O mundo é finito, não é?
Ontem fiz uma palestra para um grupo de distintos líderes de
negócios. Na palestra tentei mostrar que a taxa global de
produção de petróleo e dos condensados associados
está numa na altura máxima de todos os tempos ou num
"pico" que, se a escala for muito ampliada, aparece como um
"planalto". Utilizei minhas extensões, já publicadas,
da abordagem de King Hubbert para apoiar meus argumentos.
Tive uma oposição significativa de vários membros da
audiência. Os seus argumentos foram os seguintes:
1. King Hubbert tentou tratar da questão de recursos finitos e hoje
sabemos que ele estava errado.
2. Apesar de ciclos de Hubbert emergirem para províncias
petrolíferas individuais, eles não podem emergir para o mundo
todo.
3. Estivemos a prever o pico da produção global de
petróleo desde há muito e ele nunca aconteceu até agora.
4. A tecnologia estará sempre à frente da geologia e, portanto,
continuaremos a produzir ainda mais petróleo a cada ano, apenas de
lugares diferentes e a preços mais altos.
5. A produção de óleo de xisto nos EUA e alhures e o jogo
da substituição tecnológica compensarão os
declínios em curso dos reservatórios de petróleo
convencional tais como Ghawar, Burgan, Cantarell, Samotlor, Prudhoe Bay e
muitos outros.
Eu infringi claramente crenças pessoais profundamente enraizadas em
alguns dos membros do meu público e eles ficaram transtornados comigo.
Mas os seus argumentos estão no centro do mito nacional nos EUA, o que
significa que estou numa minoria pequena e impopular.
Então, como é que alguém convence o povo nos EUA de que a
Terra é esférica e finita, que a sua crusta é muito
delgada e que os seus recursos fósseis não podem ser produzidos
para sempre a taxas arbitrariamente elevadas? Citando meu amigo Dr. Albert A.
Bartlett, Professor Emérito de Física na Universidade do
Colorado, tal convencimento é uma tarefa árdua.
Estas pessoas acreditam que o crescimento perpétuo é
desejável, consequentemente ele deve ser possível e isso
possivelmente não pode ser um problema. Ao mesmo tempo ainda há
uns poucos remanescentes de pessoas da "terra esférica" que se
movem a falar acerca de "limites" e em particular acerca dos limites
que estão implícitos na expressão "capacidade
biótica"
("carrying capacity").
Mas limites são embaraçosos, pois conflitam com o conceito de
crescimento perpétuo, de modo que há um movimento crescente para
abolir o conceito de limites.
The Physics Teacher, Vol. 34, No. 6, pp. 342-343, 1996.
Deixem-me tentar tratar dos pontos 1-3 acima com o gráfico abaixo.
Digitalizei a previsão original de King Hubbert da
produção global de petróleo apresentada no seu
relatório de 1956 para a Shell Development Co. Sobrepuz a
história real da produção mundial de petróleo bruto
e dos condensados líquidos associados em milhões de barris de
petróleo por dia (mi.b/d). Ao longo dos últimos 8 anos, esta taxa
oscilou em torno dos 72-74 mi. b/d apesar do mundo todo tentar fazer o melhor
possível para atender à procura sempre crescente por
petróleo.
A previsão de King Hubbert da produção global de
petróleo e condensados revisitada 54 anos depois. Os dados da
produção real provém de uma combinação de
estatísticas da EIA e de outras fontes para a produção
inicial. Parece que Hubbert obteve o momento do planalto (pico) da
produção de petróleo quase perfeitamente e saiu fora num
factor de dois no nível de produção. Ele não podia
ter contado a produção offshore no Mar do Norte, na
Nigéria, Angola, Brasil, águas profundas, etc. E ele não
tinha qualquer meio para prever as descobertas e a ascensão de
Cantarell, Tengiz, Majoon, Samotlor, Zakum, Prudhoe Bay e muitos outros campos
de petróleo super-gigantes. A maior parte destes campos super-gigantes
já foram descobertos e é cada vez mais improvável que
outros mais sejam descobertos no futuro. Os dados de Hubbert nada dizem acerca
do impacto da sísmica 3D, de furos desviados, furos horizontais, furo
hidrofracturados maciçamente, perfuração no mar em
lâminas de água de dois quilómetros, etc. Ainda assim,
quase 60 anos atrás, Hubbert afastou-se apenas um factor de dois no
nível de produção e acertou perfeitamente acerca do
momento do pico. Agora pense-se acerca de uma previsão económica
para todo o mundo que seja boa apenas uns meros 10 anos depois. Se encontrar
um, por favor partilhe-a comigo e eu a mencionarei neste blog.
Considerando o incrível impactos que a tecnologia (ponto 4 acima) tem
tido sobre a produção de petróleo à escala mundial
ao longo dos últimos 60 anos, a previsão de Hubbert é
quase um milagre, demonstrando que a soma de variáveis aleatórias
não relacionadas (incrementos anuais da produção de
petróleo e condensados de todos os campos petrolíferos do mundo)
com distribuições arbitrárias e variâncias finitas
tende a uma [curva] gaussiana, não importa o que digam economistas e
outros leigos. Hubbert simplesmente não dispunha de suficientes
variáveis aleatórios no seu conjunto de dados, porque estas
variáveis ainda estavam no futuro quando ele traçou a sua Figura
22. Nas seis décadas que nos separam, a tecnologia criada por pessoas
como eu trouxeram estas novas variáveis aleatórias (campos
petrolíferas) à vida e duplicaram a produção
resultante, mas não mudaram a localização [temporal] do
pico.
O ponto 5 necessita de tratamento cuidadoso, para além do âmbito
deste blog elementar. Basicamente, se o gasto energético
necessário para produzir um recurso for maior do que a energia
proporcionada por aquele recurso, a produção será travada
mesmo que os pagamentos sejam em ouro puro. As grandes formações
de xistos limosos
(mudstone),
chamadas erradamente de "xistos", são muito difíceis
de produzir e um bocado de energia deve ser investido para que estas
formações produzam energia como petróleo bruto leve.
Portanto a nossa capacidade para por a produzir os xistos limosos
impermeáveis de baixa qualidade a taxas constantes que recordem os
campos de petróleo de alta qualidade como Ghawar ou Cantarell é
nula. Ponto. Deixarei o assunto para peritos, como jornalistas, economistas e
alunos do quinto ano pintarem, um quadro róseo das novas oportunidades
ilimitadas.
Agora deixem-me centrar sobre o meu outro assunto favorito: a
demonstração da arrogância cósmica e da
ignorância ilimitada de alguns economistas. O meu economista menos
favorito, Dr. Julian Simon, é famoso pela sua crença de que
não há limites para o crescimento e por "derrotar" o
professor Paul Ehrlich na igualmente famosa aposta da mercadoria.
Simon também escreveu o seguinte absurdo, pelo qual se tornou um
professor de faculdade e o querido de alguns decisores políticos e
think (sic!) tanks:
-
Existe agora tecnologia para produzir em quantidades virtualmente
inexauríveis todos os produtos feitos pela natureza alimentos,
petróleo, mesmo pérolas e diamantes...
-
Temos agora nas nossas mãos realmente nas nossas bibliotecas
a tecnologia para alimentar, vestir e fornecer energia para uma
população sempre crescente durante o próximo 7 mil
milhões de anos...
-
Mesmo que nenhum novo conhecimento fosse alguma adquirido ... seríamos
capazes de avançar aumentando a nossa população para
sempre...
Como observou secamente o Prof. Bartlett, mesmo que Simon se desviasse num
factor de 1000 (economistas habitualmente desviam-se um bocado) na sua
estimativa da duração da expansão futura da humanidade (7
milhões e não 7 mil milhões de anos) e a humanidade
crescesse apenas 1 por cento ao ano, o número de humanos seria excedido
por 10 à potência 30410. Acontece que a previsão de Simon
do número de humanos suportados pela tecnologia e pela ciência
económica é 1 seguido por 30.000 vezes maior (como em
1.000.000.000.000.000.000.000.000...) do que o número de átomos
do Universo. Como lhe parece agora o factor 2 de Hubbert?
Meu outro favorito de todos os tempo é uma previsão de três
de Irving Fisher, professor de teoria económica de Yale, que em
21/Outubro/1929 declarou: "As acções alcançaram o que
aparenta ser um patamar permanentemente alto". Três dias depois, a
Quinta-feira Negra introduziu os Estados Unidos na Grande Depressão.
Recentemente, outro economista génio de Princeton declarou que o
petróleo era irrelevante para economias modernas.
O meu primeiro encontro pessoal com a previsão económica de alto
nível foi na Shell. A Shell pagou uma fortuna à Goldman Sachs,
Chase Manhattan Bank, Deutsche Bank e uma dúzia de outras
organizações para previsões do preço do
petróleo bruto abarcando um espaço de tempo de 1 a 30 anos. A
Shell ficou muito feliz com estas previsões, até que nós a
pusemos todas junto num gráfico, com vários anos de pontos de
partida. Todo os zigzags começariam tangencialmente no último
segmento de dados reais e então perder-se-iam em todas as
direcções cobrindo literalmente toda a página como
spaghetti confuso, com os preços finais previsto indo desde US$5 por
barril a US$300 por barril. Concluímos que estas
suposições económicas muito caras não tinham
capacidade preditiva e estabelecemos um preço de petróleo
constantemente baixo para o planeamento do negócio. Desde 1985, aquela
suposição bruta da engenharia foi boa durante quase 20 anos e
nada custou.
Temo pensar o que possa ser a consequência imediata de tal
arrogância. A Deusa sem misericórdia de Rhamnous, Nemesi, ou o o
próprio Zeus podem ficar irados:
Vê tu como Deus atinge sempre os maiores animais com o seu raio, e
não lhes permite fazerem discursos insolentes, ao passo que aqueles de
menor vulto não o irritam? Como da mesma forma seus raios caem sempre
sobre as casas mais altas e as maiores árvores? Portanto, Ele
manifestamente gosta de deitar abaixo todo aquele que se exalta a si
próprio. Assim, muitas vezes um exército poderoso é
derrotado por uns poucos homens, quando Deus nos seus ciúmes envia o
medo ou a tempestade do céu e eles perecem de uma maneira indigna de si.
Pois Deus não permite a ninguém ter pensamentos elevados, salvo
ele próprio.
História de Herodoto, VII, 10, traduzido por George Rawlinson (1910).
Vamos pensar sobre isto. Recentemente não vi quaisquer economistas a
sacrificarem seus melhores carneiros ou touros com eferendas a Deus, de modo a
que Ele possa lançar alguma luz sobre a magia opaca a que eles chamam de
previsão.
PS: E aqui está
como as previsões de 1972 do amplamente desacreditado Clube de Roma se parecem 30 anos depois
. Será que as
verificou? Nada mal para um punhado de loucos ignorantes. Agora pense por um
segundo: o que acontecerá se as suas previsões se
mantiverem nesta Terra finita e esférica? Sim, posso ouvi-lo a dizer:
"Por que incomodar-me a pensar acerca de coisas tão
desagradáveis? Conseguiremos mais, ainda mais de tudo com a nossa
tecnologia superior. Sempre o fizemos".
16/Abril/2012
[*]
Do Conselho Director da ASPO-USA. Professor de petróleo e
geosistemas do Departamento de Engenharia da Universidade do Texas-Austin.
Entre 1990 e 2009 foi professor de geoengenharia na Universidade da
Califórnia-Berkeley. Antes de Berkeley foi investigador na Shell
Development, uma companhia de investigação administrada durante
20 anos por M. King Hubbert. A sua investigação e ensino envolve
modelação matemática e numérica de sistemas
terrestres, bem como a termodinâmica e a ecologia da oferta de energia
para a sobrevivência humana. Ele também está dirigir
investigação sobre gás natural não convencional e
recursos petrolíferos. É co-autor de mais de 200 documentos e
relatórios. Seu blog é
LifeItself
.
O original encontra-se em
http://www.aspousa.org/index.php/2012/04/the-world-is-finite-isnt-it/
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
|