Portugal participa no confisco de bens à Venezuela
por José Goulão
O governo da República Portuguesa está envolvido, directa e
indirectamente, na apropriação ilegal de pelo menos três
mil milhões de euros de bens públicos da Venezuela a que o Estado
venezuelano está impedido de recorrer para comprar medicamentos,
alimentos e outros produtos de primeira necessidade para a sobrevivência
da população do país. Dessa verba, 1359 milhões de
dólares correspondem ao valor do ouro de Caracas extorquido pelo Banco
de Inglaterra, com anuência dos países da União Europeia; e
1543 milhões de euros é a fatia de dinheiro confiscada pelo Novo
Banco, uma entidade nacional que foi salva com dinheiro extraído dos
bolsos dos portugueses e depois oferecida a um fundo abutre norte-americano.
Até prova em contrário, o governo de Portugal é parte
responsável por estes actos além do reconhecimento do
golpe terrorista através do qual os Estados Unidos designaram o seu
agente Juan Guaidó como "presidente interino" da Venezuela. Os
portugueses continuam à espera de respostas concretas a perguntas
directas sobre estas actividades governamentais praticadas à revelia e
contra os interesses dos portugueses, sobretudo dos que vivem emigrados na
Venezuela. Até agora só o silêncio tem respondido aos
pedidos de esclarecimento, o que também não parece perturbar a
comunicação
mainstream
que, assim sendo, só tem o que merece. Mas o silêncio
governamental vai valendo com uma confissão de cumplicidade de Lisboa
com os crimes cometidos pela direcção fascista dos Estados Unidos
da América contra a República soberana da Venezuela. Quem cala
consente, sobretudo sendo este um governo que tem palavra fácil.
"A nossa estratégia funciona
"
E o que está a passar-se contra a Venezuela, com
participação do governo de Portugal, é uma guerra
avassaladora que envolve "crimes de lesa humanidade" passíveis
de cair sob a alçada do Tribunal Penal Internacional, de acordo com um
relatório pedido pela ONU
e em poder da Comissão de Direitos Humanos da organização.
A guerra que atinge a Venezuela não resulta de sanções
pontuais, como poderá pensar-se. O que os Estados Unidos montaram, desde
que o presidente Obama declarou o país como "uma ameaça
à segurança nacional" norte-americana, em 2014, é um
sistema organizado de punição colectiva que visa a falência
e o desmantelamento do Estado venezuelano.
O Conselho de Relações Externas dos Estados Unidos, o mais pesado
dos famosos
think tanks
deste país, confessa que "as sanções são
alternativas visíveis e menos dispendiosas do que uma
intervenção militar". Por outras palavras, as
sanções são uma guerra, admite.
Mais claro ainda nos termos usados é um membro do Departamento de Estado
norte-americano que prestou declarações sob
condição de anonimato a um conjunto de jornalistas, entre os
quais Maria Molina, da Rádio Colômbia. "Estamos a assistir a
um colapso económico total da Venezuela", disse. "Portanto, a
nossa política funciona, a nossa estratégia funciona".
É a pessoas deste jaez e com esta consciência humanitária
que o governo de Portugal está associado.
No passado dia 25 de Abril, dois economistas norte-americanos, Max Weibrot e
Jeffrey Sachs, do Centro de Investigação Política e
Económica dos Estados Unidos,
concluíram que o bloqueio económico e humanitário representa uma "punição colectiva"
que provocou já a morte de pelo menos 40 mil pessoas na Venezuela. Se
as sanções não existissem, revelam os autores, a economia
do país não teria sido afectada, seguiria o seu caminho; por
outras palavras, não haveria "crise humanitária",
não existiria "colapso".
Uma teia imperial
As sanções nada têm de acumulação de
decisões pontuais aleatórias. São aplicadas através
de uma teia estruturada com o objectivo de asfixiar os mecanismos que permitem
a vida de um Estado e de um país.
A sucessão de Ordens Executivas emanadas pelos Estados Unidos mas com
impacto global, sobrepondo-se à ordem internacional vigente segundo o
sistema da ONU, ilustram o funcionamento de um verdadeiro poder imperial.
As medidas estabelecidas por Washington contra a Caracas do mesmo tipo
das impostas ao Irão e a Cuba pretendem fazer com que a Venezuela
deixe de funcionar com a banca internacional e o sistema financeiro em geral,
não possa comercializar os produtos que garantam a subsistência do
Estado e das populações, como o petróleo e o ouro. Neste
quadro a Venezuela fica inibida de exportar e importar, de se administrar, de
se financiar e de honrar as suas dívidas. Esta asfixia induz um processo
sádico de punição de milhões de pessoa
forçando-as, no limite, a submeter-se à miséria ou a
virar-se contra um governo que não é, de facto,
responsável pela degradação constante da
situação.
Mercê da complexa teia de procedimentos aplicada de forma
arbitrária em termos políticos, económicos, financeiros,
sociais e humanitários, a Venezuela não pode vender
petróleo e ouro, não pode comprar medicamentos em geral e vacinas
em particular, não pode contrair empréstimos junto da banca
internacional, onde também não pode movimentar os seus activos
depositados ou em circulação no estrangeiro; além de
não lhe ser permitido pagar as dívidas, para que depois possa ser
acusada de não honrar prazos de pagamento e cair em default. Levando
assim, por arrastamento, os impérios internacionais de
notificação de créditos, como a Standard and Poor's a
colocar a Venezuela nos últimos lugares, muito abaixo de
"lixo" situação mais grave ainda do que as de
países vítimas de guerras e agressões militares.
Trata-se de um sistema maquiavélico, sádico, repete-se, porque
atinge os seres humanos onde eles são mais débeis, dependentes e
indefesos como a saúde, a alimentação, os bens essenciais
de consumo. Uma guerra imposta sem tropas mas também com mortos, feridos
e famintos.
A componente portuguesa
E o governo de Portugal participa de forma sorrateira, sem o assumir perante os
portugueses, nesta operação que provoca danos deliberados na
economia e no sistema de saúde venezuelano, com a agravante de originar
"diversos casos de morte o que implica crimes de lesa
humanidade", segundo o relatório apresentado pelo perito
independente da ONU, Alfred-Maurice de Zayas, na última sessão da
Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas.
Uma participação portuguesa que não acontece apenas por
arrastamento, devido às "nossas alianças" ou às
inerências da União Europeia. É uma opção
deliberada.
Já em Agosto de 2016, por exemplo, o Novo Banco decidiu que estava
impossibilitado de fazer operações em dólares com os
bancos venezuelanos, invocando pressões de outras entidades
bancárias com as quais se relaciona. Fê-lo numa conjuntura em que
instituições como o Citibank se negaram a receber fundos
venezuelanos para importar 300 mil doses de insulina, o Crédit Suisse
proibiu os seus clientes de realizarem operações financeiras com
a Venezuela e, só em Novembro de 2017, foram bloqueadas por bancos
internacionais 23 operações de compra de alimentos, produtos
básicos e medicamentos, no valor de 39 milhões de dólares.
Mais recentemente, em Janeiro e Fevereiro deste ano, coincidindo com a
entronização golpista de Juan Guaidó, o Novo Banco travou
uma operação de importação venezuelana de vacinas
contra a meningite, rotavírus e gripe, atitude que afectou directamente
2,9 milhões de crianças venezuelanas.
Outro banco com grande representação em Portugal, o Santander,
surge envolvido em actuações deste tipo. Rejeitou uma
movimentação de fundos para reparação dos
equipamentos hemodinâmicos da área cardiológica, o que
atingiu directamente pelo menos 500 crianças com cardiopatia
congénita. Exemplos deste tipo multiplicam-se em cadeia, associados a
centenas de instituições financeiras internacionais e respectivos
ramos.
Os fundos do Estado venezuelano confiscados pelo Novo Banco atingem os 1543
milhões de euros, verbas para serem prioritariamente utilizadas em
produtos essenciais como medicamentos e alimentação.
Não consta que o governo de Portugal, depois de ter oferecido o antigo
Banco Espírito Santo, resgatado pelos contribuintes portugueses, a um
fundo abutre norte-americano, se tenha movimentado para evitar as
consequências das decisões desumanas da instituição
afinal um banco português.
Porém, observando o comportamento do executivo de Lisboa nas
questões venezuelanas, seria contra-natura que o fizesse.
Porque até prova em contrário o governo da
República Portuguesa e o Banco de Portugal deram aval à
extorsão de ouro no valor de 1359 milhões de dólares
à República da Venezuela. O secretário norte-americano do
Tesouro, Steven Mnuchin, afirmou que todos os governos e bancos centrais da
União Europeia foram consultados sobre a operação,
concretizada pelo Banco de Inglaterra, onde o ouro fora depositado de
boa-fé; e ainda não houve ninguém que o desmentisse.
Aliás, como já anteriormente ficou registado, o governo
português fez-se representar, em 11 de Abril, numa reunião com o
mesmo Mnuchin dedicada à asfixia financeira contra a Venezuela. É
do secretário do Tesouro de Trump a seguinte declaração:
"Continuaremos a utilizar todas as nossas ferramentas diplomáticas
e económicas para apoiar o presidente interino Guaidó".
Fiel aos tiques de "bom aluno", o executivo de Lisboa não
poderia deixar de obedecer também à Ordem Executiva 13850 do
governo norte-americano, que bloqueia, entre muitas outras coisas, o
comércio de ouro com a empresa estatal venezuelana Minerven.
Como o governo de Portugal continua a manter o silêncio sobre estes seus
envolvimentos, e como não poderá alegar engano sobre as
verdadeiras intenções "democráticas" de Trump ou
Mnuchin, não existem dúvidas de que se identifica com o
carácter agressivo, desumano e anti-democrático do lado onde se
colocou.
Objectivos claros e terroristas
O ministro venezuelano dos Negócios Estrangeiros, Jorge Arreaza, costuma
citar um dos seus interlocutores oficiais norte-americanos que lhe disse um
dia: "já que não podemos mudar o governo venezuelano vamos
arruinar a vossa economia".
A declaração resume, sem dúvida, todo um programa
terrorista de âmbito transnacional sob a batuta dos Estados Unidos.
Segundo o
relatório de Alfred-Maurice de Zayas
, o perito independente designado pela ONU para avaliar a
situação, esse programa "além de obstruir o acesso ao
financiamento externo e aos pagamentos internacionais afecta o financiamento
normal do aparelho produtivo nacional, criando uma redução da
oferta de bens e serviços locais".
Ainda segundo Zayas, as sanções de Trump e Obama e as medidas
unilaterais do Canadá e da União Europeia "agravam directa e
indirectamente a escassez de medicamentos como insulina e antirretrovirais,
acarretando demoras na distribuição e funcionando como agravante
em diversos casos de morte o que implica crimes lesa-humanidade".
O compromisso de Alfred-Maurice Zayas para apreciar a situação
é com a ONU, não com Nicolás Maduro.
Seria, portanto, bastante mais digno e humanista que o compromisso do governo
de Portugal fosse com as Nações Unidas, não com Donald
Trump e o seu farsante Guaidó.
07/Maio/2019
O original encontra-se em
www.oladooculto.com/noticias.php?id=347
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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