Para devolver a esperança à esquerda
Uma discussão não é uma batalha, a não ser
para a CFDT
[1]
Se queremos reconstruir uma organização de massas e uma
relação de forças mais consequente, é preciso
reconstruir uma verdadeira ideologia da transformação social. E
rapidamente.
Para devolver a esperança à esquerda, para afastar os fascistas e
as suas ideias do poder, para retomar o controlo que faz lei nas mãos
dos capitalistas, não bastará amontoarmo-nos ou unirmo-nos numa
lista ou por detrás de um candidato.
É preciso reconstruir uma verdadeira ideologia de
transformação social.
Não se trata unicamente de distribuir uns quantos subsídios, de
baixar o preço de um serviço municipal ou de instaurar a
gratuidade para este ou aquele serviço.
É preciso transformarmos a forma de gerir, desencadearmos lutas para
mudar as regras, apropriarmo-nos coletivamente dos instrumentos até aqui
privados, para investir em novas áreas de intervenção.
Sem isso, o poder da esquerda não passa de um simples gestor. E quando o
dinheiro falta para satisfazer todas as necessidades, retomamos a velha
lógica da traição não temos outra
hipótese. Miterrand não teve outra hipótese
senão abandonar o rigor. Jospin não teve outra hipótese
senão privatizar a Air France e abandonar as lutas. Hollande não
teve outra hipótese senão a lei do trabalho ou o CICE
[1]
para a competitividade
mas hoje, a cidade de Lyon não tem nenhuma
hipótese, a região da Occitânia não tem a
hipótese de retomar a gestão direta das vias férreas, a
primavera marselhesa não tem a hipótese de recuperar o direito
à greve nas cantinas
e, portanto, a classe operária
terá a hipótese de ir à pesca nos dias das
eleições porque, no final das contas, para que servem os eleitos
se não temos poder de escolha?
Vamos precisar de um grande momento de autocrítica e de análise
das nossas práticas de gestão se quisermos sair da
desconfiança generalizada.
E os argumentos do estilo é melhor do que a direita, ou
ainda, fizeram isso mas também tomaram aquele boa medida
não têm nenhum peso. Aliás, conduzem-nos de fracasso em
fracasso.
Não, na verdade temos de refletir numa verdadeira forma de agir.
Senão, o pior está para vir.
Eu sei muito bem que nem sempre fazemos o que queremos que não podemos,
num abrir e fechar de olhos, mudar o sistema que, em muitos aspetos, restringem
a escolha e que as relações de forças nem sempre nos
são favoráveis. Mas já não consigo suportar que os
eleitos nos expliquem que travaram uma batalha apenas porque tiveram uma
discussão com um prefeito, um empregador ou um ministro. Uma
discussão não é uma batalha! A não ser talvez para
a CFDT. Uma batalha é um conjunto de ações que visam
mobilizar a população ou uma parte dela, apoiar-se nas
contradições do adversário (inclusivamente quando estamos
num executivo em que ele é maioritário), forçá-lo a
revelar-se publicamente para ser submetido ao julgamento coletivo
Quando
travamos uma verdadeira batalha e somos vencidos, podemos dizer que não
temos outra opção. Mas quando só entrámos em
discussões, podemos dizer que optámos. Por nos colocarmos do lado
do sistema.
Em suma, a síndrome da esquerda plural ainda está bem presente.
Alguns acharão que sou um esquerdista. No entanto, continuo a ser
disciplinado e a votar no menos mau. Mas estou farto. Sobretudo,
milhares dos nossos concidadãos não nos agridem com arengas como
eu posso fazer, contentam-se em nos ignorar e em deixar de votar, em deixar de
lutar. É talvez mais agradável para o espírito de alguns
que podem afirmar tranquilamente que o povo não percebeu nada ou que
é preciso fazer política de outro modo continuando a
fazer tudo igual, Mas também é dramático. E um dia
virá em que será preciso tirar lições disto.
23/Fevereiro/2021
[1] CFDT: Confederação Francesa Democrática do Trabalho
[2] CICE: Crédito Tributário para a Competitividade e Emprego
[*]
Laurent Brun, antigo agente de operações de manobra nos
estaleiros de Lyon-Perrache, filho e neto de ferroviários e
secretário-geral da federação dos ferroviários da
CGT.
O original encontra-se em
www.legrandsoir.info/pour-redonner-l-espoir-a-gauche.html
e em
lepcf.fr/spip.php?page=article&id_article=4746
. Tradução de Margarida Ferreira.
Este artigo encontra-se em
https://resistir.info/
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