O lítio rende prémios Nobel e muito dinheiro, mas a que custo?
por
Sputnik
Três cientistas que estabeleceram marcos no desenvolvimento de baterias
de lítio ganharam o Prémio Nobel de Química em 2019. Eles
vêm de países que industrializam o mineral exportado
(principalmente) da América do Sul, onde estão 85% das reservas
mundiais. Sputnik explica como o negócio funciona no Chile, o principal
produtor mundial.
Há quem imagine uma sociedade sem fios para a comunicação
e livre de combustíveis fósseis. As
baterias de iões de lítio
mudaram substancialmente as tecnologias de comunicação e
significaram uma metamorfose na maneira como comunicamos. Também tiveram
um forte impacto no transporte e na electrificação rural.
No entanto, o que não mudou foi a política de
extracção que prevalece na América do Sul, onde parece que
a mineração e o desenvolvimento tecnológico não
são compatíveis. Argentina,
Bolívia
e Chile são mundialmente conhecidos pela sua salmoura rica, da qual o
lítio é extraído, estes países compõem o
"Triângulo de Lítio", mas exportam a
matéria-prima sem a industrializar.
O lítio é obtido através de um processo de
evaporação. "As salmouras presentes sob a superfície
do sal são extraídas em poços de bombagem e depois
transportadas para grandes piscinas de evaporação para obter os
sais. Através de um processo químico, o carbonato de lítio
é obtido",
explicou a Sputnik
Gabriela Burdiles, directora de projectos da ONG chilena FIMA.
O Chile, líder na extracção, acredita que, para manter a
sua primeira posição, deve aumentar a quantidade de toneladas de
lítio que exporta, e não agregar valor. Segundo o
estudo
La economía política de la explotación de litio en Chile:
1980-2018
publicado em 2018 no Journal No. 34 de Ciências Sociais da
Universidade de Quilmes, Argentina , tal acontece em parte devido
à sólida estrutura política e social, tecnológica e
produtiva que a elite instalou no país.
AS CHAVES DO NEGÓCIO
Embora no Chile o lítio seja considerado "mineral
estratégico" e em teoria os depósitos
pertençam ao Estado, os privados têm as concessões de
exploração e eles próprios realizam os estudos de
viabilidade exigidos pelo Estado para conceder as licenças.
Os lucros que obtêm são desconhecidos.
No entanto, sabe-se que em 2016 o Chile exportou 201 310 toneladas do mineral e
seus componentes, 38,4% da produção mundial, e que em 2017 as
exportações geraram mais de 700 milhões de dólares.
No ano seguinte, as exportações de lítio totalizaram 948
milhões de dólares,
segundo
América Economia. Duas empresas instaladas no norte do Chile possuem o
monopólio, a Sociedade Química e Minera (SQM) e a
Rockwood-Albemarle.
Os autores do estudo garantem que os capitais da indústria de
mineração de lítio no Chile funcionam como
"enxertia" nas economias dos territórios onde estão
instaladas, limitando o seu desenvolvimento, sendo geralmente prejudiciais.
As
externalidades negativas que geram
são diversas:
-
esgotamento progressivo das reservas de água;
-
divisão interna dos povos nativos, forçados a negociar
privilégios com as empresas no seu próprio território;
-
destruição e poluição dos ecossistemas;
-
quando as empresas se instalam, importam os bens e serviços
necessários para operar (como máquinas e serviços
técnicos), a mão-de-obra que contratam é pouco qualificada;
-
geram uma migração interna de trabalhadores, com jornadas de
trabalho que não podem ser consideradas normais;
-
não há reinvestimento no território, o que acentua uma
economia não diversificada;
-
também não há investimentos em laboratórios de
pesquisa, perpetuando a exploração e exportação de
minério não industrializado.
No entanto, o modelo extractivista de enclave de exportação
é incentivado pelas elites quer políticas quer empresariais, que
em muitos casos são compostas pelas mesmas pessoas.
Eles contam com a estrutura legislativa mais liberal do mundo: no Chile, os
trabalhadores não podem negociar condições de trabalho ou
salários por sectores produtivos, mas uma empresa pode estar discutir o
mesmo aspecto com dois sindicatos, propondo ofertas diferentes.
Entre outras coisas, as empresas não fazem contribuições
para pensões de reforma dos trabalhadores; também não
está estabelecido um limite quanto ao número de trabalhadores que
podem ser subcontratados. Na indústria do cobre, mais de 60% dos
trabalhadores têm emprego desta forma.
Ver também:
O lítio no Chile, ¿fonte de felicidade ou infortúnio?
Corrida ao lítio em Portugal já se transformou num caso de polícia
O lítio pode ser a energia do futuro e há abundância em Portugal
El papel de la explotación de las minas de litio en el Golpe de Estado de Bolivia
O original encontra-se em
mundo.sputniknews.com/...
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