Brasil leiloa outra vez o seu petróleo

A 7ª Rodada de licitações de áreas de exploração de petróleo e gás, verdadeiro crime de lesa-pátria implementado pela Agência Nacional do Petróleo (ANP), terminou em 19 de Outubro e foi marcada pela voracidade dos investidores, motivados pelo alto preço do barril de petróleo e a preocupação com a diminuição das reservas mundiais de óleo. O apetite foi tal que houve quebra do recorde de arrecadação de bônus de concessão em uma só rodada. Foram leiloadas 251 áreas, arrematadas por multinacionais como Shell, Repsol YPF, BG Energy, Devon, Newfield, ENI SpA e Amerada Hess.

Com esses leilões, o investimento em pesquisa e infra-estrutura feito ao longo de décadas pela Petrobras foi repassado às multinacionais. Além disso, a exemplo das rodadas anteriores, nessa 7ª, a empresa teve que realizar enorme investimento (R$ 503,5 milhões) para arrematar áreas que originalmente, pela lei do monopólio, seriam suas.

Como denuncia Fernando Siqueira, "O Brasil está dando bilhetes premiados para empresas estrangeiras". Dessa forma, ao entregar às multinacionais recursos naturais não-renováveis, patrimônio do povo brasileiro, o governo Lula aprofunda sua política servil ao imperialismo.

CECAC

Entregar reservas de petróleo é crime de lesa-pátria!

por Fernando Siqueira [*]

Em 1988, sob o comando de Barbosa Lima Sobrinho e a ajuda decisiva de vários segmentos da sociedade brasileira, a Associação dos Engenheiros da Petrobrás ( AEPET ) conseguiu convencer o parlamento brasileiro a elevar ao nível constitucional o Monopólio Estatal do Petróleo por 441 votos a 6 e 7 abstenções. O objetivo era garantir o controle desse estratégico bem para uso do povo brasileiro, pois, no mundo, a questão do petróleo só tem duas alternativas: ou é monopólio estatal ou é propriedade do cartel internacional.

Com a mexida na Constituição, efetivada sob o rolo compressor coordenado por Fernando Henrique, e a posterior quebra do monopólio pelo artigo 26 da Lei 9478/97, o país passou a correr enorme risco de perda do controle de um bem de alta importância estratégica. A Lei 9478 criou a Agência Nacional do Petróleo (ANP) para regular o setor e, teoricamente, defender o interesse da sociedade brasileira, mas temos assistido exatamente ao inverso.

David Zylbersztajn, genro de FHC, que comandou inicialmente a ANP, passou a leiloar as áreas em que a Petrobrás investiu e correu riscos geológicos, para servir no final, muitas vezes, a empresas estrangeiras. Fê-lo com tal avidez que os blocos licitados tinham uma área 220 vezes maior que os blocos licitados no Golfo do México. Estamos agora caminhando para o 7º leilão, no dia 17 de outubro, em São Paulo, sendo que o sexto leiloou áreas com grande potencial petrolífero na Bacia de Campos. O Brasil está dando bilhetes premiados para empresas estrangeiras.

A venda dessas áreas se mostra absurda porque, pela Lei 9478, as empresas que as adquirem passam a ser donas do petróleo produzido e podem exportá-lo. A Shell já está exportando o nosso petróleo.

O Brasil não tem petróleo para exportar. A grande predominância das nossas rochas é da era paleozóica. Estas rochas detêm apenas 1% das reservas de petróleo mundiais. Significa que não temos perspectivas de grandes descobertas. A previsão dos geólogos sérios é de que nossas reservas devem ficar em torno de 22 mil milhões de barris. A Petrobrás fez pesquisas em todo o território nacional (29 bacias) e constatou isto. Reteve para sua atividade apenas 7% do total por serem as mais prováveis de gerar resultado econômico.

As licitações têm demonstrado que as empresas estrangeiras só adquirem as áreas que a Petrobrás mapeou. A idéia de virem recursos para áreas novas se mostrou falaciosa. Além disso, o governo federal, para atender a uma solicitação do Ministério da Fazenda, vem exportando o petróleo, sendo hoje o principal item de exportação do país. O planejamento estratégico da Petrobrás prevê exportação de 522 mil barris de petróleo por dia entre 2006 e 2010, volume que colocaria o país no mesmo nível de alguns membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), como o Catar e os Emirados Árabes Unidos, e acima do Iraque, cujas exportações estão prejudicadas pela guerra. O Catar, por exemplo, exporta hoje 541 mil barris de petróleo por dia e os Emirados Árabes Unidos, 514 mil barris por dia. Já o Iraque, cujas exportações foram reduzidas desde a primeira invasão americana, no início dos anos 90, vende ao mercado externo 389 mil barris de sua produção diária.

O governo Lula não mudou a política no setor petróleo, agravada na era Fernando Henrique Cardoso. Em 1999, FHC mudou o estatuto da Petrobrás, nomeou novos conselheiros de fora, entre eles Francisco Gross (diretor do banco Morgan Stanley) e Phillip Reischstul, que assumiu a presidência da empresa. E fez um estrago. Dividiu-a em 40 Unidades de Negócio que transformaria em subsidiárias para posterior privatização. A mudança do estatuto também passou a permitir a venda de ações para estrangeiros. Venderam 40% do capital total na Wall Street que, somados aos 20% de ações já em poder de testas de ferro, fez com que 60% das ações passassem para mãos estrangeiras. 3% foram vendidas para o FGTS e o governo acabou com apenas 37% das ações totais da empresa. Isso significa que, se as reservas de petróleo passarem para a Petrobrás, 60% delas passarão a pertencer a empresas estrangeiras em detrimento do povo brasileiro.

Com as reservas que o país tem, inclusive as que estão para serem descobertas, se não houver controle por parte do governo, o nosso petróleo só dará para cerca de 20 anos. Isto se não houver exportação.

Os especialistas sérios do mundo todo apontam para a ocorrência do pico da produção mundial de petróleo entre 2010 e 2015. Isso significa que a curva de demanda vai superar irreversivelmente a oferta. A luta pelo petróleo se intensificará e o preço do barril superará os US$ 100. Isso levará pânico à economia dos países importadores. Ao não ter controle sobre o setor petróleo, o Brasil passará a ser país importador do seu próprio petróleo, mesmo que esteja a caminho da auto-suficiência.

A energia é a principal responsável pela sobrevivência da humanidade. Sem energia morremos de fome e de frio. É, portanto, um bem de elevadíssima estratégia de sobrevivência dos países. Não podemos desperdiçá-la, nem entregá-la de graça. Exportar energia ou entregar nossas reservas é crime de lesa-pátria.

19/outubro/2005
[*] Diretor de Comunicações da Associação de Engenheiros da Petrobrás .

Ler também 6ª licitação no Brasil: Erro estratégico no setor do petróleo , de César Benjamin, Paulo Metri e Rômulo Tavares Ribeiro.

O original encontra-se em http://www.cecac.org.br/MATERIAS/Setima_rodada_Siqueira.htm


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
22/Out/05