Porque Trump quer manter Andrew Jackson na nota de 20 dólares
– e porque os seus oponentes o combatem furiosamente

por Valentin Katasonov [*]

'. Não é segredo que a América é governada pelo Sistema de Reserva Federal. Os principais accionistas da Reserva Federal estão encarregados da moeda e, assim, também da América. Para fortalecer e manter seu poder, estes patrões da moeda precisam da "sua própria" narrativa. E é por isso que eles reescrevem a história – não apenas nos manuais e nos filmes de Hollywood, mas também no papel-moeda. Ao longo do último século a história da América foi bem "editada" no papel-moeda do país e o seu desenho foi alterado mais de uma vez.

Tudo indica que os patrões da moeda não têm intenção de cessar esta prática. Em Abril de 2016, o então secretário do Tesouro dos EUA, Jacob Lew, anunciou que as notas de US$5, US$10 e US$20 teriam um novo desenho a partir de 2020. Lew apresentou a ideia como se os planos do Departamento do Tesouro para redesenhar as notas representassem "a voz do povo" ao invés de um capricho das autoridades. Segundo o Departamento do Tesouro, grupos de activistas em sítios das redes sociais haviam principiado a defender que o papel-moeda do país apresentasse mulheres americanas eminentes e figuras bem conhecidas de minorias étnicas. A lista de sugestões incluía a Primeira-Dama Eleanor Roosevelt, Rosa Parks, que começou o movimento dos direitos civis dos negros, Wilma Mankiller, a primeira chefe mulher da nação Cherokee, a activista afro-americana Harriet Tubman, e muitos outros. Entretanto, o Departamento do Tesouro nada disse acerca de como foram reunidas e seleccionadas as sugestões, ou acerca do grupo de campanha Women on 20s, o qual não veio de parte alguma.

Os planos do Departamento do Tesouro para substituir o sétimo presidente dos EUA, Andrew Jackson, pela pouco conhecida activista Harriet Tubman foram um choque para muitos americanos. Nos media sociais muita gente disse que a nova nota seria "a mais feia" da história dos EUA. Donald Trump, que naquele momento ainda era candidato presidencial, também defendeu o sétimo presidente dos Estados Unidos. "Andrew Jackson tem uma história notável e parece grosseiro retirá-lo da nota", disse Trump durante uma entrevista à NBC em Abril de 2016.

Ao mudar-se para a Casa Branca, em 20 de Janeiro, Trump imediatamente pendurou um retrato de Andrew Jackson no Gabinete Oval. O actual presidente dos EUA não faz segredo do facto de que o sétimo presidente dos EUA é tanto o seu modelo como o seu ídolo. O principal estratega de Trump, Stephen Bannon, reiteradamente comparou Trump a Jackson. Após a posse do novo presidente, disse Bannon: "Não penso que tenhamos um discurso como este desde que Andrew Jackson veio para a Casa Branca". Enquanto isso, ao comentar acerca da selvajaria sem precedentes da resposta de muitos media, ONGs e grupos de negócios à sua chegada à Casa Branca, o próprio Trump notou que "não houve nada como isto [na América] desde Andrew Jackson".

Para aqueles que actualmente tentam obstruir Donald Trump, ele e Andrew Jackson são igualmente censuráveis. De facto, está a ser feito tudo o que é possível para que o americano médio nem mesmo saiba quem foi o presidente Jackson. Eles querem por qualquer retrato na nota de 20 dólares a fim de apagar o sétimo presidente dos EUA da memória dos americanos.

Andrew Jackson (1767-1845), eleito pelo Partido Democrata (é considerado como um dos seus fundadores), foi presidente dos EUA de 1829 a 1837. Ele poderia ter-se tornado presidente mais cedo: nas eleições de 1824 ganhara a maioria dos votos tanto entre os eleitores como nos colégios eleitorais, mas não recebeu uma maioria eleitoral. O presidente foi portanto escolhido pela câmara baixa do parlamento (House of Representatives), a qual optou por John Quincy Adams ao invés de Jackson. Nas eleições de 1828, a agenda da campanha de Jackson, com o objectivo de libertar a América da opressão dos banqueiros, era clara como cristal. Naquele tempo, o Second Bank of the United States, o qual era essencialmente um banco central, estava em operação na América. Era um projecto de banqueiros europeus, primariamente os Rothschilds. Em 1816 o banco conseguiu obter um alvará (charter) pelo prazo de 20 anos do Congresso dos EUA e começou a emprestar moeda ao governo dos EUA, o que levou a uma ascensão rápida da dívida do governo. O slogan de Jackson nas eleições de 1828 foi: "Sem banco e com Jackson – ou banco e sem Jackson" ("No bank and Jackson – or bank and no Jackson"). Jackson declarou abertamente guerra aos bancos e venceu-a. Tornou-se presidente dos EUA e iniciou uma campanha para revogar o alvará do Second Bank of the United States. Em 1831, Nicholas Biddle, o presidente do banco, enviou um projecto de lei ao Congresso para estender o alvará do banco. A lei foi aprovada por ambas as casas do Congresso, mas Andrew Jackson vetou-a e o Congresso foi incapaz de anular o veto. Em 10 de Julho de 1832 Jackson falou acerca dos perigos de um banco central: "Não são apenas os nossos próprios cidadãos que estão a receber a generosidade do nosso governo. Mais de oito milhões das acções deste banco são mantidas por estrangeiros [...] Não haverá perigo para a nossa liberdade e independência num banco que por sua natureza tem tão pouco compromisso com o nosso país? [...] Controlar a nossa divisa, receber nossos dinheiros públicos e controlar milhares dos nossos cidadãos sob a sua dependência, isto seria mais formidável e perigoso do que o poder naval e militar do inimigo".

Em 1833, o volume de papel-moeda e depósitos emitidos pelo Second Bank havia ascendido a US$42,1 milhões, uma soma enorme naquele tempo, e Andrew Jackson destruiu toda a estrutura. Em 1833 ele transferiu fundos do governo do Second Bank para um certo número de bancos comerciais dos EUA. Ainda mais surpreendentemente, no fim do seu mandato presidencial Andrew Jackson conseguira eliminar completamente a dívida nacional. Isto parece inconcebível nos dias de hoje quando o nível da dívida nacional dos EUA começa a atingir a marca dos US$20 milhões de milhões (trillion). Houve várias tentativas de assassinato de Jackson e ele chegou a ser atingido a tiro, mas morreu de causas naturais. Antes da sua morte foi-lhe perguntado o que é que considerava como o seu maior feito. Sem hesitação, Andrew Jackson replicou. "Eu matei o banco".

Estou certo de que Donald Trump tem um bom entendimento de todas as nuances da presidência Andrew Jackson e sabe que o US Federal Reserve System é essencialmente o mesmo como banco central. Depois de Jackson, a América sobreviveu durante oitenta anos sem um banco central. O Federal Reserve System só foi criado pelo Congresso dos EUA no fim de 1913, mas mais de uma centena de anos se passaram desde então. Os patrões da moeda têm estado no controle da América durante um longo tempo. Eles odeiam Andrew Jackson, ao passo que Donald Trump o admira abertamente. Penso que ele sabe que não será capaz de repetir o feito de Andrew Jackson de eliminar o banco central, o equilíbrio de poder é demasiado desigual, mas ele tenciona contrapor-se. Em particular, ele está em vias de tentar reduzir a dívida nacional. Reduzir a dívida nacional a zero (como fez Andrew Jackson) é um sonho utópico, mas Trump tem falado reiteradamente em desacelerar seu crescimento ou mesmo executar uma reestruturação parcial. Entretanto, também será difícil que consiga isto, uma vez que os patrões da moeda precisam que as impressoras do Fed estejam em actividade. E é o Departamento do Tesouro que está a assegurar a procura ao vender seus títulos de dívida em troca de dólares.

Talvez Trump consiga, pelo menos, manter a efígie de Andrew Jackson na nota de 20 dólares. Veremos.

08/Março/2017

[*] Membro associado da Academia Russa de Ciência Económica e Negócios.

O original encontra-se em www.strategic-culture.org/...


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
13/Mar/17