Aumento do Custo de Vida

Degradação das condições económicas e sociais para a generalidade dos portugueses

por CGTP-IN

O ano de 2011 é marcado por um acentuado aumento do custo de vida, concretizado pela subida da generalidade dos preços dos e bens e serviços acompanhado da redução do rendimento das famílias.

A partir de cálculos da CGTP-IN com valores, podemos afirmar que, a não serem revistas as medidas do Governo, a quebra no poder de compra será superior a 120€ mensais e a 1.440€ anuais.

Aumento dos preços

A saída da crise, ao invés da apregoada mudança e de "que nada seria igual" após o colapso do sistema económico e financeiro, traz para 2011 o aprofundamento da principal causa da presente situação, ou seja, o acentuar da redução do poder de compra das famílias, plasmada numa acentuada quebra da parte da riqueza que é distribuída sob a forma de salário, com consequente aumento da retribuição do capital.

O aumento do custo de vida em 2011, por via da acção do Governo, atingirá a maioria das famílias, com um conjunto significativo de preços de bens e serviços a sofrer um aumento superior ao da inflação. É o caso:

  • Do pão que, no caso de uma família com um consumo diário de 10 unidades, agravará o orçamento anual em 72€;
  • Da electricidade, com um aumento de 18,51€ por ano;
  • Dos transportes, com um aumento que, no caso de uma família com passe social, será superior a 50€ anuais;
  • Dos combustíveis que, no caso de uso esporádico de veículo próprio, pode representar um aumento de 240€ por ano;
  • Da habitação, com um aumento das taxas de juro de curto prazo (das quais resultam a fixação/actualização dos empréstimos à habitação) a significarem uma subida de 590€ anuais, valor que será superior para um conjunto alargado de famílias, em especial das mais jovens, com compra recente de habitação própria;
  • Do IVA, que sobe de 21% para 23%, o que se traduz em aumento superior a 9,5% (2pp. em 21%).
Além destes aumentos o Governo, por via do Orçamento de Estado com o acordo do PSD, introduziu novos encargos para os trabalhadores e as populações que se traduzem numa degradação no acesso a bens e serviços essenciais:

  • Na saúde, com a retirada da comparticipação que era a 100% em diversos medicamentos, a par da alteração na classificação de medicamentos, ou seja, do inevitável aumento no preço dos medicamentos e com a subida das taxas moderadoras e o acréscimo de exames e certificados médicos. Como exemplo dos efeitos na subida do preço dos medicamentos temos:
Nome
Custo
Custo com anterior comparticipação
Custo actual com redução da comparticipação
Estado
Utente
Estado
Utente
Omeprazol (medicamento genérico, para as úlceras de estômago)
31,89 (+9€ suportados pelo doente)
22,00€ 9,89€ 11,9 18.89
CIPRALEX (Antipsicótico)
+ 12€ suportados pelo doente
  12€   24€
Anti-diabético
30€ (+1.35€ suportados pelo doente)
28,5 1,5 27,15 2,85
  • No ensino e na formação profissional, com a retirada de bolsas no ensino superior, a redução da acção social escolar no ensino básico e secundário e a redução de bolsas de formação profissional e nos estágios;
  • Nas acessibilidades, com a introdução de portagens em vias que estavam livres de pagamento;
  • Na generalidade dos serviços públicos, com o aumento de taxas cobradas pelo Estado (no âmbito da Administração Interna, Justiça…).

Sistematizando, ainda que não colhendo o efeito de todas as medidas:

Despesas mensais

Valores em euros
2010
2011
D em €
Ano
Mês
Ano
Mês
Ano
Mês
TOTAL 8161,56 680,13 9264,6 772,05 1103,04 91,92
Aumento do Pão, pressupondo o consumo médio de 10 unidades 612 51 684 57 72 6
Habitação; despesas com água, electricidade, gás e outros combustíveis 5086,2 423,85 5735 477,92 648,84 54,07
dos quais electricidade (consumo médio) 487,2 40,6 505,71 42,14 18,48 1,54
dos quais habitação (resultante do aumento da taxa de juro) 4202,76 350,23 4793,4 399,45 590,64 49,22
dos quais água gás e outros combustíveis 396,24 33,02 435,89 36,32 39,6 3,3
Transportes 2463,36 205,28 2845,57 237,13 382,2 31,85
dos quais transporte público (com aumentos médios de 4,5%) 1045,08 87,09 1092,08 91,01 47,04 3,92
dos quais transporte individual (actualizando o preço em conformidade com aumento registado em 2010) 1418,28 118,19 1560,14 138,12 239,16 19,93
dos quais utilização esporádica de uma SCUT (que passa a ser portajada a 0,08€/km)     96 8 96 8
Fonte: CGTP-IN, a partir de INE, Anuário estatístico 2009, actualizando as despesas médias de um agregado familiar pelos valores da inflação até 2010. Os aumentos de 2010 para 2011 foram realizados a partir de algumas medidas implementadas/anunciadas pelo Governo, contabilizando-se os aumentos nos transportes e nos custos com habitação e electricidade a partir das medidas anunciadas e, no caso dos combustíveis, conforme os aumentos verificados em 2010. Não são captados aumentos na saúde nem no ensino.

Redução do rendimento das famílias

A pressão para a contenção e redução salarial, desencadeada pelo Governo com o patrocínio do grande patronato, sistematiza-se em Portugal por uma diversidade de formas que atinge a generalidade dos trabalhadores e dos pensionistas portugueses.

Em termos sumários, não captando todas as implicações das medidas do Governo, podemos verificar que a perda de rendimentos será muito significativa e terá consequências assinaláveis para milhares de trabalhadores, pensionistas e suas famílias.

A contenção/redução salarial será consequência:

  • Do não cumprimento do acordo sobre a actualização do salário mínimo nacional (SMN), com uma perda de 15€ mensais;

Perda de rendimentos líquidos

 
2011
(cumprido acordo)
2011
D em €
Ano
Mês
Ano
Mês
Ano
Mês
Trabalhador a receber o SMN 7000,00 500,00 ? 485,00 ? -15,00


  • Da redução, na administração publica e sector empresarial do estado, do vencimento daqueles que auferem mais de 1.500€ brutos, podendo atingir 10% do rendimento e nunca menos que 3% e o congelamento para os restantes trabalhadores, a par do aumento em 1 pp dos descontos para a ADSE;
Perda de rendimentos líquidos

 Valores em euros
2010
2011
D em €
Trabalhador da Administração Pública ou Sector Empresarial do Estado com salário Bruto de 1550€ em 2010 15949,50 1139,25 15495,97 1106,86 -453,53 -32,40


  • Da retirada, ou redução do abono de família, afectando mais de 1 milhão e 400 mil crianças e jovens;

Perda de rendimentos líquidos

 Valores em euros
2010
2011
D em €
Casal com um filho de 9 meses e rendimento líquido de 1.172€ em 2010 17198,3 1228,45 16226 1159 -972,3 -69,45
Nota: neste exemplo partimos de salários brutos de 800€ e 500€ em 2010, para cada um dos cônjuges, sendo que os rendimentos líquidos em 2010 são acrescidos de 56,45€ do abono de família e a perda de rendimentos em 2011 incorpora a retirada do abono.

  • Da redução, num sentido ainda mais restritivo, do direito ao subsídio social de desemprego e ao rendimento social de inserção, que já com o presente enquadramento negava a mais de 250.000 trabalhadores no desemprego quaisquer prestações sociais;

Perda de rendimentos líquidos

 Valores em euros
2010
2011
D em €
Trabalhador no desemprego, com descontos durante um ano 6904,10 493,15 0,00 0,00 -6904,10 -493,15

Não estando reflectido nos cálculos que em cima apresentamos, há ainda o congelamento do valor das pensões e o congelamento de salários, ou aumentos inferiores à inflação no sector privado que, segundo projecções do Banco de Portugal, se traduzirão numa quebra do rendimento disponível das famílias de 2,4%.

Degradação do nível de vida, aumento das desigualdades e estagnação económica do país

As consequências e efeitos da aplicação do aumento dos preços de bens e serviços essenciais, a par da redução do rendimento das famílias (daquelas que vivem do seu trabalho, pois para os detentores de capital dos grandes grupos económicos as opções políticas garantem a manutenção e o aumento dos seus rendimentos), terão como consequência uma brutal degradação das condições de vida.

Como se não bastasse, as desigualdades sociais irão aumentar, aqueles que serão empurrados para o limiar, ou mesmo para baixo do limiar de pobreza, aumentarão.

O país vai entrar em recessão, prevendo o Banco de Portugal uma quebra de 1,3% da riqueza criada em 2011, valor que não será compensado em 2012, ou seja, daqui a dois anos, estaremos no nível de riqueza criada de 2007. São mais cinco anos perdidos para o desenvolvimento do país, da elevação das condições de vida dos trabalhadores e da generalidade do povo, cinco anos que só aproveitou uma minoria para arrecadar ainda mais riqueza, cinco anos aos quais muitos outros se vêm juntando.

Manutenção dos lucros escandalosos dos grandes grupos económicos e financeiros

O Governo, e os partidos da direita, não estão interessados na justiça social. Pelo contrário, toda a política que vêm implementando ao longo das últimas décadas reflecte uma opção de classe pelos grandes grupos económicos e financeiros, que vão arrecadar lucros recorde em 2010.

Só nos primeiros nove meses de 2010, são já mais de 9.802.262.587€ os lucros líquidos (já depois de impostos) de 21 Grupos, um aumento superior a 150% face aos primeiros nove meses de 2009.

No conjunto das 21 empresas estão, fundamentalmente, instituições determinantes na garantia de serviços e bens essenciais às populações e, na sua maioria, privatizados ao longo das últimas duas décadas.

Lucros dos Grandes Grupos Económicos
 
2010   (9 Meses)
2009   (9 Meses)
D
SECTOR FINANCEIRO
BES 490.196.000 392.371.000 97.825.000,00
BPI 223.400.000 197.300.000 26.100.000,00
SANTANDER TOTTA 359.300.000 401.300.000 -42.000.000,00
MILLENIUM/BCP 259.900.000 190.300.000 69.600.000,00
CGD 140.222.000 373.148.000 -232.926.000,00
SECTOR ENERGÉTICO
EDP 870.200.000 835.200.000 35.000.000,00
EDP RENOVÁVEIS 23.100.000 70.000.000 -46.900.000,00
REN 79.200.000 116.300.000 -37.100.000,00
GALP 355.000.000 260.000.000 95.000.000,00
COMUNICAÇÕES
ZON 32.900.000 42.500.000 -9.600.000,00
PT 5.617.000.000 195.600.000 5.421.400.000,00
CONSTRUÇÃO
CIMPOR 175.300.000 183.600.000 -8.300.000,00
Soares da Costa 6.024.587 6.647.588 -623.001,00
MOTA-ENGIL 38.478.000 75.635.000 -37.157.000,00
Teixeira Duarte 52.002.000 -11.000 52.013.000,00
GRANDE DISTRIBUIÇÃO
SONAE (resultados directos) 141.000.000 108.000.000 33.000.000,00
J. MARTINS 210.000.000 151.000.000 59.000.000,00
PRODUÇÃO DE PASTA DE PAPEL
SEMAPA 125.700.000 71.700.000 54.000.000,00
PORTUCEL 154.300.000 72.500.000 81.800.000,00
ALTRI 47.340.000 -12.021.000 59.361.000,00
EXPLORAÇÃO DE VIAS DE COMUNICAÇÃO
BRISA 401.700.000 105.100.000 296.600.000,00
TOTAL 9.802.262.587 3.836.169.588 5.966.092.999,00
TOTAL / DIA 35.905.724 14.051.903 21.853.821


Os lucros não param de aumentar!

Os dados conhecidos em relação a 2010, indiciam que este foi um ano ímpar na obtenção de lucros. Só os quatro maiores bancos a operar em Portugal registaram um aumento dos seus resultados líquidos superior a 8,2%, qualquer coisa como mais 135.113 mil €.

Resultados líquidos

Unidade: euros
 
2010
2009
BES 656 991 000 575 092 000
MILLENIUM / BCP 360.916.000 249.302.000
BPI 290.500.000 273.900.000
SANTANDER TOTTA 457.000.000 532.000.000
TOTAL 1.765.407.000 1.630.294.000
TOTAL / DIA 4.836.732 4.466.559
D em €
135.113.000
D em %
8,29%

Propostas para uma ruptura que concretize a mudança necessária – crescimento económico e justiça social

Portugal não pode continuar refém de um modelo assente em exclusivo nas exportações, que faz tábua rasa do peso das importações e do contributo da procura interna para a dinamização económica.

Para a CGTP-IN é essencial que as exportações sejam consideradas num quadro de complementaridades, que a substituição de importações por produção nacional seja uma realidade, com a procura interna a desempenhar um papel determinante no relançamento económico.

Para tal, para além de medidas que privilegiem e defendam, no quadro de excepcionalidade que vivemos, a produção nacional direccionada para o mercado externo, mas também interno, o aumento dos salários e das pensões, ou seja, o aumento do poder de compra da generalidade da população é fundamental do ponto de vista económico, com um alcance em termos de justiça social que se exige.

Para a CGTP-IN a promoção do emprego, o combate à precariedade e ao desemprego, à exclusão social e à redução de prestações sociais, têm de estar no centro das políticas implementadas e não pode ficar dependente de conjunturas, nem muito menos do comportamento da procura externa.

O aumento das receitas fiscais, por via do combate à fraude e evasão, o fim dos paraísos fiscais, uma maior justiça e progressividade dos impostos num quadro de colocar a pagar mais quem mais pode, no caso concreto os grandes grupos económicos e financeiros, são elementos que permitirão aliviar as famílias dos cortes salariais e do aumento de preços que se perspectivam para 2011.

Lisboa, 25/Fevereiro/2011

O original encontra-se em http://www.cgtp.pt/index.php

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