Brasil:
O capitalismo extractivo e o grande salto para trás
por James Petras
O Brasil testemunhou um dos mais gritantes retrocessos
sócio-económicos da moderna história mundial: de uma
dinâmica nacionalista de industrialização para uma economia
exportadora primária. Entre meados da década de 1930 e meados da
década de 1980, o Brasil cresceu a uma taxa média de cerca de 10%
no seu
sector manufactureiro, em grande medida com base em políticas
intervencionistas do estado, subsídios, protecção e
regulação do crescimento de empresas públicas nacionais e
privadas. Mudanças no "equilíbrio" entre o capital
nacional e estrangeiro (imperial) começaram a verificar-se a seguir ao
golpe de 1964 e aceleraram-se após o retorno da política
eleitoral nos meados da década de 1980. A eleição de
políticos neoliberais, especialmente com a eleição do
regime Cardoso em meados da década de 1990, teve um impacto devastador
sobre sectores estratégicos da economia nacional: a
privatização generalizada foi acompanhada pela
desnacionalização dos altos comandos da economia e a
desregulamentação maciça de mercados de capitais
[1]
. O regime Cardoso preparou o cenário para o fluxo maciço de
capital estrangeiro nos sectores agro-mineral, financeiro, seguros e
imobiliário. A ascensão das taxas de juro, como exigido pelo FMI,
o Banco Mundial e o mercado especulativo imobiliário elevaram os custos
da produção industrial. A redução de tarifas de
Cardoso acabou com subsídios à indústria e abriu a porta a
importações industriais. Estas políticas neoliberais
levaram ao declínio relativo e absoluto da produção
industrial
[2]
.
A vitória presidencial do auto-intitulado "Partido dos
Trabalhadores", em 2002, aprofundou e expandiu o "grande
retrocesso" promovido pelos seus antecessores neoliberais. O Brasil
reverteu para tornar-se um exportador primário de
commodities,
como soja, gado, ferro e minérios que se multiplicaram, as
exportações de material de transporte e manufacturas declinaram
[3]
. O Brasil tornou-se uma dos principais exportadores de commodities extractivas
do mundo. A dependência do Brasil das exportações de
commodities foi ajudada e compensada pela entrada maciça e a
penetração de corporações imperiais multinacionais
e de fluxos de financeiros por bancos além-mar. Os mercados
além-mar e os bancos estrangeiros tornaram-se a força condutora
do crescimento extractivo e da morte industrial.
Para ter um melhor entendimento da "grande reversão" do Brasil
de uma dinâmica nacionalista-industrializante para uma vulnerável
dependência imperial conduzida pela extracção agro-mineral,
precisamos resumidamente rever a economia política do Brasil ao longo
dos últimos cinquenta anos a fim de identificar os "pontos de
viragem" decisivos e a centralidade da política e da luta de classe.
Modelo militar: Modernização a partir de cima
Sob a ditadura militar (1964-1984) a política económica era
baseada numa estratégia híbrida enfatizando uma tríplice
aliança do estado, do capital estrangeiro e do capital privado nacional
[4]
centrada primariamente em exportações industriais e
secundariamente e
commodities
agrícolas (especialmente produtos
tradicionais como o café).
Os militares rejeitaram o modelo nacionalista-populista baseado em
indústrias do estado e cooperativas camponesas do deposto presidente
Goulart e puseram em vigor uma aliança de capitalistas industriais e
agronegócio. A cavalgar uma onda de mercados globais em expansão
e beneficiando da repressão do trabalho, a compressão de
salários, subsídios abrangentes e políticas
proteccionistas, a economia cresceu a dois dígitos desde o fim da
década de 1960 até meados da de 1970, o chamado "Milagre
brasileiro"
[5]
. Os militares, se bem que afastando quaisquer ameaças de
nacionalizações, puseram em vigor um certo número de
regras de "conteúdo nacional" e ampliaram a dimensão e
âmbito da classe trabalhadora urbana, especialmente na indústria
automotiva. Isto levou ao crescimento dos sindicatos de trabalhadores
metalúrgicos e posteriormente do Partido dos Trabalhadores. O
"modelo exportador" baseado na indústria leve e pesada, de
produtores estrangeiros e internos, tinha base regional (Sudeste). A
estratégia de modernização aumentou desigualdades e
integrou os capitalistas "nacionais" a multinacionais imperiais. Isto
preparou o terreno para o início das lutas anti-ditatoriais e o retorno
da democracia. Partidos neoliberais ganharam hegemonia com a viragem para
políticas eleitorais.
Políticas eleitorais, a ascensão de neoliberalismo e a
ascendência do capitalismo extractivo
A oposição eleitoral que sucedeu aos regimes militares esteve
inicialmente polarizada entre uma elite liberal, adepta do livre mercado
agro-mineral e aliada a multinacionais imperiais e, por outro lado, um bloco
nacionalista de trabalhadores, camponeses, trabalhadores rurais e classe
média baixa. Trabalhadores militantes constituíam a CUT,
camponeses sem terra o MST e ambos juntaram-se à classe média para
constituir o PT.
[6]
A primeira década de política eleitoral, 1984-94, foi
caracterizada pelo puxa e empurra entre o capitalismo estatista residual
herdado do regime militar anterior e a emergente burguesia do "livre
mercado" liberal. As crises de dívida,
hiper-inflação, corrupção sistémica
maciça, o impedimento do presidente Collor e a estagnação
económica enfraqueceram gravemente os sectores capitalistas estatais e
levaram à ascendência de uma aliança do capital
agro-mineral e financeiro, tanto de capitalistas estrangeiros como locais,
ligada a mercados além-mar. Esta coligação
retrógrada encontrou o seu líder politico e o caminho do poder
com a eleição de Fernando Henrique Cardoso, um antigo
académico de esquerda que se converteu em fanático do mercado
livre.
A eleição de Cardoso levou a uma ruptura decisiva com as
políticas nacionais estatistas dos sessenta anos anteriores. As
políticas de Cardoso deram um impulso decisivo à
desnacionalização e privatização da economia,
elementos essenciais na reconfiguração da economia do Brasil, e
à ascendência do capital extractivo
[7]
. De acordo com quase todos os indicadores, as políticas ultra-liberais
de Cardoso levaram a um precipitado grande salto para trás, concentrando
rendimento e terra, e aumentando a propriedade estrangeiro de sectores
estratégicos. A "reforma" da economia de Cardoso a expensas do
trabalho industrial, da propriedade pública, dos trabalhadores sem terra
provocou greves generalizadas e ocupações de terra
[8]
. A "economia extractiva", especialmente a abertura de sectores
lucrativos na agricultura, mineração e energia, ganhou
espaço a expensas das forças produtivas: a posição
relativa da manufactura, tecnologia e serviços avançados
declinou. Em particular, os ganhos do trabalho como um todo declinaram como
percentagem do PNB
[9]
.
A taxa de crescimento médio da indústria declinou para uns magros
1,4%. O emprego no sector industrial caiu em 26%, o desemprego subiu para mais
de 18,4%, o "sector informal" subiu de 52,5% em 1980 para 56,1% em
1995
[10]
.
A privatização de empresas públicas como a
Telebrás, firma gigante e lucrativa de telecomunicações,
levou ao despedimento maciço de trabalhadores e à
subcontratação de trabalho com salários mais baixos e sem
benefícios sociais. Sob Cardoso, o Brasil tinha as mais altas taxas de
desigualdade (coeficiente de Gini) entre todos os países do mundo.
Cardoso utilizou subsídios do estado para promover o capital
estrangeiro, especialmente nos sectores da exportação
agrária e mineral, enquanto pequenos e médios agricultores
ansiavam por crédito. O seu programa de desregulamentação
financeira levou à especulação com divisas, lucros
maciços e inesperados para bancos da Wall Street quando o regime elevou
as taxas de juro em mais de 50%
[11]
. A bancarrota de agricultores levou ao seu despojamento pelos capitalistas
agro-exportadores. A concentração de terra assumiu uma viragem
decisiva quando 7% dos grandes proprietários que possuíam
fazendas de mais de 2000 hectares aumentaram a dimensão das suas terras
de 39,5% para 43% das terras agrícolas brasileiras
[12]
.
Durante os oito anos de Cardoso no governo (1994-2001) houve um tsunami de
investimento estrangeiro: mais de US$50 mil milhões entraram no
país só nos primeiros cinco anos dez vezes o total dos 15
anos anteriores
[13]
. Companhias agro-minerais de propriedade estrangeiras entre as principais
companhias estrangeiras (em 1997) representavam mais de um terço e
continuavam a crescer. Entre 1996-1998 multinacionais estrangeiras adquiriram
oito grandes firmas de alimentos, mineração e
produção metálica
[14]
.
As políticas neoliberais de Cardoso abriram a porta amplamente para a
tomada de indústrias críticas e sectores bancários pelo
capital estrangeiro. No entanto, foram os presidentes do "Partido dos
Trabalhadores" que vieram a seguir, Lula da Silva e Rousseff, que
completaram o
Grande Salto para Trás da economia brasileira ao se voltarem
decisivamente para o capital extractivo como a força condutora da
economia.
Do neoliberalismo ao capital extractivo
As privatizações de Cardoso foram apoiadas e aprofundadas pelo
regime Lula. A ultrajante privatização de Cardoso da mineradora
Vale do Rio Doce por uma fracção do seu valor foi defendida por
Lula; o mesmo se passou com a privatização de facto da companhia
petrolífera estatal Petrobrás. Lula abraçou as
políticas monetárias restritivas, acordos de excedente
orçamental com o FMI e seguiu as prescrições
orçamentais dos directores do FMI
[15]
.
O regime Lula (2003-2011) adoptou as políticas neoliberais de Cardoso
como um guia para promover a reconfiguração da economia do Brasil
em benefício do capital estrangeiro e interno, agora assente no sector
primário e de exportação de matérias-primas. Em
2005 o Brasil exportou US$55,3 mil milhões em matérias-primas e
US$44,2 mil milhões em bens manufacturados; em 2011 o Brasil triplicou
suas exportações de matérias-primas para US$162,2 mil
milhões enquanto suas exportações de manufacturas
aumentaram para uns meros US$60,3 mil milhões
[16]
.
Por outras palavras, a diferença entre o valor das
exportações de matérias-primas e de manufacturas aumentou
de US$13 mil milhões para mais de US$100 mil milhões nos
últimos cinco anos do regime Lula. A desindustrialização
relativa da economia, o desequilíbrio crescente entre o sector
extractivo dominante e o sector manufactureiro ilustra a reversão do
Brasil para o seu "estilo colonial de desenvolvimento".
O capitalismo agro-mineral, o estado e o povo
O sector exportador do Brasil beneficiou-se enormemente com a ascensão
dos preços das
commodities
. O principal beneficiário foi o sector
exportador agro-mineral. Mas o custo para a indústria, transporte
público, condições de vida, investigação e
desenvolvimento e educação foi enorme. As
exportações agro-minerais proporcionarem grandes receitas para o
estado mas também extrairam-lhe grandes subsídios,
benefícios fiscais e lucros.
A economia industrial do Brasil foi afectada desfavoravelmente pelo boom da
commodities
devido à ascensão no valor da sua divisa, o real, em
40% entre 2010-2012, a qual aumentou o preços das
exportações de manufacturas e diminuiu a competitividade dos
produtos manufacturados
[17]
. As políticas de "mercado livre" também facilitaram a
entrada de bens manufacturados mais baratos da Ásia, particularmente da
China. Enquanto as exportações primárias para a China
deram um salto, o sector manufactureiro do Brasil, particularmente bens de
consumo como têxteis e calçados, declinou entre 2005 e 2010 em
mais de 10%
[18]
.
Sob os regimes Lula-Rousseff, a extrema dependência de um número
limitado de
commodities
levou a um declínio agudo nas forças
produtivas, medido pelos investimentos em inovações
tecnológicas, especialmente aqueles relacionados com a indústria
[19]
. Além disso, o Brasil tornou-se mais dependente do que nunca de um
único mercado. De 2000 para 2010 a importações chinesas de
soja a principal exportação agrícola
representaram 40% das exportações do Brasil; as
importações chinesas de ferro a exportação
mineira chave constituem mais de um terço do total das
exportações daquele sector. A China também importa cerca
de 10% das exportações brasileiras de petróleo, carne,
celulose e papel
[20]
. Sob os regimes Lula e Rousseff, o Brasil reverteu para uma economia quase
mono-cultural dependente de um mercado muito limitado. Em consequência, o
arrefecimento da economia da China levou como era de prever a um
declínio no crescimento do Brasil para menos de 2% de 2011 para 2013
[21]
.
Brasil: Paraíso económico do capital financeiro
Sob as políticas de mercado livre do Partido dos Trabalhadores, o
capital financeiro entrou a jorros no Brasil, como nunca antes. O investimento
directo estrangeiro saltou de cerca de US$16 mil milhões em 2002,
durante o último ano do regime Cardoso, para mais de US$48 mil
milhões no último ano do governo de Lula
[22]
. A carteira de investimento na maior parte de tipo especulativo
subiu de US$5 mil milhões negativo em 2002 para US$67 mil milhões
em 2010. Entradas líquidas de investimento directo estrangeiro (IDE) e
investimentos de carteira totalizaram US$400 mil milhões durante
2007-2011, a comparar com os US$79 mil milhões durante o período
anterior de cinco anos
[23]
. Investimentos de carteira em títulos de altos juros retornaram entre
8% e 15%, o triplo e o quádruplo das taxas na América do Norte e
Europa. Lula e Dilma são presidentes poster da Wall Street.
De acordo com os indicadores económicos mais importantes, as
políticas dos regimes Lula-Dilma foram as mais lucrativas para o capital
estrangeiro além-mar e os investidores nos sectores agro-minerais
primários na história recente do Brasil.
O modelo agro-mineral e o ambiente
Apesar da sua retórica política em favor da família
agricultora, os regimes Lula-Dilva têm estado entre os maiores promotores
do agro-negócio na história política brasileira. A maior
fatia de recursos do estado foi concedida à agricultura, finanças
e grandes proprietários rurais. De acordo com um estudo, em 2008/2009
pequenos proprietários receberam cerca de US$6,35 mil milhões, ao
passo que o agro-negócio e grandes proprietários rurais receberam
US$31,9 mil milhões em financiamento e crédito
[24]
. Menos de 4% dos recursos do governo e de investigação foi
destinada à agricultura familiar e explorações
agro-ecológicas.
Sob Lula, a destruição das florestas tropicais verificou-se a um
ritmo acelerado. Entre 2002 e 2008 a vegetação da região
do
Cerrado
foi reduzida em 7,5% ou mais de 8,5 milhões de hectares, principalmente
por corporações do agro-negócio
[25]
. O Cerrado brasileiro é uma das regiões de savana mais
biologicamente ricas do mundo, concentrando-se na região centro-leste do
país. De acordo com um estudo, 69% da terra de propriedade de
corporações estrangeiras está concentrada no Cerrado do
Brasil
[26]
. Entre 1995 e 2005 a fatia de capital estrangeiro no sector cerealífero
agro-industrial saltou de 16% para 57%. O capital estrangeiro capitalizou com
as políticas neoliberais sob Cardoso, Lula e Dilma deslocando-se para o
sector do agro-combustível (etanol), controlando cerca de 22% das
companhias brasileiras de cana-de-açúcar e etanol
[27]
e rapidamente invadindo a floresta amazónica.
Entre Maio de 2000 e Agosto de 2005, graças à expansão do
sector exportador, o Brasil perdeu 132 mil quilómetros quadrados de
floresta devido à expansão de grandes proprietários de
terra e multinacionais dedicados à criação de gado, soja e
madeira
[28]
. Entre 2003 e 2012, mais de 137 mil quilómetros quadrados foram
desflorestados, crime ajudado por multibilionários investimentos do
governo em infraestrutura, incentivos fiscais e subsídios.
Em 2008 o dano à floresta tropical amazónica aumentou 67%. Sob
pressão de indígenas, camponeses, trabalhadores rurais sem terra
e movimentos ecológicos o governo entrou em acção para
restringir a desflorestação. Ela declinou de um pico de 27.772
quilómetros quadrados em 2004 (o segundo, apenas inferior ao de 1995,
sob Cardoso, com 29.059 km2) para 4.656 km2 em 2012
[29]
.
A criação de gado é a principal causa da
desflorestação na Amazónia brasileira. Estimativas
atribuem mais de 40% a grandes capitalistas e corporações
multinacionais de processamento de carne
[30]
. Os principais investimentos em infraestrutura dos regimes Lula-Dilma,
principalmente estradas, haviam aberto anteriormente terras florestais
inacessíveis a empresas corporativas de gado. Sob Lula e Dilma, a
agricultura comercial, especialmente a soja, tornou-se o segundo maior
contribuidor para a desflorestação da Amazónia.
Acompanhando a degradação do ambiente natural, a expansão
do agro-negócio foi acompanhada pelo despojamento, assassínio e
escravização de povos indígenas. A Comissão
Pastoral da Terra, da Igreja Católica, informou que em 2004 a
violência latifundiária atingiu o seu mais alto nível em
pelo menos 20 anos o segundo ano do mandato de Lula. Os conflitos
subiram de 1.801 em 2004, quando em 2003 foram 1.690 e em 2002 foram 925
[31]
.
Segundo o governo, corporações de gado e soja exploram pelo menos
25 mil brasileiros (principalmente índios despojados da sua terra e
camponeses sem terra) sob "condições análogas
à escravidão". As principais ONGs afirmam que o
número verdadeiro poderia ser dez vezes superior àquele. Mais de
183 fazendas foram inspeccionadas em 2005 libertando 4.133 escravizados
[32]
.
Mineração: A fraude da "privatização" da
Vale,
agora poluidora número um
Cerca de 25% das exportações do Brasil são
constituídas por produtos minerais o que destaca a crescente
centralidade do capital extractivo na economia. O minério de ferro
é o minério de maior importância, representando 78% do
total das exportações mineiras. Em 2008, o ferro representou
US$16,5 dos rendimentos da indústria, num total de US$22,5 mil
milhões
[33]
. A vasta maioria das exportações de ferro está dependente
de um único mercado a China. Quando o crescimento da China
diminui, a procura declina e a vulnerabilidade económica do Brasil
aumenta.
Uma firma, privatizada durante a presidência Cardoso, a Vale,
através de aquisições e fusões controla quase 100%
da produção das minas de ferro do Brasil
[34]
. Em 1997 a Vale foi vendida pelo estado neoliberal por US$3,14 mil
milhões, uma pequena fracção do seu valor. Ao longo da
década seguinte ela concentrou seus investimentos na
mineração, estabelecendo uma rede global de minas e mais de uma
dúzia de países na América do Norte e do Sul,
Austrália, África e Ásia. O regime Lula-Dilma desempenhou
um papel importante para facilitar a dominância da Vale no sector mineiro
e o crescimento exponencial do seu valor. O valor líquido da Vale hoje
é de mais de US$100 mil milhões mas ela paga uma das mais baixas
taxas de imposto do mundo, apesar de ser a segunda maior companhia mineira do
mundo, o maior produtor de minério de ferro e o segundo maior de
níquel. Os royalties máximos sobre a riqueza mineral subiram de
2% para 4% em 2013
[35]
. Por outras palavras, durante a década do governo
"progressista" de Lula e Dilma, a taxa fiscal era um sexto daquela da
conservadora Austrália, que mantém uma taxa de 12%.
A Vale tem utilizado os seus enormes lucros para diversificar
operações mineiras e actividades relacionadas. Ela liquidou
negócios como o aço e a celulose vendendo-os por US$2,9 mil
milhões aproximadamente o preço pago por todo o complexo
mineral. Em vez disso concentrou-se na compra de minas de ferro de competidores
e literalmente na monopolização da produção. A Vale
expandiu-se no manganês, níquel, cobre, carvão, potassa,
caulim, bauxita; comprou ferrovias, portos, terminais de contentores, navios e
pelo menos oito centrais hidroeléctricas; dois terços das suas
centrais hidroeléctricas foram construídas durante o regime Lula
[36]
.
Em suma, o capitalismo floresceu durante o regime Lula com lucros recorde no
sector extractivo, perigo extremo para o ambiente e deslocamento maciço
de povos indígenas e produtores em pequena escala. A experiência
mineira da Vale sublinha as poderosas continuidades estruturais entre o regime
neoliberal de Cardoso e o de Lula: o primeiro privatizou a Vale a preço
de saldo, o último promoveu a Vale como o produtor e exportador
monopolista dominante de ferro, ignorando totalmente a
concentração de riqueza, lucros e poderes do capital extractivo.
Em comparação com o crescimento geométrico dos lucros de
monopólio do sector extractivo, os miseráveis dois dólares
por dia de Lula e Dilma, dados como subsídio para reduzir a pobreza,
dificilmente permitem classificar este regime como "progressista" ou
de "centro-esquerda".
Se bem que Lula e Dilma estejam embevecidos com o crescimento do
"campeão mineiro" do Brasil (a Vale), outros não
estão. Em 2002, a Public Eye, um grupo de direitos humanos e ambientais,
deu à Vale um "prémio" como a pior
corporação do mundo: "A Vale Corporation actua com o maior
desrespeito pelo ambiente e direitos humanos no mundo"
[37]
. Os críticos citaram a construção da barragem de Belo
Monte, da Vale, no meio da floresta tropical amazónica como tendo
"consequências devastadoras para regiões com biodiversidade
única e tribos indígenas"
[38]
.
O sector mineiro é capital intensivo, gera poucos empregos e acrescenta
pouco valor às suas exportações. Ele tem degradado
á água, a terra e o ar; afectado desfavoravelmente comunidades
locais, despojado comunidades índias e criado uma economia de altos e
baixos.
Com o acentuado arrefecimento da economia chinesa, especialmente o seu sector
manufactureiro em 2012-14, os preços do ferro e do cobre caíram.
As receitas de exportação do Brasil declinaram, minando o
crescimento geral. É especialmente importante que a
canalização de recursos para infraestruturas destinadas aos
sectores agro-minerais resultou no esgotamento de fundos para hospitais,
escolas e transporte urbano os quais estão de deprimidos e
proporcionam um serviço fraco a milhões de trabalhadores urbanos.
O fim do "mega ciclo" extractivo e a ascensão de protestos em
massa
O modelo de orientação extractiva do Brasil entrou num
período de declínio e estagnação em 2012-2013
quando a procura mundial especialmente na Ásia declinou,
sobretudo na China
[39]
. O crescimento flutuou em torno dos 2%, mal acompanhando o crescimento
populacional. A classe baseada neste modelo de crescimento, especialmente o
estrato reduzido de investidores estrangeiros de carteira,
mineração monopolista e grandes corporações do
agro-negócio, os quais controlam e arrecadam a maior parte das receitas
e lucros, limitou os "efeitos gotejamento"
("trickle down effects")
que os regimes Lula-Dilma promoveram como a sua
"transformação social". Se bem que alguns programas
inovadores tenham sido iniciados, o acompanhamento e a qualidade dos
serviços realmente deteriorou-se.
O número de camas para pacientes em hospitais declinou de 3,3 por 1000
brasileiros em 1993 para 1,9 em 2009, o segundo mais baixo da OCDE
[40]
. As admissões em hospitais financiados pelo sector público caiu
e as longas esperas e baixa qualidade são endémicos.
O gasto federal no sistema de saúde tem caído desde 2003, quando
ajustado à inflação, segundo o estudo da OCDE. A despesa
pública em saúde é baixa: 41%, a comparar com 82% no Reino
Unido e 45,5% nos EUA
[41]
. A polarização de classe inerente ao modelo extractivo
agro-mineral estende-se às despesas do governo, impostos, transportes e
infraestrutura: financiamento maciço para rodovias, barragens, centrais
hidroeléctricas para o capital extractivo, contra gastos inadequados e
em declínio para transportes públicos, saúde
pública e educação.
As raízes mais profundas dos levantamentos em massa de 2013 estão
localizadas na política de classe de um estado corporativo. Os regimes
Cardoso e Lula-Dilma, ao longo das últimas duas décadas, seguiram
uma agenda elitista e conservadora, amortecida pela política
clientelista e paternalista que neutralizou a oposição em massa
durante um período de tempo extenso, até que a rebelião em
massa e os protestos à escala nacional desmascararam a fachada
"progressista".
Publicistas de esquerda e sabichões conservadores que saudaram Lula como
um "progressista pragmático" ignoraram o facto de que durante
o seu primeiro mandato o apoio do estado à elite do agro-negócio
foi sete vezes maior do que a oferecida aos agricultores familiares que
representavam aproximadamente 90% da força de trabalho rural e
proporcionavam a maior parte dos alimentos para consumo local. Durante o
segundo mandato de Lula, o apoio financeiro do Ministério da Agricultura
ao agro-negócio durante a safra 2008.09 foi seis vezes maiores do que os
fundos concedidos ao programa de redução da pobreza de Lula, o
altamente publicitado programa "Bolsa Família"
[42]
. Ortodoxia económica e demagogia populista não são
substitutos de mudanças estruturais substantivas, envolvendo uma reforma
agrária ampla que abranja 4 milhões de trabalhadores rurais sem
terra, assim como uma renacionalização de empresas extractivas
estratégicas como a Vale a fim de financiar agricultura
sustentável e preservar a floresta tropical.
Ao invés disso, Lula e Dilma saltaram em força para o boom do
etanol: "açúcar, açúcar por toda a parte"
mas sem nunca perguntar, "Que bolsos enchem?" A crescente rigidez
estrutural do Brasil, sua transformação numa economia capitalista
extractiva, potenciou e ampliou o âmbito da corrupção. A
competição por contratos mineiros, concessões de terra e
projectos gigantes de infraestrutura encoraja as elites dos negócios
agro-minerais a pagarem ao "partido no poder" a fim de assegurar
vantagens competitivas. Isto se verificou particularmente com o "Partido
dos Trabalhadores" cuja liderança executiva (destituída de
trabalhadores) era composta de profissionais em ascensão, aspirando a
posições na classe da elite que encarava os subornos nos
negócios para o seu "capital inicial" como uma espécie
de "acumulação inicial através da
corrupção".
O boom das
commodities,
durante quase uma década, encobriu as contradições de
classe e a extrema vulnerabilidade de uma economia extractiva dependente de
exportações de bens primários para mercados limitados. As
políticas neoliberais adaptadas à promoção de
exportações de
commodities
levaram ao influxo dos bens manufacturados e enfraqueceram a
posição do sector industrial. Em consequência, os
esforços de Dilma para renovar a economia produtiva a fim de compensar o
declínio das receitas de
commodities
não funcionaram: estagflação, excedentes
orçamentais em declínio e enfraquecimento da balança
comercial praguejaram a sua administração precisamente quando a
massa de trabalhadores e da classe média estão a pedir uma
redistribuição de recursos em grande escala, de subsídios
ao sector privado para investimentos em serviços públicos.
As fortunas politicas de Rousseff e do seu mentor, Lula, foram
construídas sobre os frágeis fundamentos do modelo extractivo.
Eles falharam em reconhecer os limites do seu modelo, muito menos em formular
uma estratégia alternativa. Uma colcha de retalhos de propostas,
reformas políticas, retórica anti-corrupção face
aos protestos de milhões de pessoas que se estendem a todas as grandes e
pequenas cidades do país não resolve o problema básico de
desafiar a concentração de riqueza, propriedade e poder de classe
da elite agro-mineral e financeira. As suas aliadas multinacionais controlam as
alavancas do poder político, com e sem corrupção e
bloqueiam quaisquer reformas significativas.
A era do "Populismo Wall Street" de Lula está acabada. A ideia
de que altas receitas provenientes das indústrias extractivas podem
comprar lealdades populares através do consumismo, financiado pelo
crédito fácil, está ultrapassada. Os investidores da Wall
Street já não louvam mais os BRICs como um novo mercado
dinâmico. Como é previsível eles estão a transferir
seus investimentos para actividades mais lucrativas em novas regiões.
Quando a carteira de investimentos declina e a economia estagna, o capital
extractivo intensifica sua pressão dentro da Amazónia e com
terrível preço por parte da população
indígena e a floresta tropical.
O ano de 2012 foi um dos piores para os povos indígenas. Segundo o
Conselho Indigenista Missionário, filiado à Igreja
Católica, o número de incidentes violentos contra as comunidades
índias aumentou 237%
[43]
. O regime Rousseff deu aos índios o menor número de
títulos legais à terra do que qualquer presidente desde o retorno
da democracia (sete títulos). A esta taxa, o estado brasileiro
levará um século para titular os pedidos de terra das comunidades
índias. Ao mesmo tempo, em 2012, 62 territórios índios
foram invadidos por latifundiários, mineiros e madeireiros, 47% mais do
que em 2011
[44]
. A maior ameaça de despojamento vem de projectos como a mega barragem de
Belo Monte
e centrais hidroeléctricas gigantes promovidas pelo regime
Rousseff. Quando a economia agro-mineral vacila, as comunidades índias
estão a ser esmagadas ("genocídio silencioso") a fim de
intensificar o crescimento agro-mineral.
Os maiores beneficiários da economia extractiva do Brasil são os
principais
traders
de
commodities
do mundo os quais, à escala mundial, embolsaram US$250 mil
milhões ao longo do período 2003-2013, ultrapassando os lucros
das maiores firmas da Wall Street e cinco das maiores companhias
automobilísticas. Em meados de 2000, alguns
traders
desfrutaram retornos de 50 a 60 por cento. Mesmo em 2013 eles estavam numa
média de 20-30% (
Financial Times
, 4/15/13, p. 1). Especuladores de
commodities
ganharam mais de 10 vezes o que foi gasto com os pobres. Estes especuladores
lucram com flutuações de preços entre
localizações, com oportunidades de arbitragem proporcionadas pela
abundância de discrepâncias de preços entre regiões.
Traders monopolistas eliminaram competidores e os impostos baixos (5-15%)
aumentaram a sua mega riqueza. Os maiores beneficiários do modelo
extractivista Lula-Dilma, ultrapassando mesmo os gigantes agro-minerais,
são os vinte maiores
traders
-especuladores de
commodities.
Capital extractivo, colonialismo interno e o declínio a luta de classe
A luta de classe, especialmente sua expressão em greves conduzidas por
sindicatos e trabalhadores rurais localizados em acampamentos que lançam
ocupações de terras, declinou drasticamente ao longo do
último quarto de século. O Brasil durante o período que se
seguiu à ditadura militar (1989) foi um líder mundial em greves,
com 4000 em 1989. Com o retorno da política eleitoral e a
incorporação e legalização dos sindicatos,
especialmente na estrutura de negociações colectivas tripartidas,
as greves declinaram para uma média de 500 durante a década de
1990. Com o advento do regime Lula (2003-2010) as greves declinaram ainda mais,
para 300-400 por ano
[45]
. As duas maiores centrais sindicais, CUT e Força Sindical, aliadas ao
regime Lula, tornaram-se adjuntas virtuais do Ministério do Trabalho:
sindicalistas asseguravam posições no governo e as
organizações recebiam grandes subsídios do estado,
ostensivamente para treino e educação do trabalhador. Com o boom
das
commodities
e a ascensão das receitas do estado e rendimentos de
exportações, os governos formularam uma estratégia do
gotejamento, aumentando o salário mínimo e lançando novos
programas anti-pobreza. Nas zonas rurais, o MST continuava a pedir uma reforma
agrária e empenhado em ocupações de terras mas a sua
posição de apoiar criticamente o Partido dos Trabalhadores em
troca de subsídios sociais levou a um declínio agudo nos
acampamentos a partir dos quais lançar ocupações de
terras. No arranque da presidência de Lula (2003) o MST tinha 285
acampamentos, em 2012 tinha 13
[46]
.
O declínio da luta de classe e a cooptação dos movimentos
de massa estabelecidos coincidiram com a intensificação da
exploração capitalista extractiva do interior do país e o
violento despojamento das comunidades indígenas. Por outras palavras, a
exploração acrescida do "interior" pelo capital
agro-mineral facilitou a concentração de riqueza nos grandes
centros urbanos e nas áreas rurais estabelecidas, levando à
cooptação de sindicatos e movimentos rurais. Portanto, apesar de
algumas declarações retóricas e protestos
simbólicos, o capital agro-mineral encontrou pouca solidariedade
organizada entre o trabalho urbano e os índios despojados e
trabalhadores rurais escravizados na Amazónia "arrasada". Lula
e
Dilma desempenharam um papel chave na neutralização de qualquer
frente unida nacional contra as depredações do capital
agro-mineral.
A degeneração das principais confederações
trabalhistas é visível não só com a sua
presença no governo e com a ausência de greves como também
na organização dos comícios anuais de trabalhadores no
1º de Maio. Os mais recentes virtualmente não incluíram
qualquer conteúdo político. Há espectáculos de
música, temperados com lotarias oferecendo automóveis e outras
formas de entretenimento consumista, financiados e patrocinados por grandes
bancos privados e multinacionais
[47]
. Esta relação entre a cidade e a Amazónia lembra com
efeito uma espécie de colonialismo interno, no qual o capital extractivo
subornou uma aristocracia do trabalho como aliado cúmplice para a sua
pilhagem das comunidades do interior.
Conclusão: Com movimentos de massa, o modelo extractivista está
sob sítio
Se a CUT e a Força Sindical estão cooptadas, o MST está
enfraquecido e as classes de baixo rendimento receberam aumentos
monetários, como e por que movimentos de massa sem precedentes emergiram
em simultâneo numa centena de grandes cidades e outras menores por todo o
país?
O contraste entre os novos movimentos de massa e os sindicatos foi evidente na
sua capacidade para mobilizar apoio durante os dias de protesto de
Junho-Julho/2013: os primeiros mobilizaram 2 milhões, os últimos
100 mil.
O que precisa ser esclarecido é a diferença entre os pequenos
grupos locais de estudantes (
Movimento Passe Livre
, MPL) que detonaram os
movimentos de massa com base num aumento em tarifas de autocarros e os gastos
faraónicos do estado com a Copa do Mundo (campeonato de futebol) e as
Olimpíadas e os movimentos de massa espontâneos que questionaram
as políticas orçamentais do estado e as prioridades na sua
totalidade.
Muitos publicistas dos regimes Lula-Dilma aceitam sem questionamento as verbas
orçamentais atribuídas a projectos sociais e de infraestrutura,
quando
de facto apenas uma fracção é realmente gasta na medida em
que são roubadas por responsáveis corruptos. Exemplo: entre
2008-12 foram destinados R$6,5 mil milhões para transporte
públicos nas cidades principais mas só 17% foi realmente gasto (
Veja,
17/07/2013). Segundo a ONG "Contas Abertas", ao longo de um
período de dez anos o Brasil gastou mais de R$160 mil milhões em
obras públicas que não estão concluídas, nunca
deixaram a prancheta de desenho ou foram roubadas por responsáveis
corruptos. Um dos mais notórios casos de corrupção e
má administração é a construção de 12
quilómetros de metro em Salvador, com a condição
estabelecida de que seria completado em 40 meses ao custo de R$307
milhões. Treze anos depois (2000-13) as despesas aumentaram para cerca
1000 milhões de reais e escassos 6 km foram completados. Seis
locomotoras e 24 carruagens compradas por 100 milhões de reais
decompuseram-se e a garantia dos fabricantes expirou (
Veja,
17/07/2013). O projecto foi paralisado por acções de
sobrefacturação corrupta envolvendo responsáveis federais,
estaduais e municipais. Enquanto isso, 200 mil passageiros são
forçados a viajar diariamente em autocarros decrépitos.
A corrupção profunda que infecta toda a
administração Lula-Dilma conduziu a um vasto fosso entre os
apregoados feitos do regime e a deteriorada experiência diária da
grande maioria do povo brasileiro. O mesmo fosso existe em
relação às despesas para preservar a floresta tropical
amazónica, as terras dos índios e para financiar os programas
anti-pobreza: responsáveis corruptos do PT desviam fundos para financiar
suas campanhas eleitorais ao invés de reduzir a destruição
ambiental e reduzir a pobreza.
Se a riqueza do boom no modelo extractivo agro-mineral "filtrou-se"
para o resto da economia e elevou salários, isso fez-se de um modo muito
irregular, desigual e distorcido. A grande riqueza concentrada no topo
encontrou expressão numa espécie de novo sistema casta-classe no
qual transporte privado helicópteros e heliportos
clínicas privadas, escolas privadas, áreas de
recreação privadas, exércitos de segurança privada
para os ricos e abastado foram financiados por subsídios promovidos pelo
estado. Em contraste, as massas experimentaram um agudo declínio
relativo e absoluto em serviços públicos nas próprias
experiências essenciais da vida. A ascensão no salário
mínimo não compensada por 10 horas de espera em apinhadas salas
públicas de emergência, transportes irregulares e sobrelotados,
ameaças pessoais diárias e insegurança (50 mil
homicídios). Pais que recebem a esmola anti-pobreza enviam seus filhos
para escola decadentes onde professores mal pagos correm de uma escola para
outra mal atendendo suas classes e proporcionando um fraco aprendizado. A maior
indignidade para aqueles que recebem esmolas de subsistência foi
dizerem-lhes que, nesta sociedade de classe-casta, eles eram "classe
média"; que faziam parte da imensa transformação
social que retirou 40 milhões da pobreza, quando se arrastavam para suas
casas com horas de tráfego, retornando de empregos cujo salário
mensal pagava uma partida de ténis num clube de campo da classe alta. A
economia extractiva agro-mineral acentuou todas as desigualdades
sócio-económicas do Brasil e o regime Lula-Dilma acentuou esta
diferença pela elevação das expectativas, ao afirmar o seu
cumprimento e a seguir ignorar os impactos sociais reais na vida diária.
As verbas orçamentais em grande escala do governo para transporte
público e promessas de projectos para novas linhas de metro e comboio
foram adiadas durante décadas pela corrupção em grande
escala e a longo prazo. Os milhares de milhões gastos ao longo de anos
renderam resultados mínimos uns poucos quilómetros
completados. O resultado é que o fosso entre as projecções
optimistas do regime e a frustração das massas aumentou
amplamente. O fosso entre a promessa populista e o aprofundamento da clivagem
entre classes sociais não será encoberto por lotarias sindicais e
almoços VIP. Especialmente para toda uma geração de jovens
trabalhadores que não estão presos às antigas
memórias do Lula "metalúrgico" um quarto de
século antes. A CUT, a FS, o Partido dos Trabalhadores são
irrelevantes ou são percebidos como parte do sistema de
corrupção, estagnação social e privilégio. A
característica mais gritante da nova onda de protesto de classe é
a divisão geracional e organizacional: trabalhadores metalúrgicos
mais velhos ausentes, jovens trabalhadores não organizados dos
serviços presentes. Organizações locais e
espontâneas substituem os sindicatos cooptados.
O local de confrontação é a rua não o lugar
de trabalho. As reivindicações transcendem salários
monetários as questões em causa são o
salário social, padrões de vida, orçamentos nacionais. Em
última análise os novos movimentos sociais levantam a
questão das prioridades de classe nacionais. O regime está a
despojar centenas de milhares de residentes em favelas um expurgo social
para construir complexos desportivos e acomodações de
luxo. As questões sociais permeiam os movimentos de massa. A sua
independência organizativa e autonomia sublinham o mais profundo desafio
a todo o modelo extractivista neoliberal; muito embora nenhuma
organização ou liderança nacional tenha emergido para
elaborar uma alternativa. Mas a luta continua. Os mecanismos tradicionais de
cooptação fracassam porque não há líderes
identificáveis para subornar. O regime, a enfrentar o declínio
dos mercados de exportações e dos preços das
commodities,
e profundamente comprometido com investimentos não produtivos de muitos
milhares de milhões de dólares nos jogos, tem poucas
opções. O PT perdeu há muito a sua vanguarda
anti-sistémica. Seus políticos estão ligados a e
financiados por bancos e elites agro-minerais. Os líderes sindicais
protegem seus feudos, suas deduções mensais automáticas e
seus estipêndios. Os movimentos de massa das cidades, tal como as
comunidades índias da Amazónia, terão de encontrar novos
instrumentos políticos. Mas ao tomarem o caminho da
"acção directa" eles deram o primeiro grande passo.
[1] James Petras and Henry Veltmeyer Cardoso's Brazil: A land for Sale
(Lanham, Maryland: Rowman and Littlefield 2003/Chapter 2.
[2] ibid Chapter 1.
[3] James Petras, Brasil e Lula Ano Zero (Blumenau: EdiFurb 2005)
Chapter 1.
[4] Peter Evans, Dependent Development: The Alliance of Multinational State
and Local Capital in Brazil (Princeton NJ : Princeton University Press 1979).
[5] Jose Serra "The Brazilian Economic Miracle" in James Petras Latin
America from Dependence to Revolution (New York: John Wiley 1973) pp. 100
140.
[6] Brasil e Lula op cit. Ch. 1
[7] Cardoso's Brazil Ch. 5
[8] ibid, Ch.3 and 6
[9] ibid, Table A.12, p. 126
[10]iIbid, Ch. 3.
[11] ibid, Ch. 1, 2.
[12] ibid, Ch. 5
[13] ibid, Ch. 2.
[14] ibid, Table A. 6.
[15] Brasil e Lula, Ch. 1.
[16] Brazil Exports by Product Section (USD)
www.INDEXMUNDI.com/trade/exports/Brazil
[17] Peter Kingstone "Brazil 's Reliance on Commodity Exports threatens
its Medium and Long Term Growth Prospects"
www.americasquarterly.or/icingstone
.
[18] Brazil Exports op cit.
[19] Kingstone op cit.
[20] Kingstone op cit. World Bank Yearbook 2011.
[21]
Financial Times,
3/26/13, p. 7.
[22] Brazil's Surging Foreign Investment: A Blessing or Curse? VSITC
Executive Briefing on Trade Oct. 2012.
[23] ibid
[24]
rainforests:mongabay.com/amazon_destruction
[25] Ibid.
[26] Bernard Mancano Fernandes and Elizabeth Alice Clements "Land
Grabbing, Agribusiness and the Peasantry in Brazil and Mozambique "
Agrarian South (April 2013).
[27] Rainforests op cit.
[28] Rainforests op cit.
[29] Rainforests op cit.
[30] ibid
[31] Jose Manual Rambla "La agonia de los pueblos indigenas, buera de la
agenda reivindicativa de Brasil" rebellion.org/notice, 5/7/13.
[32] Rainforests ibid p. 8
[33] Brazil Mining,
www.e-mj.com/index.php/reatures/850-Brazil-,mining
.
[34] Wikipedia Vale,
en.wilkipedia.org/wiki/vale_miningcompany
.
[35]
The Economist,
June 2, 2013.
[36] Wikipedia, p. 9.
[37]
Guardian,
Jan. 27, 2012.
[38] ibid
[39]
Financial Times,
July 13, 2013, p. 9.
[40]
Financial Times,
July 1, 2013.
[41] ibid
[42] Rainforest op cit.
[43] ibid
[44] ibid
[45] Raul Zibechi, "El fin del consenso lulista" rebellion 7/7/13
[46] Ibid.
[47] Ibid.
O original encontra-se em
http://petras.lahaine.org/?p=1945
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
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