O perfil do declínio petrolífero

Como evoluirá a produção de petróleo?   Haverá um pico agudo ou um longo planalto (plateau) duradouro?

por Rembrandt [*]

Gráfico 1. O nosso futuro está altamente dependente do modo como a produção mundial de petróleo está a declinar. Se ela declinar rapidamente, com uma pequena percentagem a cada ano ou mais, será muito difícil completar a transição energética sem consequências económicas severas. Se a produção estabilizar e houver planaltos durante uma década ou mais, após os quais começa o longo período de declínio, isto proporcionaria meios muito melhores para sustentar a economia actual. É necessária estabilidade a fim de aumentar a escala de fontes de energia alternativas de modo suficiente a fim de substituir o petróleo durante um período de transição de décadas.

Dentro do mundo dos previsores independentes existe tanto o cenário do pico como o do planalto. O grupo dos "piquistas" agudo é representado principalmente pelos peritos que fazem parte da Association for the Study of Peak Oil and Gas (ASPO). A melhor publicação saída do mesmo é a do Uppsala Hydrocarbon Study Group (UHSG) , o qual é dirigido pelo presidente da ASPO, Kjell Aleklett.

Na sua tese de doutoramento , Fredrik Robelius esboçou o destino dos campos petrolíferos gigantes que conduzem a produção de petróleo, e chegou à conclusão de que a produção atingirá o pico entre 2008 e 2018, a aproximadamente 90 a 95 milhões de barris por dia. O seu cenário mais provável declara que o pico é em 2012 após o qual ocorrerá um declínio agudo. Por volta de 2030, sugere ele, a produção poderia ter declinado para um ponto tão baixo como 50 milhões de barris por dia.

O grupo dos previsores do "planalto" é disperso. Eles vêm de uma varidade de organizações tais como o BGR , o World Energy Council e a consultora de energia PFC Energy . A análise desta última resulta em que a produção máxima será atingida em torno de 2014, a aproximadamente 100 milhões de barris por dia, a qual seria mantida durante uma década após o que ocorreria um declínio lento.

O cenário do planalto seria mais benéfico para o mundo porque provavelmente não conduzirá à escassez generalizada de combustíveis líquidos. Outras fontes de líquidos ou fontes energéticas equivalentes podem nesse caso preencher uma grande parte do fosso entre oferta e procura que iria verificar-se. O mundo poderia intensificar o ritmo significativamente para que a transição energética tivesse êxito, abrindo o caminho para o momento em que a produção mundial entrasse em declínio real. Se este declínio ocorrer imediatamente após o pico sem a preparação suficiente proporcionada por um planalto, é inevitável uma crise mundial de combustíveis líquidos.

A diferenças decorrem principalmente de desacordos relativos ao papel do progresso tecnológico na valorização de reservas petrolíferas e sua transformação e reservas produzíveis.

O que impulsiona a produção de petróleo?

Sabemos das estatísticas que desde o princípio de 2005 a produção de petróleo, incluindo o não convencional, tem estado num planalto ligeiramente ascendente (ver Oilwatch Monthly ). Pode-se concluir de diferentes relatórios que, no mesmo período de tempo, 4 a 5 milhões de barris por dia de nova produção foram acrescentados à oferta (Skrebowksi, 2006; Koppelaar, 2006; CERA, 2005). Isto implica em que a actual produção mundial está a declinar a uma taxa de 4% a 5% ao ano. Quando se examina os novos campos de petróleo programados para entrar em produção nos próximos anos pode-se ver uma continuação de acréscimos de oferta recentes. Aproximadamente 5 milhões de barris por dia serão acrescentados a cada ano até 2010. A partir disto pode-se concluir que a situação actual – um planalto que começou em 2005 – é estável por agora desde que nenhum factor importante venha a alterá-la. Esta situação está plotada na figura 3, onde vemos a produção a aumentar num planalto inclinado para cima até 2010, continuada por um planalto inclinado para baixo até 2013 após o qual o declínio se inicia. No total, este cenário representa um total de reservas recuperáveis (provadas + prováveis) de 1220 mil milhões de barris, o que concorda com estimativas actuais da base de dados IHS Energy.

Gráfico 3.

Em relação à questão do pico ou planalto, isto levanta duas perguntas. Por quanto tempo a indústria petrolífera será capaz de acrescentar tão grande quantidade de nova produção a cada ano? E a segunda é se a taxa de declínio de 4% a 5% é estável ou aumentará ou diminuirá no futuro?

A resposta à primeira pergunta está dependente de dois desenvolvimentos: descobertas futuras de petróleo e acréscimos de actores não convencionais. A resposta à segunda pergunta está dependente de desenvolvimentos tecnológicos que acrescentem reservas, mantendo baixa a taxa de declínio, e das expectativas de produção quanto aos campos petrolíferos gigantes do mundo (Robelius, 2007).

A partir de dados históricos sabemos que as descobertas atingiram o pico na década de 1960 e têm estado a declinar desde então. Actualmente estamos a descobrir em média um barril por cada três consumidos. A continuação desta tendência, a qual é muito provável dada da falta de novas regiões que não tenham ainda sido exploradas, implicaria uma quantidade remanescente de petróleo ainda por descobrir da ordem do 100 a 250 mil milhões de barris. O efeito de 170 mil milhões de barris de novas descobertas nos próximos 15 a 20 anos é mostrado na figura 4. Isto estenderia o actual planalto até aproximadamente 2017, aceitando a suposição de que a actual taxa de declínio de 4,5% ao ano permanecerá estável.

Gráfico 4.

Se bem que as descobertas possam influenciar a extensão do planalto, o petróleo não convencional provavelmente não terá uma tal influência. Por não convencional, neste artigo, refiro-me a areias petrolíferas, xistos betuminosos, petróleo polar e petróleo pesado ou extra-pesado. Os cenários actuais para estas fontes de petróleo não convencional estimam um nível de produção entre 8 e 12 milhões de barris por dia em 2030 (Campbell, 2006; IEA, 2006). Isto é demasiado pouco e demasiado tarde. O efeito de aproximadamente 12 milhões de barris/dia em 2030 de produção não convencional é mostrado na figura 5, a qual apenas torna ligeiramente mais lento o declínio que começa em 2017.

Gráfico 5.

Será que a taxa de declínio continua nos 4,5%?

O cenário da figura 5, com um planalto a estender-se durante uma década, está muito dependente da evolução futura da taxa de declínio. Como foi mencionado anteriormente, o desenvolvimento tecnológico pode acrescentar reservas aos actuais campos petrolíferos do mundo, o chamado crescimento das reservas, e portanto desacelerar a taxa de declínio significativamente. Para mais pormenores acerca do crescimento da reservas, escrevi um série de três partes acerca das mesmas, publicadas no ano passado em The Oildrum (1) , (2) , (3) . As estimativas e opiniões sobre crescimento da reserva diferem amplamente. Para este exercício de cenário, adoptámos o número de 500 mil milhões de barris apresentado por Ray Leonard como a conclusão consensual de uma das mais recentes Conferências HedBerg sobre o futuro da produção petrolífera. Mais informação acerca desta conferência pode ser encontrada na entrevista do jornalista David Strahan a Ray Leonar acerca da Conferência HedBerg . O número da conferência HedBerg leva a uma estimativa das reservas convencionais recuperáveis de 1890 mil milhões de barris (1220 mil milhões das reservas actuais, 170 mil milhões de descobertas futuras e 500 mil milhões do crescimento da reserva). Quão provável esta quantidade de crescimento da reserva pode ocorrer será discutido posteriormente no final. O efeito é mostrado na figura 6, onde vemos que uma soma de 500 mil milhões de barris não leva a uma extensão do planalto, mas sim a uma taxa de declínio muito mais lenta após o pico ligeiramente mais elevado.

Gráfico 6.

Por outro lado, também há um significativo potencial descendente devido aos campos petrolíferos gigantes e super-gigantes que dominam a produção. Na sua tese de doutoramento, Fredrik Robelius efectuou um esplêndido trabalho de análise dos maiores campos petrolíferos do mundo. Um conjunto de 507 campos gigantes e super gigantes contem cerca da metade das reservas de petróleo que actualmente se espera que venham a ser produzidas, segundo a base de dados IHS Energy. A sua fatia da produção total actual é de 48% ou, em termos de produção, 40 milhões de barris por dia. A partir deste modelo, Robelius espera que estes campos venham a ser a força principal do perfil da produção petrolífera que está para acontecer. Quando este grupo de campos, que têm estado no planalto desde a década de 1980, começa a declinar a produção mundial o acompanhará. Na figura 7 é mostrado o caso do baixo padrão de Robelius. As hipóteses por trás deste cenário podem ser encontradas na sua tese de doutoramento, páginas 126 e 127 , tais como a expectativa de que a produção final (ultimate production) do super gigante Ghawar será de 105 mil milhões de barris.

Gráfico 7.

A seguir ao declínio da produção dos campos super gigantes, os quais obrigam a aumentar as taxas de declínio, a produção de águas profundas também terá uma influência significativa. Os campos de águas profundas têm uma rápida inclinação ascendente, um pico curto e uma rápida inclinação descendente, pois é o modo mais económico de produzir petróleo neste tipo de campos. No total, espera-se que a produção de águas profundas suba para 9 a 12 milhões de barris por dia no princípio da próxima década, após o que estabelece-se um declínio de 10% a 15% (Campbell 2006, Robelius 2007).

Um cenário do que poderia acontecer ao perfil da produção petrolífera devido a estas descidas potenciais é apresentado na figura 8. Vemos aqui a produção a aumentar até um pico em 2010, após o que estabelece-se o declínio o qual aumenta rapidamente no fim da próxima década. O que conduz a uma estimativa de reservas recuperáveis convencionais de 1170 mil milhões de barris (1000 mil milhões das reservas actuais e 170 mil milhões de descobertas futuras).

Gráfico 8.

Conclusões

1) Se a taxa de declínio global da produção existente continuar nos 4,5%, a produção de petróleo provavelmente ficará num planalto a um nível de 90 milhões de barris por dia desde cerca de 2010 até o fim da próxima década, após o que estabelecer-se-á um declínio entre moderado e agudo.

2) Se a taxa de declínio global da produção existente reduzir-se dos 4,5% para 2%, graças ao acréscimo de 500 mil milhões de barris devido ao crescimento da reserva, a produção provavelmente aumentará com algumas protuberâncias rumo aos 95 milhões de barris por dia no fim da próxima década, após o que estabelecer-se-á um declínio entre lento e moderado.

3) Se a taxa de declínio global da produção existente aumentar dos 4,5% para 8%, devido ao efeito do fim da era dos campos gigantes e do declínio da produção em águas profundas, a produção provavelmente atingirá o pico em torno de 2010 em 88 milhões de barris por dia, declinando ligeiramente para 80 milhões de barris por dia no fim da próxima década, após o que estabelecer-se-á um declínio agudo.

Discussão

A discussão sobre o pico petrolífero progrediu significativamente desde que o artigo sobre o fim do petróleo barato foi publicado na Scientific American (Campbell & Lahérrere, 1998). Actualmente há um acordo convergente em que estamos a entrar num período no qual a oferta já não pode atender à procura, o que abre caminho para preços elevados do petróleo perduráveis. Ou por causa da expectativa de um longo planalto na produção por uma ou várias décadas, ou por causa de um pico após o qual será estabelecido um declínio agudo. O meu exercício de cenário apoia principalmente a visão de um pico com um declínio agudo. As condições em que um planalto possa ocorrer durante mais de uma década são uma quantidade improvável de crescimento da reserva, significativamente acima do 500 mil milhões de barris, e/ou aumentos muito mais altos de produção não convencional.

Quanto àquilo que é o cenário mais provável, suponho que o aumento rumo a uma taxa de declínio mais elevada, como se mostra na figura 8, seja o que vá ocorrer. O raciocínio por trás disto é uma combinação de desenvolvimentos: 1) O fim da era dos campos gigantes, onde havia uma base de produção firme de 40 milhões b/d, a qual está a cair abruptamente; 2) O fim de um aumento agudo na produção graças às águas profundas, o qual está a desaparecer com uma diminuição igualmente aguda; 3) O facto de que o mundo produziu mais reservas nos últimos três anos do que as que foram acrescentadas com o crescimento de descobertas e reservas (Robelius, 2007; J.S. Herold, 2007); 4) O efeito de efeitos acima da superfície sobre a produção, os quais conduzirão a declínios mais altos, uma vez que a partir de 2009/2010 haverá um fosso significativo entre oferta e procura de pessoal (CERA, 2007), há um problema em acrescer suficientes plataformas petrolíferas para exploração e produção (Simmons, 2006), inquietações e geopolítica estão a atrasar o desenvolvimento de novos campos, e a produção mantém-se baixa em vários países tais como Iraque, Venezuela e Nigéria, os quais provavelmente não mudarão para melhor no futuro.

12/Outubro/2007

Referências
Campbell C. (2006),   The availability of non-conventional oil and gas, Prepared for the Office of Science and Innovation,   Department of Trade and Industry, 16 pages, London
Campbell C. & Laherrére J. (1998), The end of cheap oil, Scientific American, March 1998, p. 78 – 83
CERA (2005), Worldwide Liquids Capacity Outlook to 2010, CERA Advisory Services, 58 pages
CERA (2007), Engineering Talent Squeeze --“People Deficit” -- Likely to Cause Further Delay in Some Oil & Gas Production Projects through 2010, Cambrigde Energy Research Associates
Herold J. S. (2007), Global Upstream Performance Review 2007, 29 pages
IEA (2006), World Energy Outlook 2006, International Energy Agency, Chapter 3, pages 92-94, Paris Koppelaar R. (Oktober 2006), Oil Supply Analysis 2006 - 2007, ASPO-NL Newsletter, 4 pages
Robelius F. (2007), Giant Oil Fields - The Highway to Oil, Faculty of Science and Technology, PhD.,Uppsala University, 168 Pages
Simmons M. (2006), Limits to Growth: The Impact of Rig Scarcity, Oil & Money Conference, London, 23 slides,September 18, 2006
Skrebowkski C. (April 2006), Prices holding steady, despite massive planned capacity additions, Petroleum Review, p. 28 - 31


[*] Analista holandês, editor de http://www.peakoil.nl/

O original encontra-se em http://europe.theoildrum.com/node/3060


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
17/Out/07