Vacinas contra a Covid-19: os governos, mais uma vez, aos pés das
multinacionais farmacêuticas
Que se tomem as medidas necessárias para fortalecer a
investigação pública, garantir a sua independência
do capital privado e criar uma indústria farmacêutica
pública capaz de fabricar os medicamentos considerados como essenciais
pela OMS, entre eles, as vacinas.
por Ángeles Maestro e Eloy Navarro
[*]
Desde há algum tempo que se está a evidenciar a
distorção que o capitalismo introduz no conhecimento
científico e, em especial, na chamada "
medicina com base na evidência
"
[1]
. Poderosos interesses económicos decidem o que se investiga, o que se
fabrica e o que não se fabrica, privando a humanidade de avanços
que o seu próprio desenvolvimento poderia oferecer. A
determinação exercida pelo objetivo prioritário do lucro
empresarial, que se paga com milhões de mortes prematuras e
doenças evitáveis, afeta de forma decisiva a
produção de medicamentos
[2]
. Como tem sido repetidamente denunciado, até se inventam novas
patologias ou seja, sinalizam-se doenças inexistentes para
se poderem prescrever certos medicamentos, especialmente nas doenças
mentais
[3]
.
É bem sabido que uma das consequências esperadas da pandemia
é o colossal negócio para as multinacionais farmacêuticas
derivado da compra de milhões de doses de vacinas.
Agora, gigantes empresariais que exibem, anualmente, margens de lucro muito
superiores às da banca, nem mesmo terão de correr riscos com os
seus investimentos , o dinheiro público dos Estados da UE,
incluindo o espanhol, compra adiantadamente milhões de doses
antecipadamente de vacina; e faz isso antes de terem sido demonstradas a sua
validade, eficácia e segurança.
Em meados de junho, o ministro da Saúde anunciava a adesão da
Espanha ao Acordo de Compra Antecipada de Vacinas
[4]
contra a COVID 19. Com este acordo, a UE decidiu investir grande parte dos
2.700 milhões de euros do Instrumento de Apoio a Emergências para
"
contribuir para a implantação da vacina
". Ou seja, acertou-se o financiamento antecipado da
produção da vacina.
A corrida entre as grandes farmacêuticas foi vencida, até agora,
pela britânica AstraZeneka, que recebeu 1.200 milhões de euros da
UE por 300 milhões de doses.
É significativo que o acordo de financiamento e o desembolso do dinheiro
tenham ocorrido quando a fase III ainda não havia sido concluída,
enquanto choviam as críticas à apresentação da
vacina russa, exatamente nas mesmas condições. Acaba de ser
anunciado que o ensaio clínico desenvolvido pela AstraZeneca foi
suspenso devido a graves efeitos secundários.
A AstraZeneka, como outras multinacionais, já conseguiu assegurar-se
não só de indemnizações dos governos da UE aos
quais fornecerá a vacina, caso as empresas sejam condenadas a pagar por
possíveis efeitos secundários da mesma
[5]
, mas também está a tentar ficar totalmente isenta de
responsabilidade civil.
Perante uma situação grave, em que é mais do que
provável que, como já aconteceu em outras ocasiões, se
aproveitem a angústia e o medo da população perante a
enfermidade e a morte inoculadas em grandes doses pelos média
para que o poderoso lóbi do medicamento consiga fabulosos lucros,
a Coordenadora Antiprivatização da Saúde, num comunicado
recente
[6]
:
1.º - Denuncia que o resultado da investigação
biomédica realizada com fundos públicos do Estado espanhol, que
se reduziu em 25% nos últimos dez anos, é sistematicamente
transferido para empresas privadas
[7]
. Desta forma, e mais uma vez, o desmantelamento ou a parasitação
do setor público, deixa a saúde sem instrumentos próprios
e favorece o colossal negócio das empresas privadas.
2.º - Afirma que o dinheiro público pago a multinacionais
farmacêuticas para vacinas ainda não testadas e em detrimento de
instituições públicas, implicará cortes noutros
serviços, especialmente graves em tempos de uma crise sanitária,
social e económica como a que estamos a viver.
3.º - Refere que, quando se adotam decisões
contra natura
como a que estamos a analisar, costuma acontecer que anos depois se descubra
que as empresas beneficiadas subornaram aqueles que estavam envolvidos em tais
deliberações.
4.º - Lembra que, como depois se soube, os membros do comité de
especialistas da OMS sobre a gripe A foram financiados pelas multinacionais
Roche e Glaxo, fabricantes, respetivamente, do Tamiflu e da Relenza. Dessa
forma, ocultou-se que esses fármacos eram ineficazes contra o
vírus H1N1 e, além disso, tinham importantes efeitos
secundários não declarados. A OMS exortou os governos a
investirem nestes medicamentos cerca de 5.000 milhões de euros em 2009,
justamente quando se iniciavam os drásticos cortes nos serviços
públicos devido ao rebentar da crise.
No Estado espanhol, as enormes quantidades de ambos os medicamentos comprados
pela ministra da Saúde, Trinidad Jimenz para o tratamento de
supostos 12 milhões de casos caducaram nos armazéns
[8]
, segundo um relatório de 2017. Além disso, foram gastos cerca de
300 milhões de euros em vacinas contra uma epidemia que nunca existiu.
Os laboratórios envolvidos faturaram 700.000 milhões de
dólares por ano.
Por tudo isto, como aponta a Coordenadora Antiprivatização da
Saúde, é preciso exigir que:
1.º - Se constitua de imediato um comité científico com
reconhecida independência da indústria farmacêutica para
avaliar a validade, eficácia e segurança das vacinas
disponíveis, inclusive as produzidas por instituições
públicas de outros países.
2.º - Se tomem as medidas necessárias para fortalecer a
investigação pública, garantir a sua independência
do capital privado e criar uma indústria farmacêutica
pública capaz de fabricar os medicamentos considerados como essenciais
pela OMS, entre eles, as vacinas.
[1]
rebelion.org/la-distorsion-de-la-medicina-basada-en-la-evidencia/
.
[2]
Gotzsche, Peter.C, (2014) Medicamentos que matam e crime organizado,
www.researchgate.net/...
[3]
www.eldiario.es/...
[4]
www.boe.es/diario_boe/txt.php? id = BOE-A-2020-9132
[5]
www.publico.es/...
.
[6]
www.casestatal.org/...
[7]
saludporderecho.org/...
.
[8]
Relatório oficial publicado em 2017,
www.aemps.gob.es/...
21/Setembro/2020
[*]
Médicos e membros da
Coordenadora Antiprivatização da Saúde Pública
(CAS)
O original encontra-se em
blogs.publico.es/...
e a tradução em
pelosocialismo.blogs.sapo.pt/vacinas-contra-a-covid-19-os-governos-106695
Este artigo encontra-se em
https://resistir.info/
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