A desindustrialização de Portugal, com o beneplácito do
governo PS
Com o fecho da refinaria em Matosinhos a GALP pretende reduzir custos a
fim de continuar a distribuir elevados dividendos aos acionistas, embora para
isso tenha de destruir muito emprego e capacidade produtiva do país
As empresas do setor da energia e, em especial a GALP, assim como os respetivos
acionistas têm gozado de um verdadeiro regime de exceção e
de apoio do Estado em Portugal. Aumentam os preços quando querem e como
querem, obtendo elevados lucros, e nem o governo nem os reguladores fazem
alguma coisa para defender os consumidores, que são na sua esmagadora
maioria trabalhadores. E como se tudo isto já não fosse
suficiente, o Estado concede-lhes benefícios fiscais que se traduzem em
centenas de milhões de receitas fiscais perdidas que, depois,
são compensados com enormes aumentos de impostos (IRS, IVA) pagos pelos
trabalhadores, pensionistas, e outros portugueses.
A juntar a tudo isto, quando a GALP, para manter os elevados lucros que tem,
anuncia que vai encerrar a refinaria em Matosinhos e lançar no
desemprego mais de 400 trabalhadores diretos e por em perigo o posto de
trabalho de mais de 1100 trabalhadores indiretos, vem logo o ministro do
Ambiente, João Matos Fernandes, dar cobertura a essa decisão
dizendo:
"O Governo português, em bom tempo, decidiu alargar na sua proposta a
sítios onde existem indústrias poluentes, em primeiro lugar as
refinarias. Não estou a dizer que estávamos a espera que isto
acontecesse com esta brevidade,
mas era de imaginar que um dia destes, um ano destes, essa
situação viesse a colocar-se".
Para o ministro, a decisão da GALP era previsível, natural e
inevitável; mas para o país é a destruição
do aparelho produtivo, é mais um passo na sua
desindustrialização o contrário daquilo que o governo diz
querer; e, para os trabalhadores, o desemprego a quem o ministro acena com
alguns apoios sociais.
No entanto, a GALP no comunicado que enviou a CMVM foi muito mais explicita nas
razões que a levam a fechar a refinaria de Matosinhos. Esta medida
permitirá segundo a GALP
"uma redução de mais de 90 milhões por ano em
custos fixos, e descontinuar 200 milhões de ativos",
ou seja, de equipamentos que deixarão de ser utilizados. Depois
acrescenta, para
"adoçar o veneno da pílula",
preocupações ambientais
(permitirá uma redução de 900kt das emissões de
CO2).
Mas as verdadeiras razões não são estas, mas sim, como
afirma a própria GALP no seu comunicado, os
"efeitos da pandemia COVID-19, originaram um impacto significativo nas
atividades industriais de downstream da GALP".
E para que o grupo não tenha uma redução
significativa nos seus lucros despede-se trabalhadores e destrói
capacidade produtiva do país. É a solução habitual
e mais fácil utilizada pelas entidades patronais.
EM PLENA PANDEMIA A GALP AUMENTOU MAIS OS PREÇOS DOS COMBUSTIVEIS QUE NA
UNIÃO EUROPEIA
Aproveitando a falta de qualquer controlo de preços dos
combustíveis (gasóleo e gasolina) em Portugal, e contando com a
passividade e mesmo aceitação do governo e da ENSE, a GALP em
plena pandemia (março/novembro 2020) aumentou os preços dos
combustíveis mais do que o verificado nos países da União
Europeia, alargando o fosso, como revela o quadro 1 com dados divulgados pela
DGEG do MATE.
O preço do litro do gasóleo sem incluir impostos, que reverte na
totalidade para as empresas e não para o Estado, em março de 2020
era, em Portugal, já superior ao preço médio praticado nos
países da União Europeia em 2,3% mas, em novembro de 2020, essa
diferença aumentou para 6,6%. Uma variação semelhante se
verificou no preço da gasolina 95 sem incluir impostos: em março
de 2020 o preço do litro em Portugal era inferior à média
dos preços da gasolina sem impostos nos países da União
Europeia em -2,5%, mas em novembro de 2020 o preço em Portugal já
era superior em 5,2% ao da UE. A GALP e outras petrolíferas procuraram
compensar as quebras nas vendas por um aumento significativo dos preços
sem impostos, para assim poderem manter os elevados lucros. No mesmo
período verificou-se o aumento do fosso do Preço de Venda ao
Público (PVP), que inclui os impostos, do gasóleo e da gasolina
entre Portugal e a UE: a diferença a mais entre Portugal e UE
aumentou entre mar/nov2020 (quadro 1)
ELEVADOS DIVIDENDOS DISTRIBUIDOS TODOS OS ANOS PELA GALP AOS SEUS ACIONISTAS
À CUSTA DOS PREÇOS LEONINOS SUPERIORES AOS DA UNIÃO
EUROPOEIA PAGOS PELOS PORTUGUESES
Apesar da remuneração média dos trabalhadores em Portugal
ser cerca de metade da média da UE, a GALP impõe preços
aos consumidores portugueses que são superiores aos preços
médios praticados na União Europeia, perante a passividade do
governo e do regulador que nada fazem e tudo permitem, arrecadando elevados
lucros que depois os distribui aos seus acionistas sob a forma de dividendos
cujos valores chocantes constam do gráfico 1
(dados divulgados pela própria GALP no seu "site").
Os dividendos distribuídos pelo GAP aos seus acionistas, no
período 2009/2019, cresceram vertiginosamente. Entre 2009 e 2019,
aumentaram em 249,2%
(subiram de 166M para 580M).
A GALP dos 4183 milhões de lucros que obteve no período
2009/2019 distribuiu, aos seus acionistas, 3.542 milhões de
dividendos à custa dos preços leoninos que impõe aos
portugueses. No quadro 2, estão os maiores acionistas beneficiados com
a distribuição de elevados dividendos agora no período
2003/2019.
No período 2003/2019, dos 7.115 milhões de lucros obtidos
pela GALP, os acionistas receberam 5.676 milhões , sendo 3.469
milhões (61,1%) por 7. Com a exceção da Parpublica,
que é uma empresa pública, mas que apesar disso ela e o governo
nada fazem para evitar o fecho da refinaria e o despedimento de 400
trabalhadores, todas os outros são estrangeiros ou têm sede no
estrangeiro, gozando de um importante benefício fiscal: estão
isentos de pagamento de imposto sobre os dividendos, ao contrário de um
pequeno acionista em Portugal que paga 28% de imposto sobre o valor do
dividendo. É por esta razão que a família Amorim
constituiu uma empresa na Holanda para gerir a sua participação
na GALP.
É IMPORTANTE LEMBRAR OS ENORMES BENEFICIOS FISCAIS QUE O ESTADO TEM
CONCEDIDO À GALP
Um exemplo. Em 2008, o governo de Sócrates, através da
Resolução do Conselho de Ministros nº 55/2008, aprovou a
concessão à GALP de um benefício fiscal que custou ao
Estado 211 milhões de receitas de IRC perdidas para compensar
este grupo precisamente pela
modernização das refinarias de Sines e Matosinhos,
valor aquele que representou um quinto do investimento total realizado nas
refinarias. A GALP quer destruir aquilo que foi feito com dinheiro dos
contribuintes.
02/Janeiro/2021
Ver também:
É tempo de lutar, em defesa da Refinaria e pela nacionalização da GALP
Encerramento da refinaria da GALP no Porto não serve os interesses nacionais
Audição, com carácter de urgência, do Ministro do Ambiente e da Acção Climática, acerca do anunciado encerramento da refinaria da GALP do Porto
"Encerramento da refinaria de Matosinhos é um grave atentado à economia nacional"
Sobre a privatização da GALP
, 21/Set/2006
"A privatização do sector energético representou um verdadeiro crime para o interesse nacional"
[*]
edr2@netcabo.pt
Este artigo encontra-se em
https://resistir.info/
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