Se a oposição venezuelana fosse francesa
O que aconteceria se a oposição venezuelana fosse francesa? O
caso da deputada María Corina Machado é revelador pois a
Justiça da França seria implacável com ela
Desde Fevereiro de 2014 a Venezuela sofre com a violência orquestrada
pela extrema-direita golpista. Ao contrário do que mostram os meios de
comunicação ocidentais, ela se limita a nove dos 335
municípios do país e reina a tranquilidade na imensa maioria do
território nacional, particularmente nos bairros populares. Alguns
estudantes procedentes dos bairros abastados tomam parte em graves
acções criminosas e não em
manifestações pacíficas como afirmam os media ocidentais.
Mas eles estão longe de serem maioritários. Na verdade, a maioria
das pessoas detidas tem graves antecedentes criminais e vários,
inclusive, são procurados pela Interpol.
[1]
A oposição dirige esses novos sectores abastados. Ainda que a
violência tenha sido limitada em termos geográficos, está a
ser mortífera. De facto, pelo menos 37 pessoas perderam a vida, algumas
em condições particularmente atrozes: seis pessoas que circulavam
de moto foram degoladas por cabos de aço estendidos nas ruas. Por outro
lado, cinco membros da Guarda Nacional Bolivariana e um promotor da
República foram assassinados por esses grupúsculos, e outras oito
pessoas que tentavam abrir caminho nas ruas e desmontar as barricadas foram
executadas. Cerca de 600 pessoas foram feridas, dentre elas 150 membros das
forças da ordem.
[2]
Os danos materiais são incontáveis e superaram os 10 mil
milhões de dólares, com a multiplicação de actos de
terrorismo e de sabotagem que miram tudo o que representa a
Revolução Bolivariana, democrática e social: autocarros
incendiados, estações do metro saqueadas, uma universidade
a UNEFA completamente destruída pelas chamas, dezenas de
toneladas de produtos alimentícios destinados aos mercados
públicos reduzidos a cinzas, edifícios públicos e sedes
ministeriais saqueadas, instalações eléctricas sabotadas,
centros médicos devastados, instituições eleitorais
destruídas etc.
[3]
María Corina Machado é uma das autoras intelectuais desses actos
criminosos. Deputada da oposição, ao invés de respeitar a
legalidade constitucional do país lançou numerosos apelos
públicos à violência: "O povo da Venezuela tem uma
resposta: 'Rebeldia, rebeldia'. Alguns dizem que devemos esperar
eleições dentro de alguns anos. Podem esperar os que não
conseguem alimentos para os seus filhos? Podem esperar os funcionários
públicos, os camponeses, os comerciantes, de quem tiram o direito ao
trabalho e à propriedade? A Venezuela não pode esperar mais".
[4]
Corina Machado pôs-se mesmo ao serviço de uma potência
estrangeira hostil ao representar o Panamá durante uma reunião da
Organização dos Estados Americanos, em flagrante
violação dos artigos 149 e 191 da Constituição. O
primeiro estipula que "os funcionários públicos não
poderão aceitar cargos, honras ou recompensas de governos estrangeiros
sem a autorização da Assembleia Nacional". O segundo, por
sua vez, enfatiza que "os deputados ou deputadas da Assembleia Nacional
não poderão aceitar ou exercer cargos públicos sem perder
seu mandato, salvo em actividades docentes, académicas, acidentais ou
assistenciais, que não suponham dedicação exclusiva.".
[5]
A deputada acaba de perder a imunidade parlamentar e o seu mandato no
Parlamento.
[6]
Ela nega-se a aceitar a sua nova situação jurídica,
afirmando que seu mandato só pode ser revogado em caso de "morte,
renúncia, extinção ou destituição resultante
de sentença tribunal"
[7]
. A lei, no entanto, é muito clara: segundo o Regulamento Interno e de
Debates da Assembleia Nacional, a imunidade parlamentar pode ser revogada pelo
voto maioritário dos deputados, o que foi o caso. Em
relação ao seu cargo de deputada, ela o anulou automaticamente ao
violar os artigos 149 e 191.
[8]
O que aconteceria se María Corina Machado fosse francesa? Seria
investigada sob os rigores da lei penal. De facto, a deputada destituída
atentou contra os interesses fundamentais da nação, isto
é, contra a "forma republicana de suas
instituições" (artigos 410-1), ao convocar uma ruptura
violenta da ordem constitucional
[1]
.
Da mesma maneira, o artigo 411-4 estipula que "o facto de manter
[relações de] inteligência com uma potência
estrangeira, com uma empresa ou organização estrangeira ou sob
controle estrangeiro ou de seus agentes, com vistas a suscitar hostilidades ou
actos de agressão contra a França é sancionável com
30 anos de detenção criminal e 450 mil euros de multa.
Sanciona-se com as mesmas penas o facto de proporcionar a uma potência
estrangeira, a uma empresa ou organização estrangeira ou [que
esteja] sob o controle estrangeiro ou de seus agentes, os meios de empreender
hostilidades ou realizar actos de agressão contra a França".
De fato, Corina Machado tem-se reunido regularmente com o Departamento de
Estado dos Estados Unidos, o qual desempenha um papel chave na
desestabilização da Venezuela.
Corina Machado também teria infringido o artigo 412-2 do Código
Penal francês e seria acusada de complô: "Constitui um
complô a resolução tomada entre várias pessoas de
cometer um atentado, quando essa resolução se concretiza mediante
um ou vários actos materiais. O complô é punido com dez
anos de prisão de 150 mil euros de multa. As penas chegam a vinte anos
de detenção criminal e a 300 mil euros de multa, quando uma
pessoa depositária de autoridade pública comete a
infracção."
Corina Machado também teria violado os artigos 412-3 e 412-4 do
Código Penal. Estes, estipulam que "constitui um movimento
insurreccional toda violência natureza de colectiva que ponha em risco as
instituições da República ou atente contra a integridade
do território nacional. É punido com quinze anos de
detenção criminal e 250 mil euros de multa o facto de participar
de um movimento insurreccional: 1. Edificando barricadas, trincheiras ou todo
tipo de obra com o objectivo de impedir ou colocar entraves à
acção da força pública; 2. Ocupando abertamente ou
mediante ardil ou destruindo todo edifício ou instalação;
3. Assegurando o transporte, a subsistência ou as
comunicações dos insurgentes; 4.
Provocando agrupamentos de insurgentes, qualquer que seja a forma;
5. Empunhando uma arma. 6. Substituindo uma autoridade legal".
Se a ex-parlamentar María Corina Machado fosse francesa, estaria na
prisão e seria acusada de graves crimes contra o Estado e as
instituições da República. Aconteceria o mesmo aos
principais líderes da oposição venezuelana que
participaram das violências mortíferas desde Fevereiro de 2014.
[1] Agencia Venezolana de Noticias, "Delincuentes buscados por Interpol
manejaban 18 barricadas en
Táchira", 18 de março de 2014;
Agencia Venezolana de Noticias
, " Guarimbas: Instrumento de la ultraderecha que ha cobrado 36
vidas ", 25/Março/2014; Romain Migus, " Venezuela:
la fabrique de la terreur ", Março/2014.
http://www.romainmigus.com/2014/03/la-fabrique-de-la-terreur.html
(site consultado em 31/Março/2014).
[2]
Agencia Venezolana de Noticias, "Violencia derechista en Venezuela
ha generado 37 muertos y 559 heridos", 31/março/2014;
Telesur, "Más de 10 mil millones de dólares en
pérdidas materiales por guaribas", 27/Março/2014.
[3]
Agencia Venezolana de Noticias, "Violencia derechista en Venezuela
destruye 12 centros de atención médica y electoral",
27/Março/2014.
[4]
Salim Lamrani, "25 verdades sobre las manifestaciones en
Venezuela ",
Opera Mundi,
23/Fevereiro/2014.
[5]
Constitución de la República Bolivariana de Venezuela.
http://www.tsj.gov.ve/legislacion/constitucion1999.htm
(sítio consultado em 31/Março/2014)
[6]
EFE, "Parlamento venezolano ratifica pérdida de investidura de
diputada María Corina Machado", 26/Março/2014.
[7]
Agence France Presse, "Opositora Machado regresa el miércoles a
Caracas y teme ser detenida", 24/Março/2014.
[8]
Asamblea Nacional de la República Bolivariana de Venezuela,
"Reglamento Interior y de Debates de la Asamblea Nacional".
www.asambleanacional.gob.ve/...
(sítio consultado dia 31/Março/2014).
[9]
Code pénal français.
www.legifrance.gouv.fr/affichCode.do?cidTexte=LEGITEXT000006070719
(sítio consultado dia 31 de março de 2014).
[*]
*Doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos, Salim Lamrani é
professor-titular da Universidade de la Reunión e jornalista,
especialista nas relações entre Cuba e Estados Unidos. Seu
último livro é
Cuba. Les médias face au défi de l'impartialité
, Paris, Editions Estrella, 2013, com prefácio de Eduardo Galeano.
Contacto:
lamranisalim@yahoo.fr
,
Salim.Lamrani@univ-reunion.fr
Página no Facebook:
https://www.facebook.com/SalimLamraniOfficiel
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
|