Congressos, só de
cuisine
por César Príncipe
E eis que Cazal-Ribeiro, aguerrido ex-deputado da Nação,
supostamente finado, reapareceu, há dias, reincorporado no Hemiciclo.
Esbracejou, enrubesceu, estrebuchou, acicatou as hostes, ameaçou o
Governo. Haveria que deter o Congresso do PCP, mesmo que o conclave respeitasse
a Constituição, cumprisse a Lei, garantisse a Ordem, acautelasse
a Saúde Pública. Não é de agora a sanha dos Cazais.
Como não há condições para ilegalizar o Partido,
proíba-se o Congresso. Intento ciclópico. O malvado PCP resistiu
ao Tarrafal, certamente resistirá ao Cazal. Assim foi com a Festa do
Avante, realizada, com todas as regras e condicionalidades, contra os
vaticínios mais funestos. Pelos vistos, o PCP é gato de sete
fôlegos: atravessou a República de 5 Outubro, o Fascismo de 28 de
Maio, a Democracia de 25 de Abril. E prepara-se para os 100 anos. Brevemente.
Em 6 de Março de 2021. Com ou sem pandemias. Que as pandemias menos
passageiras são as normalizadas: as da miséria, do desemprego, da
incultura, do medo e da desesperança. Não dão
tréguas. Nunca deram. Raramente deixam a Humanidade em paz.
Estamos em Novembro. Uma irmandade de filhos dilectos do salazarismo-marcelismo
acaba de reconstruir e reanimar uma "Aliança
Democrática", proclamando a República de Rabo de Peixe,
exercício para desembarque no Continente. Além deste
desígnio programático, o Pacto do Rabo jura terminar com a
subsídiodependência (não de banqueiros, eurofundistas e
similares, não, não se trata de dar cabo de parasitas ricos, mas
de alegados parasitas pobres, no caso, de crianças esfomeadas,
famílias secularmente deserdadas, precocemente envelhecidas). Segundo o
Pacto do Rabo, estas gentes precisam de ser despojadas do rendimento
mínimo de inserção e obrigadas a trabalhar, a produzir, a
poupar e a investir e reinvestir no Espírito Santo. Não no Divino
do Arquipélago. Por(ventura) no Ex-DDT. Os empregos cairão dos
céus. É a economia pós-moderna.
O Pacto do Rabo & a Campanha Anticongresso encontraram o generoso e habitual
acolhimento do Sistema Mediático. Assentou-se a jurisprudência e
concertou-se a agenda: não seria altura para o PCP se pôr a
reflectir sobre problemáticas e dilemáticas internas e
internacionais. Urge suspender a democracia quando o PCP levanta a voz, o punho
e a cabeça. Às armas. O corona é quem mais ordena.
Será oportuno relembrar: PSD e CDS (núcleo genético do
rabismo de peixe) votaram contra a criação do Serviço
Nacional de Saúde, estabelecido em 1979. São os que hoje
tão irados se mostram com o Congresso do PCP, força que se
associou ao PS para que milhões de portugueses desde há 40 anos
usufruam deste avanço básico, humanista e civilizacional.
Além do mais, estamos perante um surto demagógico e farisaico:
cazalistas, rabistas e tele-opinantes não
percepcionaram
riscos sanitários no Congresso Nacional dos Cozinheiros,
Taguspark/Oeiras (10-12 do mês corrente). Centenas de comensais
portugueses e estrangeiros tiveram o privilégio de ouvir mais de 50
oradores. Gentilmente anunciado, o evento não aguçou a
percepção
viral dos Altos Magistrados da Contami(nação) nem sequer dos
Rufias da Extrema-Direita. Os cazalistas não exprimiram qualquer
reserva. Imperou o CBM/Consenso da Boa Mesa. Para os defensores da saúde
como um ramo de negócio, o CBM é bem mais apetitoso do que o SNS.
Face à maldição do Congresso do PCP e à
bênção do Congresso Nacional dos Cozinheiros,
inclinar-nos-emos para uma tese maliciosa: a Batalha de Loures nada tem a ver
com congressos, mas com as entidades que os organizam e com a doutrina que os
movem e a história de classe que os inspira. O PCP até prescindiu
de mesas e convidados. Em vão. De nada lhe valeu. Cometeu um erro de
percepção:
deveria ter promovido um congresso gastronómico:
Eles comem tudo e não deixam nada.
Mas não há organizações perfeitas. E não
há cura para esta obsessão: sempre estiveram especial ou
exclusivamente
focados
no PCP. Imaginem. Desde há um século.
Focados.
Focados.
Para recorrer ao Dicionário Futebolês, onde a pátria vai
beber do fino.
24/Novembro/2020
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