Loucura fria
A tardia e insuficiente ajuda da União Europeia
O jornalismo áulico do poder viceja em Portugal
por João Ramos de Almeida
[*]
A Comissão Europeia demorou a responder à crise, mas, até
agora, as suas decisões e o protagonismo de Ursula von der Leyen
estão longe de decepcionar. Bruxelas disponibilizará 37 mil
milhões para a economia e para a produção de bens da
área da Saúde. Vai criar uma reserva estratégica de
equipamentos médicos e disponibilizá-los aos Estados em
situação de carência, como hoje
acontece com Itália e a Espanha. Instou os Estados-membros a proibir a
exportação desses bens e equipamentos, tentando evitar
negócios escandalosos como a venda por uma empresa italiana de 500 mil
kits para testes aos Estados Unidos. Van der Leyen tem apelado aos governos
para que flexibilizem os controlos fronteiriços aos transportes de
mercadorias ou aos europeus que querem regressar aos seus países
e restringiu o acesso externo à União. E, ponto
crucial, o Banco Central Europeu aprovou em duas fatias 870 mil milhões
de euros para comprar dívida soberana, garantindo fazer "tudo o que
for necessário para ajudar a área do euro a atravessar esta
crise".
(Manuel Carvalho, director do
Público,
22/3/2020)
O melhor das medidas é o tempo do verbo
o futuro
.
Nada foi feito em tempo, nada foi feito até agora. E o que for feito,
deve manter a todo o custo as fronteiras abertas, mesmo que a UE seja já
a fonte dos contaminados. Ontem, havia cerca de 120 mil infectados na Europa,
mais do que em toda a Ásia.
E quanto aos dispositivos criados: recusa-se os
eurobonds
e promete-se mais
dívida soberana
para,
no futuro
como o FMI já está a fazer com a Itália se
voltar a esticar a trela da
troica,
com a imposição de medidas
neoliberais
que já provaram em 2011-2014 que não funcionam, criam
desigualdade, não aumentam a produtividade, geram desequilíbrios
externos, aprofundam desequilíbrios estruturais, desequilíbrios
na distribuição do rendimento, geram mais pobreza, mesmo para
quem tenha trabalho.
Não há crise humana que faça a esta gente perder de vista
o objectivo do jogo:
manter a fonte do poder
a dívida.
E por isso, não há dúvida que está
"longe de decepcionar"
porque nunca houve dúvidas ao que vinha. Decepção
é este jornalismo do poder.
22/Março/2020
[*]
Economista.
O original encontra-se em
ladroesdebicicletas.blogspot.com/2020/03/loucura-fria.html
Este artigo encontra-se em
https://resistir.info/
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