Alerta e apelo sobre o
Projecto de Lei Quadro da Água
Tentativa de privatização dos próprios rios!
por Associação Água Pública
No dia 18 de Dezembro de 2003 o Governo colocou na internet o documento
intitulado
Projecto de Lei Quadro da Água - Projecto de Decreto Lei, precedido de autorização legislativa da Assembleia da República, sobre Protecção dos Recursos Hídricos
, complementado por uma segunda proposta de decreto lei,
mais curta, sobre a
titularidade do domínio hídrico
. Declara estes projectos em
discussão pública, convidando os interessados a enviar
comentários para um endereço de correio electrónico
até 10 de Janeiro de 2004 (depois alargado até 25/Jan/2004).
Num total de 111 artigos, revogam-se seis densíssimos Decretos-Lei que
constituem a espinha dorsal do sistema português de direito e
administração da água e que entroncam em múltiplas
ramificações, desde a regulamentação
específica da água até ao Código Civil, ao Direito
Administrativo e á própria Constituição da
República. Para além disso, pressupostamente estes
decretos transcreveriam a Directiva Quadro da Água, que
engloba e articula todas as outras Directivas da CE neste âmbito, oito das
quais transpostas pela legislação agora revogada.
É absolutamente impossível no prazo relâmpago
oferecido analisar a amplitude e alcance da eventual
aprovação de uma versão, mesmo burilada, destes
projectos-surpresa.
Sem o tempo necessário para o debate e com o risco de aprovar uma lei,
sem que os Portugueses se apercebam do seu verdadeiro conteúdo e das
graves implicações que vai ter no futuro das suas vidas.
Alega-se que faz a transposição da Directiva Quadro da
Água da CE o que é falso.
A componente verdadeiramente legislativa deste projecto incide no
estatuto, administração e licenciamento do uso da água,
dos terrenos do domínio público hídrico e das
infraestruturas hidráulicas, que não são objecto da
Directiva Quadro da Água (DQA).
No respeita à qualidade da água, a cópia ou
paráfrase de numerosos parágrafos inócuos dá a
falsa imagem de reconhecimento, mas é ciosamente omitida
qualquer quantificação, estipulação de
obrigação ou norma precisa que impute obrigações ao
Governo ou coarte o abuso indiscriminado da água cuja
protecção é o objectivo explícito da DQA.
O projecto do Governo não contribui de forma alguma para a
implementação da DQA, e, pelo contrário, a
desresponsabilização e implícito encolhimento
do Estado inviabiliza qualquer hipótese de capacitação
para o seu cumprimento.
Com estes projectos pode o governo obter receitas rápidas, mas em troca
da degradação e exaustão da água, reduzindo em
simultâneo as despesas com a sua protecção e abdicando das
suas funções sociais e ambientais.
Em duas principais linhas de acção:
Fomento de negócios na exploração lucrativa da
degradação e sobreexploração da água, que
passa ao estatuto legal de stock de cotas de captação
e de poluição a comercializar pelo Governo a preços
de mercado da água.
Desresponsabilização total do Estado pela protecção
da água, pela salvaguarda da saúde e da segurança das
populações, pela garantia de acesso dos cidadãos à
água potável, e por todo o futuro.
Através da revogação da legislação que
regula o estatuto do domínio público hídrico, o
licenciamento e concessão do uso do domínio hídrico
(público e privado) e o regime económico-financeiro, associada
à introdução de novo articulado, a água
(captação e poluição) e as infraestruturas de
controlo passam a ter um estatuto de mercadoria que o Governo vende
como tem vindo a ser feito com bens móveis e imóveis do
património público. São em simultâneo
estabelecidas regras que garantem um negócio lucrativo a
quem adquirir estas cotas de degradação e
espoliação da água.
Revoga, substituindo-a por frases vagas, sonantes mas sem qualquer sentido
jurídico nem científico, a legislação que obriga o
Estado a rotinas de monitorização estipuladas por lei,
classificação e verficação da conformidade da
água em relação aos usos definida em parâmetros
estipulados quantitativamente, altera os processos de licenciamento e as
responsabilidades face a riscos e danos, tornando o Estado irresponsável
e inimputável.
A participação pública, já muito insuficientemente
assegurada pela legislação actual, e os curtos processos de
inquérito público associados ao licenciamento e ao planeamento
desaparecem sem deixar rasto.
APELO
A Associação Água Pública apela aos Deputados da
Assembleia da República para a recusa da autorização
legislativa e procedam a um amplo debate em sede da AR, de forma a aprofundar,
em consciência, esta importante questão vital para os
cidadãos.
Apela a todos os portugueses, a todas as instituições e
organizações que possam intervir, incluindo as que têm
assento no Conselho Nacional da Água, para travarem estas duas propostas
de Decreto Lei e denunciarem o seu conteúdo.
Apela para a exigência de uma verdadeira Lei da Água, da
Assembleia da República, devidamente instruída com o conhecimento
e competências adequadas, amplamente discutida num processo
público, aberto, transparente, verdadeiramente participado e não
inferior a seis meses, que estabeleça os princípios do direito da
água português. Uma Lei da Água que proporcione o
enquadramento adequado ao bem estar presente e assegure o futuro dos
portugueses, um futuro que só existe se defendermos a agua...
Lisboa, 10/Jan/2004
O original encontra-se em
Associação Água Pública
.
Este documento encontra-se em
http://resistir.info
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