A defesa e a segurança no discurso europeísta
por Rui Namorado Rosa
UM ESTADO DE GUERRA QUE O IMPERIALISMO DESEJARIA INTERMINÁVEL
Não obstante a recessão económica, a despesa militar
mundial tem crescido sustentadamente desde 1998, tendo recebido novo impulso em
2002, quando cresceu 6% (10% nos EUA, 12% na Rússia e 18% na China),
para atingir 2,5% do PIB mundial, o que correspondeu ao dispêndio de
US$128 per capita. Os EUA destacam-se por serem responsáveis por 43% da
despesa mundial e o Médio Oriente destaca-se por ter a mais elevada
intensidade de despesa, 6,3% do PIB.
[
http://www.acronym.org.uk/dd/dd72/72nr11.htm
].
Estas despesas são colossais e insensatas, e as tendências
observadas razão de grande alarme. Como fenómeno tem as suas
explicações; elas radicam na dinâmica das indústrias
de guerra e de segurança que se alimentam do capitalismo e
suportam a sua hegemonia mundial. Aqui tem principal destaque o complexo
militar-industrial, que apoiado na mobilidade do capital financeiro, alimentado
pela vaga privatizadora neoliberal, atingiu dimensão planetária.
Observando os dados disponibilizados pelo Center for Defense Information
conclui-se que é intensa a actividade de fusão e
aquisição entre empresas da indústria militar, incluindo
aquisições transatlânticas, sobretudo entre os EUA e o RU.
A outra face da mesma realidade é a aceleração de
intervenções militares em várias escalas e variadas
regiões do mundo. Contabilizando as intervenções armadas
dos EUA no estrangeiro verificamos: do elenco das 89 acções
catalogadas entre Abril de 1975 e Fevereiro de 2001, 62 foram desencadeadas
desde 1990, e 26 desde 1998; o intervencionismo imperial é patente
após o colapso do sistema socialista na URSS e na Europa de Leste
[
http://www.cdi.org/products/almanac0102.pdf
].
O mercado mundial de armamento atingiu US$35 mil milhões em 2002 (mas
atingira níveis de US$65 mil milhões/ano em fins da década
de 1980 e aquando da guerra do Golfo (1990-91). O complexo militar-industrial
fará todos os possíveis para explorar esse espaço de
manobra e retomar esses altos volumes de negócios. Nesse mesmo ano de
2002 os EUA deteve 40% das vendas, logo seguidos pelo RU com 21%.
Para o ministro da Defesa britânico a presente guerra no Iraque tem sido
uma feliz oportunidade para o teste de novidades da
indústria britânica em carros de combate, peças de
artilharia, aviões de combate, bombas e mísseis, bem como de
sistemas integrados de comunicação e informação e
de gestão de stocks, desde já a pensar em futuros negócios
de venda de armamentos [
http://www.deso.mod.uk/archive_030910_sp.htm
]. O que é um mau mas forte argumento para o total alinhamento do
governo do RU na invasão do Iraque em Março de 2003. O complexo
militar-industrial agradece.
O LONGA E APERTADO ABRAÇO ATLÂNTICO
O RU será possivelmente a primeira potência militar europeia
enquanto certamente é aquela que mais estreitos laços tem e
interesses partilha com os EUA. O RU mantém relações
estreitas com os laboratórios militares norte-americanos na
manutenção e desenvolvimento de ogivas nucleares, apoia-se nos
sistemas de navegação via satélite, inteligência e
localização de alvos fornecidos pelos EUA e a sua política
nuclear militar está intimamente sincronizada com a dos EUA (e da NATO).
Após a Segunda Guerra Mundial, nos EUA a lei
Atomic Energy Act
(1954, revista em 58) veio iniciar uma era de cooperação externa
desse país no âmbito do projecto, desenvolvimento e fabrico de
armamentos nucleares, bem como da transferência de combustíveis
nucleares. Foi na base dessa lei que foi firmado o Acordo de Defesa
Mútua UK/US (UK/US MDA) em 1958, que desde então vem sendo
renovado, de forma a acomodar as novas armas entretanto desenvolvidas bem como
a transferência de novos materiais e de informação
actualizada. Actualmente abrange não só armas nucleares mas
também reactores nucleares. É um acordo gerido secretivamente,
largamente à margem dos respectivos órgãos legislativos.
Alguns milhares de toneladas de combustível nuclear para fins militares
foram transferidos nos dois sentidos entre os EUA e o RU, pelo menos no
período 1960-79, ao abrigo desse Acordo de Defesa Mútua, cujas
origens e destinos não são inteiramente conhecidos; todavia
parece evidente que os ciclos de combustível nuclear, civil e militar,
decorreram em paralelo e em certa extensão se misturaram, de modo que se
poderá falar de desvios de combustível civil para fins militares
e vice-versa.
[
http://www.cnduk.org/press2/press31.htm
;
http://www.cnduk.org/pages/binfo/ttus.html
].
Esse Acordo serve de base para a estreita cooperação entre
corporações dos dois países, como foi o caso entre a
Westinghouse e a Rolls Royce no fabrico de reactores para a propulsão de
submarinos nucleares. A Rolls Royce & Associates, constituída em 1959,
beneficiou da transferência de tecnologia a partir daquela
corporação norte-americana para construir e aprovisionar 25
reactores para submarinos nucleares britânicos (incluindo
lançadores de mísseis balísticos). Após a
aquisição de activos pela principal accionista em 1998,
transformou-se na actual Rolls Royce Marine Power Operations. Após ter
construído e mantido reactores para submarinos nucleares da classe
Trident, está agora a desenvolver submarinos da nova classe Astute [
http://www.cnduk.org/pages/binfo/derby.html
].
A interdependência e a cooperação entre as
indústrias de defesa norte-americana e europeia são
públicas ainda que não publicitadas. Fusões,
aquisições e joint-ventures são comuns entre os dois
lados, sob o olhar vigilante do General Accounting Office (órgão
do Congresso dos EUA) [
http://www.fas.org/man/gao/
]. Nos últimos anos assiste-se mesmo ao crescimento do investimento por
parte de corporações de base europeia, que procuram assimilar
tecnologia e alargar os seus negócios ao outro lado do Atlântico;
é o caso da BAE Systems, uma das maiores transnacionais do sector
aeroespacial [
http://www.us.net/signal/index.html
].
ORIGENS E VICISSITUDES DA POLÍTICA EUROPEIA DE DEFESA
A União da Europa Ocidental (UEO) foi fundada pelo Reino Unido,
França e o Benelux através do Tratado de Bruxelas para a
Colaboração Económica, Social e Cultural e a Defesa
Colectiva (1948); iniciativa europeia, terá sido um passo precursor da
criação do Tratado do Atlântico Norte (NATO) em 4 de Abril
de 1949, já sob o domínio dos EUA. O Tratado de Bruxelas foi
depois reformulado pelo Protocolo de Paris de 23 de Outubro de 1954,
incorporando já a Alemanha e a Itália, as duas potências
europeias derrotadas na Guerra mundial. Quando o Reino Unido integrou a
Comunidade Europeia em 1973, a importância da UEO como fórum de
coordenação de políticas de defesa europeias ficou
prejudicada e declinou.
A Declaração de Roma (Outubro de 1984) marca a
reactivação da UEO, ao expressar a vontade de reforço da
segurança ocidental, não só da Europa
Ocidental mas de toda a Aliança Atlântica, e ao afirmar a
solidariedade mútua face a qualquer situação de potencial
ameaça à paz, em qualquer parte do mundo, ou perigo da
estabilidade económica. A Plataforma de Hague (Outubro de 1987)
assinala a identificação da UEO com a União Europeia nos
objectivos de defesa e segurança europeias e assume a indivisibilidade
da segurança atlântica e a vontade de reforçar o pilar
europeu da Aliança Atlântica.
A identidade de interesses políticos e económicos dos dois lados
do Atlântico foi-se assim revelando desinibidamente evidente.
A UEO veio a assumir parte activa aquando da guerra Irão-Iraque
(1980-88) e na guerra do Golfo (1990-91), e de novo na guerra dos Balcãs
(embargo à Jugoslávia com operações no
Adriático e no Danúbio, 1992-96, e missões na
Bósnia, Albânia, Kosovo e Croácia, 1993-2001), a pedido e
com o apoio da UE, e em articulação com a NATO e a OSCE. Na
realidade, o seu envolvimento em acções concretas mas menores, em
ambos teatros de guerra, significou que, mais do que importância militar
operacional, a função principal da UEO era a
coordenação político-militar dos Estados membros da UE e a
legitimização política internacional dessas
intervenções estrangeiras no Golfo Pérsico-Arábico
e nos Balcãs.
De novo em Roma (Novembro 1992), o Conselho de Ministros da UEO anunciou o seu
alargamento a par do fortalecimento do seu papel operacional e a
transferência da sua sede para Bruxelas; e reafirmou o seu compromisso
com as Declarações de Masstricht (EU, Dezembro 1991) e de
Petersberg (UEO, Junho 1992) e a sua vontade de desempenhar a missão de
instrumento da defesa da UE e de pilar europeu da Aliança
Atlântica. Em Junho de 1997, o Tratado de Amesterdão expressamente
incorporou no seu articulado as missões de Petersberg (socorro
humanitário, manutenção de paz, forças de combate
no controlo de crises), as quais passaram a ser parte integrante da
Política Europeia de Segurança e Defesa. A UEO seria pois o
braço da UE para a coordenação e cumprimento dessas
missões. Foi mais um passo no atribulado caminho para a
integração das políticas de defesa e de forças
militares na Europa Ocidental, mas desde 2000 a UEO persiste essencialmente
limitada à coordenação de programas de armamentos [
http://www.assembly-weu.org/en/accueil.php
;
http://www.weu.int/Key%20texts.htm
].
A actual minuta do Tratado Constitucional da UE afirma a vontade de intervir em
missões «fora da União na manutenção da paz,
prevenção de conflitos e fortalecimento da segurança
internacional, de acordo com os princípios da Carta das
Nações Unidas». A vontade de a UE projectar a sua
influência, mesmo militar, pelo mundo é manifesta; e não
mostra, à semelhança dos EUA, disponibilidade para actuar dentro
do quadro das instâncias internacionais máximas, designadamente da
Assembleia-Geral ou do Conselho de Segurança da ONU, mas tão
só cumprir os seus princípios, interpretados à sua maneira.
AS FORÇAS ARMADAS EUROPEIAS
A ideia de um exército europeu é remota, mas só na
última década teve avanços sensíveis. Assim, a
França e a Alemanha, que realizam periodicamente Conselhos de Defesa
bilaterais, no Conselho de La Rochelle (Maio de 1992) acordaram constituir um
grande unidade militar, com vocação europeia, que
contribuísse para a dotação da UE com capacidade militar
própria, e convidaram os restantes estados membros da União da
Europa Ocidental a participar nesse exército europeu.
http://www.france.diplomatie.fr/actu/article.asp?ART=30242
Aquando da cimeira franco-britânica de Saint-Malo (Maio de 1998) a
França e o Reino Unido afirmaram a vontade de protagonismo da
União na cena internacional e propuseram a criação de
capacidade militar autónoma e de uma política de defesa comum.
O Tratado de Amesterdão, em vigor desde 1 de Maio de 1999, fixou de
facto o desenvolvimento de uma Política Externa e de Segurança
Comum (CFSP) visando a progressiva elaboração de uma
Política de Segurança e Defesa Europeia (ESDP), com capacidade de
acção autónoma, suportada em meios militares e civis e por
órgãos de decisão comuns.
No Conselho Europeu de Helsínquia (Dezembro de 1999) foram adoptados os
objectivos globais de defesa europeia: forças militares de cerca de 100
mil soldados, 400 aviões e 100 navios, capazes de entrar em
acção no prazo de 60 dias por um período de pelo menos um
ano; esse era o conceito de Força Europeia de Reacção
Rápida (ERRF). Um dos componentes básicos para viabilizar esse
objectivo seria a disponibilidade de meios de transporte de tropas e de
equipamentos para intervenção rápida e em larga escala em
teatro de guerra; outra condição seria a
constituição de órgãos de planeamento e comando.
Em 2000, foram formalizados planos para a ERRF, estabelecidos laços
formais com a NATO e acordos sobre as contribuições nacionais com
estados membros. Mas a UE carece de capacidade suficiente para
intervenções significativas fora do seu território e
prossegue contactos com a NATO para a utilização conjunta dos
meios desta Aliança em caso de crise.
Recentemente, no Conselho franco-alemão de Defesa e de Segurança,
realizado em Paris, a 22 de Janeiro de 2003, os dois países insistiram
no reforço da capacidade de acção da EU e no
estabelecimento da Política Europeia de Segurança e Defesa
(ESDP); mais propuseram a sua conversão numa União Europeia da
Segurança e Defesa (UESD) que capacite a União Europeia para o
desempenho do seu papel na cena internacional, sem prejuízo
de contribuir também para o pilar europeu da Aliança
Atlântica. Para o efeito, reconheceram de novo a necessidade de
desenvolver uma capacidade de reacção rápida, e mostram-se
favoráveis à constituição de um estado-maior
conjunto. [
http://www.delegfrance-cd-geneve.org/chapter1/
].
Analogamente, a França e o Reino Unido têm realizado
Conferências de Defesa bilaterais, e na cimeira franco-britânica de
Le Touquet-Pas de Calais, a 4 de Fevereiro de 2003, avaliaram positivamente os
progressos realizados no quadro da ESDP e da cooperação desta com
a NATO, e propuseram novas iniciativas para acelerar esse progresso. E
não foram modestos nas suas propostas, ou não fossem a
França e o Reino Unido as duas maiores potências militares
europeias. Afirmaram a necessidade de reforço de responsabilidades da UE
na gestão de crises assim como a vocação mundial da ESDP
não só em apoio dos objectivos da política externa da
União mas também na promoção de democracia,
direitos humanos, boa governação e reformas. Afirmaram o
princípio da solidariedade e assistência mútua, civil e
militar, no seio da UE face a ameaças comuns, a ser incorporado como
cláusula de solidariedade no novo tratado da União; a vontade de
partilharem meios a fim de se apoiarem na luta face a novos risco, como o
terrorismo, convidando à parceria os restantes estados membros; e
comprometeram-se a respeitar os compromissos subscritos no seio da NATO,
reconhecida como permanecendo o fundamento da defesa colectiva dos seus
membros. Mais afirmaram a necessidade de serem fixados objectivos qualitativos
e quantitativos que assegurem quer capacidade de reacção
rápida quer capacidade para a condução simultânea de
várias operações, que contribuam também para a
constituição duma força de reacção da NATO;
e insistiram na criação de uma agência europeia
inter-governamental para o desenvolvimento coordenado de capacidades de defesa
que garanta o cumprimento de missões no quadro da PESD. Por sua parte
fixaram-se os objectivos de constituir forças terrestres, aéreas
e marítimas de intervenção rápida, suportadas na
cooperação entre os seus estados-maiores na
planificação e no comando de operações, bem como de
dotarem-se de novos porta-aviões e de cooperarem na melhoria da
disponibilidade e eficácia de grupos aéreos embarcados;
finalmente, a cooperação bilateral alargar-se-á ao
domínio industrial através dos programas de
aquisição de porta-aviões.
[
http://www.defense.gouv.fr/actualites/discours_divers/2003/d050203/050203.htm
].
A INDÚSTRIA ARMAMENTISTA EUROPEIA
Os encontros bilaterais das potências europeias não foram em
vão nos seus desígnios. Pouco depois das cimeiras relatadas, em
Maio de 2003, os estados membros tomaram a decisão de contratar a
aquisição de 180 aviões de transporte militar Airbus A-400
M por 20 mil milhões, bem como de ultrapassar divergências
e pressões exteriores (norte-americanas) quanto ao relançamento
dos projectos espaciais Galileo e Ariane. Beneficiam dessa
adjudicação o grupo franco-alemão-espanhol EADS e o grupo
britânico BAE Systems, que são proprietários da sociedade
Airbus; com este contrato, a Airbus vê largamente compensadas as suas
perdas nas vendas para a aviação civil e a EADS ascende ao
terceiro lugar mundial no sector aeronáutico
[
http://www.newsmax.com/archives/articles/2003/5/27/150125.shtml
].
Os países da EU com maiores orçamentos para a defesa são,
num primeiro plano, o RU e a França e, num segundo plano a Alemanha e a
Itália; mas do ponto de vista de esforço em
investigação e desenvolvimento tecnológico para fins
militares, em primeiro plano estão o RU e a Espanha e, em segundo plano,
a França e a Alemanha.
Por estes dados e pela sua íntima ligação com os EUA, o RU
tem destacado protagonismo na indústria armamentista. A indústria
armamentista britânica orgulha-se de representar 3% da
produção industrial e deter 21% do mercado mundial desse ramo.
É um sector industrial com marcada presença no RU mas de capital
já completamente privatizado e fortemente internacionalizado, um
negócio assumidamente global; mas a BAE Systems e a
Rolls-Royce continuam sendo duas das maiores corporações deste
ramo com base no RU não obstante estarem internacionalizadas.
A Política de Indústria de Defesa britânica,
adoptada em Outubro 2002, poucos meses antes da cimeira franco-britânica
de Le Touquet (Fevereiro de 2003) é conduzida pelo governo em
íntima colaboração com a indústria através
de um Conselho de Indústrias de Defesa. Esta
política compreende três prioridades: fomentar a competitividade
empresarial, explorar as aplicações militares de tecnologias de
todas as origens (programas militares e civis, nacionais e estrangeiros) e
abertura e alargamento do mercado nas perspectivas da importação
e da exportação. O RU coopera activamente com os EUA, com a NATO
e com a UE, através de encontros políticos ao mais alto
nível, na Defense Capabilities Initiative (NATO) e no
European Union Headline Goal e na futura European Defense
Capabilities Development and Acquisition Agency. Claro que esta
política conforma-se perfeitamente com o complexo militar-industrial,
altamente integrado em alguns poucos grupos empresariais e globalizado, e muito
activo na procura de investimentos e mercados
[
http://www.deso.mod.uk/archive_030910_sp.htm
].
A SEGURANÇA REENTRA EM CENA
Desde 2003 a Segurança surge como uma nova palavra-chave no discurso
oficial da UE e seus governos, associada a ameaças de terrorismo, de
crime organizado e desastres naturais, mas invocando simultaneamente a
segurança dos cidadãos e a competitividade económica.
Segundo a CE, a UE deverá investir numa cultura de
segurança que tire partido das potencialidades da
indústria de segurança e da comunidade
científica, para enfrentar actuais e futuros desafios de
segurança. O Conselho Europeu de 12 de Dezembro de 2003 adoptou a
versão final da Estratégia de Segurança Europeia,
identificando os desafios e as ameaças, bem como uma Acção
Preparatória (comunicação COM(2004) 72, 3 de Fevereiro
2004) que, antecipando um Programa Europeu de Investigação para a
Segurança (ESRP), a arrancar em 2007, estabelecerá uma agenda de
investigação para o avanço da segurança. A
acção preparatória parte, entre outras, da
constatação de sub-financiamento em I&D na área da
segurança, relativamente a outras regiões do mundo, e no
potencial existente para a colaboração entre actuais
domínios de investigação civis e não civis mas
relacionados com a segurança. A base legal da ESRP será decidida
e aplicada à luz do actual Tratado e dos desenvolvimentos conducentes ao
futuro Tratado Constitucional, incluindo à criação de uma
Agência com competências no desenvolvimento de capacidade de
defesa, investigação, aquisições e armamentos. Como
órgão de consulta da CE nesta área, foi constituído
um Grupo de Personalidades - GOP (incluindo administradores empresariais,
directores de instituições de investigação, altos
responsáveis da defesa, figuras políticas destacadas, membros do
PE, observadores de instituições intergovernamentais) presidido
por dois comissários Philippe Busquin e Erkki Liikanen. No seu
relatório, o GOP considera que a ESRP contribuirá para o
reforço da base de investigação científica e o
incremento da competitividade industrial, portanto para o crescimento
económico, e para ele propõe um orçamento adicional de
1000 milhões/ano, que deverá contribuir para atingir a
meta de Barcelona: 3% do PIB para I&D em 2010 [
http://europa.eu.int/comm/research/security/news/article_682_en.html
].
A Segurança inter-relaciona-se com diversas políticas actuais ou
emergentes, incluindo a ESDP (Política Europeia de Segurança e
Defesa) e CFSP (Política Comum de Negócios Estrangeiros e
Segurança). Mas o vector económico é evidente. As
decisões anteriormente referidas foram antecedidas pela
comunicação da CE COM(2003) 113, de 11 de Março de 2003,
intitulada European Defense Industrial and Market Issues: Towards
a EU Defense Equipment Policy em que as questões do mercado
europeu de armamentos surgem como centrais
[
ftp://ftp.cordis.lu/pub/era/docs/communication_security_030204_en.pdf
;
http://europa.eu.int/eur-lex/en/com/cnc/2003/com2003_0113en01.pdf
].
A UE dispõe de importantes projectos directa ou indirectamente
vocacionados para a defesa e a segurança, com destaque para o quadro da
European Space Policy: Galileo, sistema de rádio-navegação
por satélite, e o sistema global de monitorização
ambiental e segurança, GMES, ambos em desenvolvimento pela CE em
associação com Agência Espacial Europeia (ESA), que se
prevê estejam operacionais em 2008. A ESA, consórcio europeu da
indústria aeroespacial, é igualmente responsável pelos
veículos de lançamento de satélites, presentemente o Ariane
[
http://europa.eu.int/comm/space/index_en.html
;
http://www.esa.int/esaLA/index.html
].
A segurança vai-se afirmando como mais um e promissor
pretexto de financiamento público de grandes corporações
privadas e de consolidação de interesses económicos
industriais, já poderosos mas insaciáveis, ou meramente
emergentes; as indústrias aeroespacial, química,
farmacêutica, telecomunicações, informática,
serviços diversos, etc. terão renovadas ou inovadoras
oportunidades de negócio; naturalmente que em prejuízo de
aplicações sociais dos recursos públicos e certamente
cerceando garantias fundamentais dos cidadãos europeus. A
indústria da defesa pretende assim ganhar renovado alento ao passo que o
seu segredo de sucesso se alarga à esfera de outros sectores
industriais.
Entretanto, as razões económico-sociais, ideológicas e
geopolíticas subjacentes aos terrorismos e aos crimes organizados
persistem essencialmente inatendidas, se não agravadas, como
manifestações intrínsecas do presente estádio de
imperialismo global.
15 de Abril de 2004.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info
.
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