Revolução colorida no Cáucaso coloca a Rússia num
dilema
A subida ao poder de Nikol Pashinyan na Arménia pode ser
decisiva no
Cáucaso e alterar o equilíbrio de poder numa região
outrora dominada por Moscovo
por M.K. Bhadrakumar
Após um intervalo de três anos desde a mudança de regime na
Ucrânia, em Fevereiro de 2015, outra revolução colorida
está a desdobrar-se em mais uma antiga república soviética
no Cáucaso a Arménia.
Um levantamento popular exigindo mudanças democráticas e
oportunidades económicas está a crescer na Arménia.
Os media do ocidente ensaiaram chamá-la de "Revolução
de Veludo". Todas as características clássicas de uma
revolução colorida são já visíveis neste
levantamento político. Um homem de meia-idade chamado
Nikol Pashinyan
surgiu de lugar nenhum para liderar a campanha em favor da mudança de
regime. Ele prometeu proteger direitos humanos, assim como combater com
severidade a corrupção desenfreada e o compadrio.
Os media ocidentais entusiasticamente começaram a transformar Pashinyan
numa figura de culto. Ele começou a deixar crescer uma barba grisalha
três semanas atrás. Envergando uma T-shirt camuflada e
calças cargo, sua face fotogénica sob um boné estilo
militar instantaneamente provoca uma comparação com Che Guevara
nos cartazes em Yerevan.
A juventude loucamente empolgada com uma razoável percentagem de
mulheres jovens chiques da classe média adora o seu olhar
másculo e está a aderir a acções de
sit-in
na praça principal da cidade em Yerevan com um fundo de música
rock e uma actuação ao vivo do principal cantor da banda de
metais System of a Down, dos EUA. Os protestos já assumem a
aparência de um carnaval. As autoridades não sabem como lidar com
os jovens revolucionários.
Há apenas uma semana, Pashinyan não conseguiu ser eleito
primeiro-ministro e o parlamento arménio, que elege o chefe de governo,
fez outra votação na terça-feira. Desta vez Pashinyan
venceu.
Pashinyan está agora pronto a tomar o comando da Arménia,
substituindo o governo de uma década de Serzh Sargsyan, apoiado por
Moscovo. Curiosamente, ele teve êxito em persuadir o partido de Sargsyan,
o qual dispõe de maioria no parlamento, a mudar de lado e
apoiá-lo.
Comparado com Gandhi e Mandela
Milhares dos seus apoiantes estão eufóricos na Praça da
República em Yerevan. A revolução colorida está
à beira da vitória e venceu sem violência. Pashinyan
está a ser comparado a Gandhi e Nelson Mandela.
A Arménia, um país remoto sem litoral de 2,9 milhões de
pessoas no Sul do Cáucaso, surgiu da noite para o dia como um estado na
linha de frente na política das grandes potências. Sua
importância inusitada de hoje deve-se em grande parte ao facto de o
país ser membro da Organização do Tratado de
Segurança Colectiva e da União Económica
Euroasiática, lideradas por Moscovo e, naturalmente, como o local
de uma base militar russa.
O Cáucaso é o ponto fraco da Rússia e uma
revolução colorida na Arménia resultando no
estabelecimento de um regime não amistoso afectará a
segurança das regiões do Cáucaso Norte da Rússia.
Uma revolução colorida provocou a mudança de regime na
Geórgia a seguir a uma disputada eleição em 2003 e as
relações georgiano-russas nunca se recuperaram completamente.
Contudo, Moscovo tomou uma posição neutral na actual tempestade
política e Pashinyan tem emitido declarações a dizer que
pretende dar prioridade às ligações da Arménia com
a Rússia, particularmente a cooperação militar. O
presidente russo Vladimir Putin não perdeu tempo em congratular
Pashinyan tão logo a votação parlamentar endossou-o como o
próximo governante da Arménia. Putin disse procurar
"relações amistosas" com o novo governo.
Mas as equações são delicadamente equilibradas. A grande
questão é o que acontece quando Pashinyan apela a uma
votação rápida e tiver êxito em obter um mandato
popular por si próprio, conquistando uma base de poder sólida.
Claramente, ele desfruta do apoio ocidental. Moscovo não pode
arriscar-se a outra confrontação com o ocidente na
Eurásia. Putin preferirá evitá-lo.
Por outro lado, a estratégia dos EUA é cercar a Rússia na
massa de terra euro-asiática com um arco que vai desde os países
Bálticos até a Europa Central, a qual está agora pronta
para abarcar a altamente estratégica região do Cáucaso.
Mais a leste jaz a Ásia Central, onde os EUA já estão
entrincheirados no Afeganistão.
Mas isso não é toda a história. Há uma razão
adicional para ser expectável que os EUA façam um esforço
determinado para consolidar sua influência sobre a Arménia. A
questão é que a Arménia também faz fronteira com a
Turquia e o Irão e o fim de jogo no conflito da Síria está
a aproximar-se.
A Arménia teve uma história perturbada com a Turquia Otomana e
dificilmente se dá bem com Ancara. A matança em grande escala de
arménios étnicos em 1915 permanece uma enorme controvérsia
na política externa turca. O presidente Donald Trump emitiu uma
declaração recentemente no aniversário do massacre
arménio, o que aborreceu a Turquia. A comunidade arménia nos EUA
exerce um bocado de influência na política americana.
Basta dizer que se os EUA conseguirem entrincheirar-se na Arménia isto
colocará dores de cabeça tanto à Turquia como ao
Irão, os quais estão actualmente na mira de Washington. Os EUA
já desfrutam de laços fortes com os curdos habitantes da
região.
Igualmente, em algum momento, o projecto de mudança de regime na
Arménia está destinado a extravasar para o vizinho
Azerbaijão, o qual também está sob domínio
autoritário. Já há um nível elevado de
atenção ocidental quanto à geopolítica do
Azerbaijão. Naturalmente, o Azerbaijão seria um grande
prémio para os EUA no grande jogo do Cáucaso. É rico em
petróleo e, de modo interessante, há uma minoria étnica
azeri a viver dentro do Irão.
Acumulam-se nuvens tempestuosas
Acima de tudo, se o Azerbaijão for arrastado para a órbita dos
EUA, o Tio Sam pode molhar os seus pés no Mar Cáspio, o qual
até agora tem sido de facto um lago russo-iraniano. Na verdade, tempos
fatídicos estão pela frente na geopolítica do
Cáucaso, a qual tem sido uma região ardentemente contestada ao
longo de toda a história quando impérios em torno competiam pelo
seu controle persa, turco e russo.
No pano de fundo dos conflitos no Iraque e na Síria, as tempestades que
se acumulam nas relações dos EUA com a Turquia e o irão e
nas actuais condições da Nova Guerra Fria, a convergência
russo-turca-iraniana na preservação do actual estatuto da
Arménia de "neutralidade positiva" não deveria ser
subestimado.
Por outro lado, é improvável que Washington deixe a
Arménia escorregar através dos seus dedos, depois de ter
investido tanto na agenda da mudança de regime e impulsionado até
à vitoria a cuidadosamente coreografada "Revolução de
Veludo".
09/Maio/2018
O original encontra-se em
www.atimes.com/...
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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