Escândalo
O "rastro ucraniano" dos mísseis norte-coreanos

por Eduard Popov

Nos últimos dias e semanas a probabilidade de um conflito quente entre os Estados Unidos da América e a República Democrática e Popular da Coreia foi escalada. Contudo, de modo desagradável para as autoridades americanas, revelou-se que a Coreia do Norte está na posse de motores de mísseis modernos de quatro etapas capazes de voar distâncias consideráveis, portanto classificáveis na classe dos Mísseis Balísticos Intercontinentais (ICBM).

Anteriormente, os norte-coreanos eram conhecidos por deterem tecnologia de foguetes simples e primitiva – foguetes tácticos com motores de duas etapas. Como pessoa interessada na história da ciência missilística russa (e soviética), posso dizer que a avançada ciência soviética da defesa levou décadas de trabalho perseverante e enormes esforços intelectuais, financeiros e organizacionais para transitar aos motores de foguete de três etapas e a seguir aos de quatro etapas.

Entretanto, parece que o segredo por trás do "milagre dos mísseis" norte-coreanos foi revelado pelos media americanos. Há alguns dias, em The New York Times, um perito do International Institute for Strategic Studies, Michael Elleman, assim como responsáveis da inteligência estado-unidense, sugeriram que os motores balísticos intercontinentais da RDPC foram comprados por especialistas norte-coreanos no mercado negro com peças fabricadas na Ucrânia.

Alexander Turchynov. A Ucrânia negou furiosamente estas acusações. Além disso, de acordo com a antiga tradição ucraniana já estabelecida, Kiev acusou a Rússia de fornecer os mísseis. Isto foi declarado por um dos líderes do Euromaidan que é chefe do Conselho de Segurança Nacional e Defesa, Turchynov. Uma outra política ucraniana e antiga patroa de Turchynov, Yulia Tymoshenko, admitiu que na verdade é possível que motores ucranianos de mísseis tenham sido fornecidos à RDPC. Se estes factos se confirmarem, diz ela, então a Ucrânia depara-se com um desastre.

Em 16 de Agosto, o escândalo que envolve a posse de motores de foguetes ucranianos pela RDPC recebeu um novo impulso com duas peças jornalísticas notáveis. A primeira: responsáveis da inteligência americana declararam que a RDPC pode ter produzido independentemente tais motores de mísseis sem importação de produtos. Esta declaração contraria o senso comum e contradiz as capacidades tecnológicas realistas da Coreia do Norte. É discutível que engenheiros militares norte-coreanos tenham cumprido um feito tecnológico em dois ou três anos quando a União Soviética levou décadas com recursos científicos e financeiros mais poderosos. A lógica determina que o regime norte-coreano tenha optado pelo caminho mais simples e mais barato – comprar motores prontos para usar e, assim, poupar dinheiro e, sobretudo, tempo precioso.

Os EUA foram obrigados a encobrir este escândalo. Se eles reconhecerem as origens ucranianas dos motores de foguetes da Coreia do Norte, então teriam de admitir que o seu apoio ao governo ilegal do Euromaidan na Ucrânia foi um erro estratégico. Naturalmente, também poderia ser assumido que aqueles que falaram queriam simplesmente assustar a sociedade americana com o papão do progresso militar e científico na Coreia do Norte.

Vovan e Lexus. A outra notícia é que o chefe da empresa ucraniana Yuzhmash, Sergei Voyt, admitiu ao brincalhão russo Aleskey Stolyarov ("Lexus"), o qual numa brincadeira telefónica fez-se passar como sendo Turchynov, que os motores de mísseis da RDPC realmente podiam ter vindo da Ucrânia. Durante a conversação telefónica, Lexus perguntou a Voyt para responder abertamente se motores de foguete ucranianos podiam ter acabado no território da Coreia do Norte, ao que Voyt respondeu que a Yuzhmash não podia ser a fonte dos motores ou da sua tecnologia, mas que há uma outra empresa que coopera com a RDPC – o Yuzhnoye Design Office (Gabinete de Desenho Yuzhnoye). O que é que a equipe fez exactamente Voyt admitiu não saber, mas disse que o SBU e o SVR (inteligência externa) da Ucrânia estariam a par.

Três conclusões se impõem com base no que foi dito acima:
(1) A Yuzhnoye é um parceiro de trabalho da RDPC;
(2) O director da fábrica Yuzhmash associada à Yuzhnoe "não sabe" o que os seus vizinhos e parceiros desde longa data estão a fazer;
(3) Aqueles que precisam saber (a inteligência ucraniana) já sabem.

Portanto, o director da Yuzhmash essencialmente confirmou o "rastro ucraniano" dos motores de mísseis da Coreia do Norte. Suas sugestões subtis (hints) e omissões parecem ser muito calculadas e sob medida para o seu interlocutor, o qual Voyt deve ter pensado que não era outro senão o próprio Turchynov.

Ao invés de epílogo: uma breve revisão histórica

Em 1954 em Dnepropetrovsk, a qual as actuais autoridades ucranianas redenominaram como Dnieper, foi fundado um gabinete de desenho junto à fábrica Yuzhmash e encabeçado pelo futuro académico Mikhail Yangel. O gabinete de Yangel empenhou-se no desenvolvimento de ICBMs e era o competidor mais encarniçado dos principais fabricantes de mísseis da URSS. Ali foram produzidos os motores para ICBMs. O director da fábrica no período final soviético foi o segundo presidente da Ucrânia, Leonid Kuchma.

A era dourada da Yuzhmash e da Yuzhnoe de Yangel acabou com o colapso da União Soviética. Embora Dnepropetrovsk continuasse a produzir motores para foguetes russos, na década de 1990 começou uma crise aguda. Muitos académicos, desenhadores e engenheiros foram forçados a procurar trabalho alhures. A seguir à vitória do Euromaidan, em 2014, o novo governo ucraniano decidiu cessar a cooperação com indústrias russas na esfera da defesa. Portanto, a Yuzhmash foi forçada a comutar para produtos não específicos e, com toda a seriedade, consideraram a possibilidade de produzir... troleibuses.

Na década de 1990 a imprensa ucraniana informou de numerosos casos de equipamento militar, armas e munições vendidas no mercado negro (contornando o orçamento ucraniano). A seguir ao colapso da União Soviética, para recordar, a Ucrânia foi deixada com três distritos militares os quais em termos de volume de armas ultrapassavam mesmo os da Rússia. Mas ao longo da primeira década da independência ucraniana, a maior e melhor parte destas armas foi vendida. Também se informou que a Yuzhmash estava a comerciar tais produtos. Além disso, engenheiros projectistas de Dnepropetrovsk foram activamente atraídos a outros países para se empenharem na criação de escudos (shields) de mísseis nucleares, tais como aqueles do Irão e da Coreia do Norte.

Um outro pormenor de não pequena importância é que Dnepropetrovsk é o centro da Judiaria Ucraniana e o feudo de um dos mais poderosos clãs, nomeadamente aquele que produziu Kuchma, Lazarenko (antigo presidente e primeiro-ministro), Tymoshenko, os oligarcas Pinchuk e Kolomoysky (o chefe do Congresso Judeu Ucraniano) e Yarosh (o líder do Right Sector). O clã de Dnepropetrovsk distingue-se por uma extrema falta de propósito ideológico e por absoluto cinismo. Exemplo: Kolomoysky financiou os gangs do Right Sector apesar do seu extremo anti-semitismo.

Tomando tudo em conjunto, isto mostra quão moral e psicologicamente factível seria que tal tecnologia altamente lucrativa e altamente procurada no mercado negro global de armas fosse vendida precisamente aqui.

17/Agosto/2017

Ver também:
  • Relações EUA-Rússia destinadas a uma viragem incrível

    O original encontra-se em www.fort-russ.com/2017/08/scandal-ukrainian-trace-of-north-korean.html


    Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
  • 23/Ago/17