A vigarice de Macron não funciona!
por Rémy Herrera
Num curto discurso televisivo difundido segunda-feira 10 de Dezembro às
20h00, o presidente Emmanuel Macron enunciou as medidas destinadas, segundo
ele, a acalmar a cólera popular dos "coletes amarelo": 1) a
remuneração dos trabalhadores que recebem o Smic (ou
salário mínimo interprofissional de crescimento) aumentaria
"em 100 euros por mês" a partir de Janeiro de 2019; 2) um
bónus "que não terá nem imposto nem encargo"
seria pago no fim do ano de 2018 por
"todos os empregadores que o puderem";
3) o pagamento das horas suplementares seria novamente desfiscalizado": e
4) a alta da CSG (contribuição social generalizada) seria anulada
em 2019 para os reformados que recebem menos de 2000 euros mensais.
Apesar da brevidade e da tecnicidade das propostas, não foi preciso
muito tempo aos franceses para calcular o que iriam ganhar com isto... De
facto, quase nada! O presidente da República entregou-se publicamente a
um dos seus números de actor de teatro para os quais sua esposa o treina
há dezasseis anos. A operação de comunicação
incluiu no entanto um número de hipocrisia. Foi o
mea culpa
ao qual Emmanuel Macron, habitualmente tão sobranceiro, não
havia habituado seus compatriotas. A arrogância presidencial baixa de
tom; mas não o seu incrível talento para os golpes de
prestidigitação! Entre ameaças de endurecimento da
repressão e uma forçada compaixão miserabilista, Macron o
mago tirou do seu chapéu um magro ramalhete de flores murchas: quatro
medidazinhas que fazem passar os franceses por mendigos e servem de pretexto
aos media dominantes para reclamar com veemência a paragem da
mobilização dos coletes amarelos.
Explicações.
1) A alta de 100 euros do Smic virá essencialmente do seu aumento
automático legal (para 25 anos [dois "menus com sobremesas" no
McDonalds!]) e (quanto ao resto) do pagamento de um prémio de actividade
que já estava previsto conceder. De modo claro, esta alta estava
orçamentada para o ano de 2019 e na realidade não corresponde
senão a uma antecipação de alguns meses no
calendário.
2) Muito poucos assalariados serão afectados pelo outro bónus,
dito "excepcional", pois o seu pagamento é deixado à
boa vontade do patronato. Apenas as grandes firmas poderão
pagá-lo, mas certamente não as pequenas e médias empresas.
Estando este prémio isento de "encargos sociais", os
patrões que puderem dá-lo terão mesmo interesse em
fazê-lo ao invés de aumentar os salários!
3) A desfiscalização das horas suplementares também
já estava prevista para 2019. Ela restaura uma disposição
posta em prática pelo antigo presidente Nicolas Sarkozy. Teria sido
preciso ao contrário propor trabalhar menos para partilhar o trabalho
com os desempregados e os trabalhadores a tempo parcial ou com contratos
precários e, naturalmente, pagar as milhões de horas
suplementares já efectuadas pelos trabalhadores, mas que continuam
não paga pelo patronato (nem pelo Estado).
4) Quanto ao chamado "impulso favorável" aos reformados,
mentem-nos mais uma vez: depois de assistirem à redução
das suas pensões durante 18 meses apesar de Macron na sua
campanha eleitoral haver jurado protegê-los não só
os reformados nada ganharam (o que é agora anunciado é a
renúncia a um imposto adicional), como também ainda vão
perder poder de compra na medida em que a revalorização das
pensões a partir de Janeiro de 2019 (+0,3%) não compensará
sequer o ritmo da inflação (+2,0% previsto no ano de 2019).
Esta falsa generosidade de um "presidente atento aos franceses"
não é portanto senão um aprofundamento da lógica da
austeridade neoliberal. Os salários do sector privado continuam a
não progredir, as remunerações dos funcionários
permanecem congeladas, os subsídios de desemprego continuam a ser
corroídos... Pois, no fundo, quem são os "grandes
esquecidos" do discurso presidencial? Os ricos! O grande patronato e
accionistas da bolsa esfregam as mãos: nenhuma nova
contribuição lhes será exigida. O imposto sobre a fortuna
não é restabelecido! As torrentes de dinheiro público
oferecidas como prenda às firmas transnacionais (através do
"crédito de imposto para a competitividade e o emprego, CICE), sem
a menor garantia de investimentos produtivos nem de criação de
empregos, não são atenuadas! E as "reformas" de
destruição do Estado e dos serviços públicos, dos
sistemas de reformas, da protecção social dos cidadãos...
não são postas em causa!
Três dias antes dos anúncios do presidente-mágico, o Senado
francês havia votado um alívio da
"exit-tax",
ou seja, do mecanismo de imposição das mais-valias latentes
aquando da transferência pelos contribuintes afortunados do seu
domicílio fiscal fora da França a fim de aproveitarem-se de uma
fiscalidade mais vantajosa no estrangeiro. E apenas três após este
mesmo discurso de 10 de Dezembro, a direcção do grupo
automóvel Ford confirmava sua decisão de encerrar sua
fábrica de Blanquefort, na periferia de Bordéus, e de despedir
mais de 850 trabalhadores que entretanto haviam aceite
diminuições de salários nestes últimos anos para,
se lhes havia dito,
"salvar a empresa".
Tudo mudou para que nada mudasse.
Que razões haveria para os coletes amarelos e todos os trabalhadores
para pararem as lutas? No dia 14, a jornada de acção, de greve e
de manifestações organizadas conforme o apelo dos sindicatos CGT
(Confédération générale du Travail), FO (Force
ouvrière), FSU (Fédération syndicale unitaire) e Union
syndicale Solidaires (de que faz parte o SUD, Solidaires Unitaires
Démocratiques) pelo aumento imediato dos salários e das
pensões e pela defesa da protecção social, reunia milhares
de pessoas em Paris e em várias grandes cidades da França
e foi reforçada por cortejos de alunos de liceu.
No dia seguinte, sábado 15 de Dezembro, teve lugar o "Acto V"
da mobilização dos coletes amarelos. Num contexto particular: o
de um atentado terrorista verificado algumas horas antes nas ruas de
Estrasburgo, provocando cinco mortos e impondo um momento de recolhimento no
país (e o adiamento de uma moção de censura apresentada
pela esquerda contra o governo na Assembleia Nacional). O poder macroniano
respondeu à quinta manifestação do povo dos coletes
amarelos como um domador de circo trata um tigre: pelo método dos golpes
de bastão e de chicote após o bolo dado segunda-feira
à noite. A mobilização das forças da ordem era
impressionante: um polícia para cada manifestante no conjunto do
território nacional e mesmo dois polícias por manifestante em
Paris, onde dezenas de estações de metro haviam sido fechadas e
instalados controles com revistas nas estações de comboio e
lugares públicos diversos desde a véspera. Cento e sessenta e
oito interpelações na capital e 115 pessoas coladas em
custódia. E à noite, as redes sociais dos coletes amarelos
já convidavam a um "Acto VI", no sábado 22 de Dezembro,
para
"preparar o réveillon de Natal em Paris"
e
"a vitória do povo".
15/Dezembro/2018
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