O Orçamento do Estado aprovado para 2006 permite aumentar os
salários da função pública mais do que 1,5%;
A Autoeuropa mentiu quando em Novembro/2005 apresentou a proposta que
determinava nova redução do poder de compra em 2006
RESUMO DESTE ESTUDO
Contrariamente ao que tem afirmado o ministro das Finanças do governo de
Sócrates, o Orçamento do Estado para 2006 aprovado pela
Assembleia da República permite aumentar as despesas com as
remunerações certas e permanentes dos trabalhadores da
Administração Pública mais do que 1,5%.
Assim, se os cálculos do governo constantes do Mapa IV da Lei do
Orçamento do Estado que foi aprovado pela Assembleia da República
estiverem certos, e se o governo não alterar a repartição
da dotação provisional que constava dos documentos que forneceu
à Assembleia da República, o governo tem cobertura no
Orçamento do Estado para 2006 aprovado pela Assembleia da
República para aumentar as despesas com as remunerações
certas e permanentes dos trabalhadores da Administração
Pública em 3,9%; portanto, não corresponde à verdade que o
governo apenas possa conceder um aumento de 1,5% aos trabalhadores da
Administração Pública. O Orçamento do Estado
aprovado pela Assembleia da República permite ir mais longe, e se o
governo não vai é porque pretende que sejam novamente os
trabalhadores da Administração Pública a suportar os
custos do agravamento da crise económica e social que o levou a rever em
baixa todas as previsões macroeconómicas, como consta da 2ª
versão do Programa de Estabilidade e Crescimento apresentada em Dezembro
de 2005.
Tal como sucede com o governo, a empresa Autoeuropa mentiu em Novembro de 2005
quando apresentou aos trabalhadores uma proposta de aumento de
remunerações que determinava em 2006 uma nova
redução do poder dos trabalhadores, dizendo que não podia
ir mais longe, pois se o fizesse isso determinaria a perda de competitividade
da empresa.
A proposta que a Autoeuropa apresentou em Novembro de 2005 determinaria um
aumento na remuneração media dos trabalhadores de apenas 2,5%. No
entanto, como a empresa pretendia que vigorasse durante 15 meses, e como
durante este período a taxa de inflação aumentaria,
segundo o Banco de Portugal, 3,1%, os trabalhadores da Autoeuropa perderiam em
2006 novamente poder de compra, a juntar ao que tinham perdido no
período 2003-2005 devido ao congelamento dos seus salários.
Apesar da Comissão de Trabalhadores da Autoeuropa ter defendido junto
dos trabalhadores a aceitação da proposta que a empresa pretendia
impor, os trabalhadores em referendo recusaram a proposta. Como
consequência da recusa dos trabalhadores, a Autoeuropa foi obrigada a
apresentar em Janeiro de 2006 uma nova proposta em que o aumento na
remuneração média é já de 3,3%, e a nova
remuneração só vigorará durante 12 meses, portanto
não os 15 meses que inicialmente a empresa pretendia impor. O aumento de
3,3% na remuneração média é superior à taxa
de inflação prevista pelo Banco de Portugal para 2006, que
é de 2,5%.
Mesmo em relação à redução em 100% da
remuneração por trabalho suplementar ao sábado, cujos
efeitos não conseguimos calcular por falta de informação,
a proposta que a Autoeuropa foi obrigada a fazer em Janeiro de 2006 devido
à luta dos trabalhadores é mais favorável do que a de
Novembro de 2005. De acordo com a proposta da empresa de Novembro de 2005 a
redução era em todos os sábados e para sempre. Segundo a
proposta de Janeiro de 2006, a redução já é em
sábados alternados e durante 5 sábados. Interessa dizer que esta
proposta da empresa viola o CCT do sector que legalmente se sobrepõe a
ela e por isso, a nosso ver, poderá ser sempre impugnada.
A empresa para levar mais facilmente a Comissão de Trabalhadores a
aceitar as suas propostas tem-se recusado a respeitar a lei portuguesa no que
esta estabelece relativamente ao direito a informação
económica e outra que deverá ser dada quer à
Comissão de Trabalhadores quer aos delegados sindicais (artº 503
do Código do Trabalho e artº 356 da Lei 35/2004).
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Os salários dos trabalhadores da Administração Publica
perderam de uma forma contínua poder de compra em 6 anos consecutivos,
como provam os dados do quadro I.
Os dados do quadro I mostram de uma forma quantificada que o poder de compra
dos salários dos trabalhadores da Administração
Pública têm diminuído desde 2000, prevendo-se uma nova
redução do poder em 2006, se a proposta do governo de aumento de
apenas 1,5% for para a frente.
A este propósito, interessa recordar que em Junho de 2005, o governo de
Sócrates apresentou a 1ª versão do Programa de Estabilidade
e Crescimento para 2005-2009 (o chamado PEC1) que previa na pág. 42, em
relação aos custos salariais da Administração
Pública, uma " actualização da tabela salarial 2% ao
ano" no período 2006-2009. No entanto, confrontado o ministro das
Finanças da altura com este aumento de apenas "2% ao ano"
quando na pág. 54 do mesmo documento se previa uma taxa de
inflação "de 2,9% em 2006", a resposta foi de que isso
não significava uma redução do poder dos salários
em 2006, pois a "actualização da tabela salarial em 2% ao
ano" devia ser entendida como um aumento médio no período do
Programa, que era de 2005-2009, o que significava que o aumento da tabela
salarial poderia em alguns anos ser superior a 2%.
O ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2006 APROVADO PELA ASSEMBLEIA DA
REPÚBLICA PREVÊ UM AUMENTO DE 3,9% NAS DESPESAS COM
REMUNERAÇÕES CERTAS E PERMANENTES
Durante o debate do Orçamento do Estado para 2006, o actual ministro das
Finanças, confrontado várias vezes com tal questão, sempre
negou que o poder de compra dos salários dos trabalhadores da
Administração Pública sofreria nova redução
em 2006. Em relação a esta matéria, observe-se o quadro II
que contém o valor inscrito no Orçamento do Estado para 2006 para
aumentos das despesas com as "Remunerações certas e
permanentes" dos trabalhadores da Administração
Pública para este ano.
Os valores que têm força de lei, por serem aprovados pela
Assembleia da República, são os que constam do chamado Mapa IV
anexo à Lei do Orçamento do Estado e que se encontram
desagregados dos chamados Mapas Informativos, que se encontram na coluna do
quadro II com o titulo "Lei do Orçamento- Mapa IV". Os dados
constantes do Relatório do Orçamento para 2006 são apenas
informativos mas servem para esclarecer melhor os dados apresentados pelo
governo.
Assim, no quadro II, na coluna "Lei do Orçamento Mapa IV
2006", na linha "Remunerações certas e
permanentes" estão 8.389,9 milhões de euros que é a
verba, de acordo com os cálculos do governo, necessária para
pagar aos trabalhadores da Administração Pública sem
qualquer aumento. E o valor 8.719 milhões de euros que está
também no quadro II, na coluna "Relatório OE 2006
Orçamento 2006" e na linha "Remunerações certas
e permanentes" consta do quadro 3.2.12 da pág. 74 do
Relatório do OE2006 e inclui já a dotação
provisional que o governo destinava na altura ao aumento dos salários
dos trabalhadores da Administração Pública e que era de
329,1 milhões de euros do total de 443,2 milhões de euros que
constavam da "dotação provisional" que foi aprovada
pela Assembleia da República.
Como provam esses valores, se os cálculos do governo constantes do Mapa
IV aprovado pela Assembleia República estiveram certos, e se o governo
não alterar a repartição da dotação
provisional que constava dos documentos que forneceu à Assembleia da
República, então há cobertura no Orçamento do
Estado aprovado pela Assembleia da República para aumentar as despesas
com as remunerações certas e permanentes dos trabalhadores da
Administração Pública em 3,9% ; portanto, não
corresponde à verdade a justificação apresentada aos
sindicatos da Administração Pública nem a
explicação dada à opinião pública
afirmação pública pelo ministro das Finanças que
não era possível fazer um aumento das despesas das
remunerações dos trabalhadores da função
pública em 2006 superior a 1,5%, quando a taxa de inflação
prevista pelo Banco de Portugal, já em Janeiro de 2006, é de 2,5%
para 2006. O Orçamento do Estado para 2006 aprovado pela Assembleia da
República permite ir mais longe como provam os dados constantes do
quadro II, e se o governo não vai mais longe é porque pretende
agravar ainda mais as condições de vida dos trabalhadores da
Administração Pública, ou seja, que sejam fundamentalmente
estes a pagar as consequências do agravamento da situação
económica e social do País resultante da politica centrada na
obsessão do défice, como provam as previsões em baixa
constantes da 2ª versão do Programa de Estabilidade e Crescimento
apresentada em Dezembro de 2005.
A AUTOEUROPA NÃO CUMPRE AS LEIS PORTUGUESAS
Tal como sucede com o governo, a empresa Autoeuropa também mentiu aos
trabalhadores quando em Novembro de 2005 apresentou uma proposta salarial que
determinava uma nova redução do poder de compra dos
trabalhadores com a justificação de que não podia ir mais
longe pois se o fizesse perderia competitividade.
Para que as justificações e explicações que
apresenta não possam ser analisadas objectivamente e eventualmente
contestadas a Autoeuropa tem-se recusado a cumprir a lei portuguesa em
relação ao direito à informação. Para
além disso, a empresa também não cumpre o nº3 do
artº 56 da Constituição da República Portuguesa que
estabelece que "compete às associações sindicais
exercer o direito à contratação colectiva o qual é
garantido nos termos da lei".
Em 1999, os lucros da Autoeuropa divulgados pela revista Exame atingiram 12,3
milhões de contos; e, em 2000, cerca de 16,3 milhões de contos;
portanto, num ano apenas aumentaram 32,5%. A partir desse ano a Autoeuropa
deixou de divulgar dados de natureza económica. Para além disso,
tem-se recusado a cumprir a lei portuguesa, nomeadamente os artº 503 do
Código do Trabalho que obriga as empresas a fornecerem
informação de natureza económica e financeira aos
delegados sindicais, e o artº 356 da Lei 35/2004 que impõe as
mesmas obrigações em relação à
Comissão de Trabalhadores. A informação que as outras
empresas divulgam e que a Autoeuropa divulgou até 2000, passou a ser
considerada pela empresa como confidencial e desta forma recusa-se a cumprir a
lei portuguesa. É desta forma, violando a lei, que a Autoeuropa tem
mantido "cega" a Comissão de Trabalhadores impondo a esta
facilmente os seus argumentos. Seria pelo menos legitimo esperar que o governo
obrigasse as empresas estrangeiras a funcionar em Portugal a respeitar a lei
portuguesa.
A AUTOEUROPA MENTIU EM NOVEMBRO DE 2005 QUANDO APRESENTOU UMA PROPOSTA SALARIAL
QUE DETERMINAVA UMA NOVA DIMINUIÇÃO DO PODER DE COMPRA DOS
TRABALHADORES
Como é de conhecimento público, desde 2003 que os
salários dos trabalhadores da Autoeuropa estão congelados. Apesar
disso a Autoeuropa apresentou, em Novembro de 2005, uma proposta de aumento
salarial de apenas 2,5% para 15 meses, com um aumento mínimo de 30 euros
a todos os trabalhadores. Para além disso havia ainda um premio anual de
200 euros em que não existia a certeza de que todos os trabalhadores o
recebessem e ainda a redução em 100% do acréscimo da
remuneração do trabalho suplementar realizado ao sábado. E
a justificação apresentada na altura pela
administração da empresa para fazer tal proposta foi a de que
não poderia ir mais longe porque se o fizesse a Autoeuropa perderia
competitividade.
O Banco de Portugal prevê que a inflação vai aumentar, em
2006, 2,5%, o que corresponde a uma taxa de inflação de 3,1%
para um período de 15 meses, que era o período que a empresa
pretendia que vigorassem os novos salários.
Embora os salários na Autoeuropa estivessem congelados durante 2 anos
(2003-2005), os trabalhadores receberam, durante esse período, como
compensação um prémio de 550 euros, o que dividido pelos
dois anos dá uma média de 225 euros para cada ano. No entanto,
este valor não foi incorporado nos salários da tabela o que
determinava que o aumento de 2,5% proposto pela empresa era calculado sobre os
salários da tabela sem ser considerado o premio médio anual de
225 euros.
Face à firmeza dos trabalhadores que recusaram a proposta da empresa,
embora ela tenha sido defendida pela Comissão de Trabalhadores, a
Autoeuropa apresentou em Janeiro de 2006 uma nova proposta que é a
seguinte: (1) O aumento de 2,5% já não será para um
período de 15 meses, mas sim de 12 meses (um ano); (2) O premio anual
passa para 300 euros e será recebido por todos os trabalhadores; (3) A
redução de 100% na remuneração do trabalho
suplementar feito ao sábado não será aplicado em todos os
sábados, mas apenas em sábados alternados e vigorará
somente durante 5 sábados de produção de um novo produto.
Procuremos quantificar o que representa para os trabalhadores as proposta da
Autoeuropa: a primeira apresentada em Novembro de 2005 e, a segunda, em
Janeiro de 2006. Os resultados constam do quadro III. No entanto, para que os
valores constantes sejam facilmente compreensíveis interessa dizer que a
remuneração média na empresa Autoeuropa em 2003, quando
os salários dos trabalhadores foram congelados, rondava os 950 euros por
mês; portanto durante os 2 anos os trabalhadores receberam em
média por mês 950 euros, mais 22,91 euros, que resulta do
complemento de 550 euros dividido por 28 meses (os 2 anos do congelamento
incluindo os subsídios de férias e natal), o que dá, em
média, 969,64 euros por mês.
Como mostram os dados do quadro III, a proposta que a empresa apresentou em
Novembro de 2005 determinava um aumento na remuneração
média dos trabalhadores da Autoeuropa de apenas 2,5% para um
período de 15 meses, durante o qual o Banco de Portugal previa que a
taxa de inflação aumentasse em 3,1%, o que determinava uma nova
redução do poder de compra dos trabalhadores da Autoeuropa a
juntar ao que perderam durante o período 2003-2005 em que os seus
salários estiveram congelados.
A proposta apresentada pela Autoeuropa em Janeiro de 2006 devido à luta
dos trabalhadores da Autoeuropa, apesar de terem contra si o ministro da
Economia e o secretário geral da UGT que em declarações
publicas se colocaram ao lado da empresa contra os trabalhadores; repetindo, a
segunda proposta apresentada pela empresa em Janeiro de 2006 determina um
aumento na remuneração total média de 3,3%. E tem ainda a
vantagem de vigorar para apenas um período de 12 meses, quando a
primeira proposta da Autoeuropa era para vigorar durante 15 meses. E o Banco de
Portugal, prevê que a taxa de inflação aumentará nos
próximos 12 meses 2,5% , que é inferior ao aumento médio
de 3,3% na remuneração média que calculamos.
Em resumo, a proposta da empresa apresentada em Janeiro de 2006 não
permite recuperar o poder de compra perdido durante o período em que os
salários da tabela estiveram congelados (2003-2005), mas permite que os
trabalhadores não percam mais poder de compra em 2006, o que não
sucedia com a proposta apresentada pela empresa em Novembro de 2005. No
entanto, existe um ponto que não conseguimos calcular, por falta de
dados, as consequências para os trabalhadores que é a
redução em 100% da remuneração do trabalho
suplementar feito ao sábado. Mas mesmo neste ponto a proposta que a
empresa foi obrigada a fazer em Janeiro de 2006 devido à luta dos
trabalhadores é mais favorável do que a de Novembro de 2005. De
acordo com a proposta da empresa de Novembro de 2005 a redução
era em todos os sábados e para sempre. Segundo a proposta de Janeiro de
2006, a redução já é em sábados alternados e
durante 5 sábados. Interessa dizer que esta proposta da empresa viola o
CCT do sector que legalmente se sobrepõe a ela e por isso, a nosso ver,
poderá ser sempre impugnada.
15/Janeiro/2006
[*]
Economista,
edr@mail.telepac.pt
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