A crise financeira

por Juan Torres López [*]

. Introdução

A crise que estamos a viver é a mais séria do último século. O capitalismo lixo da especulação financeira generalizada fez saltar pelos ares o emprego e a estabilidade macroeconómica, já precários, nos últimos anos de predomínio neoliberal.

Os dirigentes políticos não têm alternativas, os banqueiros (os verdadeiros e directos causadores da crise) tratam de evadir-se às suas responsabilidades enquanto utilizam as multimilionárias ajudas que recebem dos estados para sanear na medida em que podem os seus balanços. Os cidadãos assistem perplexos ao aumento vertiginoso do desemprego, às quebras de empresas e ao incremento da dívida.

E, enquanto isso, as esquerdas permanecem praticamente ausentes. Umas, silenciosas por obtusidade ou cumplicidade. Outras, silenciadas porque não foram capazes de dar poder aos cidadãos. E todas divididas, confusas e sem serem capazes de tomar com firmeza a iniciativa para informar, formar e mobilizar os milhões de pessoas que arcam nas suas costas os efeitos da crise.

Isto ocorre em grande parte porque nos últimos anos as esquerdas descuraram a prática unitária e a formação e concepção de alternativas capazes de aglutinar os movimentos sociais, as organizações, sindicatos, partidos e pessoas individuais numa grande onda de rebeldia e resposta ao neoliberalismo.

Os prejudicados com tudo isto são os milhões de trabalhadores e desempregados, mulheres e homens desamparados que, sem representação político-social e fragmentados, não podem enfrentar o domínio neoliberal senão com resignação, frustração e sofrimento.

A tarefa que as esquerdas têm pela frente não é pequena nem fácil. Mas se há algo que esteja claro é que há que começar por analisar com rigor a situação, por denunciar sem descanso o que está a ocorrer por oferecer à sociedade alternativas tangíveis, que não sejam apenas cantilenas nem o recurso ao velho nominalismo que a nada conduz.

Esta última convicção foi o que nos levou a participar em dezenas de palestras, seminários de formação e reuniões de todo tipo nos últimos meses.

Temos a certeza de que a crise económica que estamos a sofrer é um marco histórico que a esquerda deveria aproveitar para mostrar aos cidadãos que a acumulação que o capitalismo é capaz de gerar não é senão um grande fiasco, uma fraude, uma via sem retorno, um beco sem saída, uma quimera que leva exactamente aonde estamos, à derrocada financeira e à crise global.

Nestes momentos em que a especulação financeira abriu as carnes do capitalismo, as organizações da esquerda, de todas as suas sensibilidades e correntes, deveriam converter-se em redes globais de denúncia e seus militantes e filiados nos grãos de areia que fossem mostrando a todos os que se está a passar, que ensinassem aos cidadãos o que os bancos fizeram com o seu dinheiro, o apoio que os bancos centrais e os governos prestaram aos especuladores multimilionários que provocaram a crise e, por fim, que lhe oferecessem as medidas alternativas que é preciso tomar sem demora para evitar que tudo se vá ruindo pouco a pouco.

Este pequeno livro é uma modesta contribuição para esta denúncia. Não podemos ir a mais lugares para explicar o que está a ocorrer e acreditamos que o oportuno era proporcionar este guia para entender e explicar a crise.

O livro resume um texto mais amplo e documentado sobre a crise e suas alternativas, dos mesmos autores, a ser publicado pela Editorial Icaria. Esta edição resumida está concebida como um guia simples para entender o factos e princípios mais importantes e que nos parecem essenciais para explicar a crise, para fazê-la compreensível económica e politicamente. Pretende ser uma espécie de prontuário para a acção e a mobilização que movimentos sociais como o ATTAC tentam promover contra a injustiça global que traz consigo o capitalismo financeiro. É um texto breve que quer servir para que muitas outras pessoas possam seguir a cadeia de consciencialização e denúncia para prolongá-la a todas as latitudes, para que não reste nem um vizinho, nem um concidadão de cada um de nós a quem não tenhamos explicado o roubo gigantesco que perpetraram os bancos e os financeiros, os custos humanos terríveis que tem a especulação e a alternativa criminosa que consiste em resgatar com milhares de milhões de euros os que provocaram a crise enquanto se nega um punhado de milhares para evitar que a cada dia continuem a morrer de fome mais de 25000 pessoas e mais de 6000 por falta de água em todo o mundo.

Oxalá seja útil e contribua para gerar as ondas de rebeldia e denúncia necessárias para tornar possível outro mundo, mais justo e humano.

Sevilha e Madrid, Fevereiro/2009

[*] Juan Torres López ( www.juantorreslopez.com ): Doutor em Ciências Económicas e Catedrático de Economia Aplicada na Universidade de Sevilha. É autor de uma dúzia de livros, como "Economia Política", "Toma el dinero y corre", "La globalización neoliberal del dinero y las finanzas" ou "Desigualdad y crisis económica", de numerosos artigos científicos e de mais de 400 de divulgação e análise política. Além disso coordena, Alberto Espinosa, o sítio web de pensamento económico alternativo www.altereconomia.org .
O texto acima é a introdução do livro La crisis financiera: Guía para entenderla y explicarla (95 pgs., 898 kB), o qual pode ser descarregado gratuitamente em http://hl33.dinaserver.com/hosting/juantorreslopez.com/jtl/

Alberto Garzón Espinosa ( www.agarzon.net ): Licenciado em Ciências Económicas pela Universidade de Málaga e aluno de pós-graduação da Universidade Complutense de Madrid.


Este excerto encontra-se em http://resistir.info/ .
22/Set/09