Soledad Brother: The Prison Letters of George Jackson , que foi publicado em Outubro de 1970 e circulou amplamente, e Blood in My Eye , publicado postumamente em Fevereiro de 1972. Foi o assassinato de George Jackson dentro da San Quentin State Prison, na Califórnia, em 21 de Agosto de 1971 que preparou o cenário para os mais políticos e sangrentos levantamentos da história americana.

No presídio de Attica, a norte de Nova York, mais de 800 condenados jejuaram numa homenagem silenciosa a Jackson em 22 de Agosto, no dia seguinte à sua morte. Os responsáveis de Attica, confrontados com uma população condenada que predominantemente minoritária e politicamente agitada, e alarmados pelo grau de organização aparente na demonstração de solidariedade, endureceram a segurança, disparando uma série de acontecimentos que conduziram ao levantamento principiado em 9 de Setembro e finalizado com uma greve táctica em 13 de Setembro.

Logo após a rebelião inicial em Attica, os condenados começaram a organizar-se durante as saídas para o pátio da prisão. No manifesto que elaboraram é evidente que compreendem a política do aprisionamento — o seu reconhecimento do propósito das prisões nos EUA e a sua exigência de serem levados para um país não imperialista tornam isto claro. Unificados por uma compreensão política da sua situação, os condenados encontraram a vontade para resistir e transformaram o motim de Attica numa insurreição plena contra o status quo. Eles emitiram o seu manifesto e tentaram utilizar os reféns que haviam tomado para pressionar as autoridades a negociações sob o olhar vigilante dos observadores externos que haviam convidado.

A opressão em Attica, contudo, demonstrou não ser negociável. A insurreição foi sufocada em 13 de Setembro por uma força de assalto coordenada de mais de duas centenas de guardas do estado. Unidades tácticas, armadas com espingardas e cobertas por equipes de franco-atiradores (snipers) equipados com rifles de alto poder postados nos telhados dos edifícios vizinhos, avançaram em meio a uma nuvem de gás lacrimogéneo e atacaram os insurrectos no pátio da prisão.

Tom Wicker, do New York Times , um dos negociadores, documentou a fúria da repressão do Estado em Attica no seu livro, A Time to Die . Nunca foi feita uma avaliação completa do fogo que choveu sobre os condenados e refens naquele dia. Contudo, pelo menos 39 rajadas de munição de espingardas foram descarregadas dentro do pátio, pulverizando os condenados com a munição de 390 cartuchos de espingarda. O número total de cartucho de rifle de alto poder disparados sobre os condenados nunca foi determinado. A contagem final da carnificina em Attica foi de 43 mortos, incluindo dez reféns. Três reféns, 85 condenados e um guarda estadual foram feridos.

Os condenados de Attica experimentaram a fúria total da repressão do Estado, a qual não acabou depois de cessar o fogo. Wicker relatou as brutais represálias físicas e mentais cometidas contra os condenados naquele dia, bem como a investida da retaliação legal — nos três anos que se seguiram à insurreição, mais de 1400 acusações de acção criminal foram efectuada em processos contra 61 condenados de Attica. Os julgamentos e punições dos condenados continuaram durante o resto da década, e as precipitações políticas do assalto continuam até hoje.

O retrocesso político negativo e as consequências legais que resultaram da utilização de força letal contra os condenados desarmados de Attica foi a segunda lição aprendida pelos responsáveis das prisões e do Estado. A retomada da prisão de Attica tornou-se um símbolo da utilização excessiva da força governamental. Dentre as sequelas da violência, a generalização da crítica conduziu ao estabelecimento de uma comissão especial do estado a fim de investigar todos os aspectos do incidente, incluindo as acções do então governador Nelson Rockfeller. Em 1974, 1200 dos condenados que afirmavam terem sido batidos e torturados por responsáveis correccionais em Attica apresentaram formalmente uma denúncia para processar e, após 25 anos de litígio, ganharam uma considerável indemnização monetária.

As actuais políticas de encarceramento reflectem as lições aprendidas nas décadas de 1960 e 1970 e são responsáveis pelos níveis mínimos de perturbação nas prisões em face das taxas de encarceramento sem precedentes dos últimos 30 anos. Estas políticas de encarceramento incluem extensões projectos de construção a fim de aumentar a capacidade das prisões, adopção generalizada da última tecnologia em prisão, e recrutamento de um vasto exército de pessoa correccional. Dentre as mais draconianas e, ao mesmo tempo, as mais efectivas das políticas actuais está a adopção e expansão do encarceramento supermax por todo o país.

PRISÕES SUPERMAX

“Supermax” na comunidade correccional é a abreviação de encarceramento de "super-máxima segurança". Chase Riveland, o porta-voz semi-oficial do Departamento de Justiça americano, define uma prisão supermax como:

...uma unidade altamente restritiva, abrigo de alta supervisão dentro de uma instalação segura, ou uma instalação inteiramente segura, que isola condenados da população geral e um do outro devido a crimes graves, assaltos reiterados ou comportamento violento, ameaça de fuga ou fuga real de instalação(ões) de alta segurança, ou incitamento ou ameaça de incitar perturbações na instituição correccional.

A generalização do uso do encarceramento supermax é um desenvolvimento recente. Os administradores de prisões habitualmente isolam condenados problemáticos, mas desafios legais a estes "cárceres dentro de presídios" durante as décadas de 1970 e 1980 restringiram sua utilidade para presídios oficiais. Os presídios supermax, quer sejam novos ou instalações remodeladas, são concebidos e construídos "com a finalidade expressa de encarcerar condenados sob condições altamente isoladas com acesso severamente limitado a programas, exercícios, equipe ou outros condenados. Os presídios supermax subvertem efectivamente restrições legais acerca da prática da segregação e, desde que todos os condenados nestas instalações estão essencialmente em confinamento solitário, maximiza o poder da instituição de controlar indivíduos.

O encarceramento supermax decorre directamente das lições aprendidas pelos responsáveis das prisões dos anos 60 aos 70. A ameaça ao sistema prisional apresentada por condenados politizados foi drasticamente reduzida. Uma política comum durante o período anterior era a prática da "dispersão" — condenados problema, uma vez identificados, eram espalhados pelo sistema, hospedados em outros estados, ou transferidos para uma instalação federal a fim de impedi-los de se unirem. Naturalmente, o resultado em muitos casos era que os condenados politizados reiniciavam o recrutamento e a organização nos seus novos destinos. O encarceramento supermax resolve esta ameaça através da hospedagem de todos os agitadores e outros "perturbadores" em conjunto em instituições de alta segurança. Um benefício colateral de isolar "perturbadores" sob a segurança supermax é impedir o seu contacto com indesejáveis influências exteriores, como o poder que George Jackson galvanizou durante os anos 60 e 70. Ao mesmo tempo, o encarceramento supermax corresponde à segunda lição aprendida com as insurreições políticas do período radical — a utilização de força letal contra condenados organizados e a consequente precipitação política foi minimizada durante os últimos 25 anos.

A vida na supermax é austera. Os condenados tipicamente passam 23 horas por dia sozinhos em suas celas com pouco ou nenhum contacto humano. A célula, a unidade e as portas dos chuveiros são operadas remotamente a partir de um controle central. Em algumas unidades, mesmo viagens periódicas aos chuveiros são eliminadas por meio de instalações pré-programadas de duche dentro das celas. Os serviços médicos, religiosos e de aconselhamento são limitados a visitas em frente à cela ou providenciados através de televisão em circuito fechado. Refeições e lavagem de roupa são passadas através de portinholas que também permitem aos guardas terem acesso para assegurarem ou removerem restrições com segurança ou utilizarem gás e/ou armas de fogo para subjugarem condenados combativos ou resistentes. O isolamento da supermax, contudo, não proporciona privacidade — os condenados são continuamente monitorados através de cameras ou dispositivos de escuta e o que se lhes comunica é através de interfones.

A actividade dentro de cela é limitada por duras restrições acerca da propriedade, e fora da cela a actividade é rara. Os condenados são pouco movidos e escoltados por pelo menos dois guardas. Pode-se-lhes permitir fazer exercício três a sete horas por semana sozinhos num espaço contido e pode-se-lhes permitir uma ou mais visitas sem contacto por mês por visitantes aprovados. A comunicação com o mundo do lado de fora varia conforme a instituição mas é limitada e estreitamente vigiada.

Poucos programas de reabilitação estão disponíveis para condenados supermax. Não há programas de trabalho significativos e as oportunidades educacionais são limitadas e estão disponíveis só através da televisão ou da correspondência. Equipes de capelães, ou clérigos aprovados ou voluntários podem proporcionar serviços religiosos através de visitas em frente à cela, mas poucos artigos religiosos são permitidos, se é que há algum.

A utilização da violência institucional é uma ameaça sempre-presente nas unidades supermax. A força utilizada para restringir e mover condenados dentro e fora da celas é considerada "rotina". Outras utilizações de força previstas por responsáveis dos presídios incluem executar extracções da cela, intervir em comportamento auto-destrutivo, e subjugar condenados combativos ou resistentes.

Entre os piores características do encarceramento supermax está o facto de que a designação de prisioneiros para o isolamento é arbitrária. Ao contrário das prisões tradicionais onde a segregação deve ser justificada e administrada de acordo com o processo devido, a autoridade para colocar condenados dentro de uma instalação supermax, e dela remove-los, é totalmente burocrática e portanto discricionária.

Pouca consideração é dada ao impacto imediato e a longo prazo do encarceramento supermax sobre os condenados. A posição de Riveland acerca da questão é evasiva: "Pouco se sabe acerca do impacto de trancar um condenado em uma cela isolada durante uma média de 23 horas por dia com limitada interacção humana, pouca actividade construtiva e um ambiente que assegura o máximo controle sobre os indivíduos". Tendo em vista o facto de que os efeitos psicopatológicos do confinamento solitário são conhecidos há mais de 150 anos, e que a Suprema Corte dos Estados Unidos condenou o confinamento solitário com argumentos psiquiátricos em 1890, a posição de Riveland acerca do impacto do confinamento solitário é mais do que evasão — é desinformação grosseira.

Se quisermos realmente conhecer o que o isolamento faz ao homem, podemos ouvir as vozes sonoras e claras dos próprios condenados. George Jackson, que passou oito anos e meio dos seus onze anos de prisão em confinamento solitário, apresentou uma descrição explícita dos efeitos da segregação punitiva no presídio de Soledad no notório O Wing. Max Row:

Destroi os processos lógicos da mente, os pensamentos de um homem tornam-se completamente desorganizados. O ruído, demência jorrando de toda garganta, sons frustrados das barras, sons metálicos das paredes, os tabuleiros de aço, as camas presas às paredes, os sons ocos de um cano em ferro fundido ou da toalete.

Os cheiros humanos, o desperdício humano lançado sobre nós, corpos não lavados, a comida podre. Quando um preso branco deixa isto ele está arruinado para o resto da vida. Nenhum negro deixa o Max Row pelos seus próprios pés. Ele só pode abandonar o Max Row no vagão da carne ou açoitado pelos pés de porco.

É notável quão acuradamente a descrição de George Jackson ilustra as descobertas de um estudo psiquiátrico posterior dirigido pelo Dr. Stuart Grassian que documentou os efeitos psicopatológicos do confinamento solitário. Um sintoma da psicopatologia é a mudança da percepção. Grassian cita um prisioneiro acerca de sons e cheiros dentro do confinamento solitário.

Você fica sensível ao ruído — o sistema de canalização. Alguém na fileira acima de mim pressiona o botão da torneira, a água precipita-se através dos canos — é demasiado ruído, afecta os seus nervos. Não posso aguentar isto — começo a gritar. Estarão a fazer isto de propósito? Após um bocado você já não pode suportar. Comidas — eu costumava comer tudo o que eles serviam. Agora não posso suportar os cheiros — a carne — a única coisa que consigo aguentar comer é o pão... Difícil respirar, ranço, cheiro odioso das toaletes — o fedor começa a parecer intolerável.

Grassian relata que os condenados só experimentaram estes sintomas enquanto estavam na solitária. Ele documenta outros sintomas, incluindo perturbações afectivas, dificuldades de pensar, concentração e memória, perturbações quanto ao conteúdo do pensamento, e problemas com o controle de impulsos. É importante notar que o estudo de Grassian foi efectuado sobre os efeitos do confinamento em solitária por curto prazo — a duração mediana da segregação no seu estudo era de dois meses com uma amplitude de onze dias a dez meses, e aos prisioneiros era dado, por lei, pelo menos 24 horas de alívio do isolamento todos os 15 dias. A extensão temporal da permanência na supermax, em contraste, é indeterminado, com alguns condenados cumprindo toda a sua sentença em confinamento solitário.

E o que acontece a estes condenados se ou quando eles saem da prisão — qual é o impacto a longo prazo do isolamento? Mais uma vez, Riveland é evasivo: "Serão os potenciais efeitos negativos maiores depois de um indivíduo ter estado numa tal instalação por três meses, um ano, três ano, cinco anos, ou mais? Faz o isolamento extenso, a ausência de estímulos normais e um ambiente controlado resultar em danos para a psique de um condenado? A investigação nesta área é escassa".

Grassian, infelizmente, não apresenta resposta à questão porque o seu estudo foi limitado ao efeito sobre homens actualmente encarcerados. Mas, mais uma vez, podemos voltar-nos para George Jackson, que apresentou um agudo acompanhamento a partir de dentro dos sobreviventes da O Wing, Max Row. Eles acabam, afirmou, ou como activistas políticos ou como homens destruídos. Ele considerou:

Os homens destruídos estão tão danificados que eles nunca serão outra vez membros adequados de qualquer espécie de unidade social. Tudo o que ainda estava bom neles quando entraram naquele enquadramento, qualquer coisa que possa ter escapado aos efeitos ruinosos da experiência colonial negra, qualquer coisa que possa ter sido resgatável quando entraram pela primeira vez naquele enquadramento — tudo foi perdido quando eles o deixaram.

Isto revela o que há de melhor nas pessoas ou destroi-as inteiramente. Mas ninguém deixa de ser afectado. Ninguém que deixa isto está normal.

Os responsáveis dos presídios sabem muito bem o que o confinamento solitário pode fazer aos homens. Riveland reconhece a resistência às prática supermax: "...uma facção de responsáveis pelas correcções, condenados e advogados de condenados levantaram preocupações acerca ou mesmo condenaram-nas. Eles sugerem que elas são 'cruéis e desumanas', susceptíveis de abusos, e lesivas aos condenados a elas expostas". Na análise final, contudo, ele relata que muitos responsáveis correccionais defendem a utilização de unidades supermax como "benéficas". Por outras palavras, o encarceramento supermax serve as suas necessidades de controle dos condenados e os responsáveis pelos presídios pretendem manter a sua utilização sem se preocuparem com as lesões a curto ou longo prazo dos condenados.

Apesar do dano para os condenados e o facto de que a constitucionalidade do encarceramento supermax não é clara e de responsáveis dos presídios preverem desafios legais, a prática está generalizada e em crescimento. Em 1997 havia pelo menos 57 instalações supermax em operação por todo o país (incluindo 16 só no Texas) e um mínimo de dez sistemas adicionais de presídios a desenvolverem programas e instalações supermax.

Os responsáveis do Estado e dos presídios aprenderam bem suas lições — o nível actual de opressão mantido nos presídios americanos impediu quaisquer perturbações em grande escala como aquelas verificadas nos anos 60 e 70.

O PROBLEMA PRISIONAL AGORA

Apesar da prática generalizada do encarceramento supermax, o desenvolvimento daquilo que tem sido chamado de "prisões robô" e a entusiástica adopção das "tecnocorrecções" pelos responsáveis pela liberdade condicional e sob palavra, o problema prisional nos Estados Unidos está rapidamente a alcançar proporções de crise. As forças que provocam a crise são tanto económicas como políticas.

O actual encarceramento em massa nos Estados é um resultado da desindustrialização do país durante os últimos vinte e cinco anos e das consequentes deslocações sociais e económicas que impactam desproporcionalmente americanos das minorias. A relação directa entre desemprego e encarceramento que existiu desde a década de 1930 até à de 1980 foi alterada — o sistema prisional agora mantém grande parte do exército industrial de reserva por períodos extensos realmente para manter a taxa de desemprego baixa — um desenvolvimento que não fora previsto pelos observadores das prisões no passado. Quando fiz o prognóstico, em 1983, de que "...o problema prisional nos EUA só pode ficar pior", não previa os últimos refinamentos na maquinaria da opressão.

A crise prisional já começou. Indicadores actuais sugerem que a recessão económica crónica que foi evitada ao longo dos últimos vinte ano está sobre nós. Esta recessão, tal como as contradições económicas do capitalismo no passado, produzirão uma inundação de novos prisioneiros que terão de ser acomodados num sistema que actualmente está próximo, ou quase, da plena capacidade. Os custos económicos do encarceramento em massa e do controle correccional nos EUA já são estarrecedores e não podem ser mantidos. Apesar das poupanças proporcionadas pela tecnologia na construção de prisões, na manutenção e na administração, os custos económicos ainda são excessivos, um facto que mesmo os mastigadores de números do governo reconhecem. Como a economia contrai-se e os impostos sobre o rendimento definham, os governos federal e estaduais estão a incorrer cada vez mais profundamente em défices. Os presídios já estão a ser apontados nos cortes orçamentais, e a crise política do sistema, adiada pelas expansivas e onerosas políticas prisionais dos últimos vinte anos, está pendente — o problema prisional está a tornar-se uma questão política outra vez.

Ironicamente, os presídios supermax podem ser os primeiros a irem ao ar — o custo de manter massas de homens em confinamento solitário concentrado provou-se ser muito maior até mesmo do que o encarceramento regular de máxima segurança. O encerramento das instalações supermax por si só poderia atear insurreições generalizadas nas prisões porque colocaria o "perturbadores" outra vez entre a população prisional geral. Uma que isto aconteça, o protesto e a resistência seguir-se-iam, e a voz dos prisioneiros americanos, silenciada por tanto tempo, seria ouvida outra vez — o que reflectiria o "som que precede a fúria daqueles que são oprimidos" proclamado em Attica em 1971.

O QUE PODE SER FEITO AGORA?

Durante a sua confrontação com o estado, os condenados de Attica apelaram à consciência dos cidadãos da América por assistência — um apelo feito há mais de trinta anos atrás mas que ainda é crítico hoje. Há muito a ser feito para ajudar os condenados.

A reforma prisional é uma importante questão política. Os revolucionários devem estabelecer ligações com prisioneiros sempre que possível. É essencial para os condenados que entendam porque estão por trás das grade e saber que têm apoio do lado de fora. Devemos apoiar os desafios legais em curso ao encarceramento supermax e iniciar acções contra estados que praticam hospedagem supermax e ainda não foram desafiados. O término do isolamento supermax não só aliviará prisioneiros individuais de condições excessivamente opressivas como desafiara directamente o sistema prisional.

Podem ser lançados projectos para organizar e levantar o dinheiro necessário para financiar a campanha legal contra a "supermax" e outros desafios ao sistema. Estes projectos deveriam incluir representantes das comunidades que sofrem o maior impacto do encarceramento, especialmente negros e latinos, e podem ajudar na reabilitação de prisioneiros, uma tarefa que foi abandonada de todo pelo Estado. Projectos relativos a prisões locais podem constituir redes e formar coligações de trabalho com grupos pela reforma prisional ao nível do estado, da região e nacional. Uma investigação pela Internet revela que muito já está a ser feito. Partilhar a experiência e coordenar esforços fortalece o movimento.

Mas a reforma prisional deve ser sempre revolucionária — dentro do movimento prisional devemos enfatizar o relacionamento entre capitalismo e encarceramento nos Estados Unidos e os seus impactos devastadores sobre a classe trabalhadora, especialmente as minorias nacionais. A consciência revolucionárias é a única esperança real para os oprimidos pelo sistema. É importante recordar o testemunho de George Jackson quanto a este facto essencial — na sua autobiografia ele reconheceu a sua primitiva mentalidade criminosa e contou como ficou enredado com a lei e lhe foi oferecida uma sentença leve num acordo negociado de defesa. Ao ser sentenciado, contudo, foi enviado para uma penitenciária por um prazo de um ano. Jackson explica:

Aquilo foi em 1960. Eu tinha dezoito anos. Tenho estado aqui desde então. Encontrei Marx, Engels, Trotsky e Mao quando entrei na prisão e eles redimiram-me. Durante os primeiros quatro anos nada estudei senão ideias económicas e militares. Encontrei guerrilhas negras, George "Big Jake" Lewis e James Carr, W. L. Nolen, Bill Christmas, Tony Gibson e muitos, muitos outros. Tentámos transformar a mentalidade criminal negra numa mentalidade revolucionária negra.

George Jackson concluiu sua autobiografia com as seguintes linhas que lhe foram enviadas por um condenado que anteriormente havia resistido à visão revolucionária do problemas prisional:

Sem o frio e a desolação do inverno aqui
não poderia haver o calor e esplendor da primavera!
A calamidade endureceu a minha mente, e transformou-a em aço!
Poder para o Povo!

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[*] Escritor socialista independente, norte-americano. Está actualmente a trabalhar na história da conquista americana e da exploração do povo mexicano.

O original encontra-se em http://www.monthlyreview.org/0903vogel.htm


Este artigo encontra-se em http://resistir.info .

10/Set/03