Os acordos secretos do juiz Garzón

La Jornada (editorial)

A actuação de Baltazar Garzón como juiz do Tribunal Nacional de Espanha, foi posta em causa devido à publicação do livro La conspiración, el último atentado de los GAL. Nesta obra autobiográfica, José Amedo ex-subcomissário de polícia, relata como, em 1994, supostamente Garzón participou numa conspiração orquestrada pela direita espanhola, um segredo público em Espanha, para envolver as mais altas figuras do governo socialista do ex-presidente Felipe Gonzalez na investigação sobre os Grupos Anti-terroristas de Libertação (GAL).

Este grupo paramilitar fora criado naquele tempo pelo governo presidido pelo Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) para atacar os membros da organização separatista basca ETA; de facto, os GAL foram acusados de perpetrar assassinatos e de empregar a tortura, e os seus membros, entre eles Amedo, foram processados por diversos delitos, num escândalo que levou o PSOE a perder as eleições de 1996 e afectou profundamente a imagem de Felipe Gonzalez.

De acordo com a versão de Amedo, em 1994 o juiz Garzón teria pressionado, a ele e ao polícia Michel Dominguez, também condenado pelo caso dos GAL, para envolver vários funcionários do governo socialista, depois do presidente Gonzalez não o ter chamado para fazer parte do seu gabinete. Quer dizer, a participação de Garzón na presumível conspiração teria sido devido a uma vendetta política.

No livro, Amedo afirma que o juiz, em entrevistas irregulares efectuadas no seu gabinete, o ameaçou com um processo à sua esposa, apesar de ela nada ter a ver com o caso, se ele recusasse testemunhar contra Rafael Vera, então secretário de Estado para a Segurança. Concretamente, Garzón ter-lhe-ia dado instruções precisas sobre o que declarar em tribunal para implicar Vera no financiamento dos GAL, a partir de fundos secretos do Estado, se bem que Amedo nunca tivesse tido conhecimento exacto disso. Em poucas palavras, o juiz teria preparado e orientado o testemunho de Amedo.

Mais, o ex-polícia admitiu que, pelo seu falso testemunho, recebeu vultuosas somas de dinheiro da parte de Pedro J. Ramírez, dono do diário El Mundo e um dos presumíveis conspiradores, juntamente com Francisco Alvarez-Cascos, então secretário geral do Partido Popular, e José Maria Aznar que sucedeu a Felipe Gonzalez no poder.

Se bem que as notas prévias sobre o livro deixem no ar muitas incógnitas, as revelações sobre a participação de Garzón nesta suposta conspiração constituiriam um duro golpe na imagem do magistrado, que se auto-define como uma pessoa de esquerda e um férreo defensor dos direitos humanos e da justiça universal; o juiz perderia o reconhecimento internacional que adquiriu quando se encarregou do processo contra o ditador chileno Augusto Pinochet, em 1999. E mais, tais revelações dariam mais força às acusações de que Garzón é um fundamentalmente motivado pelas suas ambições pessoais, em detrimento dos princípios fundamentais que devem reger o seu desempenho como juiz, como é caso da imparcialidade no momento de julgar um caso.

Assim, se se confirmarem as acusações de Amedo, o sistema de justiça espanhol ficaria sob suspeição, pois tornar-se-ia claro que a actuação dos magistrados poderia estar determinada por interesses políticos extrajudiciais. Em resumo, o livro de Amedo poderia significar o fim das aspirações políticas de Garzón e afectar a credibilidade do Tribunal Nacional e do Partido Popular.

O original encontra-se em http://www.jornada.unam.mx/2006/02/11/edito.php .
Tradução de José Paulo Gascão.


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21/Fev/06