por Associação de Combate à Precariedade
Cinco meses depois do repto lançado no Fórum Precariedade e
Desemprego, a Associação de Combate à Precariedade
Precários Inflexíveis, avançou na sua proposta de
apresentar um plano concreto para combater a precariedade e desemprego no
país, com propostas que poderão melhorar a vida para os mais de 2
milhões e 850 mil pessoas em situação de desemprego e
precariedade no país, que já constituem 55% de toda a
força de trabalho.
A ACP-PI apresenta as linhas mestras para o trabalho que se iniciará
agora, sob a forma de campanha aberta, com reuniões e discussões
temáticas para aprofundamento das propostas. A associação
interpelará diversos actores sociais e politicos, nomeadamente no
âmbito das eleições legislativas, para que tomem
posição acerca das questões que afectam a maioria da
população activa, pessoas precárias e desempregadas.
Segundo a OIT
[1]
, os trabalhadores precários em Portugal recebem apenas 60% do
salário dos contratados sem termo, com uma taxa de pobreza que atinge os
25%.
Os eixos principais a ser discutidos estão expostos nos sete
capítulos seguintes:
1. Novos Riscos, Novas Respostas Segurança Social
2. Reforço do Mecanismo de Regularização dos Falsos Recibos
Verdes
3. Novo Regime de Contribuições e Direitos para os Recibos Verdes
4. O Buraco Negro do Trabalho Temporário
5. Contra a Eternização da Precariedade na
Investigação
6. Nem Estágios Profissionais Nem Estagiários Profissionais
7. Pelo fim da Perseguição no Desemprego
Este documento é a base para o trabalho dos próximos meses da
Associação de Combate à Precariedade
Precários Inflexíveis.
Maio de 2015
1. Novos riscos? Novas respostas! Segurança Social
Hoje a precariedade e o desemprego afetam mais de metade da
população ativa e mesmo os trabalhadores mais estáveis
estão mais instáveis do que nunca, com carreiras contributivas
intermitentes, com milhares de pessoas que não conseguem manter o
emprego tempo suficiente para cumprir os prazos de garantia e com outros tantos
expulsos do subsídio de desemprego por se terem alterado os tempos de
atribuição da prestação social e o seu valor. A
estatística do país com a terceira maior taxa de precariedade e
de baixos salários da União Europeia é trágica: um
em cada dois desempregados não tem apoio social. Porque defendemos o
direito ao trabalho, defendemos a proteção de quem não tem
trabalho.
A Segurança Social de hoje foi desenhada após a
Revolução de 1974 e durante muito tempo significou uma resposta
eficiente e eficaz aos riscos sociais que a sociedade portuguesa enfrentava. Na
última década o cenário mudou e um novo risco social mudou
tudo: a precariedade.
Um sistema que tinha sido construído solidariamente para proteger quem
não tinha podido descontar e quem tinha descontado pouco, garantindo o
princípio da substituição do rendimento do trabalho para
quem deixava de poder trabalhar, tinha os seus alicerces em carreiras
contributivas longas, com curtos períodos de desemprego, e com um
aumento progressivo da massa salarial. As últimas décadas foram
mudando este cenário e apareceu um novo alibi: a demografia. As reformas
legislativas não foram pacificas e, sob o signo da sustentabilidade,
cortaram-se direitos e rendimentos, mas não se protegeram os novos
riscos sociais.
Os anos da troika e o regime de austeridade abriram uma ferida profunda na
sustentabilidade do sistema e aceleraram a conversão do mercado de
trabalho para a precariedade e baixos salários como regra, com cada vez
menos proteção social. Neste momento o sistema não
é universal, porque exclui uma enorme camada da população.
Novos riscos
Precariedade
A precariedade é um
novo risco social
que o atual sistema não comporta e que é complexo. É um
novo risco social porque afeta milhões de pessoas e porque o sistema
atual não está pensado para intermitências
trabalho/desemprego cada vez mais rápidas, com períodos alargados
de não-atividade e com taxas de sub-emprego alarmantes, como é o
caso do part-time involuntário, que afecta centenas de milhares de
pessoas.
Desemprego de massas: alto, estrutural e de longa duração
O subsídio de desemprego foi pensado para substituir o rendimento de um
trabalhador durante o período em que este procurava um novo emprego.
Esta resposta faz sentido num cenário em que a taxa de desemprego
é baixa e em que o desemprego de longa duração não
é um problema. Há muitos anos que essa já não
é a realidade em Portugal. Depois da austeridade e das
alterações ao subsídio de desemprego esta
prestação social está a funcionar como um conta gotas para
apagar um incêndio.
Desde há 5 anos, o desemprego oficial passou a ler-se em dois
dígitos e mesmo depois da emigração massiva de mais de 400
mil pessoas, o desemprego em sentido lato afeta hoje perto de um milhão
de pessoas. Entre 2007 e 2014 o desemprego jovem duplicou, com a crise
económica a explicar 70% do crescimento do desemprego jovem. O
desemprego de longa duração cresceu mais de 100% nos anos da
austeridade e as estatísticas revelam que 8 em cada 10 desempregados com
mais de 45 anos não conseguem encontrar emprego. Sejamos claros: o
desemprego é o maior problema que o país enfrenta.
A "retoma económica" será sempre uma miragem enquanto
se mantiver o regime de austeridade e isso é claro no nível de
emprego, o pior da Europa, depois de ter recuado para níveis de meados
dos anos '90 do século passado.
A Segurança Social tem de dar resposta ao desemprego de massas enquanto
persistir a crise social porque o modelo atual é um modelo de
exclusão, sendo apenas uma porta giratória entre o trabalho
precário e a pobreza.
Novas respostas
Se um precário é um desempregado intermitente e se um
desempregado tem hoje poucas hipóteses de deixar de ser precário
então é vital que a Segurança Social encontre formas de
apoiar quem cai nesta espiral.
Em 2013 lançámos o desafio: nenhum desempregado pode ficar sem
apoio no desemprego e os recursos orçamentais para suportar esta medida
devem ser encontrados junto das empresas que maiores lucros fazem como
resultado da precariedade e desemprego.
Relembre-se que, de acordo com o INE
[2]
, durante o programa da troika o rendimento salarial caiu de 65,5% do
rendimento disponível para 62,4%, tendo os rendimentos de capital subido
para 36,4%. Ou seja, a austeridade retirou 5,8 milhões de euros dos
salários e transferiu para o fator capital 4,4 mil milhões.
A austeridade alterou as regras do jogo, fazendo com que os salários,
também por via do aumento da precariedade e do desemprego, perdessem
para os ganhos de capital. Assim, cumprindo a sua função de
redistribuitiva e combatendo mais este efeito preverso da austeridade, é
necessário que nenhum desempregado fique sem apoio.
Da mesma forma, é importante que as regras de atribuição
do subsídio de desemprego sejam revistas de forma a garantir que os
estagiários e também os trabalhadores a part-time têm
acesso a prestações sociais durante os períodos de
inatividade.
São necessárias alterações que permitam combater o
problema do desemprego de longa duração, do desemprego jovem e
dos trabalhadores precários com prazos de garantia curtos; para
além de terem enormes vantagens por atuarem como estabilizadores
automáticos, permitindo redinamizar o investimento económico.
A precariedade e o desemprego estrutural são novos riscos e portanto
exigem novas respostas que o sistema não prevê e, da mesma forma,
exigem novas formas de financiamento. Os recursos necessários para esta
mudança no seguro social universal deve, no entanto, ter uma premissa de
redistribuição, pelo que deve encontrar o financiamento
necessário junto daqueles que ganham com a precariedade e o desemprego
alto. Abandonar esse princípio redistribuitivo e desistir do combate
à precariedade e ao desemprego estrutural é desistir do direito
ao trabalho abandonando o pleno emprego a uma visão de mercado do que
é trabalhar. Por isso, deve ser no combate pelo pleno emprego que se
investe o que é capturado a quem lucra com a precariedade e o desemprego.
Com o próposito de abordar de frente estes problemas, é urgente:
1) Estender a protecção no desemprego a todos os desempregados,
com um apoio no desemprego a todas as pessoas que ficaram desempregadas nos
últimos quatro anos.
2) Aplicar
uma taxação especial sobre os lucros das empresas que utilizam o
modelo de precariedade laboral
, com elevada rotação laboral para a sua actividade
económica.
2. Reforço dos mecanismos de regularização de falsos
recibos verdes
Os falsos recibos verdes são uma das mais persistentes e agressivas
estratégias de precarização, à margem da lei e do
respeito pelos direitos mais elementares no trabalho. Ao não permitir o
acesso ao direito básico ao contrato de trabalho, as entidades patronais
aplicam a precariedade máxima. Sem qualquer protecção, os
trabalhadores, formalmente e à força considerados independentes,
são ilegalmente afastados de direitos como o gozo de férias, o
pagamento de subsídio de férias e natal ou a
regulação dos ritmos e horários de trabalho. Além
disso, têm ainda de assumir todos os meses e isoladamente o pagamento das
contribuições à Segurança Social, enquanto as
entidades patronais fogem às suas obrigações.
Depois de décadas em que se banalizou esta escandalosa ilegalidade, um
primeiro passo foi dado com a aprovação da nova lei de combate
aos falsos recibos verdes. Esta mudança, que partiu da proposta e da
iniciativa dos cidadãos, introduz pela primeira vez na
legislaçãomecanismos concretos para facilitar a
regularização destas situações.
Mais de um ano após a entrada em vigor da Lei nº 63/2013, sendo
certo que se obtiveram resultados concretos e inéditos, é
evidente que é preciso bastante mais para garantir um verdadeiro combate
aos falsos recibos verdes. Assim, é urgente um aprofundamento dos
mecanismos para a regularização das situações
ilegais e o reconhecimento da relação laboral:
1)
Garantir uma maior protecção ao trabalhador
, que continua vulnerável perante a possibilidade de chantagem e
represálias por parte das entidades patronais:
a) No momento em que a irregularidade é detectada:
deve ser assegurado um reforço das competências da Autoridade para
as Condições do Trabalho
, que, perante a recolha de indícios claros de falso trabalho
independente no âmbito das suas acções inspectivas, deve
ter à sua disposição mecanismos que garantam o cumprimento
da lei previamente à via judicial.
b) Nos casos em que a situação segue para tribunal:
garantir que a acção de reconhecimento do contrato de trabalho
prossegue os seus objectivos
, defendendo os legítimos interesses público e do trabalhador,
mesmo quando existe uma aparente concordância das partes (empregador e
trabalhador) na situação potencialmente irregular.
reflectir sobre o efeito prático da tentativa de
conciliação no âmbito do processo
, considerando a situação de especial vulnerabilidade do
trabalhador.
reavaliar a possibilidade do trabalhador ser arrolado como testemunha do
empregador
, tendo em conta os seus eventuais efeitos.
2)
Assegurar a rápida e directa concretização dos direitos
resultantes do reconhecimento da relação laboral
: nomeadamente, a regularização das contribuições
para a Segurança Social por parte das entidades empregadoras.
3. Um novo regime de contribuições e direitos para os recibos
verdes
O actual regime de contribuições para quem trabalha a recibos
verdes é injusto, inadequado e impraticável. Porque resistiu
às mudanças necessárias, com adaptações que
apenas agravaram as injustiças, há muito deixou de responder
à realidade.
O trabalho considerado independente banalizou-se e passou a incluir centenas de
milhares de pessoas, maioritariamente com baixos rendimentos e de todos os
sectores de actividade. Apesar disso, mantiveram-se os traços essenciais
de um sistema pensado, há várias décadas, para enquadrar
um contingente relativamente reduzido de profissionais liberais, quase sempre
com autonomia e rendimentos acima da média: descontos desligados dos
rendimentos reais, no valor e no tempo; uma taxa contributiva muito elevada;
escalões de base de incidência, que pretendem suavizar o peso das
contribuições à custa da carreira contributiva; regras
complexas e burocracia excessiva, tornando o sistema incompreensível
para a maioria; acesso restrito e insuficiente aos apoios sociais que deveriam
decorrer das contribuições.
Hoje é inegável que, em vez de ser um instrumento de apoio e
solidariedade, este regime se transformou numa fonte de exclusão.
Perante a amplitude dos problemas que o sistema foi criando, que se acumulam e
têm consequências cada vez mais graves, o diagnóstico
é amplamente reconhecido e consensual. No entanto, as
opções políticas têm até agravado a
situação: em vez da mudança necessária, sucedem-se
remendos que tornaram o sistema ainda mais complexo e injusto. Os resultados
estão à vista: milhares de pessoas afectadas por erros sucessivos
por parte da Administração, acumulação de
dívidas, incompreensão e desvinculação dos
trabalhadores e trabalhadoras relativamente ao sistema.
É inadiável romper com a opção de tentar manter, a
todo o custo, um sistema irreformável e insustentável. Assim,
é urgente criar um novo regime de contribuições e
benefícios para o trabalho a recibos verdes, que seja simples,
praticável, justo, adequado e defenda a sustentabilidade do sistema:
1) Descontos no tempo certo
: as contribuições devem ser feitas com base nos rendimentos
apurados em cada momento, eliminando o actual ciclo de
contribuições de valor fixo com referência a rendimentos
verificados há mais de um ano. Em cada mês, deve ter-se como
referência um período curto imediatamente anterior.
2) Descontos com base no valor real dos rendimentos
: a base de incidência deve corresponder aos rendimentos reais,
eliminando os escalões. Desta forma, diminui-se a complexidade, os
descontos tornam-se compreensíveis e deixa-se de prejudicar a carreira
contributiva para compensar o peso de uma elevada taxa contributiva. Termina,
assim, a obrigatoriedade dos descontos quando não há rendimentos.
3) Uma taxa contributiva justa
: deve ser aplicada ao trabalhador uma taxa substancialmente mais baixa do que
os actuais 29,6%. Essa redução deve ser alcançada
através da responsabilização das entidades empregadoras e
da eliminação das isenções injustificadas por
acumulação com trabalho dependente.
4) Acesso real a direitos
: equiparar a protecção na doença, no desemprego e na
assistência a familiares ao regime dos trabalhadores por conta de outrem.
A taxa contributiva deve corresponder a uma verdadeira cobertura das
eventualidades e riscos previstos, ao contrário da
situação actual.
5) Simplicidade, rigor e responsabilização da
Administração
: o regime deve ser previsível e compreendido pelas pessoas abrangidas,
critérios essenciais para garantir a adesão e diminuir os
incumprimentos. Para o pagamento das contribuições, os
serviços devem emitir atempadamente um recibo, em cada mês, onde
conste o valor, a base de incidência e a taxa aplicadas, bem como o prazo
para pagamento.
6) Uma nova abordagem na gestão e cobrança das dívidas
: perante a gravidade e urgência da situação actual, deve
ser implementado um verdadeiro plano de regularização, que,
salvaguardando a sustentabilidade do sistema, tenha em conta a real
situação em que as dívidas foram contraídas e a
condição económica do devedor. O plano deve incluir
mecanismos de detecção e co-responsabilização das
entidades empregadoras incumpridoras, bem como de avaliação
rigorosa e tratamento diferenciado das situações de
insuficiência económica. Desta forma, deve terminar o recurso
generalizado aos processos coercivos e assegurada a impenhorabilidade de bens
essenciais, como a habitação de uso permanente.
4. O Buraco Negro do Trabalho Temporário
O trabalho temporário tem-se imposto enquanto uma das novas formas de
contratação moderna, aclamada como necessária face
à crise e face às alterações do mercado e às
regras ditadas por ele. Os mercados dizem que regimes como o do trabalho
temporário são essenciais para o desenvolvimento da economia,
já que a flexibilização do Direito do Trabalho tem sido
vendida como se alma dos negócios. Para impor a visão de que
não há alternativas insiste-se em defender um regime
jurídico que não serve mais do que para desresponsabilizar os
empregadores dos deveres a que estariam sujeitos caso tivessem um
vínculo directo com quem lhes presta o serviço ou produz o
objecto do seu negócio. O trabalho temporário é
flexível apenas na medida em que promove o despedimento fácil e
barato e poupa as empresas utilizadoras do que consideram ser custos
dispensáveis associados à contratação directa de
trabalhadores.
O esquema de contratação mediado por Empresas de Trabalho
Temporário (ETT), que reduz os trabalhadores a meros recursos
transaccionáveis no mercado laboral e ao serviço dos governos
já vem de longe. O plano de patrocinar as ETT's enquanto empresas
privadas de emprego por excelência passa agora por banalizar este regime,
ao ponto de ser já comum que uma empresa utilizadora recorra a
várias ETT's, como forma de contornar o período limite
estabelecido por lei para o uso de um mesmo trabalhador por parte de uma
empresa utilizadora. A concessão de algumas áreas do IEFP a
empresas de trabalho temporário, aprovado pelo actual ministro Mota
Soares é um exemplo acabado de como o modelo do trabalho
temporário se nutre das fragilidades da situação do
desemprego sem amparo e sujeito a grandes tensões. A abertura desta
"área de negócio" constitui uma
privatização dos desempregados e contribui para o contínuo
declínio salarial.
Dada a legislação dúbia e mais defensora das empresas
utilizadores e empresas de trabalho temporário do que dos trabalhadores,
há que saber o que estes pensam e como encaram este (não)
vínculo laboral, para melhor se perceber as necessidades de quem sofre
diariamente na pele esta forma precariedade.
A Associação de Combate à Precariedade
Precários Inflexíveis já apresentou, em conjunto com
outras organizações e no âmbito de uma Iniciativa
Legislativa de Cidadãos que reuniu mais de 40 mil
subscrições, uma proposta concreta de combate ao trabalho
temporário, no artigo 3º da Lei Contra a Precariedade, neste plano
mantemos a mesma proposta, que pode ser lida no ponto 5) infra-referido.
Dada a importância de reverter a situação criada, com forte
dinamização por parte do Estado através do Governo, da
utilização inequívoca dos recursos públicos na
utilização e promoção de empresas de trabalho
temporário, a ACP-PI propõe:
1) A proibição da utilização de ETTs em organismos
públicos
ou contratando para funções públicas, o IEFP e o INA
têm amplamente as condições para realizar este
serviço, que é a sua função, sem ter que financiar
e criar lucros para empresas terceiras;
2) Reversão imediata da entrada das ETTs no IEFP
;
3) Agravamento fiscal para as ETTs
, aumentando as
contribuições para a Segurança Social
, devido à elevada rotação que as mesmas praticam, para
financiar a protecção dos trabalhadores em trabalho
temporário, e
reduzindo-se o seu período mínimo de descontos para acesso ao
subsídio de desemprego;
4) Regular as ofertas de emprego
, com total transparência de utilizadores finais, rendimentos,
diferencial entre o salário pago às ETT e o salário pago
aos trabalhadores e demais informações relevantes para a
situação dos candidatos e candidatas;
5) Estabelecer legalmente que
"O utilizador da actividade, ou empresas do mesmo grupo económico,
de um trabalhador com contrato de trabalho temporário ou contrato de
trabalho por tempo indeterminado para cedência temporário por um
período superior a um ano, ou que acumule vinte meses de trabalho no
período de dois anos, fica obrigado à celebração de
contrato de trabalho, desde que tal corresponda à vontade do trabalhador
e sempre em condições iguais ou mais favoráveis do que
aquelas em que é prestada a actividade."
, isto é, que o trabalho temporário não pode ser usado
abusivamente e de forma permanente.
6) Limitar o âmbito da utilização do trabalho
temporário a actividades estritamente temporárias a serem
definidas legalmente, com um número máximo de três
renovações contratuais admissíveis.
5. Contra a eternização da precariedade na
Investigação
Em 2014, um inquérito feito pela ACP-PI a investigadores revelou a
alarmante realidade do tecido científico em Portugal: a grande maioria
dos investigadores são eternos bolseiros, dificilmente têm acesso
a um contrato de trabalho e perante a sua condição
precária, pretendem emigrar. 77,8% dos investigadores nunca tiveram um
contrato de trabalho, apenas 15,7% têm um vínculo laboral e apenas
21,5% dos bolseiros rejeitam emigrar.
O facto da larga maioria da investigação ser assegurada por
bolseiros é uma estratégia de precarização de todo
o sector. A não existência de um vínculo laboral implica
que estas pessoas não são consideradas trabalhadoras e que, como
tal, não têm direito a subsídio de desemprego,
férias ou
13º mês, e a protecção social através da
segurança social a que têm direito é extremamente limitada.
Esta fragilidade tem sido levada a ponto de ruptura nos últimos anos
pelas opções de governação do executivo de Passos
Coelho. Nos concursos individuais de bolsas de doutoramento e de
pós-doutoramento, houve um corte extraordinário no número
de bolsas atribuídas (2031 bolsas de doutoramento e 914 bolsas de
pós doutoramento no concurso de 2007 passaram a passaram a 403 e 465,
respectivamente, no último concurso às quais se somam 15
bolsas individuais de doutoramento em empresas e 600 bolsas para programas
doutorais), a par de um aumento do número de pessoas que se candidatam.
Os concursos de investigador FCT, que assegurariam uma fase mais adiantada da
carreira de investigação e que, supostamente, garantiriam a
colocação em centros ou unidades de investigação e
universidades, são abertos com a promessa de contratar 1000
investigadores até 2016, como se esse número fosse suficiente.
Por exemplo, no concurso de 2013, candidataram-se 1489 pessoas e apenas 204
foram aceites. Por último, a avaliação dos centros de
investigação, ao qual todos os bolseiros estão ligados,
condenou à extinção imediata ou a curto prazo 168 dos 322
centros que foram avaliados. Todos estes concursos ou processos de
avaliação têm sido envoltos em enormes polémicas,
muitas dúvidas foram justamente levantadas acerca dos processos de
avaliação, e os concursos surgem invariavelmente com atrasos na
abertura, divulgação dos resultados e atribuição
das bolsas por parte da FCT. Para terminar, assistimos cada vez mais à
descarada utilização abusiva de bolsas para suprir postos de
trabalho, a maioria dos quais sem qualquer ligação à
investigação; anúncios de bolsas para jardineiros ou
electricistas já não são uma raridade.
As medidas urgentes que propomos para inverter o processo de precariedade
laboral que os investigadores estão a viver são:
1) Conversão das bolsas de investigação, de gestão,
de técnico e Investigador FCT em contratos laborais
. No caso das bolsas de doutoramento, se o primeiro ano de um projecto de
doutoramento é de aprofundamento dos estudos e de
preparação para os seguintes anos de desenvolvimento de uma
temática, a partir daí um bolseiro de investigação
começa a produzir conhecimento científico e por isso consideramos
que, findo o período académico, um bolseiro de doutoramento
deveria ter direito a um contrato de trabalho.
2) Ratificação da Carta Europeia do Investigador.
A 11 de Março de 2005 foi homologada a Carta Europeia do Investigador,
que estabelece um Código de Conduta para o Recrutamento de
Investigadores no espaço da União Europeia, reconhecendo que o
trabalho do Investigador começa logo a seguir à sua
graduação e estende-se a todos os outros níveis
superiores. Para além do contrato de trabalho, a Carta Europeia do
Investigador estabelece ainda que é dever das entidades empregadoras
e/ou financiadoras garantir ao Investigador condições de
financiamento e/ou de salários com regalias de Segurança Social,
onde o direito ao subsídio de desemprego e a colocação no
escalão correcto são asseguradas.
3) Vinculação dos bolseiros às instituições
de
investigação
. A precarização do trabalho de investigação por
via de bolsas tem o efeito natural de desvincular os investigadores das
instituições de investigação. Ao contrário
dos investigadores contratados, a grande maioria dos bolseiros não se
encontra enquadrada nas instituições onde trabalha, o que os
impede, por exemplo, de eleger e ser eleito para os órgãos de
gestão e aceder aos serviços das universidades e dos institutos.
4) Enquanto não se estabelecem os contratos de trabalho e para as
situações em que se possa justificar a atribuição
de bolsa,
criação de um mecanismo de reposição imediata pela
FCT da mensalidade paga pelo bolseiro relativamente ao Seguro Social
Voluntário, e actualização do reembolso segundo uma base
de incidência efectivamente correspondente ao valor recebido pelos
bolseiros
. Actualmente, o reembolso pago pela FCT para assegurar o pagamento do Seguro
Social Voluntário (SSV) corresponde a uma base de incidência de
apenas um IAS (Indexante dos Apoios Sociais), ou seja, o valor descontado pelos
bolseiros não corresponde ao seu salário real, mas a um valor
muito inferior. Além disso, a FCT está a promover um
distanciamento dos bolseiros à Segurança Social pelos atrasos que
acumula nos reembolsos do SSV. Hoje em dia, o valor da prestação
mensal são 124.09, 12.7% do salário de um investigador de
doutoramento, que a Fundação só reembolsa ao fim de
vários meses, ou seja, quando várias mensalidades se acumulam,
criando um grave peso no orçamento dos investigadores.
5) Fim dos efeitos retroativos nas alterações no estatuto do
bolseiro ou no regulamento das bolsas, se prejudicarem os bolseiros.
6) Aumento
estruturado e planeado
do número de bolsas atribuídas e de contratos investigador FCT
celebrados, de forma a que todos os investigadores tenham acesso a um concurso
justo e não uma roleta russa flutuando ao ritmo dos ciclos eleitorais.
7) Cumprimento de uma
calendarização de abertura de concursos de bolsas
académicas (doutoramento) que coincida com o ano lectivo.
Calendarização dos restantes concursos estabelecida anualmente na
mesma data
, e anunciada atempadamente.
8) Limitação do prazo entre os bolseiros assinarem o contrato e
começarem efectivamente a receber a bolsa para um mês
. Actualmente, os bolseiros assinam um contrato de exclusividade, mas o
processo de atribuição da bolsa pode-se arrastar por meses,
durante os quais os bolseiros não podem ter qualquer rendimento.
9) Actualização imediata do valor das bolsas
, o que não é feito desde 2002, significando isso que entretanto
os bolseiros perderam 21.7% de salário devido ao aumento da
inflação e do índice de preço ao consumidor.
9) Extinção da cláusula de exclusividade
nos contratos de bolsa e pagamento obrigatório sempre que houver oferta
curricular assegurada por bolseiros.
6. Nem Estágios Profissionais nem Estagiários Profissionais
De acordo com os dados do Banco de Portugal (Boletim de Inverno), os
estágios profissionais representaram um terço do emprego criado
durante o ano de 2014, camuflando os números reais de desemprego. A
economia portuguesa, que recuou nos níveis de emprego ao ano de 1996,
não cria empregos estáveis e com direitos. Segundo os dados do
IEFP (
Relatórios de execução física e financeira
),
apenas no ano de 2014, 70 mil trabalhadores foram abrangidos pelos chamados
"Estágios Profissionais", na sua grande maioria sob a
modalidade dos "Estágios Emprego". Entre 2001 e 2011, a
média anual era de apenas 25 mil estagiários.
A empregabilidade dos estágios, medida pelo número de
trabalhadores que são contratados pela empresa onde realizaram o
estágio, diminuiu em 2014 cerca de dez pontos percentuais em
comparação ao período homólogo de 2013. O
número de estagiários contratados pelas empresas não
acompanhou a subida exponencial do número de estagiários que
não são contratados, o que prova que os estágios
não são uma via para a criação de emprego
estável.
Cerca de metade dos trabalhadores jovens aceitou a realizou do estágio
por ter perdido o emprego, e os restantes são trabalhadores à
procura do primeiro emprego. A precariedade dos estágios já afeta
jovens e mais velhos, trabalhadores com experiência profissional e os
recém-licenciados, tornando-se num mecanismo cada vez mais comum de
contratação e precarização laboral em Portugal.
Por lei, um estágio não pode corresponder à
ocupação de um posto de trabalho, mas não é isso
que acontece na prática.. Com o agudizar da crise, empresas como a
SONAE, a EDP, a PT, unidades de saúde privadas e bancos como o BPI, o
BCP e o Banif, aumentaram o recurso aos estágios profissionais,
dividindo-os pelo seu universo empresarial.
Acresce o facto do IEFP demorar cerca de quatro meses no processamento do
pedido de estágio, o que resulta em períodos de trabalho
não pago, no qual a promessa de estágio é usada como arma.
Findo o estágio, é impossível aceder a apoio no desemprego
e férias pagas.
No caso do Programa de Estágios Profissionais na
Administração Local (PEPAL) e do Programa de Estágios
Profissionais na Administração Pública Central (PEPAC),
é o Estado a promover a precariedade: em 2015, mais de dois milhares de
trabalhadores serão abrangidos por estes programas que não
ultrapassam os 691 euros de remuneração. O recurso a estes
estágios é uma substituição de trabalhadores
públicos, aumentando a precarização e a instabilidade dos
vínculos.
Os conhecimentos técnicos e profissionais, assim como a
organização laboral acumulada por gerações,
são um património de todos. Recusamos que a experiência
profissional seja usada como um monopólio das empresas que submetem os
trabalhadores a uma competição onde têm pouco a ganhar e
muito a perder. Em Portugal precisamos de empregos, por isso recusamos a
precariedade dos estágios.
A Associação de Combate à Precariedade
Precários Inflexíveis promoveu já dois eventos de uma
campanha acerca de estágios chamada SOS Estagiários, de que
já participaram e debateram vários estagiários e outras
pessoas. Foram aprovadas as seguintes propostas:
1) Uma maior fiscalização por parte da ACT das
condições em que são celebrados e desempenhados os
estágios.
Os casos de estágios não remunerados e de estagiários
submetidos a condições de trabalho não previstas na lei
devem resultar em sanções pesadas para quem os emprega. A ACT
deve ainda criar uma linha de denúncias específica para o caso
dos estágios.
2)
Fim dos PEPAC e dos PEPAL
, por uma contratação pública, decente e transparente;
4) As empresas não podem usar os estágios como forma de
rotação de trabalhadores no mesmo posto de trabalho. Por isso,
defendemos a
limitação no atual critério de empregabilidade das
empresas (
Regulamento Estágios Emprego
) que recorrem aos estágios financiados, que devem ficar obrigadas
à contratação de um em cada dois estagiários, tendo
por referência o período dos últimos cinco anos, de forma a
poderem recorrer novamente à medida.
Este critério deve ser válido para todo universo empresarial do
grupo beneficiário, impedindo que as grandes empresas possam dividir os
estagiários pelas suas sucursais e assim camuflar o uso dos
estágios.
4)
Extensão obrigatória em 3 meses dos atuais Estágios
Emprego celebrados após a entrada em vigor do novo regulamento
, que encurtou de 12 para 9 meses o período de estágio, impedindo
estes trabalhadores de acederem ao subsídio de desemprego.
5)
Imposição do pagamento das 14 remunerações anuais
por parte da entidade contratante
, nos montantes e período correspondente ao tempo de estágio.
7. Pelo fim da perseguição no Desemprego
As mais recentes Estatísticas de Emprego do INE
[3]
revelam que a acelerada flexibilização do trabalho dos
últimos anos continua a promover o desemprego. A
facilitação dos despedimentos materializou-se em números
crescentes de despedimentos, individuais e colectivos, acompanhados de uma
aceleração do ritmo: trabalho precário, desemprego,
trabalho mais precário, desemprego. Oficialmente cifrada nos 13,7% de
desemprego, a taxa real estará nos 19,1%, incluindo os 280 mil inactivos
que o INE exclui das estatísticas. No total são 993,3 mil
desempregados em Portugal, e a percentagem de precários e desempregados
na força de trabalho também aumentou: são agora 55%.
É ainda de destacar que uma fatia importante das desempregadas e
desempregados em formação no IEFP, com Rendimento Social de
Inserção ou Contratos de Emprego Inserção,
designados como "ocupados", são excluídos dos
números oficiais do desemprego.
Com um desemprego tão elevado como o que vivemos neste momento
exi gem-se respostas em três áreas: reduzir os números de
desemprego com a criação de novos postos de trabalho, e, urgente
neste momento, apoiar os desempregados e as desempregadas de forma a que
ninguém seja abandonado e romper o ciclo vicioso
precariedade-desemprego.
A limpeza de centenas de milhares de desempregados dos números oficiais
e a enorme pressão e carga burocrática exercida sobre os mesmos
para a justificação da recepção dos apoios sociais
aos quais têm direito são problemas gravíssimos, a que
acresce terem crescentemente que aceitar empregos sem remuneração
em substituição de trabalhadores despedidos e necessários
ao funcionamento de vários organismos do Estado, escolas e
estabelecimentos de Saúde, através de Contratos
Emprego-Inserção e outros programas ocupacionais.
No sentido de criar emprego propomos:
1)
Redução da jornada de trabalho para as 35 horas, sem
diminuição de salário;
2) Lançamento de um
programa de emprego público (não precário)
para responder a necessidades permanentes na sociedade;
3)
Orientar políticas económicas públicas - incluindo ao
nível macro-económico (políticas monetárias e
orçamentais) - em função de
preocupações sociais, produtivas e ambientais e em
função de objectivos de criação e
proteção do emprego (combate à precariedade), garantia de
acesso à proteção social e de cidadania (por ex: liberdade
de escolha de emprego);
4)
Os serviços públicos, como é o caso do IEFP, devem passar
a estar organizados em função de objectivos da
promoção do emprego e não como mecanismo de ajustamento
entre a oferta e a procura de emprego, numa lógica que só
alimenta a precariedade.
Como medidas de resposta de emergência, propomos:
1)
Garantir protecção social a todas as pessoas desempregadas e
abolir a lógica persecutória que actualmente impera na
situação de desemprego oficial;
2)
Alteração da forma de cálculo da taxa de desemprego oficial
, contabilizando os inactivos desencorajados e os "ocupados";
3)
Para quebrar o isolamento é necessário garantir
a gratuitidade dos transportes públicos para os desempregados,
a primeira habitação de um desempregado tem de ser garantida
e a sua condição não pode ser um desencadeador de um
processo de despejo sem alternativas e os
os serviços de eletricidade, água e gás não podem
ser cortados a famílias em situação de desemprego;
4)
Abolição dos Contratos Emprego-Inserção e de
quaisquer programas ocupacionais. Substituição dos atuais
Contratos Emprego Inserção por contratos de trabalhos nas
funções exercidas
. Os programas de CEI e CEI+ devem ser reconvertidos num verdadeiro programa de
emprego público e social, garantido às pessoas a
remuneração e direitos laborais devidos;
5)
Abolição da apresentação quinzenal
enquanto a mesma não é abolida, permitir que esta
apresentação seja realizada em qualquer ponto do país e
não exclusivamente na área de residência.
6)
Abolição da obrigatoriedade de apresentação do
documento comprovativo de isenção de taxas moderadoras
, se não acontecer de imediato aumentar o prazo de validade do mesmo;
7)
Limitação do envio de convocatórias pelo IEFP
estas convocatórias devem ser claras, úteis e com
objetivos orientados para a criação de emprego e não para
a penalização e monitorização das pessoas
desempregadas;
8)
Os desempregados devem ser atendidos por funcionários do IEFP
e não por pessoas que não pertençam a esta
instituição.
Notas
[1] ILO The Changing Nature of Jobs, 2015
[2] INE, dezembro 2014,
www.dinheirovivo.pt/Imprimir.aspx?content_id=4314293
[3] Estatísticas do Emprego 1º Trimestre 2015
O original encontra-se em
http://www.precarios.net/?page_id=12530
Este documento encontra-se em
http://resistir.info/
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